Acórdão nº 1226/07.1BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 11 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelISABEL FERNANDES
Data da Resolução11 de Março de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que compõem a 1ª Sub-Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul I – RELATÓRIO C... – Centro Comercial, SA, veio deduzir Impugnação Judicial contra o acto de liquidação de taxa de conservação de esgotos, cobrada pelo Município de Lisboa relativamente ao ano de 2005, bem como o indeferimento da reclamação graciosa apresentada.

O Tribunal Tributário de Lisboa, por decisão de 15 de Abril de 2015, julgou improcedente a impugnação.

Não concordando com a sentença, o C... – Centro Comercial, SA veio interpor recurso da mesma, tendo nas suas alegações, formulado as seguintes conclusões: «1.ª A existência de base legal em abstrato para a criação de taxas pelos municípios não basta para assegurar a legalidade do ato de criação da taxa de conservação de esgotos sendo necessário que este cumpra as respetivas exigências legais.

  1. As normas de liquidação e cobrança da taxa de conservação de esgotos aprovadas a coberto da Deliberação n.º 2/AM/2005, publicadas no Boletim Municipal n.º 570, de 2005/01/20, e a Deliberação que aprovou a TTORM, publicada por Edital n.º Edital n.º 55/2005 não apresentam qualquer fundamentação económico- financeira para a determinação do quantum da taxa criada.

  2. A sentença recorrida enferma de erro de julgamento e de interpretação e aplicação do artigo 116.º do Código do Procedimento Administrativo e dos art.º 4.º e 22.º do DL 207/94 ao decidir que “o argumento da impugnante que considera que a TTORM da CML, não tem qualquer fundamentação tanto jurídica como administrativa que permita o controlo da legalidade do tributo liquidado, o mesmo é improcedente.” pois aqueles dispositivos exigiam que o regulamento tributário apresentasse fundamentação económico-financeira adequada ao seu conteúdo, detalhada na sua nota justificativa, o que não se verificou.

  3. O juízo sobre o equilíbrio das prestações ou do sinalagma tributário só é possível quando se conheçam os custos efetivos ou reais suportados pela entidade administrativa na prestação do serviço, o que no caso em apreço não foi dado a conhecer.

  4. O Tribunal não conhece quais são os encargos da conservação da rede de esgotos porque tal informação foi deliberadamente omitida no ato de criação da taxa em causa, onde deveria constar, por força do disposto no artigo 116.º do CPA e nos artigo 103.º e 266.º da CRP, enquanto garantia dos contribuintes.

  5. Decidir sobre a observação do princípio da proporcionalidade ou da equivalência económica na criação de um tributo sem conhecer o custo real do serviço remunerado representa um cálculo impossível, por falta de um dos termos da equação.

  6. Por força das regras de repartição do ónus da prova, a demonstração dos custos de prestação do serviço caberia à impugnada, a qual, ao desrespeitar o art.º 116.º do CPA, culposamente tornou impossível à impugnante a prova do custo do serviço (cf. art.º 344.º do Cód. Civil).

  7. A sentença recorrida enferma de excesso de pronúncia quando conclui pela equivalência do sinalagma tributário sem conhecer o fundamento económico-financeiro da taxa liquidada que demonstre o custo efetivo do serviço prestado, pois o tribunal pronunciou-se sobre matéria que não lhe foi dada a conhecer: o custo efetivo ou real do serviço prestado, viciando assim a sentença de nulidade, nos termos do art.º 125.º do CPPT.

  8. Ofende o princípio da proporcionalidade, na vertente da necessidade, adequação, e proporcionalidade stricto sensu, a utilização do valor patrimonial do imóvel como critério de liquidação da taxa de conservação de esgotos quando se pode dispor do valor concreto de águas residuais produzidas pelo utilizador-pagador.

  9. A sentença recorrida enferma de erro de julgamento e de interpretação e aplicação do principio da proporcionalidade e dos artigos 4.º e 22.º do DL 297/94, quando decide que “no que respeita ao cálculo do montante do tributo ser baseado no valor patrimonial dos imóveis, importa sublinhar que se trata de uma forma de determinação desse montante que não é desajustada para repartir os encargos da conservação da rede de esgotos pela generalidade dos munícipes, pois tendencialmente os valores patrimoniais mais elevados corresponderão a imóveis de maior dimensão, habitados por maior número de utentes.".

  10. Tal juízo não respeita o princípio da proporcionalidade, na vertente da exigibilidade nem da adequação, pois não existe qualquer necessidade de fazer um juízo de presunção ou conclusivo sobre a utilização do sistema de conservação de esgotos quando tal utilização é suscetível de ser medida diretamente ou em alternativa ser calculada por referência ao consumo real de água abastecido; 12.ª Se o propósito da taxa de conservação de esgotos é remunerar o município pela prestação de um serviço que a lei obriga seja medido, não pode ser julgado como necessário e adequado o critério de determinação daquela taxa que é o valor patrimonial dos imóveis.

