Acórdão nº 1347/14.4BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 25 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelJORGE CORTÊS
Data da Resolução25 de Março de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão I- Relatório B......... S.A., deduziu impugnação judicial, na sequência do indeferimento parcial da reclamação graciosa apresentada e que incidiu sobre quarenta e duas liquidações de IUC, emitidas em Fevereiro de 2014, no montante global de € 2.707,08, valor reduzido a 848,88 com o deferimento parcial da reclamação. Em sede de impugnação, sindica o valor remanescente das liquidações, respeitante a vinte e oito liquidações, perfazendo o montante de global de € 1.854,20. O Tribunal Tributário de Lisboa, por sentença proferida a fls. 333 (numeração do SITAF), datada de 21/04/2018, julgou a impugnação judicial procedente, anulando as liquidações impugnadas e ordenando a restituição ao Impugnante das importâncias por este pagas, em função daquelas liquidações. Desta sentença foi interposto recurso pela Fazenda Pública, conforme requerimento de fls. 363 e ss. (numeração do SITAF), no qual conclui nos termos seguintes: «I- Com a devida vénia, contrariamente à asserção sustentada pela douta Sentença a quo, entende esta RFP, na esteira do mui douto Parecer do MP, proferido nos presentes autos, que o artº3º, 1 do CIUC, não estabelece uma presunção, mas antes limita-se a identificar quem são os sujeitos passivos do IUC, identificando sobre quem ele incide subjectivamente, sempre com um intuito de política legislativa em evitar interpretações ‘'contra legem” que façam vacilar a unidade e a segurança do sistema jurídico-fiscal.

II- Neste conspecto, o art.º 6º, nº1 do CIUC, aponta para a matrícula ou registo do veículo como prova da propriedade, motivo pelo qual se deve entender que os registos e certificados que acompanham o veículo contêm todos os elementos necessários à identificação do sujeito passivo, sem necessidade de referência ou recurso a contractos que conferem ou transmitem direitos sobre o veículo.

III - Se assim não fosse, instalar-se-ia na fase da liquidação do imposto uma inadmissível complexidade burocrática, atentatória da segurança e certeza jurídicas, porque associada à necessidade de identificação, através das relações contratuais subjacentes, de eventuais dissonâncias em relação à situação descrita nos registos - mesmo quando essas dissonâncias resultarem de negligência dos particulares na actualização, que lhes cabe, desses mesmos registos, facto que, em última análise, tornaria esses mesmos registos públicos inúteis.

IV - Ao que acresce o elemento teleológico do quadro normativo em análise, do qual resulta manifesta a intenção legislativa do novo regime consagrado no CIUC em tributar os proprietários de veículos constantes do registo de propriedade, independentemente da circulação efectiva desses veículos na via pública - transformando efectivamente uma tributação sobre a circulação numa tributação sobre a mera propriedade dos veículos.

V - E como bem se frisou no douto parecer do MP, este elemento teleológico sai reforçado com as alterações ao art.º 3º do CIUC, introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 41/2016, de 1 de Agosto, no sentido de se esclarecer em definitivo, que o tributo é configurado - e sempre o foi - para funcionar em integração com o registo.

VI - Também se dissente da asserção expressa na douta Sentença a quo, segundo a qual o artigo 19.º do CIUC não teria aplicação no caso concreto, posto que este preceito vigorou até Março de 2016, data em que foi revogado pela Lei nº 7-A/2016 de 30/03.

VII - Pelo que, aplicando-se a referida norma ao caso concreto - o imposto é relativo ao ano de 2014 - e admitindo-se que o artigo 3.º do CIUC consagra uma presunção ilidível, então forçoso é concluir que o funcionamento daquele artigo (i.e., a ilisão da presunção) depende igualmente do cumprimento do estatuído no artigo 19.º do CIUC, conforme se retira o seu elemento literal («para efeitos do artigo 3ºdo presente código (...)».

VIII - O que equivale a dizer que, em matéria de locação financeira e para efeitos da ilisão do artigo 3.º do CIUC, forçoso é que os locadores (como a Impugnante) cumpram a obrigação ínsita no artigo 19.ºdaquele código para se exonerarem da obrigação de pagamento do imposto, ou seja, que procedam ao registo - obrigatório, como decorre do disposto no nº2 do art.º 5º do DL 54/75 de 12/02 - da situação jurídica da locação financeira e de quem é o locatário.

IX - Ora, nenhuma prova fez o Impugnante quanto ao cumprimento desta obrigação, como aliás lhe competia, pelo que necessariamente terá de improceder a pretendida ilisão do artigo 3.º aqui em causa.

