Acórdão nº 0617/14.6BEALM de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução10 de Março de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – Relatório Vem interposto recurso jurisdicional por INSTITUTO DO CINEMA E DO AUDIOVISUAL, I.P.

, sinalizado nos autos, visando a revogação da sentença de 29-11-2018, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou totalmente procedente a impugnação judicial intentada pela A…………, S.A.

, também melhor identificada nos autos, na qual peticionava a anulação do despacho de indeferimento de reclamação graciosa deduzida contra a autoliquidação de Taxa de Subscrição devida por operadores de serviços de televisão por subscrição.

Inconformada, nas suas alegações, formulou o recorrente INSTITUTO DO CINEMA E DO AUDIOVISUAL, I.P.

as seguintes conclusões: “A. O presente recurso vem interposto contra a Douta Sentença proferida no âmbito do processo de impugnação judicial n.º 617/14.6BEALM, que correu termos no Tribunal' Administrativo e Fiscal de Almada, Unidade Orgânica 2; B. No âmbito da referida impugnação judicial, veio a Recorrida impugnar a autoliquidação do tributo previsto no n.º 2 do art.º 10.º da lei 55/2012, de 6 de Setembro, o qual, incide sobre os operadores de serviços de televisão por subscrição, referente ao acesso a serviços de programas televisivos, no território nacional, categoria na qual se insere a Recorrida; C. Em estreita síntese, a Recorrida imputou ao tributo previsto no n.º 2 do art.s 10.º da Lei 55/2012, objecto de autoliquidação, as seguintes ilegalidades: i. Violação de princípios constitucionais materiais: universalidade, igualdade, tributação do rendimento real e justiça tributária; ii. Violação de princípios constitucionais formais e orgânicos: reserva de lei na criação de impostos e legalidade fiscal; iii. Violação de princípios constitucionais da irretroactividade da lei fiscal, da segurança jurídica e da tutela de confiança; iv. Violação do princípio supralegal da proibição da consignação de receitas fiscais; v. Violação dos princípios constitucionais relativos à configuração das taxas e contribuições financeiras; princípio da equivalência e princípio da proporcionalidade; vi. Violação do Direito Europeu: violação da livre prestação de serviços e violação. das normas relativas a auxílios de Estado; e, vii. Violação da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

