Acórdão nº 570/20.7T8EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 15 de Abril de 2021
Magistrado Responsável | MOIS |
Data da Resolução | 15 de Abril de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO Apelante: C…, Lda (ré).
Apelado: A… (autor).
Tribunal Judicial da Comarca de Évora, Juízo do Trabalho de Évora.
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O A. intentou processo especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento contra a R., apresentando o competente formulário.
Realizada a audiência de partes prevista no art.º 98.º-F do Código de Processo do Trabalho, não foi alcançada a conciliação.
Notificada para apresentar a motivação do despedimento, a entidade patronal veio fazê-lo, pedindo que o despedimento seja julgado válido e eficaz, uma vez que o trabalhador adotou um comportamento que traduz uma violação dos deveres consignados na alínea a) do n.º 1 do art.º 128.º do Código do Trabalho, tratando-se de comportamento culposo que, pela sua gravidade e consequências torna imediatamente impossível a subsistência da relação de trabalho, acrescentando que se encontravam reunidos os pressupostos a que alude o art.º 351.º 1 e 2, a), e foi observado o formalismo previsto nos art.ºs 353.º e seguintes.
A entidade patronal alega para o efeito, e em suma, que: No dia 29 de dezembro de 2019, o trabalhador colocou um vídeo num grupo de WhatsApp onde estão vários colegas de loja, onde, visualizando o estado desarrumado da loja, acompanhou com as suas seguintes declarações: “Isto um gajo acorda, chega à loja logo de manhã é logo bombardeado com cenas de vitrines e putas que os pariu a todos mas depois as prioridades estão-se a cagar. Estão-se a cagar se há promoções para pôr, se há prateleiras para pôr que não existem, se há Natal para encaixotar, estão-se a cagar. E depois ainda se estão a cagar mais para o tem de se fazer, porque esta loja aqui, pronto, passamos pelos pingos da chuva, e vamos passando, é assim, sempre passámos e vamos passando, encostamo-nos a um canto e tá-se fixe, agora, esta merda que aqui está, esta merda que aqui está, eu quero ver quem é que é, se os vitrinistas ou os armazenistas que vêm para aqui como sempre, porque isto é muito bom falar pela merda do whatsapp, mas depois quando chega a hora de fazer a real, está tudo a esconder e a mexer no cabelo e a ir para o escritório, porque é que merda que se passa nesta loja é que é muito escritório e pouco trabalho físico.”.
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O vídeo foi remetido a partir do telefone do colega Nuno e foi elaborado na sequência de o encarregado de loja ter efetuado um aviso à equipa sobre prioridades de tarefas, algo com o que o trabalhador se terá sentido penalizado.
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As menções a enrolar o cabelo e a ir para o escritório são sobretudo dirigidas à subgerente da loja, A…, que também recebeu o vídeo.
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As ofensas são particularmente ofensivas para os dois encarregados de loja, pois é a direção da loja que é especialmente denegrida e vilipendiada no vídeo e que são vexados pelo vídeo em causa.
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Não é o exercício crítico que é censurável, mas a forma como este é feito, em termos que extravasam claramente a liberdade de expressão no local de trabalho num quadro hierárquico por parte de colega e subordinados.
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A conduta descrita, assumida pelo trabalhador de forma consciente e culposa, quebrou inabalavelmente o elo de respeito mútuo e de confiança que existia na relação de trabalho que este mantém com a entidade patronal.
Através da contestação que deduziu, o trabalhador pediu que o despedimento seja julgado ilícito por ser inválida a única prova produzida no procedimento disciplinar e por falta de justa causa, sendo a ré em consequência condenada a reintegrá-lo, sem prejuízo da sua antiguidade e categoria, nos termos do disposto no art.º 389.º, 1, b), e a pagar-lhe as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da sentença nos termos do n.º 1 do art.º 390.º, sem prejuízo do disposto no art.º 98.º-N, n.ºs 1 a 3, do Código do Processo de Trabalho, e deduziu pedido reconvencional, peticionando que a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 3 000 a título de indemnização por danos não patrimoniais, ao abrigo do preceituado na alínea a) do n.º 1 do art.º 389.º. .
Alega o trabalhador para o efeito, e em suma, que: 1º A nota de culpa foi-lhe entregue em mão no dia 24 de fevereiro de 2020 e, ao contrário do que se afirma no ponto 2 da decisão final, apresentou a sua defesa por escrito em 9 de março de 2020, que enviou por correio registado.
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Na sua defesa confessava os factos, explicando, contudo, que as afirmações foram proferidas num grupo restrito e privado de WhatsApp, externo à empresa, onde os seus membros trocavam opiniões sobre o trabalho e os mais variados assuntos.
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E explicava a razão do seu desabafo, sendo que a filmagem da situação que encontrou ao iniciar o serviço, quer na loja, quer no armazém, falam por si sobre a razão daquele.
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Por outro lado, como facilmente se conclui da gravação, as afirmações são feitas para todo o grupo e não para ninguém em particular.
