Acórdão nº 01235/18.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução19 de Março de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:*RELATÓRIO L., residente Rua (…), instaurou acção administrativa contra o MINISTÉRIO DA ECONOMIA, com sede na Rua (…), pedindo que seja julgada procedente a prescrição do procedimento disciplinar e, “se diferente for o entendimento”, que sejam julgados procedentes os demais vícios imputados ao acto punitivo, designadamente, falta de audiência do arguido, erro grosseiro na apreciação da prova, entre outros que ex officio o tribunal determine e, consequentemente, que seja anulado o acto punitivo impugnado, consubstanciado no despacho do Inspector-Geral da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), de 28/12/2017, que lhe aplicou a sanção disciplinar de suspensão por 70 dias, no âmbito do processo disciplinar n.º 001/PD/DALC/2017.

Por decisão proferida pelo TAF do Porto foi julgada improcedente a acção.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, o Autor formulou as seguintes conclusões:

  1. Aquando da prolação do despacho, 9 de Setembro de 2019, ainda não vigorava a norma do n.º 2 do artigo 87.º-B do CPTA (Lei n.º 118/2019 de 17 de Setembro) que permite ao MM Juiz dispensar a realização da audiência prévia quando esta se destine apenas ao fim previsto no artigo 87.º-A, n.º 1, alínea b) do CPTA.

  2. O prazo dos dez dias para as partes responderem, esgotara-se, antes da entrada em vigor da referida norma.

  3. Esta dispensa de realização de audiência prévia é ilegal e nem a justificação dos poderes de gestão para a implementação de medida de flexibilização e de agilização processual, neutralizam a sua ilegalidade.

  4. Ao decidir como decidiu no despacho de 9 de Setembro, o Tribunal violou o princípio da oralidade, que é bem diferente do princípio do contraditório, já que este se pode concretizar também por escrito.

  5. Este princípio não pode ser desconsiderado como foi pelo Tribunal, pois, mesmo quando se convoca a audiência prévia para os termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 87.º- A do CPTA, ainda assim, o Tribunal não está impedido de, após ter ouvido as partes, mandar prosseguir o processo para a realização de prova, por afinal ter concluído que o pedido ainda não estava em condições de ser pedido.

  6. Como ensinam os Autores acima referidos, pág. 678, “A não realização da audiência prévia quando ela não podia ser dispensada constitui, naturalmente, uma nulidade processual, visto que se trata da omissão de um acto que a lei prescreve e pode influir no exame e na decisão da causa (artigo 195.º, n.º 1, do CPC).” G) O despacho do Tribunal que antecede mediatamente o saneador sentença, são do mesmo dia, 19 de Novembro de 2019, H) Considerando que após a alteração legislativa da norma do n.º 2 do artigo 87.º do CPTA, o MM Juiz pode dispensar a realização da audiência prévia quando esta, se destine, apenas, a conhecer de imediato do pedido; I) Ainda assim, impunha-se que antes de proferir o saneador sentença, o Tribunal tivesse notificado as partes, para ao abrigo do princípio do contraditório, se pronunciarem e tal não sucedeu.

  7. Antes da alteração legislativa a audição das partes, apenas podia ser dispensada quando o processo findasse com base na procedência de uma qualquer excepção dilatória, o que bem se compreende, pois, as partes tiveram a possibilidade de se pronunciarem sobre a sua suscitação, após o conhecimento dos articulados nos quais foram levantadas.

  8. Sendo obrigatória a realização da audiência prévia sempre que o Tribunal tencionasse conhecer de imediato, no todo ou em parte, do mérito da causa; L) Ora, a norma da alínea b) do n.º 1 do artigo 87.º-A do CPTA, não foi alterada, pelo que da sua conjugação com a nova redacção do n.º 2 do artigo 87.º-B se tem de concluir que as partes tem de ser notificadas desta intenção, antes da mesma se concretizar, sob pena de ser violado o princípio do contraditório.

  9. E, salvo melhor entendimento não se poderá considerar que este princípio foi cumprido com o despacho de 9 de Setembro, pois, naquela data a audiência prévia tinha obrigatoriamente que se realizar e a ausência de oposição por parte das partes, não pode preterir a imperatividade da norma então em vigência.

  10. Pelo que ao silêncio das partes não pode ser dada uma valoração que então o legislador pretendeu afastar com a obrigatoriedade da realização da audiência prévia.

  11. Ficando vedado com esta alteração os princípios da imediação e da oralidade, não se aceita que nem seja obrigatório cumprir o princípio do contraditório, quando este; P) É unanimemente considerado estrutural no processo judicial, ver entre outros, o Acórdão do TCAN de 22.06.11, processo n.º 0036/07.6 BEPRT-B e o Acórdão do TCAN de 06/11/2015, processo n.º 00406/13.5 BEVIS.

  12. O seu incumprimento vai incrementar a existência de sentenças surpresa.

  13. Todo o processado desde o despacho de 9 de Setembro, deverá ser anulado, incluindo obviamente a própria decisão, cfr. artigos 195.º e 197.º do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA.

