Acórdão nº 554/19.8GHSTC.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Abril de 2021
Magistrado Responsável | BEATRIZ MARQUES BORGES |
Data da Resolução | 13 de Abril de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I. RELATÓRIO 1. Da decisão No Processo Comum Singular n.º 554/19.8GHSTC Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal Juízo Local Criminal de Santiago do Cacém - Juiz 2, submetido a julgamento foi o arguido (...), nascido em (…), A. Em matéria criminal: 1. Condenado pela prática de um crime de violência doméstica agravada, previsto e punível pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 alínea a) do CP, na pena de quatro anos de prisão efetiva; 2. Condenado na pena acessória de proibição de contato, por qualquer meio, com a vítima, (...), incluindo o afastamento da residência e local de trabalho desta, pelo período de cinco anos, e determinado que o seu cumprimento, quando se encontrasse em liberdade, fosse efetuado por meios técnicos de controlo à distância, independentemente do consentimento do arguido e da vítima, por tal se ter afigurado necessário à proteção dos direitos da vítima, nos termos conjugados dos artigos 26.º n.º 2 da Lei 33/2010 de 2 de setembro e 36.º da Lei 112/2009 de 16 de setembro; 3. Mantido o estatuto coativo de proibição de contactar a ofendida, por qualquer meio, mediante fiscalização de meios eletrónicos de vigilância.
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Obrigado a sujeitar-se a recolha de amostra em obediência ao disposto no artigo 8.º, n.º 2, da Lei 5/2008, de 12 de fevereiro («a recolha de amostra em arguido condenado por crime doloso com pena concreta de prisão igual ou superior a 3 anos, ainda que esta tenha sido substituída, com a consequente inserção do respetivo perfil de ADN na base de dados, é sempre ordenada na sentença»); B. Em matéria civil: 5. Condenado a pagar à assistente/demandante (...), a quantia de vinte e cinco mil euros, acrescida dos juros legais, à taxa supletiva das obrigações civis, desde a data da notificação para contestar o pedido de indemnização civil e até efetivo e integral pagamento; C. Julgou ainda o Tribunal a quo: 6. Improcedente o pedido de condenação como litigante de má fé da assistente/demandante formulado pelo arguido/demandado em sede de contestação escrita.
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Do recurso 2.1. Das conclusões do arguido Inconformado com a decisão o arguido interpôs recurso extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões (transcrição): “1.- O ora arguido confessou em parte o que aconteceu na noite de casamento.
Logo cai por terra o que sempre o tribunal a quo considerou da não confissão e do não arrependimento.
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- A ofendida viveu trinta e quatro anos com o arguido, logo não pode ter sido uma vida de horror constante, não há nenhum ser humano que consinta esse abuso durante tantos anos.
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- Muito mais não poderá a ofendida alegar que sempre foi forçada a ter relações sexuais com o arguido.
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Foi o arguido que sempre sustentou aquela família, além da ofendida, faziam parte da casa de habitação mais seis pessoas, sendo este que sempre ganhou para o sustento daquelas pessoas. Logo não poderia sempre ir bêbado para o trabalho e regressar bêbado como alegaram no tribunal a quo.
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O arguido, sofreu danos psicológicos, aquando viu a sua mulher toda nua, na sua cama com o seu pai.
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O arguido começou a ingerir bebidas alcoólicas, depois de ter casado com a ofendida 7. A Ofendida, nunca assumiu em tribunal que ingeria bebidas alcoólicas, antes da gravidez, sendo que se demonstrou, que a mesma ingeria bebidas alcoólicas em abundância, desde sempre.
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Nunca admitiu que era descuidada no asseio da sua casa. E que por o casal beber em demasia se batiam um ao outro.
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Não se mostrou em algum momento no tribunal, a quo qualquer prova documental ou pericial, que atestasse, os maus tratos da vítima.
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Cabia à acusação fazer prova, dos maus tratos físicos, por prova documental ou pericial.
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O tribunal a quo firmou a sua convicção com base no depoimento testemunhal de três testemunhas, familiares.
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Não relevou a prova de toda a defesa, considerando a mesma inútil, e sem qualquer credibilidade.
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O mesmo teve uma convicção parcial dos fatos, com base nos depoimentos testemunhais, tomando considerações até dogmáticas em relação aos fatos relatados pela ofendida.
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Nunca o tribunal pode tomar partido pelo que o impressiona, e só com base no depoimento testemunhal.
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Tudo o que foi trazido, pela defesa, foi desconsiderado e posto em causa.
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Não dando qualquer credibilidade à que foi relatado pela mesma, 17. O tribunal não se pode impressionar, deve sim, julgar em conformidade desprendendo-se de impressionismos.
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De dogmatismos- de verdades absolutas.
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Se se atentarmos, no tribunal a quo este ficou até incomodado, até mesmo indisposto, Porque que considerou que a vítima foi sincera não credibilizando ao invés, nada da defesa do arguido.
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Este sempre disse tanto no Interrogatório judicial que bebiam os dois que se batiam um ao outro e revelou o episódio no dia do casamento.
