Acórdão nº 675/03.9BTLRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 25 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA CARDOSO
Data da Resolução25 de Março de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I - RELATÓRIO 1. A FAZENDA PÚBLICA veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por B..., S. A. - Sucursal em Portugal, contra o indeferimento parcial da reclamação graciosa deduzida contra o acto de liquidação adicional do Imposto de Selo, relativa aos anos de 1999 e 2000, no montante de € 436 888,27 - o qual se decompõe em € 262 071,9, relativos a Imposto do Selo sobre o capital, € 131 225,99 relativos a Imposto do Selo sobre os juros e € 43 590,38 relativos a juros compensatórios, anulando tais liquidações na parte indeferida pela reclamação graciosa.

2. A Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «A. Vem o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida em 2019-07-18, no processo de impugnação judicial n.° 675/03.9BTLRS, que julgou procedente a impugnação, anulando a liquidação adicional de Imposto do Selo, relativo aos anos de 1999 e de 2000, notificada à Impugnante mediante ofício n.° 18564, de 2002-07-30, do Serviço de Finanças de Lisboa 2, no valor de € 278.129,25 (duzentos e setenta e oito mil, cento e vinte e nove euros e vinte e cinco cêntimos).

B. O ato tributário resulta da incidência do artigo 1.° da Tabela Geral do Imposto do Selo, aprovada pelo Decreto n.° 21916, de 1932-11-28, sobre as operações de concessão de crédito realizadas até 2000-02-29, e da incidência da verba 17.1 e da verba 17.2.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, e sobre as operações de concessão de crédito realizadas após 2000-03-01.

C. A Impugnante concedeu crédito ao B... - Sucursal do Rio de Janeiro e ao B... - Sucursal de São Paulo. Porém, na sentença recorrida julgou-se que “Ora, nos presentes autos não se questionam nem a personalidade tributária nem a capacidade tributária, mas tão- somente a personalidade jurídica. E, nos termos assinalados, o Banco Impugnante, enquanto sucursal do B..., é um mero órgão de administração local, que dentro da estrutura da sociedade ou pessoa coletiva, não goza de personalidade jurídica e, por isso, não constitui um sujeito autónomo de direitos e obrigações.

As sucursais, por não terem personalidade jurídica própria, não podem figurar como partes em contratos de qualquer natureza, assim, onde se nos depara a aparência de uma compra e venda, de um mútuo, de um depósito entre sede e sucursal, está-se na realidade perante figuras não contratuais, desprovidas de relevância jurídica. Trata-se de meras transferências internas regidas pela disciplina interna da sociedade, mas que não têm tutela do direito.

As transferências de fundos entre a sucursal e a sua sede, não poderão nunca considerar-se contratos de concessão de créditos /contratos de mútuo, depósitos, aplicações de capital, ou outros. Constituem fluxos internos verificados no seio de uma mesma entidade jurídica.

Assim, a Impugnante é uma sucursal de uma empresa estrangeira, não tem personalidade jurídica própria, sendo, juridicamente, uma extensão da entidade que representa." (sublinhado nosso), cf. fls. 19 da douta sentença.

D. Se, do ponto de vista jurídico-formal é patente que a sucursal não constitui uma pessoa jurídica autónoma, para efeitos fiscais, e, adianta-se, para efeitos bancários, a sucursal constitui uma entidade com elevado grau de autonomia e independência da sua sede.

E. Refere ALBERTO XAVIER sobre as sucursais no Direito Tributário que “Se determinados traços do regime inclinam para adoptar a teoria da unidade da pessoa colectiva, já outros caracteres da disciplina normativa propendem o intérprete a reconhecer à sucursal uma subjectividade distinta da sede, ao menos para efeitos fiscais - como é o caso da tributação independente e da contabilidade separada.", in Direito Tributário Internacional, 2.a Edição actualizada, 2.a Reimpressão, Coimbra, Almedina, setembro de 2011, página 325.

F. Perante a possibilidade de sujeitar a sucursal à teoria da unidade da pessoa coletiva, que retira a autonomia à sucursal, percecionando-a exclusivamente como parte integrante da pessoa coletiva - sede, e a teoria da subjetividade, que autonomiza plenamente a sucursal da pessoa coletiva - sede, o Autor defende que “a sucursal é um típico caso de património autónomo de Direito Tributário. (...) Aqui o que imprime a separação, ou autonomia, ao património em causa, não é a sua afectação especial, nem o carácter separado da sua administração, nem a sua sujeição a um dado regime de responsabilidade por dívidas, mas o facto de a lei submeter uma massa de bens e direitos a um tratamento fiscal unitário." (sublinhado nosso), in obra supra citada, página 326.

G. Explica o Autor, “A autonomia patrimonial de Direito Tributário - e que é vulgarmente designada por “equiparação a empresa independente” - revela-se, e enquanto a lei submete a tributação independente dos lucros que lhe são directamente imputáveis, ao invés de tributar a pessoa colectiva no seu conjunto ou de tributar analiticamente o residente no estrangeiro por cada um dos rendimentos isolados que auferir, através de retenção na fonte.