D. A Douta Sentença recorrida limitou a sua análise à alegada desconformidade ao Direito Europeu do tributo previso no art.º 10.º, n.º 2 da Lei 55/2012, designadamente atenta a finalidade do mesmo, concluindo no sentido de que, uma vez que as receitas geradas com a cobrança do tributo em questão "visam apenas financiar a promoção e divulgação de obras cinematográficas portuguesas", o tributo é "nessa medida, claramente discriminatório, violando de forma clara o disposto no art. 56º do TFUE"; E. Com efeito, entendeu a Douta Sentença recorrida que, alegadamente "a afectação da receita proveniente da Taxa de subscrição embaratece a produção nacional em comparação com a produção estrangeira pelo que gera uma discriminação indirecta da prestação transfronteiriça destes serviços no confronto com a respectiva prestação interna"; F. Sucede que, não pode a ora Recorrente deixar de expressar a sua veemente discordância relativamente à decisão vertida na Douta Sentença ora recorrida, uma vez que o tributo previsto no art.s 10.º, n.º 2 da Lei 55/2012 é conforme ao Direito Europeu, inexistindo uma qualquer violação do disposto no art.º 56.º do TFUE; G. Como questão prévia, e na medida em que está em causa a alegada desconformidade, do tributo previsto no art.s 10.º, n.º 2 da Lei 55/2012 com o Direito da União Europeia, em concreto com o art.s 56.º do TFUE, pelo que a interpretação da legislação nacional face a este art.s 56.º do TFUE condiciona a solução do litígio sub judice, resulta indispensável e obrigatório, caso este Venerando Tribunal tenha dúvidas ou entenda existirem elementos transfronteiriços que justifiquem a aplicação do Direito da União, Europeia, que seja proferido despacho de reenvio para o TJUE com as questões, prejudiciais que importa esclarecer antes de ser proferido o respectivo Acórdão sobre o caso sub judice; H. A Recorrente sugere que as seguintes questões prejudiciais, nesta ou noutra formulação que venha a ser decidida com base nos princípios da boa-fé e cooperação processual (artigos 7.º e 8.º do Código do Processo Civil), sejam colocadas ao TJUE, nos termos do art.s 267.º do TFUE, suspendendo-se a instância de modo a que este Venerando, Tribunal possa decidir a questão da conformidade do tributo previsto no art.s 10.º, n.º 2 da Lei 55/2012 com o art.s 56.º do TFUE: i. No caso concreto, existem elementos transfronteiriços que legitimem o direito da Recorrida, face às actividades por si desenvolvidas, de invocar as disposições do TFUE em matéria de livre prestação de serviços de forma a sustentar a ilegalidade do tributo previsto no art.º 10.º, n.º 2 da Lei 55/2012? ii. Em caso afirmativo, poderá o tributo cuja autoliquidação é impugnada, por si próprio, ser considerado como desconforme ao Direito da União Europeia ou, na verdade, importa analisar a eventual desconformidade ao Direito da União Europeia em virtude da afectação, da receita gerada com o tributo, ao fomento, desenvolvimento e protecção da arte do cinema e das actividades, cinematográficas e audiovisuais, introduzido pela Lei 55/2012? iii. Em caso afirmativo, pode o tributo previsto no art.s 10.º, n.º 2 da Lei 55/2012 ser interpretado, em virtude da sua afectação, no sentido de que tem por efeito favorecer a aquisição de obras cinematográficas e audiovisuais nacionais no confronto com as obras europeias, gerando uma discriminação indirecta da prestação de serviços entre Estado-Membros no confronto com a respectiva prestação interna e tornando a prestação de serviços entre Estados-Membros mais difícil do que a prestação de serviços puramente interna a um Estado-Membro, violando o disposto no art.º 56.º do TFUE? iv. Não deverá ponderar-se, tendo por finalidade o juízo sobre se o tributo em questão embaratece a produção nacional em comparação com a produção europeia, ou sobre a eventual discriminação indirecta da prestação transfronteiriça destes serviços no confronto com a respectiva prestação interna daí decorrente, a existência de regimes idênticos ou similares ao previsto na Lei 55/2012 noutros Estados-Membros da União Europeia? v. Por fim, o tributo previsto no artº 10.º, n.º 2 da Lei 55/2012 consiste numa medida que integra um auxílio estatal? vi. Em caso afirmativo, e face às normas da União Europeia em matéria de ajudas de Estado à produção e outras actividades cinematográficas e audiovisuais, nomeadamente ao abrigo do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de Junho de 2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do TFUE, o tributo em questão viola o disposto no art.s 56.º do TFUE? I. Não obstante, e sem prejuízo das questões prejudiciais a colocar ao TJUE, entende a Recorrente que a Douta Sentença agora recorrida deve ser objecto de revogação na medida em que o vício de violação do Direito Europeu deveria ter sido julgado improcedente; J. Desde logo, o tributo cuja autoliquidação vem impugnada nos autos incide exclusivamente sobre o acesso a serviços de programas televisivos, prestados em território nacional, devendo ser suportado por todos os operadores de serviços de televisão por subscrição, que prestem serviços em território nacional, na definição dada pelo art.s 2.º, alínea p) da Lei 55/2012, inexistindo qualquer carácter transfronteiriço subjacente a estas prestações de serviços, pelo que não há, assim, o direito da Recorrida de invocar as disposições do TFUE em matéria de livre prestação de serviços para se opor à legislação em causa; K. Na medida em que todos elementos da actividade de prestação de serviços de televisão por subscrição se circunscrevem ao território nacional, não é aplicável o disposto no art.º 56.º do TFUE; L. Note-se que, o direito à livre prestação de serviços pode ser invocado por uma empresa' relativamente ao Estado em que está estabelecida ou ao Estado em que está estabelecido o destinatário, quando os serviços são prestados a destinatários, estabelecidos num outro Estado-Membro (Acórdãos do TJCE de 17 de Maio de 1994, Corsica Ferries, C-18/93, Colect., p. I·1783, n.º 30; de 14 de Julho de 1994, Peralta, C-379/92, Colect., p. I-3453, n.º 40, e de 10 de Maio de 1995, Alpine Investments, C-384/93, Colect., p. I-1141, n.º 30); M. Ora, a Douta Sentença recorrida não considera, em algum momento, que decorre da afectação do tributo previsto no art.s 10, n.º 2 da Lei 55/2012 uma qualquer discriminação indirecta susceptível de penalizar a Recorrida; N. Por este motivo, a Douta Sentença recorrida violou o disposto no art.s 10, n.º 2 da Lei 55/2012, bem como o art.s 56.º do TFUE, na medida em que as normas em questão deveriam ter sido interpretadas no sentido de que inexiste qualquer elemento transfronteiriço que legitime a aplicação ao caso sub judice do disposto no art.s 56.º do TFUE; O. Contudo, considerou a Douta Sentença recorrida que o tributo cuja autoliquidação vem impugnada nos autos consubstancia uma restrição à livre prestação dos serviços, não por parte da Recorrida, mas sim por parte dos prestadores de serviços relacionados com a produção cinematográfica e audiovisual estrangeira, e que, por esse motivo, o tributo em questão viola o disposto no art.º 56.º do TFUE; P. No entanto, caso se entenda que a Recorrida poderá, legitimamente, invocar a ilegalidade do tributo em questão por violação do disposto no art.s 56.º do TFUE em virtude de uma alegada discriminação indirecta de prestações de serviços realizadas por outras entidades que não são partes no litígio, entende que a Recorrente que, também desta perspectiva, não resulta demonstrada nos autos qualquer restrição à livre prestação destes serviços, real ou...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT