Acórdão nº 01569/20.9BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelHelena Canelas
Data da Resolução19 de Março de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I. RELATÓRIO A FREGUESIA DE (...) e a Associação (...) Solidário, IPSS (ambas devidamente identificadas nos autos), instauraram em 05/10/2020 no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga processo cautelar contra os requeridos (1) Agência Portuguesa do Ambiente, I. P.

, (2) REN – Rede Elétrica Nacional, S. A.

e (3) Ministério do Ambiente e Transição Energética - Direção-Geral de Energia e Geologia (todos igualmente devidamente identificados nos autos) requerendo a decretação das seguintes medidas providências cautelares: a) suspensão de eficácia da Declaração de Impacte Ambiental emitida pelo Presidente do Conselho Diretivo da APA, I.P., de 21 de novembro de 2016; b) suspensão de eficácia do despacho de 27 de março de 2019 do Diretor Geral de Energia e Geologia, de concessão da Licença de Estabelecimento da instalação da Linha de Muito Alta Tensão (LMAT); c) ser decretada embargada a obra consubstanciada na construção da “linha aérea dupla, a 400kV, Ponte de Lima – Vila Nova de Famalicão”, cujos trabalhos já iniciaram; e d) ser a requerida REN intimada a abster-se de qualquer conduta ou operação material, por si ou através de terceiros, que consubstancie a implementação no terreno da construção da “linha aérea dupla, a 400kV, Ponte de Lima – Vila Nova de Famalicão.

Requereram ainda o decretamento provisório da providência de intimação para abstenção de conduta por parte da requerida REN – Rede Elétrica Nacional, S. A., ao abrigo do disposto no art.º 131.º do CPTA.

Por despacho de 13/10/2020 (fls. 254 SITAF) do Mmº Juiz a quo foi deferido o requerido decretamento provisório com intimação da requerida REN – Rede Elétrica Nacional, S.A., a abster-se de prosseguir quaisquer trabalhos que digam respeito à construção da linha de muito alta tensão em causa nos autos, no território abrangido pela FREGUESIA DE (...).

Decretamento provisório que foi, entretanto, levantado por despacho de 13/11/2020 (fls. 1346 SITAF).

Inconformada com esta decisão de levantamento do decretamento provisório a recorrente FREGUESIA DE (...) dela interpôs desde logo, em 30/11/2020 (fls. 1370 SITAF), recurso de apelação.

E por sentença de 17/12/2020 (fls. 1404 SITAF) o Mmº Juiz do Tribunal a quo pronunciando-se sobre o mérito da pretensão cautelar, julgou-a improcedente, indeferindo o decretamento das providências cautelares requeridas.

Inconformada a FREGUESIA DE (...) dela interpôs recurso de apelação (fls. 1496 SITAF).

Tramitados os recursos, foram ambos admitidos por despacho de 21/01/2021 (fls. 1635 SITAF), com subida imediata, nos próprios autos, e com efeito meramente devolutivo.

São, pois, dois os recursos de apelação que vêm interpostos pela FREGUESIA DE (...): - o primeiro (de fls. 1370 SITAF) dirigido ao despacho de 13/11/2020 (fls. 1346 SITAF) do Mmº Juiz a quo pelo qual foi levantado o decretamento provisório da providência; - o segundo (de fls. 1496 SITAF) dirigido à sentença de 17/12/2020 (fls. 1404 SITAF) que julgando improcedente a pretensão cautelar indeferiu o decretamento das providências cautelares requeridas.

Quanto ao primeiro recurso, que vem interposto do despacho que levantou o decretamento provisório da providência, a recorrente FREGUESIA DE (...) formula as seguintes conclusões, nos seguintes termos:

  1. O presente recurso jurisdicional vem interposto da sentença datada de 13.11.2020, na parte que determinou “o levantamento da providência cautelar provisoriamente decretada no nosso despacho de 13.10.2020”.

  2. Tal sentença padece nulidade por oposição dos fundamentos com a decisão relativamente aos critérios geris da concessão de providências cautelares; C) Visto que, a sentença recorrida pelos mesmos fundamentos que antes havia decretado a providência, agora de forma contraditória, determinou por falta dos pressupostos gerais o levantamento do decretamento provisório decretado.

  3. Contudo, os pressupostos gerais que serviram ao decretamento provisório mantém-se inalterados, pelo que resulta dos mesmos a constituição do periculum in mora, e bem assim a adequação ou necessidade das providências – por constituírem questões intimamente conexas – as providências requeridas continuam a ser adequadas e necessárias ao fim visado.

  4. Daí resulta a nulidade da sentença recorrida, pois os fundamentos que trilhou não conduzem à decisão que constitui o seu resultado lógico.

  5. Nestes termos, podemos concluir que a douta sentença é nula, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. c), do CPC, aplicável ex vi do disposto no art.º 1.º do CPTA, por oposição dos fundamentos com a decisão tomada.

  6. Além do mais, a sentença recorrida resulta de uma errada apreciação dos interesses em presença, para efeitos da ponderação exigida pelo art.º 120.º, n.º 2, do CPTA.

  7. Da matéria de facto dada como provada não é possível deduzir qual o impacto que a suspensão ou não suspensão da construção da linha vai ter na distribuição da energia elétrica.

