Acórdão nº 1762/14.3BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 11 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelJORGE CORTÊS
Data da Resolução11 de Março de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão I- Relatório R..........., melhor identificado nos autos, executado por reversão, na qualidade de responsável subsidiário, no PEF n.º .......... instaurado, pelo Serviço de Finanças de Loures 4, originariamente contra a sociedade «D........., Lda.» por dívidas de IRS do período de tributação de 2008, no valor global de €289.136,98, deduziu oposição à execução fiscal. O Tribunal Tributário de Lisboa, por sentença proferida a fls. 3108 e ss. (numeração do SITAF) datada de 8/01/2020, julgou a oposição procedente e, em consequência, determinou a extinção do PEF n.º .......... quanto ao Oponente. A Fazenda Pública interpôs recurso jurisdicional contra a sentença, conforme requerimento de fls. 3151 e ss. (numeração do SITAF). Alega nos termos seguintes: « (…) // 4.2. Como fundamentos da oposição invocou o oponente no seu petitório inicial, em suma: a) Apesar de ter feito parte da estrutura da gerência da sociedade executada originária, não geria a mesma, tendo esta função sido exercida sempre pelo seu pai F.........; b) Que entre 2007 e 2011 assinou três cheques bancários e uma folha de vencimentos, por conta e em representação da sociedade executada originária, pelo facto do gerente desta se encontrar em Alcanena no desenvolvimento da gestão interna do grupo de sociedades a que pertencia a executada originária e numa consulta médica no hospital, tendo autorização no banco para assinar cheques, de modo a que a sociedade executada pudesse assumir as responsabilidades a que estava sujeita; c) Que a decisão de reversão não refere os actos praticados pelo oponente que sejam susceptíveis de revestir uma actuação culposa determinante da insuficiência patrimonial da sociedade devedora originária, não tendo a Fazenda Pública logrado demonstrar a sua culpa, conforme o exige a alínea a) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT.

Concluiu o seu articulado inicial peticionando a procedência da oposição, com a consequente extinção da execução fiscal contra si.

4.3. O Ilustre Tribunal “a quo” julgou a procedente a presente oposição, considerando, para o efeito e em suma, que a Administração Tributária não conseguiu demonstrar que foi por culpa do oponente que o património da sociedade executada originária se tornou insuficiente para prover o pronto pagamento da dívida tributária em execução.

No entanto, 4.4.é entendimento da Fazenda Pública que a decisão ora recorrida, não perfilhou, com o devido respeito, e salvo sempre melhor entendimento, a acertada solução jurídica no caso sub judice. Isto porque, 4.5. considerou o Ilustre Tribunal a quo, na decisão ora recorrida que: // No que se refere à culpa do Oponente na insuficiência do património da sociedade devedora originária para o pagamento da dívida exequenda, verifica-se que o relatório de inspeção tributária, no qual se baseou a decisão de reversão aqui em causa, não refere que actos em concreto foram praticados pelo Oponente e que determinaram a insuficiência do património da sociedade devedora originária.”.

4.6. Concluiu o Ilustre Tribunal a quo, na sentença ora em crise, que “Assim, face ao que antecede, impõe-se concluir que o Oponente praticou actos de gestão em concreto da sociedade devedora originária no ano em causa, mas a Fazenda Pública não logrou provar que foi por culpa sua que o património societário se tornou [in]suficiente para o pagamento da dívida exequenda.” No entanto, 4.7. entende a Fazenda Pública que do relatório inspectivo em questão constam inúmeros factos e circunstâncias, que interpretadas de acordo com as regras de experiência comum e de normalidade de vida, inelutavelmente conduzem à conclusão que o oponente, enquanto gerente de facto da sociedade executada, adoptou, conscientemente, um comportamento que levou a que esta ficasse descapitalizada e, assim, impossibilitada de cumprir com as suas obrigações tributárias.

Senão vejamos, 4.8. Conforme consta do ponto 10. da matéria de facto tida por assente na sentença ora recorrida, ficou provado que, conforme consta do relatório de inspecção, da “conta de depósitos à ordem titulada pelo sócio R..........., identificada no ponto II.11.2. No extrato bancário desta conta são identificadas duas transferências provenientes da conta n.º ......... identificada no ponto 7) do quadro 7), nos montantes de €30.000,00 e €5.000,00. Anexo 28 (...).”.

4.9. Tal movimentação bancária das quantias pecuniárias em questão, tituladas pela sociedade executada, per si, representam uma descapitalização desta. Assim, tendo em conta a referida factualidade tida por assente, conclui-se que o oponente, ora recorrido, e enquanto gerente da sociedade executada, deveria ter encetado diligências no sentido de aferir as razões pelas quais foram efectados, sem aparente motivo, as transacções bancárias de quantias pecuniárias tituladas pela sociedade executada para a sua conta bancária pessoal.

4.11. No entanto, não resulta da factualidade tida que assente que o oponente, ora recorrido, tenha encetado qualquer diligência no sentido supra exposto.

