Acórdão nº 1619/09.0BELRA-A de Tribunal Central Administrativo Sul, 18 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelANA CRISTINA LAMEIRA
Data da Resolução18 de Março de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul I. RELATÓRIO M........

intentou contra o MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA acção administrativa especial, peticionando a declaração de nulidade do despacho do Secretário de Estado da Administração Interna, notificado em 23/9/2009, que, no processo disciplinar n.º 2004 EPP00022DIS, louvando-se nas disposições conjugadas dos artigos 43.° e 47.°, n.º 1 e n.º 2, alínea g) do Regulamento Disciplinar da PSP, aprovado pela Lei n.°7/90 de 20 de Fevereiro, o condenou na pena disciplinar de aposentação compulsiva, por uma alegada violação do dever de aprumo, previsto nos n.ºs 1 e 2, alínea f) do mesmo regulamento.

Alegou, em suma, a inexistência de procedimento criminal bem como a inexistência de decisão criminal condenatória do A., atendendo a que o Tribunal entendeu que o requerente não deveria ser julgado pelos factos que lhe são imputados no processo disciplinar.

Existindo processo judicial que apreciava os mesmos factos do processo disciplinar, este teria de ficar suspenso, a aguardar decisão transitada em julgado do processo judicial.

O processo disciplinar que culminou na pena de aposentação compulsiva, já prescreveu.

A nulidade do processo disciplinar, uma vez que apreciou factos posteriores à data da sua instauração e a falta de fundamentação do acto recorrido.

Por Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, datada de 11/3/2019, foi a acção julgada procedente e declarado nulo o acto impugnado.

Inconformado o Ministério da Administração Interna interpôs o presente recurso, terminando as Alegações com a formulação das conclusões que, de seguida, se transcrevem: “A. Verifica-se na douta sentença uma errada interpretação dos factos, na medida em que decide declarar ... nulo o acto impugnado...”, por ter considerado: ao recusar a inquirição médica e da demais prova testemunhal, o despacho do instrutor impediu o arguido de se defender eficaz e equitativamente da intenção de lhe ser aplicada uma sanção lesiva do seu direito fundamental a não ser despedido com justa causa... (...).

B. Sucede, porém, que por um lado não está em causa qualquer despedimento por justa causa, mas sim, a aplicação de uma sanção disciplinar, aplicada no final de um procedimento regularmente conduzido; C. Por outro lado, o douto tribunal desconsiderou que no âmbito do referido procedimento disciplinar, foi solicitado parecer médico ao Instituto de referência nacional, independente - Instituto de Medicina Legal -, no qual os dois peritos que o assinam concluem pela imputabilidade do arguido; D. E, não obstante ter ficado provado na douta sentença em crise, que a perícia médica foi solicitada ao Instituto de Medicina Legal de Coimbra por oficio datado de 31.05.2006 e foi pedida no âmbito do processo disciplinar 2004EPP00022DIS, onde desde 27.05.2004, 23.06.2004 e 08.07.2004 se encontravam as participações referentes aos factos ocorridos, exatamente, em 2004”, a douta sentença concluiu que” Certo é que o parecer do IML, unicamente referido a factos bem distantes, no tempo...”.

E. Contudo, nem o próprio A. assim o defende, na verdade o A. insurge-se contra a realização da perícia dois anos após a prática dos factos, mas em momento algum refere que não diz respeito a esses mesmos factos.

F. Aliás no artigo 28° da sua petição inicial refere “...A imputabilidade do arguido não foi aferida no momento da prática dos factos, pois, a perícia foi realizada dois anos depois.”, G. Igualmente, desconsiderou o douto tribunal que, a entidade a quem compete a tutela disciplinar, não estava vinculada ao parecer da médica que acompanhou a ora A., e que podia (e fez) solicitar parecer médico a entidade distinta e independente.

H. Tendo tal Entidade de referência nacional, concluído, na perícia assinada por dois técnicos, que o ora A. era imputável.

  1. A douta sentença não valoriza, igualmente, o facto de a recusa das diligências requeridas, por parte do instrutor do processo, estar devidamente fundamentada e ter tido por base, por um lado, o sobejamente falado parecer médico do Instituto de Medicina Legal - Instituição nacional de referência no âmbito das suas atribuições - que considerou imputável o arguido e; J. Por outro lado, pelo facto de as testemunhas arroladas, face aos elementos constantes nos autos, só poderem ser abonatórias, e nessa medida, o arguido não foi, em momento algum prejudicado, atendendo a que lhe foi aplicada, de entre as duas penas possíveis para as situações de infrações muito graves, como a dos autos, a menos gravosa, ou seja a reforma compulsiva, igualmente, andando mal a douta sentença quando decidiu como decidiu.

    Por fim, K. Deve ser de sublinhar que os presentes autos devem ser apreciados tendo como pano de fundo, não só a gravidade dos factos praticados, L. Mas também atendendo à qualidade de quem os praticou, ou seja, um Agente Policial a quem competia assegurar a legalidade.

    M. Assumindo, por se tratar de Agente das Forças de Segurança, especial relevância a situação dos autos, e neste contexto mal andou a sentença ora em crise, na medida em que fez uma muito errada interpretação dos pressupostos de facto, face ao que atrás ficou exposto.

