Acórdão nº 255/10.2BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 11 de Março de 2021
Magistrado Responsável | ISABEL FERNANDES |
Data da Resolução | 11 de Março de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam, em conferência, os juízes que compõem a 1ª Sub-Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul I – Relatório F... LIMITED, veio deduzir impugnação na sequência do indeferimento das reclamações graciosas, versando sobre as liquidações de IRC n° 2002.8... do ano de 1997 e n° 2002.83... do ano de 1998, no montante total de € 1.677.223,91.
O Tribunal Tributário de Lisboa, por decisão de 30 de Maio de 2013, julgou parcialmente procedente a impugnação judicial.
Não concordando com a sentença, a Fazenda Pública veio interpor recurso da mesma, tendo nas suas alegações, formulado as seguintes conclusões: «4.1 - O presente recurso, visa reagir contra a decisão proferida pelo Tribunal a quo, julgando parcialmente procedente a impugnação deduzida, e em consequência, condenar a Fazenda Publica a proceder à correcção das liquidações em causa, substituindo-as por outras que tenham por base a matéria colectável resultante das declarações apresentadas pela impugnante relativamente aos anos de 1997 e 1998, respectivamente, nos montantes de €39.401,99 e de €46.366,91.
4.2 - Após se ter aferido da legalidade das liquidações oficiosas por estas terem sido emitidas dentro do período de caducidade de liquidação do imposto, 4.3 - Definiu, a M. Juiz do Tribunal a quo, como questão fundamental, a relevância das declarações de rendimentos entregues pela impugnante, ora recorrida, após a emissão das liquidações oficiosas.
4.4 - Foi entendimento deste tribunal que, as liquidações oficiosas assumem um carácter provisório face às declarações entretanto apresentadas pela recorrida, atendendo ao principio da declaração, de acordo com o qual os dados declarados pelo contribuinte se presumem verdadeiros.
4.5 - Discorda com este entendimento a AT, aliás na senda da jurisprudência enumerada supra, uma vez que um contribuinte relapso não pode estar na mesma situação do contribuinte cumpridor. O contribuinte relapso há-de ver a sua situação fiscal definida e pautada por regras e procedimentos legais que incumbem à AT.
4.6 - Assim, e de acordo com o disposto no art. 59° do CPPT, após a liquidação oficiosa com valores diferentes das declarações apresentadas, fora de prazo, pelos sujeitos passivos, é a ele que cabe o ónus da prova.
4.7 - A simples apresentação tardia de uma declaração de rendimentos da qual vem a resultar inexistência de imposto ou imposto diverso do anteriormente liquidado não anula automaticamente a anterior liquidação. É que, a ser assim, bastaria um contribuinte não apresentar a sua declaração de rendimentos em tempo; depois apresentava uma declaração de rendimentos em que não declarasse rendimentos e a liquidação oficiosa ficaria pura e simplesmente anulada. Ora, não é esse o sentido da lei.
4.8 - Do exposto, resulta que não andou bem o Tribunal a quo neste âmbito, ao proferir a sua decisão baseada na errada interpretação dos factos, violando o direito aplicável, no caso o art. 83° do CIRC (na redacção à data dos factos), o art. 75°, n° 1 da LGT e art. 59, n° 2 do CPPT.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a impugnação improcedente, quanto à matéria aqui discutida.
PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA» * A recorrida, nas suas contra-alegações, formulou as conclusões seguintes: «I. A Administração Tributária fez à Impugnante, ao abrigo do disposto no art 83, 1 b) CIRC, na redacção à altura vigente, liquidações oficiosas de IRC relativamente aos exercícios de 1997 e 1998, por falta de entrega atempada das declarações anuais de rendimentos (modelo 22); II. As declarações anuais de rendimentos relativas aos exercícios de 1997 e 1998 foram posteriormente apresentadas pela impugnante, dentro do prazo de caducidade do direito à liquidação de impostos; III. A impugnante reclamou e impugnou as referidas liquidações oficiosas, que considerou intempestivas e ilegais por violação dos art 83 1 b) e 59 CPPT; IV. As liquidações oficiosas efectuadas ao abrigo do artº 83º, 1 b) têm carácter provisório (artº 83, 10 CIRC) podendo ser corrigidas dentro do prazo de caducidade do direito à liquidação (artº 79°, 10 CIRC, actualmente artº 101º CIRC), designadamente se o contribuinte apresentar posteriormente as declarações omitidas antes do decurso de tal prazo e a AT aceitar os rendimentos aí declarados.