  11. É legalmente possível, materialmente desejável e até recomendado pela entidade reguladora que, para efeitos de faturação dos serviços prestado na área do saneamento ou tratamento de esgotos, se proceda à medição do caudal de águas residuais produzidas, pelo que não pode admitir-se que seja indispensável o emprego de um outro critério desfasado desta realidade como seja o valor patrimonial do prédio, para determinar a taxa de conservação de esgotos.

  12. A margem de erro no cálculo da taxa de conservação de esgotos com base no critério do valor patrimonial do imóvel é seguramente maior do que com base nos volumes reais de águas residuais ou de água consumida, efetivamente medidos por instrumentos próprios, pelo que o valor da taxa que daí resultasse não poderia ser mais gravosa do património da impugnante que aquela que lhe foi exigida.

  13. A sentença recorrida enferma de erro de julgamento e de interpretação e aplicação dos art.º 22.º do Decreto-Lei 207/94, o art.º 8.º da Lei Geral Tributária e os art.º 103.º/2, 165.º/1, i) o art.º 266.º da CRP ao julgar “ajustado” que o cálculo do montante do tributo seja baseado no valor patrimonial do imóvel quando tal critério (i) não é indispensável para alcançar o fim proposto, existindo muito melhor alternativa, (i) não é suficientemente adequado à finalidade pretendida, obrigando a presunções de uso desprovidas de suporte de facto e (iii) conduz por fim a valores que dificilmente se podem compreender como sendo a menor lesão possível do património privado na prossecução do interesse público de remuneração do serviço de esgoto, resultado muito mais penalizador do contribuinte do que decorreria dos critérios de medição do caudal de águas residuais ou do consumo de água, indicados pelo legislador e a entidade reguladora.

  14. Mesmo que se entenda tratar-se de uma taxa e não de um imposto, o certo é que a ausência de correlação proporcional entre o montante cobrado e o custo que representa a conservação dos esgotos a cargo do Município, viola os princípios da equivalência, da tutela da confiança, da proporcionalidade, da proibição do excesso e o princípio da justiça, consagrados nos arts. 18.º/2) e 266.º/2 da CRP, enfermando o regulamento e o ato impugnado de ilegalidade por violação dos citados princípios.

  15. A decisão recorrida errou na interpretação e aplicação dos art.º 4.º e art.º 22 do DL 207/94 ao decidir que a taxa de conservação de esgotos não se sobrepõe a outros tributos, sendo hoje reconhecido que tem exatamente a mesma incidência objetiva da componente fixa da tarifa de saneamento que o Município de Lisboa também liquidou à impugnante nos termos do art.º 52.º, n.º 52.1.2 a) da TTORM.

  16. Ao contrário do que entendeu o Tribunal a quo, a liquidação da tarifa de saneamento (fixa e variável) já obriga a entidade gestora à realização das tarefas e à prestação dos serviços que o tribunal entendeu só serem devidos com a liquidação da taxa e conservação de esgotos. Esta taxa resulta, assim, numa segunda remuneração de um serviço já retribuído pela componente fixa da tarifa de saneamento, conforme esclarecido pela entidade reguladora na “Recomendação tarifária” n.º 1/2009, provocando assim uma duplicação de coleta.

  17. A Assembleia Municipal de Lisboa por Deliberação n.º 345/AML/2014, publicada no Boletim Municipal n.º 1088, 2.º suplemento, determinou o “fim da Taxa de Conservação de Esgotos” por ser “imperativa a conformação da prática do município de Lisboa nos domínios das Águas Residuais e dos Resíduos Urbanos com as orientações regulamentares e legislativas aplicáveis às tarifas”.

  18. A decisão recorrida enferma de erro de julgamento e de apreciação da norma ínsita no art.º 22.º do DL n.º 207/94, e das normas que atribuem competências tributárias aos municípios (art.º 13.º da Lei 159/99; os art.º 4.º/1, 16.º, d), 19.º, l) e 20.º da Lei 42/98) pois tais competências são exercidas nos termos da lei e dentro dos seus limites e manifestamente a criação de uma taxa de conservação de esgotos sobre a mesma área de serviço da componente fixa da taxa de saneamento exorbitou os limites legais.

NESTES TERMOS, Devem os erros de julgamento e de apreciação e aplicação das normas relevantes e a nulidade imputada à sentença recorrida ser julgados provadas e procedentes, dando- se provimento ao presente recurso.» * A recorrida, devidamente notificada para o efeito, ofereceu as suas contra-alegações, tendo formulado as conclusões seguintes: «1. A Recorrente declara pretender a alteração da matéria de facto, que delimitou a forma do presente Recurso, deduzido ao abrigo do n.° 1, do art. 280.°, do CPPT, norma que determina a competência deste douto TCA para a apreciação dos recursos que incidam sobre matéria de facto; 2. Nessa medida, cabe à Recorrente delimitar o objeto do recurso, em ordem a permitir a esse douto Tribunal apreender as razões da sua discordância e, bem assim, de que forma pretende ver alterado o elenco de factos, necessariamente por referência à prova produzida nos autos; 3. A Recorrente não cumpriu tal ónus processual...

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