Acórdão nº 471/16.3JALRA.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelBERGUETE COELHO
Data da Resolução13 de Abril de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora * 1.

RELATÓRIO Nos autos em referência, de processo comum, perante tribunal singular, que correu termos no Juízo Local Criminal de Abrantes do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, realizado o julgamento, o arguido (...), por via da parcial procedência da acusação, foi condenado pela prática, em autoria material, na forma consumada e em concurso real: - de 3 (três) crimes de falsificação de documento, p. e p. pelo art. 256.º, n.º 1, alíneas c) e d), do Código Penal (CP), na pena de 4 meses de prisão, cada um deles; - de 1 (um) crime de abuso de confiança p. e p. pelo art. 205.º, n.º 1, do CP, na pena de 8 meses de prisão; - de 1 (um) crime de burla informática p. e p. pelo art. 221.º, n.º 1, do CP, na pena de 1 ano de prisão; - de 15 (quinze) crimes de acesso ilegítimo, p. e p. pelo art. 6.º, n.º 1, da Lei n.º 109/2009, de 15.09, na pena de 4 meses de prisão, por cada um deles; - de 5 (cinco) crimes de falsidade informática p. e p. pelo art. 3.º, n.º 1, da Lei n.º 109/2009, de 15.09, na pena de 4 meses de prisão, por cada um deles; - em cúmulo jurídico, nos termos do disposto no art. 77.º, 1, do CP, na pena única de 5 (cinco) anos de prisão suspensa na execução por igual período e sujeita a regime de prova – cfr. arts. 50.º, n.ºs 2 e 3, e 52.º, ambos do CP.

Mais se decidiu: - suspender a pena de prisão de 5 (cinco) anos, nos termos dos arts. 50.º, n.ºs 2 e 3, 51.º, nº 1, alínea a), e 52.º, n.ºs 1, alínea c), e 2, alínea d), todos do CP, com as seguintes regras de conduta: i. Responder a convocatórias do magistrado responsável pela execução e do técnico de reinserção social; ii. Receber visitas do técnico de reinserção social e comunicar-lhe ou colocar à sua disposição informações e documentos comprovativos dos seus meios de subsistência; iii. Informar o técnico de reinserção social sobre alterações de residência; iv. Não contactar, de qualquer forma, ou aproximar-se da ofendida; v. Proceder ao pagamento da indemnização arbitrada nos termos do art. 82.º-A do Código de Processo Penal (CPP) na quantia global de 5 000,00 euros a pagar nos seguintes prazos e prestações, após trânsito em julgado e por meio de transferência bancária: a) 2 500,00€, no prazo de 1 ano e seis meses; b) 2 500,00€, no prazo de 3 anos; - condená-lo, nos termos do disposto no art. 82º-A do CPP, ao pagamento da quantia de 5 000,00 (cinco mil) euros e nos seguintes prazos e prestações, após trânsito em julgado e por meio de transferência bancária para a conta da assistente: a) 2 500,00€, no prazo de 1 ano e 6 meses; b) 2 500,00€, no prazo de 3 anos; - e consequentemente, fazer prova do depósito nos 10 dias após o decurso do prazo de pagamento referido.

Inconformado com tal decisão, o arguido interpôs recurso, formulando as conclusões: 1º - Foi o ora recorrente condenado, entre outras penas, a pagar à ofendida a quantia de € 5.000,00 (cinco mil) euros, “quantia que se fixa tendo igualmente em conta o rendimento/despesas do arguido (facto 82 e 83).”(sic).

  1. - Mais se estabeleceu que o valor estipulado deve ser pago da seguinte forma: € 2.500,00 no prazo de 1 ano e seis meses, e o restante (€ 2.500,00) num prazo de 3 anos.

  2. - O montante em que foi condenado, € 5.000,00, nas condições em que o foi, nos prazos estabelecidos, não são exequíveis de cumprimento pelo arguido, sem que ponham em causa as suas condições mínimas de bem estar, a sua própria sobrevivência, e o seu direito a uma existência condigna.

  3. - Efectivamente, o cumprimento da condição imposta implica que o arguido, deduzidas as suas despesas mensais, disponha mensalmente de uma quantia de € 138,00, quando somente tem um rendimento disponível de € 95/mês! (…).

  4. - O n.º 2 do artigo 51º do C.P., refere que: «Os deveres impostos não podem em caso algum representar para o condenado obrigações cujo cumprimento não seja razoavelmente de lhe exigir” 6º - Os deveres da suspensão da pena estão sujeitos a dois grandes limites: o respeito pelos direitos fundamentais do arguido e o Princípio da Razoabilidade.

  5. - O Tribunal a quo violou os direitos fundamentais do arguido, pois estes não podem ser postos de parte aquando da escolha de determinado dever a impor ao condenado, pondo em causa o mínimo necessário para a sua subsistência e, consequentemente, em clara violação do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana (artigo 1.º, da Constituição da República Portuguesa).

  6. - O Tribunal a quo violou igualmente o Princípio da Razoabilidade (artigo 51.º, n.º 2, do Código Penal), isto é, os deveres impostos não podem, em caso algum, representar para o arguido obrigações cujo cumprimento não seja razoavelmente de lhe exigir qualquer que seja o dever imposto pelo tribunal, sem que tenha por base uma ponderação adequada da possibilidade de cumprimento.

