Acórdão nº 36/20.5YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelILÍDIO SACARRÃO MARTINS
Data da Resolução25 de Março de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Procº nº 36/20.5YFLSB Acordam na Secção de Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça I - RELATÓRIO AA, Juíza de Direito, veio, ao abrigo do disposto nos artigos 169º e seguintes do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ) instaurar a presente acção contra o Conselho Superior da Magistratura (CSM), impugnando a deliberação do Plenário daquele órgão de 06-10-2020, que decidiu negar provimento à reclamação apresentada pela Exmª Senhora Juíza de Direito ao despacho proferido pelo Exmº Senhor Vice-Presidente de 23-03-2020, que negou o pedido de pagamento da remuneração que a Srª Juíza reclamante entendeu ser-lhe devida por, no âmbito do Quadro Complementar de Juízes da Relação ....., ter exercido funções, em regime que reputou de “acumulação”, em mais do que um tribunal.

Alegou, em síntese, que houve a preterição do direito de audiência prévia, vício de violação de lei, por violação, entre o mais, dos artigos 29º e 45º-A, do EMJ, e a violação dos princípios da retribuição, igualdade e da proteção da confiança.

Pede que a ação seja julgada procedente e, em consequência, seja anulada a sobredita deliberação, com as legais consequências.

O Conselho Superior da Magistratura, contestou, sustentando a legalidade da deliberação em causa, que a finalidade visada com a audiência prévia da autora, que foi preterida, foi assegurada pela reclamação apresentada pela autora e a inexistência de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito, e dos princípios da retribuição, da igualdade e da protecção da confiança, concluindo pela improcedência da acção por falta de fundamento legal.

Findos os articulados, foi proferido despacho que, considerando que o processo já continha os elementos suficientes para o Tribunal, com segurança, conhecer de imediato da questão de facto e de direito da causa e que, no caso dos autos, já se mostrava plenamente assegurada a discussão de facto e de direito, dispensou a realização de audiência prévia, ao abrigo do disposto nos arts. 27º, nº1, al. a) e 87-B, nº 2, ambos do CPTA.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II - FUNDAMENTAÇÃO

  1. Fundamentação de facto Tendo em atenção a posição das partes expressas nos seus articulados e o acervo documental junto aos autos, está provada, com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos e de acordo com as várias soluções de direito plausíveis, a seguinte matéria de facto: 1º - No Movimento Judicial Ordinário de 2019 a autora foi colocada como efectiva no Quadro Complementar de Juízes (QCJ) ....., mediante deliberação aprovada no Plenário do Conselho Superior da Magistratura de 09-07-2019, tendo tomado posse nesse lugar a 04-09-2019 (cf. docs. 2 junto à petição inicial e 1 junto à contestação, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).

    1. - Por decisão superior de 17-07-2019, e após reunião com a Exmª Senhora Vogal e os demais Senhores Juízes afectos ao Quadro Complementar da Relação ..... (QC….), a autora passou a desempenhar funções no Juízo de Competência Genérica de Vila Real ....... – Juiz …. – em substituição do titular desde 02-09-2019 e previsivelmente até, pelo menos, 27-11-2019 (cf. doc. 3 junto à petição inicial).

    2. - Para além das funções referidas em 2º, a autora passou a assegurar 50% do serviço respeitante ao Juízo de Família e Menores Juiz …, sendo que os outros 50% deste serviço foram assegurados por uma outra Senhora Juiz do QCJ ....., conforme despacho do Senhor Vice-Presidente do CSM de 08-09-2019, passando a desempenhar funções no Juízo de Competência Genérica ....... – Juiz … em acumulação de serviço com 50% do Juízo Central de Família e Menores …. - Juiz … (cf. doc. 4 junto à petição inicial).

    3. - Por despacho do Senhor Vice-Presidente do CSM de 25-10-2019, e desde o dia 21-10-2019, a autora passou a exercer funções (cf. doc. 5 junto à petição inicial): a.

      no Juízo de Competência Genérica ....... – Juiz …, em substituição do respectivo titular; b.

      e, em acumulação, no Juiz …, Juízo Central Cível ......., sendo responsável pela tramitação e decisão de ¼ de processos deste Juízo Central Cível.

    4. - A partir de 01-03-2020 a autora passou a exercer funções (idem): a) no Juízo de Competência Genérica ......., em exclusivo no âmbito da jurisdição civil, e em substituição de um dos titulares; b) e, em acumulação de serviço, no Juiz …, Juízo Central Cível ......., continuando responsável pela tramitação e decisão de ¼ de processos deste Juízo Central Cível.

    5. - Por requerimento datado de 20-03-2020 a ora autora apresentou via electrónica junto da entidade demandada um requerimento, enunciando as vicissitudes referidas em 1º a 5º, e concluindo com um pedido de pagamento de remuneração pelo exercício de funções em regime de acumulação de serviço, ao abrigo do disposto no artigo 29º do EMJ, na redação conferida pela Lei nº 67/2019, de 27 de Agosto, rematando com o seguinte pedido Termos em que requer a V. Exa.

