Acórdão nº 00145/11.1BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelHelena Canelas
Data da Resolução19 de Março de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* I. RELATÓRIO A.

e M.

(devidamente identificados nos autos) instauraram no Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel em 10/02/2011 ação administrativa comum contra a (1) A. SA, a (2) COMPANHIA DE SEGUROS (...) S.A.

e o (3) MUNICÍPIO DE (...) (todos devidamente identificados nos autos), peticionando a condenação solidária dos réus a repararem todos os danos provocados no seu imóvel com a execução da empreitada das obras de construção da Estrada de Funtão, que decorreram entre junho de 2007 e fevereiro de 2008, ou a pagar-lhes o custo da sua reparação e indemnizarem os danos morais sofridos no valor de 200,00€ mensais desde fevereiro de 2008 à sua reparação, que calculou à data de instauração da ação na quantia de 7.000,00€.

Por sentença de 03/07/2020 (fls. 1341 SITAF) a Mmª Juíza do Tribunal a quo julgando parcialmente procedente a ação condenou a ré A. SA, a proceder à reparação dos danos referidos no ponto 30. dos factos provados, realizando as atividades de picagem de reboco, introdução de rede de fibra de vidro, aplicação de reboco, aplicação de novo material cerâmico, remoção de argamassa da juta e aplicação de mástique e nova argamassa, limpeza, preparação e pintura melhor descritas nos artigos 2 a 6 da resposta A ao quesito 4. do relatório pericial ou, em caso de impossibilidade ou excedendo a reparação por meios próprios a quantia de 11.200,00€, a pagar aos autores a quantia de 11.200,00€, absolvendo os demais réus do pedido.

Inconformada a ré A. SA dela interpôs o presente recurso de apelação (fls. 1433 SITAF), formulando as seguintes conclusões, nos seguintes termos: A. A Recorrente entende que a decisão da matéria de facto é incorrecta quanto aos pontos 29 e 30 da matéria de facto provada; que deverão ser dados como NÃO PROVADOS.

  1. Esta alteração deverá ser feita com base nos depoimentos das testemunhas indicados e ou transcritos no corpo das alegações e de acordo com o disposto no art. 607º nº 4 do Código de Processo Civil e no art. 347º do Código Civil “à prova que for produzida pela parte sobre quem recai o ónus probatório pode a parte contrária opor contraprova a respeito dos mesmos factos, destinada a torna-los duvidosos: se o conseguir, é a questão decidida contra a parte onerada com a prova.

    ” C. Resultou demonstrado que os meios mecânicos empregues não são aptos a provocar vibrações capazes produzir as fissuras examinadas na habitação em causa.

  2. Deverá a matéria de facto ser ampliada E. De acordo com o disposto no art. 607º/4 do CPC devem ser enunciados na sentença quais os factos que se consideram provados e os factos não provados.

  3. Na contestação a Ré, ora Recorrente alegou que a obra em questão foi executada sempre de acordo com as melhores normas da arte de bem construir e dos métodos de construção previstos no projecto e demais elementos do concurso público (art. 13º). A Ré, ora Recorrente entende que este facto está PROVADO.

  4. Este facto não consta nem dos factos provados nem dos factos não provados.

  5. Apesar de entender que a actividade de construção civil e as obras de escavação ou desaterros que a integram não eram de qualificar como actividade perigosa, a douta sentença em apreço considerou que, no caso em concreto os trabalhos de escavação constituíam uma actividade perigosa.

    I. Salvo o devido respeito, apesar da referida tecnicidade do projecto de empreitada, o que é relevante para determinar a alegada perigosidade da actividade é em concreto os trabalhos que foram realizados nas imediações da moradia dos Autores.

  6. Ora, tal como foi descrito pelos factos provados, os meios utilizados na obra nas imediações do prédio dos Autores não importam qualquer risco acrescido, relativamente a uma actividade normal de escavação.

  7. Mesmo que se considere a actividade da Recorrente, nas obras executadas nas imediações da habitação em causa, como perigosa, o que se não aceita, importa verificar se a Recorrente ilidiu a presunção de culpa.

    L. Atentos os factos provados, terá de concluir ter a Recorrente demonstrado que usou de todas as providências que lhe eram exigidas tendo em vista aquele objectivo e, desse modo, ilidiu a presunção de culpa que sobre si impendia, impedindo a sua responsabilidade pela reparação dos danos.

  8. Ainda que os danos tivessem sido provocados pelas obras, o que se não aceita, isso seria o resultado, forçoso e forçado, da própria natureza dos trabalhos, uma vez que não havia outro modo de os executar.

  9. E, nessa hipótese, não pode ser imputada a responsabilidade ao empreiteiro uma vez que o projecto e o caderno de encargos é da responsabilidade do dono da obra; O. Não cabendo, portanto, ao empreiteiro aqui Recorrente, suportar o ressarcimento dos alegados danos.

    Termina pugnando pela revogação da decisão recorrida com a sua absolvição do pedido.

