Acórdão nº 0103/20.5BEPDL de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução10 de Março de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1.– Relatório Vem interposto recurso jurisdicional pela Autoridade Tributária e Aduaneira, visando a revogação da sentença de 15-12-2020, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada, que julgou procedente a reclamação judicial intentada pelo A………., melhor identificado nos autos, e anulou o despacho do Chefe da Divisão de Tributação e Justiça Tributária da Direção de Finanças de Ponta Delgada de 31 de agosto de 2020, que indeferira o pedido de anulação da penhora do prédio inscrito sob o artigo ….. da matriz predial rústica da freguesia de …….. (……), município de Ponta Delgada, no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) n.º 29922010 01004387 do Serviço de Finanças de Ponta Delgada.

Inconformada, nas suas alegações, formulou a recorrente Autoridade Tributária e Aduaneira as seguintes conclusões: “

  1. O Tribunal a quo, ao determinar a aplicação nos autos do artigo 183.º-B do CPPT, salvo o devido respeito, incorreu em erro na interpretação e aplicação do direito, devendo antes ter atendido ao facto de o ordenamento jurídico-tributário estar construído no sentido de a penhora apenas ser de levantar com o trânsito em julgado da sentença, coisa que não ocorreu ainda, por o processo de impugnação judicial n.º 134/17.2BEPDL se encontrar na fase de recurso, tendo ambas as partes (AT e responsável subsidiário) interposto os competentes recursos; B) Em primeiro lugar, estabelece o n.º 1 do artigo 183.º-B do CPPT que «se na ação de impugnação judicial ou de oposição o garantido obtiver decisão integralmente favorável em 1.ª instância» (sublinhado nosso), poderá haver caducidade da garantia, facto que não se verifica, uma vez que houve interposição de recurso por parte da Fazenda Pública e, igualmente, por parte do impugnante (responsável subsidiário), o que implica a necessidade de existir discordância deste no ganho de causa que obteve para fundamentar o seu recurso, significando isto que decisão de 1.ª instância não lhe é integralmente favorável; C) Apenas por esta situação já não seria aplicável o artigo 183.º-B do CPPT, pelo que a penhora não poderia ser levantada, por não ter operado a caducidade desta; D) Por outro lado, entende a Fazenda Pública que, anteriormente à entrada em vigor do artigo 183.º-B, já o legislador distinguia entre as garantias que poderiam caducar, e a penhora, que apenas poderia ser levantada, não caducando; E) E era assim porque o n.º 1 do artigo 183.º-A determinava que «1 - A garantia prestada para suspender a execução em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição caduca se a reclamação graciosa não estiver decidida no prazo de um ano a contar da data da sua interposição ou se na impugnação judicial ou na oposição não tiver sido proferida decisão em 1.ª instância no prazo de três anos a contar da data da sua apresentação», enquanto o n,º 1 do artigo 235.º do CPPT estabelecia que «A penhora pode ser levantada verificados os pressupostos previstos no artigo 183.º-A, aplicando-se os termos aí estatuídos, com as necessárias adaptações» (sublinhado nosso); F) Constata-se imediatamente que o artigo 183.º-A era devotado à caducidade da garantia, mas que a penhora não era considerada nessas garantias que poderiam caducar, tendo um preceito que lhe era exclusivamente dedicado, o artigo 235.º, pretendendo o legislador incutir na Administração Tributária uma tramitação célere do processo, daí sendo consideradas todas as garantias, com exceção da penhora, que apenas poderia ser levantada nos termos do artigo 235.º do CPPT; G) Com a revogação do artigo 235.º do CPPT pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, ficou afastada a penhora do regime de caducidade de garantia em vigor, H) A penhora é um ato da Administração Tributária que visa a satisfação da dívida exequenda e que, apesar de valer como garantia do pagamento da dívida, conforme estabelece o n.º 4 do artigo 199.º do CPPT, consiste numa apreensão de bens judicialmente ordenada, mesmo contra a vontade do titular do direito sobre os bens, enquanto que a caducidade prevista no artigo 183.º-B do CPPT, tem em vista a não penalização do contribuinte com os custos de uma garantia prestada voluntariamente; I) Transitou-se de um regime de caducidade da garantia e de levantamento da penhora – desde que verificados os respetivos pressupostos legais – para um sistema que prevê, exclusivamente, a caducidade da garantia prestada, pois quando o legislador recorre à expressão constante do n.º 1 do artigo 183.º-B do CPPT, de «garantia prestada para suspender o processo de execução fiscal», não pode esta abranger as medidas coercivas desenvolvidas pela AT em momento anterior à intenção de o executado recorrer à via contenciosa, e que não tinham como objetivo suspender o Processo de Execução Fiscal (PEF), mas sim garantir o crédito tributário através de posterior satisfação da dívida; J) Não se olvide que a formulação do n.º 1 do artigo 183.º-B do CPPT, quando refere que «A garantia prestada para suspender o processo de execução fiscal caduca», está a referir-se exatamente à garantia prestada voluntariamente com o intuito de suspender o processo de execução fiscal, e não à garantia constituída coercivamente para garantir o pagamento da dívida em execução; K) Na tramitação do PEF, o órgão de execução fiscal constitui, com uma medida coerciva, uma garantia de que o seu crédito irá ser pago, pelo que, posteriormente, se o executado colocar em crise a dívida, irá aproveitar, nos termos do n.º 4 do artigo 199.º, o facto de a AT já ter forma de assegurar o seu crédito; L) Existe, efetivamente, uma diferença de natureza nestas duas garantias: a garantia constituída coercivamente pela AT com a penhora destina-se à efetiva cobrança do crédito, enquanto que a garantia prestada pelo executado é feita voluntariamente «para suspender o processo de execução fiscal»; M) Com uma decisão de primeira instância integralmente favorável ao executado, entendeu o legislador devolver ao executado aquilo que tinha disponibilizado voluntariamente, sem, no entanto, abranger os bens objeto de medida coerciva, ou seja, a garantia já existente no processo e que precedeu qualquer contencioso por parte do executado; N) Com a interposição do recurso, o processo executivo não é extinto, pois a decisão de 1.ª instância não é definitiva, não tendo, igualmente, havido extinção da dívida, pelo que o credor tributário é colocado na posição que assumia antes do início do contencioso; O) Se a decisão da instância de recurso for favorável à AT, não se afigura plausível que o legislador tenha querido que a Administração Fiscal fique sem qualquer forma de cobrança, se se aplicasse a interpretação que se encontra a ser imprimida ao n.º 1 do artigo 183.º-B do CPPT.