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As declarações de rendimentos dos sujeitos passivos, apresentadas nos termos dos nºs 1 e 2 do artº 59º CPPT, gozam de presunção de veracidade, nos termos do artº 75º, 1 LGT; VI. A falta de tempestividade da apresentação da declaração de rendimentos não prejudica o seu valor probatório, já que a lei não inclui o cumprimento do prazo de apresentação como condição desse valor probatório.
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Assim, face ao principio da declaração vertido nas disposições legais citadas, a impugnante não tinha de justificar ou comprovar os valores constantes das declarações de rendimentos por si apresentadas, relativas ao exercido de 1997 e 1998; VIII. Era sobre a AT que recaía, nos termos do n.º 1 do artº 74º LGT, o ónus de provar que se verificava, no caso, qualquer das situações descritas no artº 75º, 2 LGT, as quais determinariam a cessação dessa presunção de veracidade passando então a recair sobre a impugnante o ónus de prova; IX. Contudo, a AT, podendo fazê-lo, não questionou as declarações de rendimentos entregues pela impugnante, não efectuou qualquer controle, fiscalização ou acção de inspecção, pelo que as aceitou como isentas de vício ou irregularidade, como verdadeiras.
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Não colhe a posição defendida pela FP quanto à verificação, no caso dos autos, de inversão de ónus da prova por ter havido liquidações oficiosas, passando a caber à impugnante a obrigação de provar os valores inseridos nas suas declarações de rendimentos, por não ter tal posição qualquer base legal - cf. artº 74,1 LGT - que, aliás, a FP não invoca.
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A jurisprudência citada pela FP estabelece que a mera apresentação de uma declaração de rendimentos posterior à liquidação oficiosa não anula unilateral e automaticamente a liquidação oficiosa, nada dizendo porém, sobre qualquer inversão do ónus da prova.
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Não tendo a AT questionado as declarações de rendimentos apresentadas pela impugnante, aceitou-as como reflectindo a situação tributária real da impugnante.
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Face ao princípio da tributação pelo lucro real (artº 104, 2 CRP), o imposto devido pela impugnante relativamente aos exercícios de 1997 e 1998 deve ser pois calculado com base nas declarações de rendimentos por si apresentadas e aceites pela AT.
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A douta sentença recorrida — e bem - não anulou as liquidações oficiosas feitas pela AT, mas condenou a AT a proceder à sua correcção, ao abrigo do art. 83, 10 CIRC, face às declarações de rendimentos apresentadas pela impugnante, pelo que deve ser mantida.
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A admitir-se, porém, sem conceder e por mera hipótese de raciocínio, que viesse a ser revogada a sentença recorrida, tal não implicará que prevaleçam as teses defendidas pela FP quanto à questão da determinação do exercício mais próximo e da intempestividade da liquidação, sobre as quais o Tribunal a quo se não pronunciou, por estar prejudicada a sua apreciação pela decisão contida na sentença recorrida, impondo-se, nesse caso, ou que fosse emitida decisão pelo Tribunal ad quem, por constarem do processo todos os elementos que permitem que sobre elas se decida, ou que o processo baixasse à 1ª instância, caso fosse necessário ampliar a matéria de facto e/ou proferir decisão.
Nestes termos, Deve ser negado provimento ao presente recurso, confirmando-se a decisão recorrida, assim se fazendo JUSTIÇA» * A Exma. Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo, devidamente notificada para o efeito, ofereceu aos autos o seu parecer no...
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