Acórdão nº 620/18.7BEBJA de Tribunal Central Administrativo Sul, 18 de Março de 2021
Magistrado Responsável | PEDRO NUNO FIGUEIREDO |
Data da Resolução | 18 de Março de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul I. RELATÓRIO A..... instaurou providência cautelar contra o Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, IP, na qual peticiona a suspensão da eficácia do ato administrativo do Presidente do Conselho Diretivo desta entidade, que determinou a alteração do contrato de financiamento n.º .....
, referente ao pedido de apoio na operação n.º .....
, designada por Zona de Intervenção Florestal de.....
, e a devolução do valor de € 362.322,45, por si recebida a título de subsídio de investimento.
Citada, a entidade requerida apresentou oposição, pugnando pela improcedência do processo.
Por sentença datada de 29/10/2018, o TAF de Beja julgou totalmente improcedente a providência cautelar.
A requerente interpôs recurso para este TCAS, que por decisão sumária de 12/04/2019 negou provimento ao recurso. Por acórdão de 22/05/2019, tal decisão foi mantida.
Interposto recurso de revista, o Supremo Tribunal Administrativo, em acórdão de 17/12/2019, concedeu provimento ao mesmo, revogou o acórdão recorrido e determinou a baixa dos autos à primeira instância para ampliação da matéria de facto e, se a tal nada mais obstar, a emitir novo juízo sobre a pretensão cautelar Por sentença de 10/02/2020, o TAF de Beja voltou a julgar totalmente improcedente a providência cautelar.
Inconformado com esta decisão, o requerente interpôs o presente recurso, terminando as alegações com a formulação das conclusões que seguidamente se transcrevem: “1º Nos termos do artº 118º nº 2 CPTA e artº 574º nº 1 e 2 CPC, ao contestar, deve o R. tomar posição definida perante os factos que constituem a causa de pedir invocada pelo autor, considerando-se como admitidos por acordo os factos que não forem impugnados na contestação; 2º No caso “sub judice” o Requerido não impugnou especificadamente, como a lei impõe, a substancialidade dos factos articulados na petição inicial, dando o seu acordo/confessando factualidade que é essencial para a boa decisão da causa, mas que o Meritíssimo Juiz desprezou no seu julgamento sobre a matéria de facto; 3º É o que sucede com toda a factualidade articulada na p.i. relativa à integral execução dos trabalhos objeto da operação; à aceitação pelo Requerido dos trabalhos executados na operação; ao controlo do Requerido de toda a execução dos trabalhos no decurso da operação; ao controlo dos pagamentos dos trabalhos executados; à aprovação e aceitação do Requerido de todos os pedidos de pagamento e respetivos comprovativos de despesas da operação, com expressa validação das despesas apresentadas pela Requerente, sobre as quais recai agora o argumento da ausência da pista de controlo da sua execução e pagamento; 4º Ora porque essa factualidade é manifestamente relevante para a decisão da causa, à luz do artº 118º nº 2 CPTA e do artº 574º nºs. 1 e 2 CPC, devem ser levados à matéria assente nos autos a factualidade alegada pela Recorrente nos artºs. 46º a 49º; 57º a 62º; 74º a 76º; 79º a 82º; 86º a 88º; 91º a 93º; 97º a 100º: 103º (por lapso de numeração 99º) a 102º (por lapso de numeração) da p.i.; 5º Face à matéria de facto dada como provada, a análise e julgamento sobre a verificação do “fumus boni iuris”, da forma perfunctória que caracteriza o julgamento em sede de providência cautelar, deve ser feito de forma diametralmente oposta àquela que é adotada na sentença “a quo”; 6º É óbvio que existe a pista de controlo das despesas da operação, salvo prova em contrário, pois de outra forma o Recorrido não teria aceitado como boas as despesas apresentadas pela Recorrente e não as teria liquidado, como liquidou, integralmente; 7º Se o Recorrido validou e pagou bem, ou não, as despesas da operação, é matéria que pela sua natureza só pode ser apurada em sede da instrução a levar a cabo na ação principal; 8º Nos presentes autos não há qualquer fundamento de facto que permita concluir, em sede de providência cautelar, que não existe a necessária pista de controlo das despesas apresentadas pela Requerente na operação, dado que está provado nos autos que essas despesas foram fiscalizadas, validadas e pagas pelo Recorrido; 9º À luz do artº 342º CC era ao Requerido que competia fazer prova dos factos que evoca para fundamentar a anulação dos subsídios atribuídos à Requerente; 10º É manifesto que o Requerido não fez prova nos autos de qualquer facto que infirme a anterior decisão de aceitação e pagamento dos trabalhos executados pela Requerente, e que agora foram objeto da anulação do subsídio atribuído; 11º A sentença “a quo” fez uma errada interpretação e aplicação do artº 342º CC; 12º O ato requerido excluiu no 1º Pedido de Pagamento (PP), de 11-12-2014, a despesa no valor global de € 292.314,28, correspondente a parte do valor da fatura nº 38/2014, emitida em 11-12-2014, pela A....., Lda; 13º Na sequência da pronúncia da Requerente em sede de audiência prévia, a o IFAP passou a considerar como elegíveis as despesas referentes à