Nestes termos, e nos mais de Direito que V. Exas., Colendos Conselheiros, doutamente suprirão, deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença proferida pelo Tribunal a quo, sendo substituída por outra que determine a manutenção da penhora no âmbito dos processos executivos em causa e a condenação em custas do ora recorrido, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!” O recorrido A…………… veio apresentar contra-alegações, que concluiu nos seguintes termos: “

  1. Conforme se demonstrará, a sentença em crise não merece qualquer reparo ou censura, tendo feito escorreita e inatacável interpretação e aplicação do Direito no caso concreto.

  2. Por outro lado, ainda, é indubitável que o presente recurso versa exclusivamente sobre matéria de Direito, razão pela qual se deverá ter a factualidade assente pela 1 ª Instância como incontrovertida e plena, posto que a própria Fazenda Pública não a questiona minimamente, antes a aceitando.

  3. Na verdade, mais parece que a Fazenda Pública litiga contra norma expressa e meridiana, desobrigando-se outrossim ao sucessivo acatamento de decisões jurisdicionais revogatórias das suas prévias decisões administrativas em matéria tributária e atos de liquidação, mas sem esgrimir verdadeira e fundamentante posição digna de tutela jurídica.

  4. Com efeito, a douta sentença de 15.12.2020 entendeu, e bem, julgar totalmente procedente a presente reclamação judicial porquanto o despacho do Chefe de Divisão de Tributação e Justiça Tributária da D.F. de Ponta Delgada, datado de 31.08.2020 foi proferido em manifesta violação de lei, ao denegar o pedido de anulação da penhora.

  5. Na verdade, o Tribunal considerou que tendo o sujeito passivo obtido decisão inteiramente favorável (dado que foram anuladas, em sede de impugnação judicial, as liquidações de IRC (tal como constava do petitório) subjacentes aos processos de execução fiscal instaurados para cobrança daquela alegada dívida de imposto), a garantia neles prestada (penhora de imóvel) caducava ope legis por força do disposto no artigo 183.º-B do CPPT.

  6. E note-se que a intenção do legislador foi clara e suficientemente impositiva, prescindindo inequivocamente (inclusive) de qual seria a decisão final do processo (que até poderia reverter, em instância recursória, a decisão jurisdicional primeira), conquanto a decisão de 1.ª...

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