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Apesar do vernáculo usado não existe nenhuma expressão que possa ser qualificada de injuriosa para qualquer dos restantes trabalhadores.
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Só após os trabalhos de pré inventário e inventário, em que participou ativamente, e passado praticamente dois meses, é que foi instaurado o processo disciplinar e foi suspenso preventivamente.
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Desde a sua admissão sempre exerceu as suas funções de forma diligente, assídua e interessada, e sempre demonstrou interesse e brio profissional para que a loja estivesse organizada de acordo com os padrões de qualidade e a imagem de marca da entidade patronal.
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Foi o seu brio profissional que esteve na base do desabafo e a crítica ao que encontrou ao entrar ao serviço.
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Além do desabafo, nunca teve qualquer comportamento que merecesse reparo da entidade patronal ou dos seus superiores hierárquicos.
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Continuou a desempenhar as suas funções com a mesma diligência, assiduidade e brio profissional.
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O ambiente de trabalho não sofreu alteração até a sua suspensão preventiva, mantendo um normal relacionamento com todos os colegas da loja.
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É certo que utilizou uma linguagem pouco urbana, mas a mesma não traduz qualquer desrespeito para com os seus colegas de trabalho.
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Não foi considerada a sua defesa e a justificação do seu comportamento, nem o seu arrependimento.
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À data do despedimento auferia a remuneração mensal de € 630, um subsídio de alimentação diário de € 6,05 e um abono para falhas de € 29.
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Em 31 de março de 2020, a entidade patronal pagou-lhe, em consequência do despedimento, a quantia líquida de € 1 846,35 mas não lhe facultou o respetivo recibo.
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A entidade patronal declarou à Segurança Social que aquele valor líquido correspondia a € 2 352,68.
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Não gozou as férias vencidas em 1 de janeiro de 2020.
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A entidade patronal nunca lhe proporcionou qualquer formação profissional.
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Até à presente data não conseguiu arranjar emprego, embora esteja inscrito no Centro de Emprego desde 22 de abril de 2020.
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Não recebeu qualquer subsídio de desemprego.
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Só em 3 de junho de 2020, após a intervenção da Autoridade para as Condições do Trabalho, é que a entidade patronal deu cumprimento ao disposto no art.º 341.º do Código do Trabalho, enviando-lhe o Modelo 5044, Declaração de Situação de Desemprego, o que na prática impediu que até à presente data o desenvolvimento do processo de subsídio de desemprego.
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Em consequência da atitude da premeditada da entidade patronal, não enviou esta a declaração com a comunicação da decisão de despedimento, como seria normal numa empresa com a sua dimensão, sendo uma obrigação legal que não pode ignorar.
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Em consequência deste comportamento da entidade patronal, está até agora privado de meios mínimos de subsistência, vivendo da ajuda de familiares, após se ter esgotado o “pecúlio” que a entidade patronal lhe pagou em função do despedimento.
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Tal agravou a sua angústia o sofrimento, que se vê sem rendimentos e sem perspetivas de trabalho a curto prazo, atenta a grave crise desemprego provocada pela pandemia.
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Vive em união de facto com A… e o casal tem um filho menor com um ano e oito meses de idade.
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Entretanto, a sua companheira também ficou desempregada, por não lhe ter sido renovado o contrato a termo.
A entidade patronal apresentou resposta ao pedido reconvencional peticionando que mesmo seja julgado improcedente por não provado.
Foi proferido despacho saneador que considerou a instância válida e regular, foi admitido o pedido reconvencional, foi dispensada a identificação do objeto do litígio e a enunciação dos temas da prova e foram admitidos os róis de testemunhas.
Procedeu-se a julgamento, como consta da respetiva ata, Após, foi proferida sentença com a decisão seguinte: Pelo exposto e tendo em atenção as disposições legais supracitadas: 1.º Declaro a ilicitude do despedimento do trabalhador A… pela entidade patronal C…, Lda.
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Condeno a entidade patronal a pagar ao trabalhador uma compensação em valor equivalente a três meses de retribuição base (considerando que a antiguidade remonta a maio de 2018 e o despedimento a março de 2020, ou seja, menos de três anos), até à data do trânsito em julgado da presente decisão (sendo que a retribuição base mensal a atender ascende ao montante de € 630), o que totaliza o montante de € 1 890, sendo que a este montante acrescem os juros de mora vencidos desde a data da citação e vincendos, à taxa legal.
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Condeno a entidade patronal a pagar ao trabalhador as retribuições que seriam devidas desde a data do despedimento, 18 de março de 2020, e até ao trânsito em julgado da presente decisão, incluindo as férias e os subsídios de férias e de Natal devidos no referido período, sem prejuízo do eventual desconto das quantias a que se referem os art.ºs 390.º, 2, c), do Código do Trabalho, e 98.º-N, 1 a 3, do Código do Processo do Trabalho, a determinar através do incidente de liquidação, se for necessário, acrescido dos juros de mora vencidos desde a data da liquidação e vincendos, à taxa legal.
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Condeno a entidade patronal a pagar ao trabalhador uma...
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