      1. o pagamento de remuneração devida pela acumulação, na proporção de 1/4 da remuneração devida ao Colega colocado no Juízo Central Cível .......; b) sem prejuízo de imediato e desde Janeiro de 2020 ser remunerada já em 1/5, operando-se oportunamente os acertos para a remuneração de 1/4, com efeitos rectroativos.

      (cf. fls. 1-3 do processo administrativo instrutor,) 7º - Sobre o requerimento referido em 6º foi proferido a 23-03-2020 despacho pelo Sr. Vice-Presidente do CSM com o seguinte teor: Veio a Exma. Sra. Juíza AA requerer o pagamento de remuneração invocando a acumulação de funções.

      Foi solicitado ao GAVPM o Parecer que está junto e com o qual se concorda integralmente fazendo nossas as suas conclusões e fundamentos.

      Assim, entendemos que não assiste qualquer direito à Requerente não tendo a sua pretensão fundamento legal, pelo que se indefere.

      Comunique.

      (cf. doc. 6 junto à petição inicial e fls. 19 do processo administrativo instrutor).

    6. - O parecer a que aludia e em que se fundamentou o despacho referido em 7º tinha a referência «Parecer do GAVPM de 25-02-2020», elaborado no «procedimento n.º …….24», subordinado ao assunto «Remuneração por “acumulação de funções” por Juiz colocado no Quadro Complementar de Juízes», que teve o seu início no requerimento apresentado pela Exmª Juíza BB, colocada no Quadro Complementar do Distrito ....., e no qual se consignou, além do mais, o seguinte: “ 2.2. Apreciando.

      Como já referimos, a questão ora em análise prende-se em averiguar se a ora requerente tem direito a receber remuneração por acumulação nos termos do art. 29.° do Estatuto dos Magistrados Judiciais (Lei n.° 21/85, de 30 de Julho, na versão mais recente dada pela Lei n.° 67/2019, de 27 de Agosto), o qual dispõe que: «Pelo exercício de funções em regime de acumulação ou de substituição que se prolongue por período superior a 30 dias seguidos ou 90 dias interpolados no mesmo ano judicial, ê devida remuneração, em montante a fixar pelo Conselho Superior da Magistratura, em função do grau de concretização dos objetivos estabelecidos para cada acumulação, tendo como limites um quinto e a totalidade da remuneração devida a magistrado judicial colocado no juízo ou tribunal em causa».

      Da letra do art. 29.°, do citado diploma legal, podemos, antecipadamente, concluir que apenas é devida remuneração pelo exercício de funções em regime de acumulação ou de substituição (sublinhado nosso).

      Neste conspecto, o art. 45.°-A, do EMJ, cuja epígrafe é «Reafetação de juízes, afetação de processos e acumulação de funções», dispõe o seguinte: «1 - O Conselho Superior da Magistratura, sob proposta ou ouvido o presidente da comarca, e mediante concordância dos juízes, pode determinar:

      1. A. reafetação de juízes, respeitado o princípio da especialização dos magistrados, a outro tribunal ou juízo da mesma comarca; b) A afetação de processos para tramitação e decisão a outro juiz que não o seu titular, tendo em vista o equilíbrio da carga processual e a eficiência dos serviços.

        2- O Conselho Superior da Magistratura, sob proposta ou ouvido o presidente de comarca, e mediante concordância do juiz pode determinar o exercício de funções de magistrados judiciais em mais do que um juízo ou tribunal da mesma comarca, respeitado o princípio da especialização, ponderadas as necessidades dos serviços e o volume processual existente.

        3 - As medidas referidas nos números anteriores não podem implicar prejuízo sério para a vida pessoal ou familiar do juiz têm como finalidade responder a necessidades de serviço, pontuais e transitórias, e devem ser fundadas em critérios gerais regulamentados pelo Conselho Superior da Magistratura, respeitando os princípios de proporcionalidade, equilíbrio de serviço e aleatoriedade na distribuição».

        Do preceito legal em análise resulta que tanto a reafectação de juízes a outro tribunal ou juízo, como a afetação de processos para tramitação e decisão a outro juiz que não o seu titular (tendo em vista o equilíbrio da carga processual e a eficiência dos serviços), ou, ainda, o exercício de funções de magistrado judicial em mais do que um juízo ou tribunal da mesma comarca, pressupõe previamente que o CSM obtenha a concordância do juiz visado e ter sido sob proposta ou ouvido o presidente da comarca (sublinhado nosso).

        No que concerne à circunstância de a afetação, reafectação e acumulação de funções ser proposta ao CSM pelo Presidente do Tribunal, a Lei Orgânica do Sistema Judiciário (LOSJ, aprovada pela Lei n.° 62/2013, de 26.08) no art. 94.°/4, als. f) e g) regula esta matéria da seguinte forma: «(...) 4 -O presidente do tribunal possui as seguintes competências de gestão processual, que exerce com observância do disposto nos artigos 90.° e 91.°:f) Propor ao Conselho Superior da Magistratura a reafetação de juízes, respeitado o princípio da especialização dos magistrados, a outro tribunal ou juízo da mesma comarca ou a afetação de processos para tramitação e decisão a outro juiz que não o seu titular, tendo em vista o equilíbrio da carga processual e a eficiência dos serviços; g) Propor...

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