  7. - Bem como o «princípio da possibilidade», - art.º 51.º, n.º 1 al.ª a), do Código Penal, - na medida em que permite ao Tribunal cingir o condicionamento da suspensão da execução da pena de prisão ao pagamento da parte da indemnização, que considere ser possível ao condenado satisfazer, o que não respeitou.

    Por isso, 10º - Atendendo à capacidade económica do recorrente, às suas despesas e rendimento, a douta sentença recorrida poderia e deveria ter estabelecido um regime de suspensão ajustado e conforme àqueles, o qual devia ser equiparado aos 5 anos da suspensão da pena de prisão efectiva.

  8. - Até porque, tal aplicação da suspensão sujeita ao pagamento num período igual ao da suspensão da pena de prisão – 5 anos – permite alcançar as finalidades da punição, bem como, contribuir para a reeducação e ressocialização do ora recorrente.

    Deste modo, 12º - A douta sentença recorrida deve ser revogada e substituída por outra que proceda à aplicação ao ora recorrente de uma suspensão da execução da pena de prisão do arguido, nos termos dos artigos 50º, n.º 2 e 3, art 51º, nº 1, al. a) e art 52º, n.º 1, al. c), nº 2 al. d), todos do Código Penal, sujeita, entre outras, à regra de conduta consubstanciada no pagamento da indemnização à ofendida arbitrada nos termos o artigo 82º-A do CPP na quantia global de 5 000,00 euros a pagar pelo arguido no prazo de 5 anos.

  9. - A douta sentença recorrida violou os Artigos art.º 51.º, n.º 1, al.ª a), e n.º 2 e art.º 52.º do Código Penal todos do Código Penal.

    O recurso foi admitido.

    O Ministério Público apresentou resposta, concluindo: 1- No âmbito dos presentes autos, foi o arguido (...) condenado na pena única de 5 (cinco) anos de prisão pela prática de (três) Crimes de falsificação de documento, p. e p. no art.º 256º, nº 1, als. c) e d) do C.P.; 1 (um) Crime de Abuso de Confiança p. e p. no art.º 205º, nº 1, do C.P; 1 (um) Crime de Burla informática p. e p. no art.º 221º, nº 1, do C.P.; 15 (quinze) Crimes de Acesso ilegítimo, p. e p. no art.º 6º, nº 1 da lei 109/2009, de 15/09; 5 (cinco) Crimes de Falsidade Informática p. e p. no art.º 3º, nº 1 da lei 109/2009, de 15/09, suspensa na sua execução por igual período, sujeita a regime de prova e com imposição de regras de conduta.

    2- Uma das regras de conduta impõe ao arguido proceder ao pagamento da indemnização arbitrada à assistente, nos termos o artigo 82º-A do CPP, na quantia global de 5 000,00 euros (cinco mil euros) nos seguintes prazos e prestações, após trânsito em julgado e por meio de transferência bancária: 2 500,00€, no prazo de 1 ano e seis meses; e 2 500,00€, no prazo de 3 anos.

    3- Da Douta Sentença, e no que respeita às condições pessoais e económicas do arguido, provou-se, entre outros que “o arguido aufere uma reforma no valor de 645,00 euros”, e “suporta um custo mensal de 250,00 euros a título de renda de casa. (…)”, conforme melhor resulta do facto 82 e 83 da matéria provada.

    4- No que concerne à escolha e determinação da medida da pena, pode ler-se na Douta Sentença que, na ponderação dos elementos consagrados no art.º 71º do Código Penal, foi tido em conta, entre outros, “a situação económica do arguido e as suas condições de vida e a sua personalidade, e a situação económica do arguido, o qual tem rendimentos mensais muito superiores à ofendida”.

    5- Mais resulta da Douta Sentença que a fixação da indemnização teve em conta o rendimento/despesas do arguido (facto 82 e 83), e que o prazo de pagamento é “razoável, pois implica apenas uma pequena parte do seu rendimento mensal num valor de 138,88 euros, o que seguramente não se mostra desproporcionado.” 6- Do relatório social para determinação da pena pode ler-se “em termos económicos, o arguido identifica uma situação com algumas limitações. Os seus rendimentos assentam sobretudo na sua reforma, num valor aproximado a 645 euros. Como despesas mais significativas referiu as relacionadas com as suas despesas pessoais, nomeadamente a renda da casa (250 euros) e outras despesas fixas, num valor aproximado a 100 euros.” 7- A matéria de facto dada como provada e o relatório social não foi impugnado pelo Recorrente.

    8- Pelo que, o Tribunal a quo, em devido tempo e fazendo uso dos meios de prova ao dispor, verificou que o recorrente dispunha de condições para efetuar o pagamento da quantia fixada e impôs um prazo de pagamento, dilatado no tempo, de modo a que tal esforço não ultrapasse as reais capacidades de pagamento do recorrente, em observância do principio da razoabilidade e da proporcionalidade.

    9- A Douta Sentença não violou o art.º 1.º da Constituição da República Portuguesa e artigos 51.º, n.º 1, al. a) e n.º 2 e 52.º, ambos do Código Penal.

    Nestes termos, deve ser negado provimento ao recurso interposto pelo arguido (...).

    Neste Tribunal da Relação, o Digno Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, fundamentado, entendendo que o recurso deve proceder.

    Observado o disposto no n.º 2 do art. 417.º do CPP, o arguido nada veio acrescentar.

    Colhidos os vistos legais e tendo os autos ido à conferência, cumpre apreciar e decidir.

    * 2.

    FUNDAMENTAÇÃO O objecto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraiu da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT