Acórdão nº 1946/20.5BELSB-S1 de Tribunal Central Administrativo Sul, 08 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução08 de Abril de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO A Entidade Demandada, I......, S.A., devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 30/11/2020, que no âmbito da ação de contencioso pré-contratual instaurada pela R…………, SA, contra a Entidade Demandada e as Contrainteressadas, melhor identificadas em juízo, indeferiu o pedido de levantamento do efeito suspensivo automático.

* A Entidade Demandada, ora Recorrente, apresentou recurso contra a decisão recorrida, tendo nas respetivas alegações, formulado as seguintes conclusões, que ora se reproduzem: “1. No âmbito das obrigações legais da I….. S.A. destaca-se toda a atividade associada ao cumprimento dos critérios de gestão de combustível, enquadrados na legislação do Sistema de Defesa da Floresta Contra Incêndios (SDFCI), estando as vias rodoviárias inseridas na rede secundária de faixas de gestão de combustível (FGC).

  1. A I…. S.A. assegura os trabalhos de conservação/manutenção da rede rodoviária através de contratos trienais de conservação corrente – CCC, os quais englobam os diferentes trabalhos com vista a preservar a vida útil dos diversos ativos rodoviários.

  2. Neste âmbito, englobam-se as designadas atividades ambientais (capítulo com maior investimento logo após a conservação de pavimentos), com uma vasta tipologia de trabalhos (ceifas, corte seletivo de vegetação, podas, abates, plantações e sementeiras, entre outros), que permitem manter as condições de segurança da circulação, bem como assegurar a preservação do património vegetal na envolvente das vias.

  3. Os trabalhos necessários à manutenção das FGC foram até 2017 desenvolvidos no âmbito destes contratos.

  4. No entanto, após os acontecimentos do Verão de 2017, tornou-se mais abrangente e com critérios mais exigentes a execução dos trabalhos necessários para dar cumprimento à legislação do SDFCI.

  5. Também se tornou obrigatório, conforme disposto nas Leis do Orçamento do Estado (LOE) para 2018, 2019 e 2020, a intervenção em todos os espaços florestais independentemente de existirem Planos Municipais de Defesa da Floresta contra Incêndios (PMDFCI) aprovados.

  6. Complementarmente, a obrigação de entrar em domínio privado, sempre que necessário para cumprir a gestão de combustível numa faixa de 10m, extravasa o objeto definido para os CCC, que apenas abrangem os trabalhos dentro do domínio rodoviário, pelo que é impossível intervencionar estes espaços com este instrumento contratual.

  7. Neste contexto, com este alargamento de âmbito, os CCC não estavam dimensionados para a resposta necessária ao quadro legal, face à especialização dos trabalhos em causa, o local onde os mesmos decorrem, marginalmente à via, entrando em domínio privado, a que acresce o prazo para a realização dos trabalhos, não compatível com os meios existentes e o intervalo de tempo disponível nos contratos para a sua execução.

  8. Assim, para obviar este problema, desde 2018 que os CCC têm sido complementados com outros contratos específicos, que permitiram, embora com dificuldades operacionais, envolvendo escassez de meio dos adjudicatários, face à grande procura por todas as entidades gestoras de infraestruturas, e também por questões meteorológicas e dificuldades de acesso aos terrenos, ter uma resposta mais dimensionada para as necessidades.

  9. Face à experiência adquirida nestes dois anos, com elevado número de procedimentos contratuais implicando um grande acréscimo da atividade de gestão administrativa e operacional dos mesmos, entendeu-se, face à dimensão dos trabalhos envolvidos tanto operacional como financeiramente, a que acresce a impossibilidade de executar trabalhos em propriedade privada, individualizar esta tipologia de atividade adotando uma gestão num contrato individualizado das restantes atividades incluídas nos CCC, mais vocacionadas para trabalhos típicos de engenharia civil.

  10. Neste contexto, operacionalizou-se um novo modelo de gestão da manutenção rodoviária, em que as atividades de cariz ambiental estão englobadas num contrato dedicado, os ETGV, em regime plurianual, assegurando-se nos CCC as atividades de pavimentação, drenagem, manutenção de taludes, limpezas, segurança, manutenção de obras de arte, entre outras, visando a manutenção dos ativos rodoviários e a segurança da exploração rodoviária, visando garantir o cumprimento das obrigações legais e contratuais que impendem sobre a Empresa e os princípios da boa gestão empresarial.

  11. Tal como nos CCC, seguiu-se a organização distrital, de modo a compatibilizar os dois contratos no mesmo distrito, o que levou ao lançamento de um procedimento com 18 lotes.

  12. A preparação deste procedimento decorreu em 2019, na perspetiva de se efetuar a contratualização em 2020, tendo o anúncio do concurso público sido publicado apenas em 16 de março 2020, por a Portaria de extensão de encargos ter sido publicada a 6 de março.

