Acórdão nº 0104/20.3BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução24 de Março de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - Relatório - 1 – A Directora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira - AT, vem, nos termos do artigo 152º, nº1 do CPTA (Código de Processo dos Tribunais Administrativos) e do nº 2, do art. 25º do RJAT (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária), interpor recurso para este Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral proferida no processo n.º 668/2019-T, por alegada contradição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com o decidido no Acórdão proferido pelo Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste STA no processo nº 087/18.0BALSB, de 28 de novembro de 2018, na parte referente ao direito a juros indemnizatórios, quando a anulação de um acto de liquidação for baseada unicamente em vício formal de falta de fundamentação nos termos do n.º1 do art. 43º da LGT.

Termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: I. A Autoridade Tributária e Aduaneira vem, nos termos do artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos aplicável por força do artigo 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), interpor recurso para esse Supremo Tribunal da Decisão Arbitral proferida no processo nº 668/2019–T pelo Tribunal Arbitral Singular constituído no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD).

  1. A Decisão arbitral recorrida foi proferida na sequência do pedido de pronúncia arbitral deduzido pela ora Recorrida contra o indeferimento da Reclamação Graciosa apresentada da liquidação de Imposto Municipal Sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) no valor de €15.581,64.

  2. Em suma, a Decisão arbitral, decidiu pela procedência da impugnação com a anulação da liquidação por vício de falta de fundamentação, contudo, no que respeita à condenação no pagamento de juros indemnizatórios, considerou haver lugar ao pagamento de juros indemnizatórios, por entender que: “Nos presentes autos, verifica-se que a ilegalidade da liquidação controvertida é imputável à AT”.

  3. Ora, a Decisão arbitral recorrida colide frontalmente com a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Administrativo no Acórdão fundamento, proferido pelo STA no processo nº 087/18.0BALSB, de 28.11.2018, no segmento decisório respeitante à condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios, mais precisamente. na parte referente ao direito a juros indemnizatórios, quando a anulação de um acto de liquidação for baseada unicamente em vício formal de falta de fundamentação nos termos do n.º1 do art. 43º da LGT.

  4. O Acórdão Fundamento, por sua vez, considerou que: “se a anulação de um acto de liquidação for baseada unicamente em vício formal de falta de fundamentação tal não implica a existência de erro de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido, pelo que inexiste, nesse caso, direito a juros indemnizatórios”.

  5. Assim, entre o douto Acórdão fundamento e a Decisão arbitral recorrida, existe oposição susceptível de servir de fundamento ao recurso vertente, uma vez que a questão referente a saber: se são devidos juros indemnizatórios, nos termos do art. 43.º n.º 1 da LGT em virtude da anulação de acto tributário por falta de fundamentação da liquidação, foi decidida diferentemente na Decisão arbitral recorrida e no Acórdão fundamento.

  6. Verifica-se a identidade de situações de facto, porquanto, quer no Acórdão fundamento quer na Decisão recorrida, apreciando as liquidações que foram objecto de impugnação judicial e arbitral, consideraram que estavam inquinadas de vício de falta de fundamentação, tendo concluído pela procedência do vício de falta de fundamentação.

  7. Verifica-se a identidade da questão de direito, uma vez que, quer o Acórdão fundamento quer a decisão arbitral recorrida, analisaram a questão de saber se eram devidos juros indemnizatórios nos termos do n.º 1 do art. 43.º da LGT, na sequência da anulação da liquidação por vício de forma, concretamente por falta de fundamentação das liquidações.

  8. Contudo, o Acórdão fundamento e a Decisão arbitral recorrida decidiram diferentemente quanto à questão de direito enunciada.

  9. Assim, enquanto para a decisão arbitral recorrida foi considerado existir tal direito, já para o Acórdão fundamento, pelo contrário, não existe tal direito porquanto: “O direito a juros indemnizatórios previsto no n.º 1 do art. 43.º da LGT, derivado de anulação de um acto de liquidação, depende de ter ficado demonstrado no processo que esse acto está afectado por erro - sobre os pressupostos de facto ou de direito - imputável aos serviços, de que tenha resultado pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido; se a anulação de um acto de liquidação for baseada unicamente em vício formal de falta de fundamentação tal não implica a existência de erro de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido, pelo que inexiste, nesse caso, direito a juros indemnizatórios.” (Sublinhado nosso.) XI. No caso, o presente recurso para uniformização de jurisprudência, justifica-se pela existência de contradição entre a decisão arbitral recorrida e o Acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito, no sentido de que a mesma situação de facto, da anulação da liquidação, por falta de fundamentação da liquidação, foi entendida e decidida de forma diferente quanto ao direito a juros indemnizatórios, nos termos do n.º 1 do art. 43.º da LGT.