X - Ainda que assim não se entenda e sem conceder, no caso de se admitir a hipótese de se considerar que a remessa para os registos constitui uma presunção ilidível, então, neste caso, dimana manifesto que os documentos juntos pela Impugnante não comprovam uma venda aos locatários, pois tratam-se de meras facturas, documentos unilaterais, não permitindo comprovar se a transferência de propriedade efectivamente ocorreu.

XI - Sendo que semelhante elisão presuntiva também não é alcançável mediante exibição de documentos tais como contractos de promessa de compra e venda; cópias de sentenças que determinaram pela restituição dos veículos, não só por não fazerem prova do pagamento do preço pelo comprador, como também por não fazerem prova de que se efectivou a compra e venda, não logrando também o depoimento testemunhal suprir semelhante carência probatória.

XII - De tudo quanto supra se expôs resulta claro que os actos tributários em crise não enfermam de qualquer vício de violação de lei, na medida em que à luz do disposto no artigo 3.°, n.

os 1 e 2, do CIUC e dos artigos 6.º e 19º do mesmo código, era a ora Impugnante, na qualidade de proprietária, o sujeito passivo do IUC, devendo, em conformidade, tais liquidações manter-se na ordem jurídica, por se mostrarem infringidos os antecedentes dispositivos legais.

O recorrido não apresentou contra-alegações.

X O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal, foi regularmente notificado e pronunciou-se pela procedência do recurso.

X Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.

X II- Fundamentação.

2.1. Facto A sentença recorrida assentou na seguinte fundamentação de facto: «a) A Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu quarenta e duas liquidações de Imposto Único de Circulação, cujo prazo voluntário de pagamento terminava em Fevereiro de 2014, relativamente ao mesmo número de veículos automóveis, registados em nome do ora Impugnante, no montante global de € 2.707,08 - liquidações juntas ao procedimento de reclamação gracioso, apensos aos autos, cujos conteúdos aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os legais efeitos; b) Inconformado com as liquidações, ids. na alínea antecedente, por entender não ser sujeito passivo de IUC, em 17/03/2014, o Impugnante reclamou graciosamente - articulado de reclamação graciosa, donde consta o respectivo carimbo de recepção do serviço de finanças, junto ao citado procedimento de reclamação graciosa, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido.

  1. Por despacho, proferido em 22/05/2014, por chefe de Divisão da Direcção de Finanças de Lisboa (por sub-delegação), o peticionado em sede de reclamação graciosa foi parcialmente deferido e, consequentemente, foram anuladas catorze liquidações de IUC, relativas ao mesmo número de veículos, perfazendo a quantia global anulada o montante de € 848,88 - decisão do procedimento gracioso, junta ao respectivo procedimento, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido.

  2. Concretamente, o peticionado em sede do procedimento de reclamação gracioso foi indeferido parcialmente, por o ora impugnante não ter identificado aos competentes serviços de finanças, atempadamente, os respectivos locatários, nos termos do disposto no artigo 19.ºdo CIUC e por o incumprimento contratual, por parte dos locatários, não resultar na alteração do registo da propriedade do veículo, sendo o Impugnante o sujeito passivo do Imposto, de acordo com o disposto no artigo 3.ºdo CIUC - citada decisão do procedimento gracioso.

  3. Na sequência do deferimento parcial da reclamação graciosa, de que o ora Impugnante foi regularmente notificado em 27/05/2014, permaneceram válidas vinte e oito liquidações de IUC, no montante global de € 1.854,20 (mil, oitocentos e cinquenta e quatro euros e vinte cêntimos), que constituem, justamente o objecto da presente Impugnação - citada decisão do procedimento gracioso, aviso de recepção junto àquela decisão, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido e leitura da p.i. da presente impugnação.

    MAIS SE PROVOU: f) 1. O veículo ……….. foi entregue, pelo Impugnante, por contrato de Locação Operacional, de onde não consta o direito à aquisição por parte do respectivo locatário a M........., NIF n.º........., com domicílio na rua…………….., em Setúbal, que, por contrato-promessa de compra e venda, se obrigou a comprar o referido veículo, e que, em Fevereiro de 2014 continuava ainda em poder da locatária - docs. n.°s 1 e 2 juntos com a Reclamação Graciosa, doc. 1 junto com o req. apresentado a 07/06/2017 e depoimento da testemunha.

    1. O veículo …… foi entregue, pelo Impugnante, por contrato de Locação Operacional, de onde não consta o...

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