  13. A necessidade, ainda em 2020, dos presentes contratos de ETGV, justifica-se dado que os CCC já estão exauridos de quantidades para assegurar a realização dos trabalhos de gestão de vegetação que permitam o cumprimento da legislação.

  14. Como forma de colmatar o impacto do atraso no início destes contratos e porque a empresa já tinha sido notificada pelas entidades fiscalizadoras da necessidade de efetuar trabalhos de gestão de combustível em alguns distritos, recorreu-se a adicionais aos CCC, com trabalhos a mais, os quais estão sujeitos aos limites constantes do Código de Contratação Pública.

  15. No entanto, para a campanha de 2021 já não é possível dotar os atuais CCC de quantidades que permitam dar resposta às necessidades, com a agravante que com estes contratos não é possível executar trabalhos em domínio privado, dado que este não faz parte do objeto destes contratos.

  16. Deste modo, os contratos ora impugnados são imprescindíveis para se cumprir as obrigações da IP no âmbito do SDFCI, o que não é possível com os CCC.

  17. Assim, com atraso no início das presentes empreitadas, a IP deixa de poder assegurar, em 2021, o cumprimento das suas obrigações de limpeza das faixas de gestão de combustível, incumprindo o seu dever de prevenção previsto no SDFCI, que define que os trabalhos devem estar concluídos antes do início do período crítico, isto é, em 1 de Julho.

  18. Desta forma, a IP ficará também sujeita às consequentes notificações por incumprimento por parte das autoridades competentes e eventualmente contraordenações com os respetivos pagamentos de multas.

  19. Mas, mais preocupante ainda, o incumprimento de limpeza das faixas de gestão de combustível aumentará exponencialmente o risco de incêndios, com consequências imprevisíveis, urgindo, por isso, evitar a todo o custo, a repetição das tragédias que ocorreram em 2017.

  20. Nos termos do n.º 6 do Decreto-Lei n.º 91/2015, de 29 de maio, publicado no Diário da República, 1.ª série, n.º 104, de 29 de maio de 2015, a I......, S.A é gestora das infraestruturas rodoviárias e ferroviárias.

  21. Segundo determina a alínea a), do n.º 1, do artigo 15.º do Decreto-Lei 124/2006, de 28 de Junho, sob a epígrafe “Redes secundárias de faixas de gestão de combustível”, nos espaços florestais previamente definidos nos PMDFCI é obrigatório que a entidade responsável pela rede viária providencie a gestão do combustível numa faixa lateral de terreno confinante numa largura não inferior a 10 m.

  22. A alínea r), do n.º 1, do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 124/2006, de 28 de Junho, determina que «Gestão de combustível» é a criação e manutenção da descontinuidade horizontal e vertical da carga combustível nos espaços rurais, através da modificação ou da remoção parcial ou total da biomassa vegetal, nomeadamente por pastoreio, corte e ou remoção, empregando as técnicas mais recomendadas com a intensidade e frequência adequadas à satisfação dos objetivos dos espaços intervencionados.

  23. Os critérios para a gestão de combustíveis no âmbito das redes secundárias de gestão de combustível encontram-se previstos no Anexo ao Decreto Lei 124/2006, de 28 de Junho.

  24. Na sequência dos incêndios florestais que afetaram Portugal em 2017, a Resolução do Conselho de Ministros n.º 161/2017, publicada no Diário da República, 1.ª série, n.º 210, de 31 de outubro de 2017, veio determinar o reforço da atuação no âmbito da Limpeza das Bermas e Faixas de Gestão de Combustível da Rodovia e da Ferrovia, visando contribuir eficazmente para o Sistema de Defesa da Floresta contra Incêndios.

  25. Ao considerar, como refere a douta sentença na página 16, estes contratos como um complemento e um incremento [aumento/desenvolvimento] do modelo de gestão implementado e dos trabalhos já contratualizados e executados ou a executar, a Entidade Demandada não quer dizer que estes trabalhos são de menor importância do que os outros ou, ainda, que são repetidos ou alternativos.

  26. Na verdade, estes trabalhos, determinados na sequência das recentes alterações ao Sistema de Defesa da Floresta contra Incêndios (SDFCI), estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 124/2006, de 28 de Junho, são um desenvolvimento do modelo de gestão implementado.

  27. Apesar de a presente ação tramitar como um processo urgente, com prazos abreviados, como lembra a douta sentença na página 16, mas que admite a possibilidade de interposição de recursos, não podemos esquecer que são vários lotes e que, além da Autora e da Ré, existem diversos contrainteressados, pelo que a resolução do processo poderá não ter uma tramitação tão célere como previsto.

  28. Além disso, o elevado risco de incumprimento dos trabalhos até 1 de Julho de 2021, referido na página 15 da douta sentença, não representa só a possibilidade da instauração de processos de contra-ordenação e o pagamento de multas, mas também o risco de incêndios que com esta contratação se pretendem evitar.

  29. É fundamental ainda esclarecer que embora, como menciona a douta sentença nas páginas...

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