Acórdão nº 00266/19.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Fevereiro de 2021
Magistrado Responsável | Paulo Ferreira de Magalh |
Data da Resolução | 19 de Fevereiro de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: *I - RELATÓRIO G.
, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 16 de abril de 2020, pela qual absolveu o Réu da instância por ter julgado procedente a excepção de intempestividade de apresentação da Petição inicial.
*No âmbito das Alegações por si apresentadas [Cfr. fls. 300 e seguintes dos autos, SITAF]], elencou a final as conclusões que ora se reproduzem: “CONCLUSÕES A. Vem o presente recurso interposto do douto saneador-sentença que julgou procedente a excepção de intempestividade da apresentação da petição inicial em juízo, que absolveu a Recorrida da instância.
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A Recorrida foi citada para contestar, na sequência da qual veio a deduzir a excepção de intempestividade da apresentação da petição inicial em juízo.
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No seguimento de tal alegação, entendeu o Tribunal a quo que o despacho de 18/09/2018 do Director-Nacional da PSP, que negou provimento ao recurso hierárquico interposto pelo Recorrente e manteve a decisão recorrida, ou seja, o despacho de 14/03/2018 do Comandante Metropolitano do Porto da PSP, que determinou a cassação das autorizações do Recorrente para a detenção no seu domicílio de várias armas, é meramente confirmativo.
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E que, sendo meramente confirmativo, o despacho de 18/09/2018 do Director- Nacional da PSP não é impugnável contenciosamente, nos termos do disposto no artigo 53º nº 1 do CPTA.
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E ainda que, não obstante no texto da decisão de recurso hierárquico mencione que dela “cabe recurso contencioso no prazo de três meses” esse que “não tem a virtualidade de alterar o regime legal compulsado nesta decisão, isto é, não tem a capacidade de tornar o que é inimpugnável por força da lei em impugnável, nem de tornar tempestiva uma acção que, legalmente, é intempestiva.”.
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A interpretação do despacho de 18/09/2018 do Director-Nacional da PSP resulta vítrea e é incontestável: o Recorrente dispunha de um prazo de 3 (três) meses a contar da notificação que lhe foi feita a 02/11/2018, para efectuar a sindicância nos Tribunais Administrativos da decisão da Recorrida.
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Atendendo a que o Recorrente foi notificado despacho de 18/09/2018 do Director-Nacional da PSP, a 02/11/2018, o prazo de 3 (três) meses que lhe foi comunicado como sendo o hiato de tempo em que poderia recorrer judicialmente dela terminaria a 2 de Fevereiro de 2019.
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O Recorrente propôs a presente acção no 90º (nonagésimo) dia posterior ao da sua notificação, mais concretamente em 31/01/2019, sendo que, como se apontou, tal prazo terminaria a 02/02/2019 [cf. art. 279º alínea c) do CCivil] dada a sua natureza substantiva e não processual.
I. A Recorrida adoptou dois comportamentos totalmente contrários entre si.
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A mesma Recorrida que informou expressamente o Recorrente (por decisão tomada a 18/09/2018) de que este dispunha de um prazo de 3 (três) meses, a contar de 02/11/2018, para recorrer a juízo para impugnar a decisão por si tomada, foi mesma que na Contestação assumiu uma postura totalmente contrária, desconsiderando por completo o prazo para o exercício do direito de que informou o Recorrente que este beneficiava, pugnando que afinal o prazo para eventual recurso a tribunal teria terminado 28/08/2018.
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Esta postura assumida pela Recorrida é um claro caso de abuso de direito (cf. art. 334º do CCivil).
L. O Recorrente, na sua boa fé, investiu a sua confiança no que a Recorrida evidentemente o informou e actuou de acordo com o que esta determinou ser o prazo para a impugnação judicial da sua decisão, pois propôs a presente acção dentro desse hiato de tempo.
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Logo, verifica-se um nexo causal entre a actuação da Recorrida e a do Recorrente.
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Como tal, a postura processual da Recorrida adoptada na sua Contestação, em sentido contrário ao por si determinado e notificado ao Recorrente na Decisão sobre recurso hierárquico, preenche os pressupostos da modalidade de abuso do direito supra alegada.