Com efeito, o artigo 3.°, n.° 1, alínea “c”do CIRC, dispõe que o IRC incide sobre o “lucro imputável a estabelecimento estável situado em território português de entidades referidas na alínea “c”do n.° 1 do artigo anterior”, entidades estas, que são “as entidades, com ou sem personalidade jurídica que não tenham sede nem direcção efectiva em território português e cujos rendimentos nele obtidos não estejam sujeitos a IRS”.

(...) Todavia, entre nós, [ao contrário do direito Brasileiro] a autonomia patrimonial dos estabelecimentos não conduziu à atribuição de personalidade jurídica, para efeitos fiscais, de tal sorte que o contribuinte continua a ser o residente no estrangeiro, só que tributado no país em que a sucursal se situa através de uma metodologia idêntica à das pessoas colectivas nele residentes." (sublinhado nosso), in obra supra citada, páginas 326 e 327.

H. Em sede de IRC, a tributação do estabelecimento estável incide sobre o lucro imputável ao estabelecimento estável de sociedade ou outra entidade não residente, determinado nos termos da secção II do Código, nos mesmos termos que as sociedades residentes que exerçam, a título principal, uma atividade comercial, industrial ou agrícola, cf. n.° 1 do (à data) artigo 49.° do Código do IRC, mantendo contabilidade própria, autónoma da sede, obrigação relevada pelo legislador no n.° 1 do (à data) artigo 98.° do Código do IRC.

I. A autonomia dos estabelecimentos estáveis “conduz a que as suas relações com terceiros, sejam equiparadas a verdadeiras relações jurídicas geradoras de rendimentos tributáveis e custos dedutíveis, como se o estabelecimento fosse uma entidade juridicamente independente.", cf. obra supra citada, página 327.

J. Sobre as relações internas entre o estabelecimento estável e a sede, após discorrer sobre a defesa da teoria da independência restrita, em que a autonomia fiscal do estabelecimento não pode afastar a materialidade da relação jurídica de direito privado, acaba o Autor por concluir que as alterações do regime das relações especiais introduzidas pela Lei n.° 30-G/2000, de 29 de dezembro, que concretizaram o já existente princípio do preço de plena concorrência, passaram a consagrar a teoria da independência absoluta.

K. Conclui o Autor que “Significa isto que lei nova veio afastar-se da linha inspiradora do regime anteriormente vigente, passando a consagrar expressamente a teoria da independência absoluta, não só no âmbito das relações externas, mas também no campo das relações internas entre entidade estrangeira e estabelecimento estável localizado em Portugal.”, in obra supra citada, página 332.

L. A doutrina constante do parecer do CEF n.° 65/94, de 1994-05-12, publicado no Boletim de Ciência e Técnica Fiscal n.° 374, Lisboa, Ministério das Finanças abril - junho de 1994, citada pela Impugnante na sua petição inicial, não refletiu as melhores práticas de Direito Fiscal Internacional, e acabou por ser definitivamente ultrapassada com a concretização das regras de preços de transferência.

M. Já desde os tempos da Sociedade das Nações que se defendia o princípio da autonomia do estabelecimento estável, que se refletiu na redação do n.° 2 do artigo 7.° do Modelo de Convenção Fiscal sobre o Rendimento e o Património da OCDE.

N. Se para efeitos fiscais, o estabelecimento estável é tratado como uma empresa autónoma, então, a concessão de crédito pela Impugnante a uma entidade é uma operação sujeita a Imposto do Selo quando o crédito é utilizado pelo cliente, para efeitos da verba 17.1 e da verba 17.2 da Tabela Geral do Imposto do Selo, independentemente de o cliente ser uma entidade externa ou interna à empresa.

O. Pode ler-se na douta sentença recorrida que “A Impugnante com liquidez insuficiente foi ao MMI e obteve a liquidez que outras instituições tinham em excesso, evitando assim o recurso ao refinanciamento.

Estão, pois, estas operações abrangidas pelo Despacho 20183/99, de 25 de outubro, em que O Ministro das Finanças, A..., determinou que se considerem como realizadas no mercado monetário interbancário e, consequentemente não tributáveis em Imposto de Selo as operações realizadas entre bancos desde que formalmente acordadas e confirmadas entre as salas de mercados dos mesmos nas condições normalmente adotadas naquele mercado.

Termos em que nesta parte a presente impugnação é procedente." (sublinhado nosso), cf. fls. 22 e 23 da sentença.

P. Com todo o devido respeito, tal conclusão seria verdadeira se o B..., S.A. (sede) ou a Sucursal do Rio de Janeiro ou, ainda, a Sucursal de São Paulo se tivessem financiado junto do mercado monetário interbancário para obter a liquidez necessária para as suas atividades.

Q. Foi a Impugnante que se financiou junto do mercado monetário interbancário...

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