Acórdão nº 02867/14.6BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelPaulo Ferreira de Magalh
Data da Resolução19 de Março de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: * I - RELATÓRIO CAIXA DE PREVIDÊNCIA DOS ADVOGADOS E SOLICITADORES, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 17 de abril de 2020, pela qual foi julgado procedente o pedido formulado na Petição inicial [atinente à anulação da deliberação da Direcção da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, e à restituição do valor das contribuições liquidadas durante o período em que manteve a inscrição em vigor, acrescido de juros – que o Tribunal recorrido julgou como acção de condenação à prática do acto devido], e que consequentemente, condenou a Ré a reconhecer o direito do Autor ao resgate das contribuições que tenha efectuado ao longo da sua carreira contributiva.

*No âmbito das Alegações por si apresentadas, a Recorrente Caixa de Previdência elencou a final as respectivas conclusões, que para aqui se extraem como segue: “CONCLUSÕES: 1.ª Vem o presente recurso Jurisdicional da sentença que julgou a presente acção administrativa procedente e, em consequência, condenou a CPAS «a reconhecer o direito do Autor ao resgate de contribuições que tenha efectuado ao longo da sua carreira contributiva.» 2.ª O resgate de contribuições estava previsto no art.º 10.º do RCPAS então em vigor (aprovado pela Portaria n.º n.º 487/83, de 27 de abril, alterada pelas Portarias n.ºs 623/88, de 8 de Setembro, e 884/94, de 1 de outubro).

  1. Da conjugação do disposto no n.º 1 e do n.º 3 do referido art.º 10.º do RCPAS então em vigor conclui-se que o resgate das contribuições pagas pelo beneficiário (exceptuando das destinadas à acção de assistência e da percentagem afeta a despesas de administração, deduzidas dos benefícios recebidos) só será possível caso o beneficiário ordinário da CPAS «passe a exercer actividade legalmente incompatível» com a advocacia ou solicitadoria.

  2. Pelo que o resgate das contribuições pagas só deve ser admitido em casos muito excepcionais.

  3. Pois o resgate de contribuições, na medida em que descapitaliza a instituição, deixa-a mais frágil do ponto de vista financeiro e, por isso, pondo em risco o seu futuro e a garantia das pensões de reforma dos seus muitos milhares de beneficiários.

  4. E por outro lado, o resgate das contribuições, na medida em que o beneficiário deixa de poder contar com uma futura pensão de reforma, deixa (ou pode deixar) o beneficiário sem qualquer protecção social futura.

  5. Colocando, dessa forma, em risco, o direito à Segurança Social, previsto no art.º 63.º da CRP.

  6. Assim, a única possibilidade do resgate de contribuições, que deverá ser meticulosamente avaliada, será no caso de o beneficiário cancelar a sua inscrição no seu organismo profissional, pelo facto de ter passado a exercer uma profissão incompatível com a advocacia ou a solicitadoria e faça prova desse facto junto da CPAS.

  7. No presente caso, nada disso se passou: de facto, o Recorrido, não alegou junto da CPAS (e muito menos provou) que passou a exercer outra actividade profissional incompatível com a solicitadoria.

  8. Não sendo de admitir que o pressuposto previsto no n.º 1 do art.º 10.º do RCPAS em causa, não tenha de ser verificado pela CPAS.

  9. Assim, a sentença recorrida violou o disposto no art.º 10.º, n.º 1 e 3 do RCPAS (aprovado pela Portaria 487/83, de 27 de Abril, com as alterações constantes das Portarias n.º 623/88, de 8 de Setembro e n.º 884/94, de 1 de Outubro) e o art.º 63.º da CRP.

  10. A sentença recorrida deve ser revogada e substituída por outra que julgue a presente acção improcedente e absolva a CPAS dos pedidos.

Nestes termos e com o douto suprimento de V. Exas deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue a presente acção improcedente, por não provada e, em consequência, seja a CPAS absolvida dos pedidos com o que se fará a acostumada JUSTIÇA!** O Recorrido apresentou Contra alegações, tendo elencado a final as conclusões que ora se reproduzem: “2 – Conclusões: 2.1 - A Sentença recorrida julgou procedente a presente acção administrativa e condenou a Apelante a reconhecer o direito do Apelado, ao resgate das contribuições que tenha efectuado ao longo da sua carreira contributiva.

2.2 – No recurso interposto a Apelante vem sustentar que a sentença recorrida não julgou em conformidade com as normas regulamentares aplicáveis, porquanto entende que o resgate das contribuições pagas pelo beneficiário só será possível caso este passe a exercer actividade legalmente incompatível com a solicitadoria.

2.3 – Advoga a Apelante que o resgate das contribuições (…) descapitaliza a instituição, deixa-a frágil do ponto de vista financeiro e, por isso, põe em risco o seu futuro e a garantia das pensões de reforma dos seus muitos milhares de beneficiários; (…) que o beneficiário deixa de poder contar com uma futura reforma (…) colocando, dessa forma, em risco, o direito à segurança social; e, finalmente, entende que a única possibilidade que o beneficiário tem para solicitar o resgate das contribuições é fazendo prova, também junto da própria C.P.A.S. e não apenas da O.S.A.E., que o cancelamento da sua inscrição no seu organismo profissional fundamentou-se no facto de ter passado a exercer uma profissão incompatível com a advocacia ou solicitadoria.