4.10. No entendimento da Fazenda Pública, nesta circunstância (omissão) reside a culpa do oponente, ora recorrido, pois um gerente medianamente atento, sagaz e zeloso dos interesses da pessoa colectiva que representa.

4.11. Assim, entende a Fazenda Pública que, nesta circunstância e com o seu comportamento omissivo, o oponente agiu com culpa pela diminuição patrimonial da sociedade executada originária.

4.12. Existem inúmeros factos e circunstâncias, contantes do ponto III do relatório de inspecção em questão, que inegavelmente demonstram a actuação (quer por acção quer por omissão) do oponente, ora recorrido, que traduzem a culpa deste pela insuficiência patrimonial da executada originária.

4.13. Factos e circunstâncias essas que, na opinião da Fazenda Pública, e s.m.o., não foram devidamente consideradas pelo Ilustre Tribunal recorrida no decisório ora em crise, factos e circunstâncias essas demonstrativas da culpa do oponente, ora recorrido, pela insuficiência patrimonial da executada originária para prover ao pronto pagamento da dívida fiscal de IRS em questão.

4.14. Ao não considerar, na sentença ora em crise, tais factos e circunstâncias, o Ilustre Tribunal recorrido, no modesto entendimento da Fazenda Pública, sempre com o devido respeito e salvo melhor entendimento, incorreu em erro de julgamento, no respeitante à apreciação e valoração da prova, violando, assim, o disposto nos n.º 4 e 5 do artigo 607.º do CPC, ora aplicável por força do disposto na al. e) do artigo 2.º do CPPT.

Razão pela qual, // 4.15. com o devido respeito e salvo sempre melhor entendimento, deve ser revogada a decisão ora recorrida, com as legais consequências daí decorrentes.

Pelo que se peticiona o provimento do presente recurso, revogando-se a decisão ora recorrida, …» X O recorrido nos autos apresentou contra-alegações ao recurso interposto, conforme segue: «1) A decisão posta em crise pela Fazenda Pública não enferma de qualquer vício nem é objecto de qualquer imprecisão; 2) É absolutamente falso - sendo até calunioso - dizer-se que o recorrente afirmou ter feito parte da estrutura da gerência da sociedade executada originária, como Fazenda Pública afirma; 3) Não tendo o recorrente agido em representação da sociedade, como defende na p.i., não se vislumbra como poderia o mesmo ser responsabilizado na relação jurídica estabelecida entre a sociedade “D........., Lda” e o fisco; 4) O Tribunal a quo assentou a sua convicção na apreciação crítica dos depoimentos das testemunhas inquiridas em audiência e nos elementos documentais juntos aos autos; 5) O Tribunal a quo julgou o caso fazendo uma valoração crítica e racional, fundada nas regras da experiência, mas também nas da lógica e da ciência; 6) O representante da Fazenda Pública confunde a errada apreciação da prova, com a diferente valoração dessa mesma prova.

7) A culpa pela insuficiência patrimonial é um requisito que tem de ser verificado e provado em juízo pela Fazenda Pública, o que manifestamente não ocorreu.

Nestes termos deve a douta decisão do Tribunal a quo ser mantida, devendo considera- se improcedente o recurso,…».

X O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal, foi regularmente notificado e pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.

X Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.

X II- Fundamentação.

A sentença recorrida deu como provada a matéria de facto seguinte: «1. Em 30/10/1997 foi celebrado o «Contrato de Sociedade» da «D........., Lda.» com o seguinte teor: «PRIMEIRO: F......... (...) e L......... (...) SEGUNDO: Dra I......... (...) outorga na qualidade de procuradora e em representação da sociedade ”I........., S.A.” (...) Disseram: que pela presente escritura constituem entre o primeiro outorgante e a representada da segunda outorgante uma sociedade comercial por quotas com a firma "D........., Limitada" (...) ARTIGO OITAVO - Um - A gerência da Sociedade e a sua representação, em juízo ou fora dele, activa e passivamente, incumbem a um ou mais gerentes eleitos por períodos não superiores a quatro anos (...). Dois - Aos gerentes são conferidos poderes necessários para assegurar a gestão corrente dos negócios da Sociedade e, em especial, para: (...); b) Abrir e movimentar contas bancárias; c) Aceitar, sacar e endossar letras, livranças e outros efeitos comerciais;(...). ARTIGO DÉCIMO PRIMEIRO (...) Fica, desde já, nomeado gerente, para o quadriénio de mil novecentos e noventa e sete/dois mil, o Senhor F.........» - cf. contrato e documento complementar, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, a fls. 542 a 544 dos autos; 2. F......... foi designado gerente da sociedade «D........., Lda.» para o quadriénio 2005/2008 e esta obrigava-se com a assinatura de qualquer um dos gerentes - cf. certidão permanente do registo comercial a fls. 98 a 109 da cópia do processo de execução fiscal apensa aos autos; 3. Em 21/05/2008, o Oponente assinou o cheque n.º ........ emitido pela...

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