  10. Demonstrada está, assim, uma evidente contradição entre a Decisão recorrida e o Acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito que importa dirimir, mediante a admissão do presente recurso e consequente anulação do segmento decisório contestado, com substituição do mesmo por novo Acórdão que determine a improcedência do pedido de condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do nº 6, do art. 152º do CPTA.

  11. A infracção a que se refere o nº 2, do artigo 152º do CPTA, traduz-se num manifesto erro de julgamento expresso na decisão recorrida, na medida em que a Decisão arbitral viola o disposto no nº 1 do art. 43º da LGT, e decidiu de forma diametralmente oposta à jurisprudência maioritária.

  12. Como tem sido entendido pela Jurisprudência e Doutrina, o regime estabelecido no art. 152.º do CPTA para os recursos para uniformização da jurisprudência destinam-se a obter decisão que fixe a orientação jurisprudencial nos casos em que se verifiquem os seguintes pressupostos: i) existência de decisões contraditórias entre acórdãos do STA ou deste e do TCA ou entre acórdãos do TCA; ii) contraditoriedade decisória “sobre a mesma questão fundamental de direito”; iii) verificação do trânsito em julgado, quer do acórdão recorrido, quer do acórdão fundamento, devendo o recurso se mostrar interposto no prazo de 30 dias contado do trânsito do acórdão recorrido; iv) não conformidade da orientação perfilhada no acórdão impugnado com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA; a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta.

  13. No presente caso, estão preenchidos todos os requisitos de admissibilidade do Recurso, impostos pelo artigo 152º do CPTA, designadamente os que são enunciados no Acórdão do Pleno do STA de 21.04.2016, proferido no processo nº0698/15, quanto à contradição da mesma questão fundamental de direito, que pressupõe “identidade essencial quanto à matéria litigiosa”, conforme o Acórdão do S.T.J. de 02.02.2017, proferido no proc. 4902/14.9T2SNT.LI.SI-A.

  14. Está em causa a aplicação de forma diversa dos mesmos preceitos legais em situações fácticas substancialmente idênticas, não se entendendo estas como total identidade dos factos mas apenas a sua subsunção às mesmas normas legais, na linha do entendimento de Jorge Lopes de Sousa (CPPT anotado, p.809), e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no recurso nº 87156, de 26.04.1995.

  15. Encontra-se, pois, preenchido o condicionalismo previsto nos arts 152.º n.º 1 do CPTA e 27.° n.º 1 al. b) do ETAF.

  16. Por outro lado, o presente conflito de jurisprudência deve ser resolvido de acordo com o deliberado no Acórdão fundamento, dado que a decisão arbitral recorrida, ao ter considerado que são devidos juros indemnizatórios na sequência da anulação de uma liquidação por se ter considerado enfermava de falta de fundamentação fez, salvo o devido respeito, uma incorrecta interpretação e aplicação dos artigos 43.º n.º 1 da LGT, aos factos.

  17. Na verdade, no caso dos autos a liquidação foi anulada em sede arbitral sustentada no vício de falta de fundamentação do acto de liquidação. Ora, em face disso, entendeu a decisão arbitral, que ficava “prejudicado o conhecimento das outras causas de pedir”.

  18. Donde, tendo em conta que na génese da anulação da liquidação está um vício de forma, consubstanciado na falta de fundamentação, e não propriamente um erro de facto ou de direito, tal anulação não comporta a apreciação da legalidade do acto de liquidação.

  19. Assim, a decisão arbitral, não podia decidir que a anulação da liquidação por vício de falta de fundamentação preenchia os requisitos do artigo 43° da LGT, e desse modo condenar a entidade ora Recorrente no pagamento de juros indemnizatórios ao Sujeito Passivo.

  20. Por seu turno, da análise da mesma questão pelo Acórdão fundamento, foi decidido que, inexiste direito a juros indemnizatórios, quando a anulação do acto de liquidação se baseia unicamente em vício formal de falta de fundamentação.

  21. E o douto Acórdão fundamento conclui do seguinte modo: « Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em: -conceder provimento ao recurso e, em consequência, uniformizar jurisprudência com o seguinte sentido: O direito a juros indemnizatórios...

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