Cremos, porém, 2.4 – Que tal argumentação não pode proceder, porquanto a Sentença recorrida é uma decisão judicial onde ficou plasmada uma criteriosa apreciação da matéria de facto em discussão e uma correcta aplicação do direito vigente, não sendo, no nosso entendimento, passível de qualquer crítica ou censura, porque não violou qualquer disposição legal, substantiva ou processual, e, como tal, deverá ser mantida, integralmente, nos seus precisos termos.

Assim, 2.5 - A alegada – mas não demonstrada - e/ou eventual descapitalização da instituição ou a sua suscitada – mas não comprovada – e/ou eventual fragilidade do ponto de vista financeiro, nunca ficou a dever-se, a ter existido ou vindo a existir, ao exercício do direito de resgate das contribuições, mas sim a um conjunto de inúmeras outras situações que nada contendem com o exercício daquele direito.

Por sua vez, 2.6 - O resgate das contribuições prestadas pelo beneficiário não pode descapitalizar a instituição e/ou fragilizar a sua situação financeira, pois, resgatadas as contribuições, nelas serão deduzidas tudo o quanto o beneficiário auferiu até então, seja a que título for, e, ainda, as mencionadas comissões administrativas, não vindo este a beneficiar, no futuro, qualquer contrapartida a título de pensão por parte da Apelante.

Finalmente, 2.7 - O risco da perda do direito à segurança social por parte do beneficiário é um risco muito mais próximo e presente no âmbito da C.P.A.S. do que em qualquer outro sistema ou subsistema previdencial ou de segurança social.

Noutro aspecto, 2.8 – Alavancados na argumentação da sentença recorrida, concluímos que a C.P.A.S. detém dois universos distintos de beneficiários - os ordinários e os extraordinários - sendo certo que os ordinários são aqueles que estejam inscritos na Câmara dos Solicitadores e os extraordinários os que tenham a sua inscrição suspensa no respetivo organismo profissional, desde que requeiram a manutenção da sua inscrição na Caixa.

Ora, 2.9 - Desta alteração de status de beneficiário ordinário para extraordinário conjugado com a circunstância da suspensão da inscrição no respetivo organismo profissional, motivada por situação fáctico-jurídica geradora de incompatibilidade com o exercício da solicitadoria, que emerge o âmbito de aplicação objetivo e subjetivo previsto no n.º 1 do artigo 10.º do R.C.P.A.S., com o consequente direito ao resgate das contribuições que o beneficiário tenha efetuado durante toda a sua carreira contributiva, a que se reporta o n.º 3 do mesmo artigo 10.º.

2.10 - Não obstante a norma regulamentar prevista no n.º 1 do artigo 10.º do R.C.P.A.S., invocar o conceito de cancelamento ao referir “será cancelada a inscrição”, tal cancelamento não se confunde com o cancelamento da inscrição no respetivo organismo profissional.

2.11 - O cancelamento a que se refere o n.º 1 artigo 10.º do R.C.P.A.S., é o cancelamento da inscrição do beneficiário, enquanto beneficiário ordinário, conclusão, esta, que se retira pelo segmento final da norma, ao referir “sem prejuízo dos artigos […] e 7.º” ou seja a possibilidade de continuarem na Caixa, mas como beneficiários extraordinários.

Deste jeito, 2.12 - Não prevendo o referido artigo 10.º qualquer espécie de tramitação procedimental para a comprovação do preenchimento do pressuposto do cancelamento da inscrição junto da C.P.A.S., nem mesmo quanto à motivação do respetivo cancelamento, conclui-se que o referido pressuposto é de verificação “automática” por reporte à comunicação que lhe for efetuada pela Câmara dos Solicitadores, conforme se afere pelo dever de estreita colaboração da C.P.A.S. com aquela Câmara dos Solicitadores previsto n.º 2 do artigo 2.º do R.C.P.A.S., bem como o dever de comunicação de inscrição, previsto no n.º 5 do artigo 5.º do mesmo regulamento.

Ou seja, 2.13 - Solicitada a suspensão na respetiva ordem profissional e sendo a mesma motivada por verificação de incompatibilidade tem-se automaticamente por verificado o pressuposto previsto no n.º 1 do artigo 10.º do R.C.P.A.S., sem necessidade de qualquer controlo e verificação por parte da C.P.A.S., porquanto o cancelamento na C.P.A.S. não tem autonomia nem se verifica de motu próprio, tendo sempre na sua génese um pedido de suspensão de inscrição efetuado junto da Câmara dos Solicitadores.

Para mais, 2.14 - Note-se que seria errada a interpretação que o “cancelamento” a que se referia o n.º 1 do artigo 10.º do R.C.P.A.S. - com a inerente direito ao resgate a que se refere o n.º 3 do mesmo artigo - tivesse de equivaler ao efetivo cancelamento da inscrição na Câmara dos Solicitadores, porquanto, para...

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