limpeza manual de matos e à poda sanitária, no montante total de € 70.008,17; 14º O ato requerido determinou a final, por manifesto erro de cálculo, a devolução integral do valor da identificada fatura, no montante de € 362.322,45, não deduzindo indevidamente o montante de €70.008,17; 15º A decisão “a quo” faz assim um errado julgamento da matéria de facto discutida nos autos, devendo por isso ser revogada; 16º A decisão de fundo da causa com fundamento nos identificados vícios alegados, e o plano de direito que importa analisar nos diversos diplomas de índole do direito nacional e do direito europeu aplicáveis, não se compagina com a simplicidade e celeridade caraterística do processo cautelar; 17º O vício invalidante que justifica materialmente o ato impugnado, isto é, o vício relativo ao erro nos pressupostos de facto e de direito evocado pela Recorrente, mostra-se, de forma perfunctória, como verificado, considerando a matéria de facto que deve ser dada como assente nos autos; 18º Deve ser julgado como verificado o requisito do “fumus boni iuris” e assim decretada a providência requerida; 19º Ao assim não entender, a sentença “a quo” faz uma errada interpretação e aplicação do artº 120º nº 1 CPTA; Sem prescindir, 20º A sentença “a quo” faz uma errada interpretação e aplicação dos artºs 121º e 122º CPA; 21º A sentença “a quo” viola o artº 33º do Regulamento (EU) nº 65/2011, de 27-1, e não cumpre os requisitos de fundamentação exigidos nos artºs 151º a 153º CPA; 22º Com efeito, a pista de controlo analisada na sentença “a quo”, à luz do art.º 33º do Regulamento (EU) nº 65/2011, de 27-1, é feita na avaliação da relação contabilística entre os fornecedores da Requerente, P..... Lda., A..... Lda e R..... Lda, e os subcontratados destas sociedades, e não, como devia ser, entre aqueles fornecedores e a A..” O IFAP, IP, não apresentou contra-alegações.
* Perante as conclusões das alegações da recorrente, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso, cumpre aferir: - do erro de julgamento da decisão sobre a matéria de facto; - do erro de julgamento de direito quanto à verificação dos requisitos de concessão da tutela cautelar e suspensão do ato.
Dispensados os vistos legais, atenta a natureza urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.
* II. FUNDAMENTOS II.1 DECISÃO DE FACTO Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos: “A) A Requerente é uma associação de direito privado, sem fins lucrativos, constituída por produtores florestais, e tem por objeto social a defesa e promoção dos interesses dos produtores e proprietários florestais e o desenvolvimento de ações de preservação e valorização das florestas, dos espaços naturais, da fauna e flora; a defesa e valorização do ambiente, do património natural construído, a conservação da natureza, bem como, de uma maneira geral, a valorização do património fundiário e cultural dos seus associados: cfr. doc. n º 1 junto com o Requerimento Inicial – RI; B) Em 2014-09-17, a Requerente celebrou com a Entidade Requerida um acordo denominado “Contrato de Financiamento nº .....
, referente ao pedido de apoio na operação nº .....
, designada por ZONA DE INTERVENÇÃO FLORESTAL DE .....
, no âmbito da candidatura ao Programa PRODER – Programa de Desenvolvimento Rural do Continente: cfr. doc. 2 junto com o RI; C) Do acima referido contrato, ressalta além do mais, que a Entidade Requerida concedeu à Requerente um subsídio não reembolsável no valor de € 1.755.096,09, correspondente a 70,12% do valor do investimento total da operação aprovada para aquela ZIF; que os pagamentos são realizados sob a condição da sua elegibilidade e conformidade com as normas aplicáveis e; ainda que, em caso de incumprimento, pode ocorrer a modificação unilateral do contrato de financiamento e a consequente devolução das ajudas indevidamente recebidas: cfr. doc. n º 2 junto com o RI; D) Em 2017-02-06, a Requerente foi notificada, para efeitos de audiência prévia, nos seguintes termos: 1. Na sequência da ação de controlo administrativo, realizada em 07/06/2016, nomeadamente no decurso dos trabalhos com a Inspeção Geral de Finanças (IGF), no âmbito da Certificação de Contas de 2015, verificou-se uma situação de incumprimento da legislação aplicável a Ação “Proteção contra Agentes Bióticos Nocivos" do PRGDER - Programa de Desenvolvimento Rural do Continente, que se enquadra no Regulamento (CE) n° 1698/2005, de 20 de Setembro, regido a nível nacional pelos Decreto-Lei n° s 2/2008. de 4.01 e Decreto-Lei n° 37-A/2008, de 5.03 (com as alterações que lhes foram introduzidas pelos Decretos-Lei n°s 66/2009, de 20.03, 69/2010, de 16.06 e 62/2012, de 14.03) e pela Portaria n° 1137-D/2008, de 9 de outubro (alterada pela Declaração de Retificação n° 74/2008, pelas Portaria n° 147/2009, pela Portaria n" 739-B/20Q9, pela Declaração de Retificação n° 58/2009 e pela Portaria n" 228/2011).
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Constatou-se na referida ação, a existência de relações especiais, com os fornecedores A....., Lda e P....., Lda, uma vez que o...
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