  8. Igualmente, não é possível aferir se o fornecimento do “bem absolutamente essencial” vai de alguma forma ser alterado.

  9. Pelo que, não resulta de nenhum lado que a capacidade de produção de energia está a aumentar, ou que se a linha não for construída, ou no caso SUSPENSA a construção, que a eletricidade se vai PERDER como afirma o Douto Tribunal.

  10. Salvo o devido respeito, o Douto Tribunal tirou conclusões sobre matérias que nem sequer foram alegadas pelas partes.

  11. Além do mais, o Douto Tribunal pronunciou-se (erradamente) sobre as consequências da manutenção da providência para a imagem externa de Portugal, no entanto, NÃO resulta também da matéria dada como provada QUAIS serão as GRAVES consequências para a imagem externa do País.

  12. ALIÁS, NÃO FOI SEQUER ALEGADO se Portugal se comprometeu COM PRAZOS de construção da Linha de Muito Alta Tensão em causa.

  13. No entanto, o Douto Tribunal assumiu que a suspensão da construção da Linha de Muita Alta Tensão vai significar um atraso na concretização do projeto QUANDO NÃO SABE, até quando é que Portugal acordou com Espanha na construção da Linha de Muita Alta Tensão em causa.

  14. Acresce ainda que este interesse publico referido pelo Douto tribunal não é actual pois é baseado numa eventualidade, ou seja, na suspensão da construção de uma Linha de Muito Alta Tensão, que obviamente, não está sequer em funcionamento.

  15. Ora, se o interesse publico não é sequer actual, não pode sair prejudicado como se faz entender na decisão recorrida.

  16. Assim, o decretamento das providencias requeridas não se mostra “relevantíssimo” para o interesse publico, pois, a Linha objecto do acto suspendendo ainda nem sequer está em funcionamento, não tendo sido sequer alegado que consequências para o cidadão comum pode trazer.

  17. Aliás, nas palavras do Douto Tribunal, a consequência é que a energia poderá “perder-se”.

  18. Assim, mal andou a decisão recorrida ao considerar o decretamento das providencias relevantíssimo para o interesse publico, quando esse interesse publico não existe na actualidade nem resultou provado que possa existir com segurança, sendo meramente eventual e residual.

  19. Por outro lado, dúvidas não podem existir, que a construção da linha IMPEDE a construção de equipamentos ESSENCIAIS para a população de (...), e, portanto, enquanto a Linha não é actualmente necessária, ACTUALMENTE as requerentes estão IMPEDIDAS de construir os equipamentos projetados.

  20. Assim sendo, os interesses que se almejam salvaguardar com o decretamento das providências claramente superior aos danos para o interesse publico, devem ser decretadas, sem mais, as providencias requeridas.

  21. Por fim, a Douta Sentença é proferida com Violação do princípio do dispositivo nos termos do normativo inserto no artigo 264º, nº 1 do C.P.C.

  22. Aliás, o próprio Douto Julgador a quo o reconhece nas suas próprias palavras, conforme passámos a transcrever: “Não o diz a requerente, mas pode ainda acrescentar-se que, além do interesse público subjacente à obra, os danos que sofrerá também poderão ser muito superiores aos que resultam para as requerentes do levantamento da providência; é que, com toda a segurança, a paragem das obras traz custos, desde logo pelo eventual reequilíbrio financeiro dos contratos de empreitada estão associados à execução dos trabalhos, e que, numa obra desde género, seriam sempre apreciáveis.” X) Consequentemente, por violação do artigo 5º e 615ºnº 1 al. d) do CPC, tal decisão é NULA.

    *Termina pugnando pela declaração de nulidade da decisão recorrida nos termos do artigo 615º nº 1 alíneas c) e d) ou, caso assim não se entenda, pela sua revogação, sendo em qualquer dos casos proferida decisão que julgue procedente o pedido de decretamento da providência cautelar de suspensão de eficácia e de intimação à abstenção de uma conduta formulada pela requerente.

    *A recorrida REN – Rede Elétrica Nacional, S.A. contra-alegou (a fls. 1455 SITAF) pugnando pela improcedência do recurso, com manutenção da decisão recorrida, formulando a final o seguinte quadro conclusivo nos seguintes termos: 1.ª Só por lapso de compreende, a referência da recorrente ao «efeito suspensivo» do recurso interposto, já que estando em causa uma sentença que julga procedente um pedido de levantamento de um decretamento provisório no âmbito de um processo cautelar, o recurso ordinário tem efeito meramente devolutivo ex vi do artigo 143.º, n.° 2, alínea b) do CPTA.

    1. A sentença recorrida determinou o levantamento da providência cautelar provisoriamente decretada fazendo aplicação do critério da ponderação de interesses por aplicação dos artigos 131.º, n.º 6 e 120.º, n.º 2 do CPTA e considerando, em face dos interesses alegados e provados, que «a manutenção da providência provisoriamente decretada será muito mais prejudicial que o seu levantamento, o que traduz um silogismo lógico sem qualquer contradição entre a decisão e os fundamentos, não enfermando por isso da nulidade que se lhe mostra imputada no recurso.

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