  14. Por violação do artigo 87.º-A n.º 1, b) do CPTA, ex vi artigo 87.º-B na redacção vigente a 9 de Setembro de 2019; T) Caso se considere, o que apenas se coloca por mera hipótese de raciocínio, que aquele despacho pode ser substituído pelo despacho de 19 de Novembro, que antecedeu imediatamente a prolação do saneador sentença, ainda assim aquela decisão é ilegal, por ter violado manifestamente o princípio do contraditório, constituindo esta decisão uma decisão surpresa, o que afronta também o artigo 20.º da CRP.

  15. Atento o exposto deve ser considerado nulo todo o processado, a partir inclusive do despacho de 9 de Setembro de 2019, retomando-se o processo na fase pré-saneador.

  16. Acresce que neste processo se impunha para uma justa composição do litígio que após a realização da audiência prévia, se marcasse a inquirição das testemunhas arroladas pelo Recorrente; W) Quando resulta dos factos dados como provados que o Recorrente não foi ouvido em sede disciplinar e não apresentou defesa, por ter interpretado que os incidentes de suspeição do Instrutor e recurso hierárquico, suspendiam o prazo para a apresentação da defesa; X) Cabia ao Tribunal para uma justa composição do litígio, em vez de terminar com a lide processual no despacho saneador, numa fase tão prematura, prosseguir com a mesma, após a realização da audiência prévia nos termos da alínea c) e ss do n.º 1 do artigo 87.ºA do CPTA a inquirição das testemunhas; Y) Pelo que também por este motivo se impunha a produção de prova testemunhal na medida em que a única que existe é a produzida em sede disciplinar e apenas pela parte acusadora, Z) O que redunda numa insuficiência da matéria de facto, pelo menos em tese, podendo assegurar-se que com a audição de testemunhas do Recorrente, não se ficaria apenas com o depoimento das testemunhas da parte contrária, as únicas consideradas revelantes pelo Tribunal para a inexistência de erro na valoração da prova; AA) E a matéria de facto poderia sofrer alterações; BB) Pelo que ajuizar da sua necessidade no caso concreto nos parece pertinente; CC) Não tendo assim considerado, a decisão incorre em erro de julgamento.

    DD) Considerou o Tribunal que a interposição de recurso hierárquico do indeferimento do incidente de suspeição não suspendia o processo disciplinar, por a norma do artigo 225.º n.º 4 da LTFP, determinar que apenas suspende a eficácia do despacho ou da decisão recorrida e não do processo.

    EE) O Tribunal fez uma interpretação errónea desta norma, pois, a interpretação a fazer da norma, é que a eficácia do despacho ou da decisão, neste caso do despacho de confirmação de Instrutor, cuja suspeição tinha sido suscitada, fica suspensa, assim como fica enquanto não for proferida decisão em sede de recurso hierárquico ou tutelar, ou seja, não poderá este praticar actos, devendo aguardar-se pela decisão do recurso; FF) Retomando o processo a sua tramitação, que neste caso em apreço, seria a audição do arguido, por este próprio pedida; GG) O processo disciplinar apenas poderia ter prosseguido, se tivesse fundamentado o prosseguimento por da sua não execução imediata, resultar grave prejuízo para o interesse público.

    HH) Este recurso hierárquico subiu de imediato nos autos, como se impunha e deverá ser considerado com o mesmo efeito do artigo 189.º do CPTA, em relação às impugnações administrativas necessárias.

    II) Não faz sentido suscitar o incidente de suspeição e este não suspender o processo disciplinar, quando quem tem a condução do processo é apenas o Instrutor.

    JJ) Conforme consta da matéria dada como provada no ponto 30, em 9 de janeiro de 2019, o Recorrente apresentou recurso hierárquico da decisão de indeferimento da segunda suspeição de instrutor.

    KK) Surpreendentemente, a 12 de Janeiro de 2018, o Recorrente é notificado da decisão proferida em sede de processo disciplinar, sem, contudo, ter tido a possibilidade de apresentar a sua defesa, sendo por isso, nula a decisão de aplicação da sanção disciplinar, nulidade, neste caso insuprível.

    LL) O saneador-sentença enferma de outro vício, que resulta de na matéria de facto, não ter dado relevância ao Doc. 4 da PI e considerado matéria de facto assente, que a designação de supervisão era utilizada e aceite pela ASAE, conforme se pode verificar no documento atrás referido, MM) Acresce que caso se tivesse realizado a audiência prévia o Recorrente ia juntar o e-mail de 03/05/2016 que agora se junta, pela qual o Recorrente dá conhecimento que vai utilizar a designação de Supervisor ao seu Superior Hierárquico máximo e não tendo esta comunicação sido objecto de qualquer reacção de natureza disciplinar ou outra qualquer.

    NN) Pelo que não poderá considerar-se que há uma terceira infracção, como a acusação assim concluiu, pela utilização daquela designação.

    OO) O Tribunal de recurso tem poderes para conhecer de facto e alterar a matéria de facto, pelo que deverá constar o Doc. nº 4 da PI e o email de 03 de Maio de 2016, que desde esta data, o Inspector Geral...

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