Acórdão nº 00606/09.2BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelCristina da Nova
Data da Resolução15 de Abril de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: * 1. RELATÓRIO fazenda pública, veio recorrer da sentença que julgou procedente a impugnação do imposto de selo relativo à doação de prédio urbano realizada em 21-02-2005.

Formulam nas respetivas alegações (cfr. fls. 87-95) as seguintes conclusões que se reproduzem: I.

A presente impugnação versa sobre as liquidações de Imposto do Selo n.º 51973 e 51976, no montante de € 4.785,75, cada.

II.

Na douta sentença recorrida julgou-se procedente a impugnação deduzida, entendendo o Tribunal a quo que as liquidações em causa deveriam ser anuladas uma vez que em virtude da escritura de rectificação da doação a Impugnante não é proprietária de metade do prédio doado, não existindo facto tributário.

III.

A Fazenda Pública considera a que deveriam ter ido à Matéria Assente os factos, com suporte documental, referidos em 4.

IV.

Nessa medida, e atento o disposto na alínea a) do art.2 712º do Código de Processo Civil, ex vi art.º 2º, alínea e) do CPPT, deverá a matéria de facto ser alterada, no sentido de serem dados como provados os factos indicados em 4. da presente peça processual.

V.

Assim sendo, imperioso se torna concluir que a escritura de rectificação foi efectuada apenas e tão só para a Impugnante se eximir ao pagamento do imposto devido.

VI.

Da escritura de doação celebrada em 21.02.2005 resulta inequivocamente que a doação do prédio contemplava o marido da Impugnante e ela própria, nela constando: “Que doam aos segundos outorgantes, seus filho e nora” tendo estes últimos declarado que “aceitam a presente doação nos termos exarados”.

VII.

Acresce que, se os doadores apenas pretendiam doar o imóvel ao filho e atento o art.º 1683º, n.º 1 do C.C. segundo o qual os cônjuges tem legitimidade para aceitar doações, heranças ou legados, independentemente do consentimento um do outro, como se justifica a intervenção da Impugnante, na qualidade de outorgante, na escritura de 21.02.2005? VIII.

A nosso ver, tal intervenção apenas teve lugar pelo seguinte motivo: uma vez que a Impugnante é casada no regime de comunhão de adquiridos, o bem doado exclusivamente ao filho nunca faria parte da comunhão, nos termos do disposto no art.º 1722º, n.º 1, al. b).

IX.

Assim sendo, para que a doação contemplasse a Impugnante, tal como era a intenção dos doadores, ela teria necessariamente de intervir e aceitar a doação, como sucedeu.

X.

No acto de outorga da escritura pública de doação foi lido e explicado o seu conteúdo.

XI.

Em todos os actos em que a Impugnante interveio declara-se quer como beneficiária da doação quer como proprietária do imóvel doado.

XII.

Não se compreendendo que a mesma venha a invocar que foi por lapso do Notário (!?) e dos outorgantes que os pais do marido da Impugnante doaram o prédio não só ao seu filho, mas também à sua nora, ora Impugnante.

XIII.

Na sentença proferida a Mmª Juíza considerou que “Tendo por escritura sido alterada a vontade dos doadores, retirando a Impugnante dessa doação, esta tem efeito reportado à data da escritura de doação.

XIV.

No entanto, salvo o devido respeito por melhor opinião, o negócio celebrado em 27.04.2006 não configura qualquer rectificação.

XV.

Segundo o art.º 249º do Código Civil (CC) o simples erro de cálculo ou de escrita, revelado no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita, apenas dá direito à rectificação desta.

XVI.

Porém é necessário que se trate de erro ostensivo, neste sentido Pires de Lima e Antunes Varela in Código Civil anotado, Vol. 1, 4ª Edição Revista e actualizada, Coimbra Editora Limitada.

XVII.

Também na Revista de Legislação e Jurisprudência, n.º 112, pág. 6, Vaz Serra defende que quando o erro na declaração negocial não for patente ou ostensivo, não é razoável sujeitar a contra-parte da declaração ou inclusivamente terceiro a quem essa declaração possa ser oposta, à mera rectificação do erro de que não se possa ter apercebido.

XVIII.

Na douta sentença proferida a Mmª Juíza considerou que tendo, por escritura de rectificação sido alterado a vontade dos doadores, retirando a Impugnante dessa doação, esta tem efeito reportado à data da escritura de doação.

XIX.

Sucede, porém, que uma mera escritura de rectificação não é susceptível de alterar a vontade dos outorgantes, tal apenas seria possível através de acção anulatória da doação, deduzida nos termos do art.º 247º do C.C., com fundamento em erro na declaração.

XX.

O Tribunal poderia ter determinado que a rectificação da escritura apenas produz efeitos inter partes, não perante a Administração Tributária.

XXI.

Segundo o art.º 36º, n.º 4 da Lei Geral Tributária a qualificação jurídica efectuada pelas partes, mesmo em documento autêntico, não vincula a Administração Tributária.

XXII.

A escritura pública de rectificação apenas faz prova plena de que os outorgantes declararam perante o notário que pretendiam rectificar a doação efectuada em 21.02.2005.

XXIII.

No entanto, não faz prova de que as declarações dos outorgantes não se encontram afectadas por vícios de consentimento ou que não se tenha verificado uma divergência entre a vontade declarada e a vontade real dos outorgantes.

XXIV.

Até porque como resulta de todos os factos apurados é manifesto que, através da rectificação, se pretendeu eximir a Impugnante do imposto devido e já liquidado (evasão fiscal).

XXV.

Nestes termos, deverá a sentença recorrida ser revogada e substituída por douto Acórdão que considere a impugnação improcedente.

Revogando a douta sentença recorrida e julgando a impugnação improcedente, Vossas Excelências farão, agora como sempre, a costumada JUSTIÇA»*A recorrida, M., não apresentou contra-alegações.

*O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se pela procedência do presente recurso, com base no...

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