    *Os contra-alegaram os recorridos autores (fls. 1496 SITAF) pugnando pela improcedência do recurso, com manutenção da decisão recorrida, não tendo formulado conclusões, bem como o MUNICÍPIO DE (...) (fls. 1523 SITAF), pugnando igualmente pela improcedência do recurso, formulando a final o seguinte quadro conclusivo, nos seguintes termos: 1.ª - O Recorrente defende que não teve qualquer conduta, seja activa e/ou omissiva, de onde pudesse resultar a sua responsabilidade – quer por factos ilícitos ou pelo risco – e a inerente obrigação de ressarcimento dos danos ocorridos na casa dos então AA.; 2.ª - Defendendo que executou a obra “(…) sempre de acordo com as melhores normas da arte de bem construir e os métodos de construção previstos no projecto e demais elementos do concurso público”, pelo que só se poderá concluir pela responsabilidade do MUNICÍPIO DE (...) em ressarcir os então AA.; 3.ª - Atendendo ao estatuído nos artigos 36.º a 38.º do Regime Jurídico das Empreitadas Públicas, à data consignado no Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março, que regulavam, especificamente, a responsabilidade do dono da obra e do empreiteiro, no que concerne a danos causados a terceiros, como é o caso, é possível concluir que: o empreiteiro responde pelos erros de concepção, se a mesma for da sua autoria, enquanto o dono da obra responde pelos erros de execução, se os mesmos forem consequência de ordens ou instruções escritas transmitidas pelo fiscal da obra, ou que tais erros e vícios, provindo embora da iniciativa do empreiteiro, houvessem obtido a expressa concordância do mesmo fiscal; 4.ª - Fora dessas hipóteses, e por falta de um genérico vínculo de subordinação da actividade do empreiteiro relativamente ao dono da obra, este não responde pelos prejuízos causados a terceiros no decurso da execução da empreitada, pois não existe no regime jurídico do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março, um princípio geral de responsabilização do dono da obra decorrente dos prejuízos provocados pelo empreiteiro no âmbito da execução do contrato; 5.ª - O que existe, em qualquer dos casos, é, em primeira linha, a responsabilização geral do empreiteiro (artigo 36.º, n.º 1) cingindo-se – como se disse – a responsabilidade do dono da obra aos prejuízos provocados naqueles casos em que os vícios da obra resultaram de ordens ou instruções transmitidas pelo fiscal por aquele nomeado, ou que hajam obtido a sua concordância expressa, e também daqueles outros em que tenha havido erros de concepção do projecto imputáveis ao dono da obra; 6.ª - Aliás, como resulta da douta decisão ora em recurso, não será pelo facto de o empreiteiro ter efectuado a construção em conformidade com o projecto, com o caderno de encargos, com o plano de segurança e saúde e, ter cumprido as orientações e recomendações da fiscalização e do dono da obra, que “(…) se poderá sem mais extrair que a lesão ao direito de propriedade dos AA. tenha emergido de erros de conceção do projeto, ou de ordens ou instruções transmitidas pelo fiscal nomeado pelo dono da obra, ou que hajam obtido a sua concordância expressa. Antes pelo contrário, apenas se prova que os danos verificados no prédio dos Autores, contíguo às obras, se produziram devido aos meios mecânicos utilizados pelo empreiteiro e, ainda que a utilização destes tenha, naquele local, sido consentida pelo dono de obra ao adjudicar à proposta da A. contendo os meios e equipamentos a utilizar, nem o seu poder de direção nem de fiscalização, retiram ao empreiteiro a autonomia no ajustamento dos meios técnicos utilizados à concreta execução da obra. Cabendo ao empreiteiro garantir que a obra se executa com as condições necessárias a evitar a ocorrência de danos a terceiros.

    ”; 7.ª - Além do mais, o Apelante não alega nem prova ter adoptado uma conduta tendente a reduzir e eliminar os próprios riscos inerentes à realização da obra, atenta a proximidade da casa dos AA.; 8.ª - A isto acresce, que a responsabilidade pela indemnização dos prejuízos causados a terceiros, que não resultassem da própria natureza ou concepção da obra, sempre seriam da responsabilidade do empreiteiro tal como se encontrava previsto no ponto 1.10.1, alínea a) do respectivo Caderno de Encargos; 9.ª - Por outro lado, de acordo o disposto nos artigos 342.º, n.º 1 e 487.º, n.º 1, ambos do Código Civil o “onus probandi” relativo à eventual responsabilidade do Apelado, incumbia aos então AA., sendo certo que como bem foi observado pelo Tribunal a quo, os então AA. não demonstraram qualquer “(…) conduta/omissão, traduzida no exercício deficiente dos seus poderes de direção e omissão de fiscalização da obra, de que dependia a sua responsabilização, o que determina desde logo, a sua absolvição do pedido”; SEM PRESCINDIR, 10.ª - Independentemente de o MUNICÍPIO DE (...) ser inteiramente alheio às fissuras existentes no prédio dos então AA., o certo é que se, por mera hipótese de raciocínio se entendesse o contrário, nunca o ora Apelado poderia ser condenado nestes autos, uma vez que o eventual direito daqueles se encontra prescrito; 11.ª - Tendo em conta a matéria...

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