Acórdão nº 448/10.2GVFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelPAULA NATÉRCIA ROCHA
Data da Resolução14 de Abril de 2021
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. n.º 448/10.2GBVFR.P1 Tribunal de origem: Juízo Local Criminal de Santa Maria da Feira– J3– Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:I. Relatório:No âmbito do Processo Comum Singular n.º 448/10.2GBVFR a correr termos no Juízo Local Criminal de Santa Maria da Feira (J3) foi julgado e condenado o arguido B… pela prática de um crime de roubo, previsto e punido pelo p. e p. artigo 210.º n.º 1 do Código Penal (na pessoa de C…), na pena de 2 anos de prisão, pela prática de um crime de roubo, previsto e punido pelo p. e p. artigo 210.º n.º 1 do Código Penal (na pessoa de D…), na pena de 2 anos de prisão, e pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo art. 3.º n.º1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro, na pena de 10 meses de prisão, sendo que, em cúmulo jurídico, foi condenado na pena única de 3 (três) anos de prisão efetiva.

Desta decisão veio o arguido interpor o presente recurso, nos termos e com os fundamentos que constam dos autos, que agora aqui se dão por reproduzidos para todos os legais efeitos, terminando com a formulação das conclusões seguintes (transcrição): I. O Tribunal a quo pronunciou-se relativamente a antecedentes criminais do arguido inscritos no CRC dos quais não podia tomar conhecimento, o que configura a nulidade da sentença, nos termos previstos na al. c), in fine, do n.º 1, do art.º 379º do CPP.

  1. Tendo em consideração o CRC do arguido nos termos em que foi emitido, a decisão recorrida viu contaminadas as operações de determinação das circunstâncias agravantes, a escolha da pena, a determinação da medida da pena e a determinação de eventual pena de substituição.

  2. Ao fazê-lo, incorreu o Tribunal a quo na nulidade da sentença por violação dos art.os 1º, 2º e 18º n.º 2 da Constituição da República e dos art.ºs 40º n.º 1, 70º, 71º n.º 1 e 50º n.º 1 do CP.

  3. A prova referente aos antecedentes criminais do arguido deverá ser renovada.

  4. A decisão recorrida não valorou adequadamente as circunstâncias atenuantes.

  5. Existindo circunstâncias dadas como provadas na sentença que não foram devidamente consideradas nem valoradas a favor do agente nos termos do artigo 71º nº. 1 e nº. 2 do CP, para uma justa determinação da medida da pena, ocorre, em nosso entender, uma violação do referido preceito legal.

  6. A qualificação da integração social do arguido deverá ser revista para ter objetivamente em conta a prova documental e testemunhal ad hoc suprarreferida (art.º 13º da motivação).

  7. A qualificação das exigências de prevenção especial deverá ser revista à luz de prova renovada dos antecedentes criminais do arguido.

  8. A decisão recorrida acolhe as declarações relativas à situação familiar, pessoal e económica do arguido. No entanto, tal factualidade, ainda que dada como provada, foi incorretamente levada em consideração para efeitos do artigo 71º do Código Penal.

  9. A decisão recorrida retirou erradamente da factualidade provada, que o arguido "demonstra uma personalidade contrária ao direito", sendo os antecedentes criminais constantes no CRC em crise um dos elementos- quiçá o principal- que motivam tal conclusão.

  10. Existe um erro notório na apreciação da prova, devendo conclusão ser eliminada da decisão recorrida, pois é incompatível com os factos dados como provados de que o arguido não pratica qualquer crime desde 2012 e regressou voluntariamente a Portugal para acertar as suas pendências judiciais.

  11. As considerações supra expendidas permitem concluir que a decisão recorrida não ponderou ou não ponderou adequadamente todos os fatores a que a lei manda atender em sede de atenuação geral da pena, violando o disposto nos art.os 40° e 71° do CP.

  12. A operação de medida da pena deverá ser refeita tendo em conta um CRC expurgado de informação impertinente e levando em conta o percurso pessoal e comportamental do arguido desde 2012.

  13. A decisão recorrida omitiu a possibilidade de atenuação especial da pena.

  14. Decorreram dez anos sobre a prática dos factos e oito anos desde a prática pelo arguido de qualquer ilícito penal; XVI. Chegado a Portugal em outubro de 2019, o arguido cumpriu pena pela prática de crime de condução sem habilitação legal e cumpre atualmente pena por factos parcialmente idênticos aos dos presentes autos praticados em 12/05/2008, ou seja, anteriores aos que ora motivaram a sua condenação, não lhe restando qualquer outra pendência judicial penal; XVII. No Reino Unido o arguido tem família estável, residência certa e trabalho assegurado.

  15. A omissão da atenuação especial da pena aplicada ao arguido viola a al. c) do n.º 1 do art.º 379º do CPP.

  16. A decisão recorrida dá uma relevância desmesurada- et pour cause - aos antecedentes criminais, em detrimento da consideração devida ao percurso de vida do arguido, que permitiria prognosticar uma necessidade diminuída da pena privativa da liberdade.