    Conclui pela procedência do recurso e revogação da sentença recorrida.

    *M........, ora Recorrido, apresentou contra-alegações, terminando com o seguinte segmento conclusivo: “17° O acto administrativo objeto da presente acção á nulo.

    1. Deve-se extrair dessa nulidade todas as consequências.

    2. Foram violados entre outras as normas do art. 29° n° 5 da C.R.P., 133° n° 2, ais., b), d) e c) e f) do C.P.A.

    TERMOS EM QUE, A douta decisão recorrida deve ser doutamente confirmada por Vs. Ex.as. Fazendo Vs. Exas dessa forma, uma vez mais, Sã, Serena e Objetiva Justiça!” * O DMMP, notificado ao abrigo do disposto no artigo 146º/1 do CPTA, emitiu pronúncia no sentido da improcedência do recurso.

    Corridos os vistos, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Administrativo para decisão.

    * I.1 – DAS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR: Em conformidade com o disposto nos artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC), é pelas conclusões do recorrente jurisdicional que se define o objecto e se delimita o âmbito do presente recurso, sem prejuízo das questões de que este tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, que inexistem, estando apenas adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

    A questão essencial a resolver reside em saber se a sentença recorrida errou na interpretação das normas jurídicas aplicáveis, inexistindo qualquer nulidade por omissão de produção de prova requerida pelo Autor / Recorrido em resposta à acusação.

    * II – Fundamentação II. 1 - De facto: Na decisão recorrida foi fixada a seguinte factualidade, não impugnada, que se reproduz, na íntegra: “1. O autor era agente principal da PSP e prestava serviço na Escola Prática de Polícia, em Torres Novas.

    1. No dia 15 de Março de 2004 L........ apresentou queixa na esquadra da PSP do Entroncamento contra o aqui Autor, acusando-o de, nesse dia, no interior da oficina de alumínios do queixoso, à Rua 1 de Dezembro, no Entroncamento, o ter agredido com uma barra de alumínio em diversas partes do corpo, causando-lhe hematomas nas costas e escoriações numa orelha.

      Cf. fs. 5 do P.A.

    2. Tal queixa foi autuada como inquérito penal n° NUIPC 74/04.5PAENT Idem.

    3. Como o MP houvesse enviado cópia da queixa ao Senhor Director da Escola Prática de Polícia, este, por despacho de 14 de Abril seguinte ordenou a abertura de processo disciplinar contra o Autor, relativamente aos factos objecto daquela queixa, processo que foi autuado logo no dia seguinte, pelo instrutor nomeado, tendo-lhe cabido o n° 2004EPP00022DIS.

      Fls. 3 do PA.

    4. No dia 13 de Maio de 2004 o agente da PSP J........ elaborou a participação n° 113/04, cujo teor no PA, a fs. 22, aqui se da por reproduzido, transcrevendo os seguintes excertos: Participo a V Ex2 que hoje, pelas 11 H35, por determinação superior, acompanhado pelo meu colega n°. 442 - R........, como motorista do CP deste Departamento Policial, desloquei-me ao estabelecimento comercial LIDL, sito na Rua……….., nesta cidade, em virtude de ali ter sido pedida a comparência desta Policia.

      Chegado ao local, fui informado por N........, responsável pelo estabelecimento, o qual me comunicou que, momentos antes, M........, nascido a C4/01Í1966, casado, Agente da PSP, (...) havia subtraído uma lixadora automática, marca Porkside, modelo KH 3115, no valor de 59 euros, tendo transposto as linhas de caixa sem efectuar o pagamento da dita máquina, tentando assim iludir os responsáveis por aqueles serviços. No entanto, o M........, com o consentimento do responsável pelo estabelecimento, efectuou o pagamento da referida máquina. O responsável, N........, foi informado do direito de queixa e respectivo prazo.” 6. No dia 18 de Maio de 2004, H........, gerente do supermercado “Modelo” de Abrantes, apresentou na esquadra de santarém da PSP uma denúncia por furto contra desconhecidos, cujo teor a fls. 95 do P.A. aqui se dá por reproduzido, transcrevendo o seguinte excerto: QUE ACUSA: DESCONHECIDOS.

      DA PRÁTICA DOS SEGUINTES FACTOS: De no dia 09, pelas 16H34, e no dia 11, do mês de Maio pelas 09H34, um desconhecido furtou do interior do Super mercado "Modelo", vários artigos, no valor de 592,78 Euros, conforme lista que se junta. Mais informa que pelo visionamento das cassetes vídeo segurança, o indivíduo entrou pela porta principal furtou os objectos em causa, saindo pelo armazém entrando na loja "M........", e saindo a seguir pela porta de serviço, seguindo de seguida para o exterior, desconhecendo para onde o mesmo se possa ter deslocado.

      Mais declara que cede as cassetes vídeo em causa a esta Policia para os fins tidos por convenientes." 7. Tal queixa foi autuada como inquérito penal n° NUIPC 177/04.6PAABT P.A. fls. 95 8. No dia 26 de Maio de 2004 o...

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