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O próprio CPTA, no seu artigo 58º nº 3 alínea b) tipifica que: “A impugnação é admitida, para além do prazo previsto na alínea b) do n.º 115: No prazo de três meses, contado da data da cessação do erro, quando se demonstre, com respeito pelo contraditório, que, no caso concreto, a tempestiva apresentação da petição não era exigível a um cidadão normalmente diligente, em virtude de a conduta da Administração ter induzido o interessado em erro;”.
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A decisão inicial tomada pela Recorrida a 14/03/2018 e notificada ao Recorrente a 16/04/2018, indicava o que se transcreve: “Fica V. Ex.ª ainda notificado de que o presente ato administrativo pode ser objecto de: a. Reclamação para o autor do ato administrativo, a apresentar no prazo de 15 dias a contar da notificação do ato; b. Recurso hierárquico para o Director Nacional da PSP, a apresentar no prazo estabelecido para a apresentação da impugnação do ato; c. Impugnação do ato nos Tribunais administrativos, a apresentar no prazo de três meses a contar da notificação do ato.”.
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Para um cidadão normalmente diligente, a forma hierarquizada como as opões ao seu dispor foram expostas pela Recorrida não é despicienda e em lado nenhum daquela notificação é feita a menção a qualquer informação mais detalhada que tivesse permitido àquele tomar consciência plena das consequências processuais de cada opção ao seu dispor.
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Actuando diligentemente face à informação prestada – com as lacunas entretanto apontadas – na citada notificação datada de 14/03/2018, o Recorrente interpretou que lhe era exigível, previamente ao recurso aos Tribunais – e porque não dispunha de nenhum elemento nesse documento que lhe indicasse o contrário – dever apresentar Recurso Hierárquico para o Director Nacional da PSP, pois pela lógica normal de qualquer cidadão diligente, só quando a instância mais alta dentro da instituição responsável pela decisão contra a qual se pretende actuar tomar uma decisão, a mesma é definitiva.
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E facto é que, como já se demonstrou, a decisão sobre o recurso hierárquico (18/09/2018) veio a conceder 3 (três) meses ao Recorrente para a impugnar judicialmente, ou seja, a interpretação daquele acerca do teor da notificação da primeira decisão coincide com aquilo que este pugna que a Recorrida lhe comunicou.
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Aliás, o próprio sentido e a hierarquia das opções ao dispor do Recorrente dispostas na Notificação datada de 14/03/2018 não induzem num cidadão diligente a noção das consequências decorrentes da eventual não propositura em Tribunal da acção de impugnação, ou até do possível Recurso Hierárquico em simultâneo.
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Tudo quanto acima se alegou decorre da própria actuação e postura da Recorrida previamente à apresentação desta lide (tanto a 14/03/2018 como a 18/09/2018), pois da sua exegese resulta que apenas quando o Recurso Hierárquico é decidido é que a única opção restante é recorrer a juízo.
V. E aqui vem desembocar a questão da actuação em boa fé da Administração que, por não ter explicado de forma cabal ao Recorrente as circunstâncias que envolvem as contabilizações dos prazos administrativos (relembre-se que se trata de um leigo desacompanhado de advogado) o induziu em erro e com isso procurou “obter a consolidação de um acto ilegal por si praticado”.
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Não era exigível ao Recorrente ter proposto a presente acção única e exclusivamente dentro do prazo propugnado quer pela Recorrida na sua Contestação, quer pelo Tribunal a quo, visto que, não obstante aquele ter actuado diligentemente, aquela o induziu em erro.
LIMITADA X. Em face disso, e de acordo com o disposto na alínea b) do nº 3 do art. 58º do CPTA, foi tempestivamente deduzida pelo Recorrente a impugnação da decisão de cassar as autorizações de detenção de armas no domicílio de que este é portador, porque feita dentro do prazo de 3 (três) meses concedido pela Recorrida, razão pela qual não se verifica a existência da excepção de caducidade alegada e decidida pelo Tribunal a quo.
Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso revogando-se a douta decisão recorrida, com as legais consequências.
Com o que se fará, como sempre, inteira e sã JUSTIÇA!“**O Recorrido Ministério da Administração Interna não apresentou Contra alegações.
*O Tribunal a quo proferiu...
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