  17. Este enviesamento configura erro notório na apreciação da prova, violando a al. c) do n.º 2 do art.º 410º do CPP.

  18. No iter decisório da suspensão da execução da pena deverão ser sopesadas todas as alternativas mais conformes às finalidades de prevenção das penas, antes ser adotada uma decisão de aplicação de uma pena de prisão efetiva.

  19. A suspensão da execução da pena pode ser subordinada ao cumprimento de deveres, à observância de regras de conduta e ao regime de prova, por um período de suspensão mais dilatado, sendo pacífico o reconhecimento de todas as vantagens que daí podem advir, em termos de ressocialização do agente e de proteção de bens jurídicos.

  20. É consabido que a prudente aplicação combinada de medidas é em geral eficaz para afastar o transgressor da prática de futuros ilícitos através da simples censura do facto e da ameaça da prisão, satisfazendo as exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa da paz e ordem públicas, realizando de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

  21. A decisão recorrida não se debruçou sobre qualquer uma destas possibilidades, incorrendo em violação do disposto nos artigos 40°, 50°, 51°, 52° e 53°, todos do CP.

  22. A decisão recorrida incorre ainda no vício de deficiência de fundamentação.

  23. O vício de deficiência de fundamentação em que está incursa acarreta a sua nulidade, ao abrigo do que conjugadamente vem disposto no n.º 2 do artigo 374° e na alínea a) do artigo 379°, ambos do Código de Processo Penal.

    Termina pedindo seja declarada inválida a decisão contida na sentença recorrida de que resultou a fixação da medida concreta da pena única de três anos de prisão efetiva aplicada ao arguido-recorrente, reenviando o processo para novo julgamento, ou, caso assim se não entenda, se suspenda a execução da pena subordinando-a, eventualmente, ao cumprimento de deveres e/ou à observância de regras de conduta, A este recurso respondeu o Ministério Público nos termos e com os fundamentos que constam dos autos, da seguinte forma: - Insurge-se o recorrente contra, por um lado, a valoração do teor do certificado de registo criminal junto aos autos e, por outro, da concreta medida da pena que lhe foi aplicada, pretendendo vê-la suspensa na sua execução.

    - Muito singelamente diremos apenas que do referido certificado constam as condenações "não canceladas", conforme alegado, no estrito cumprimento do disposto na Lei 37/2015, de 05 de maio, mormente nos seus artigos 10.º a 13.º.

    - Assim, são de valorar, como foram, os antecedentes criminais do arguido e, nessa medida, ficaria prejudicada a apreciação do restante peticionado.

    Mas sempre se dirá que, - A incriminação ou não de certos factos depende de razões de política criminal, que variam no espaço e no tempo, e a imposição de sanções penais visa a proteção de determinados valores jurídico-criminais.

    - O legislador, ao fixar a moldura penal abstrata, valora os bens jurídicos que são postos em perigo com a violação de determinada norma penal, atendendo ao bem jurídico violado e à sua ressonância ético-social.

    - Posteriormente, é tarefa do julgador, face a uma violação da norma penal, encontrar o quantum exato da pena a aplicar.

    - Como se sabe, a aplicação de penas visa a proteção de bens jurídicos, a defesa da sociedade e a reintegração social do agente.

    - Em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa, que continua a constituir, não o fundamento, mas um dos fundamentos irrenunciáveis da aplicação de qualquer pena (dr. artigo 40.º, n." 1 e 2 do Código Penal).

    - A eficácia do sistema jurídico-penal tem, pois, a ver com a prevenção, cabendo-lhe, por fim, na sua vertente especial, encontrar o quantum exato da pena que dentro dessa função melhor sirva as exigências de (re)socialização.

    - À data da prática dos factos, o arguido tinha já sido condenado, para além de em penas (plural) de multa, numa pena de 8 meses de prisão substituída por 240 dias de multa; numa pena de 8 meses de prisão suspensa por 1 ano; numa pena de 8 meses de prisão e numa pena de 4 anos e 6 meses de prisão.

    - Deste modo, bem andou o Tribunal a quo ao aplicar a pena única sem qualquer substituição.

    - Ponderando os fatores de determinação da escolha e medida concreta da pena, plasmados nos artigos 40.º, 70.º e 71.º, todos do Código Penal, afigura-se-nos que a pena aplicada é justa e adequada.

    Termina pedindo seja negado provimento ao recurso interposto pelo arguido, mantendo-se a sentença recorrida.

    Neste Tribunal de recurso o Digno Procurador-Geral Adjunto no parecer que emitiu e que se encontra nos autos, pugna pela improcedência do recurso.

    Cumprido o preceituado no art.º 417.º, n.º 2 do Cód. Proc. Penal, nada mais veio a ser acrescentado de relevante ao conhecimento de recurso.

    Efetuado o exame preliminar e colhidos os vistos legais foram os autos submetidos a conferência.

    Nada obsta ao conhecimento do mérito.

    II- Fundamentação: Fundamentação de facto

    1. São os seguintes os factos dados como provados pelo Tribunal de 1.ª Instância: 1. No dia 24 de fevereiro de 2010, cerca das 16h00m, as...

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