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- Nunca a “Vitima” como diz o tribunal, assumiu perentoriamente que bebia em excesso, mesmo antes da gravidez da sua filha (…), que esteve numa casa de alterne, que já bebia em excesso, que foi o arguido que a tirou dessa má vida.
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Que este problema do alcoolismo se deveu também em parte à união do arguido com a arguida, já que ficou demostrado e que julgo de forma séria e honesta, pelo que afirmou a ex-companheira, Testemunha, (…), ao dizer que o (…) não ingeria bebidas alcoólicas antes de conhecer a (…).
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Nunca a ofendida nas suas declarações focou, que nos último 20 e poucos anos era usual e costumeiro irem passar férias doo país, como nas ilhas.
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Nunca se pronunciou porque a decisão drástica de sair de casa e ir para o aeroporto de Lisboa, e depois ter pedido à filha do Arguido (…) para ir lá buscar, e depois ter pedido ao arguido para a ir buscar ao Monte da Caparica para voltar para casa.
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Ora não se foge de uma pessoa por ser um horror e depois face a qualquer frustração, não realizada, voltar a pedir ao “monstro” que a vá buscar e voltar para.
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A filha do casal (…) que tanto impressionou o tribunal, viveu até aos 27 anos em casa, alguém acredita que uma pessoa mormente com a cultura e capacidade dela, vivessem um terror até aquela idade.
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Mais, até viveu na casa do casal com a sua companheira, como assumiu, em tribunal.
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Qual o “Ditador” que permitia que a sua filha face à sua orientação sexual vivessem com outra mulher em sua casa.
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Se atentarmos no Depoimento da (…) esta também diz que nunca pode contar com a mãe, porque a mesma estava sempre embriagada.
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Digamos que de verdade este período conturbado, avassalador em termos de família disfuncional ocorreu entre 1989 e 1994, o casal esteve perdido, motivado pelo excesso de alcoolismo do arguido e da ofendida.
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Foi dito, pela ofendida que a partir daí nunca mais o arguido a ofendeu fisicamente, mas sim verbalmente.
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Mas pelos vistos viveu até 6 de Dezembro com o arguido, sendo que perante os seus familiares e amigo, dizia que com o (…) era só paz e amor.
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Alguém acredita que uma pessoa torturada (durante 34 anos) e amargurada tem vontade de viajar, ir festejar os anos da neta do arguido em princípio de Novembro/20, sair de casa, novamente para casa. E depois sem que ninguém desse por isso, ou por uma motivação repentina, abandonasse o lar conjugal.
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Temos também que atentar ao depoimento de todas as testemunhas de defesa que relataram o comportamento desta senhora, completamente normal em relação ao arguido, até se exibindo que tinha muito para dar em termos sexuais.
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O tribunal a quo fez algum esforço para saber da motivação desta mulher, para que depois de 34 anos, ter vindo fazer crer, que esteve durante este todo a viver com um “monstro”.
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Não pelo contrário, considerou com visão fixa, que a defesa foi inoperante, que foi nebulosa, censurando toda a prova testemunhal da defesa.
Assim, 37. Entende modestamente o Recorrente que a pena de 4 anos de prisão efetiva, aplicada ao arguido, nos termos do artigo 152.º, n.º1 e n.º 2 alínea a), do Código Penal, bem como a pena acessória de proibição de contacto, por qualquer meio, com a vitima, incluindo o afastamento da residência e local de trabalho desta, pelo período de 5 anos, que lhe foram aplicadas; - Como, ABSOLUTAMENTE DESADEQUADAS, a pena principal e acessórias, na medida em que, no caso concreto, está em crer que a aplicação de pena pedida pelo Douto Ministério Público, pena suspensa na sua execução, nos limites médios da pena, sujeito a regime de prova- com proibições de contacto, com meios eletrónicos à distância, era absolutamente adequada e suficiente as finalidades da punição, mormente, as necessidades de prevenção especial.
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Pois que, sendo no nosso sistema jurídico-penal dada sempre preferência às, Penas não privativas de liberdade, é de concluir como de todo incompreensíveis e desadequadas às circunstâncias do caso presente, e, bem assim, à personalidade do Recorrente, à pena de prisão que lhe foi aplicada. Senão porque, a acrescer ao facto de o ora Recorrente se apresentar como plenamente integrado do ponto de vista social, e profissional, a inexistência de quaisquer antecedentes criminais.
Pelo que, será de concluir que a presente condenação surge como um incidente isolado na vida do Recorrente.
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Posto isto, é forçoso concluir-se que a opção pela aplicação ao aqui Recorrente da pena de prisão efetiva pelo crime de violência doméstica não se mostra de modo algum como correta e justa, pecando por manifestamente desadequada, não se enquadrando nos princípios legais do arts. 40º e 70º do C. Penal, nem, tão pouco, nos princípios constitucionais consagrados nos arts. 27º e 32º da Constituição da República Portuguesa.
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Ao invés, e tendo em consideração a conjuntura que levou à prática dos factos em apreço sempre deverá optar-se, nos termos desse art. 70º, pela aplicação de pena não privativa de liberdade, pois que, no que respeita punir o crime em causa, de violência doméstica, mesma pena que sempre se mostra passível de realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, no que ao Recorrente e...
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