Acórdão nº 087/16.4BEFUN de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACÓRDÃO DO PLENO DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO *** 1. RELATÓRIO 1.1.

R……………. veio, ao abrigo do disposto no artigo 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo do acórdão que nestes autos foi proferido a 16 de Setembro de 2019, pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul (Acórdão integralmente disponível para consulta em www.dgsi.pt), invocando oposição com o acórdão da mesma Secção de Contencioso e Tribunal Central, proferido a 11 de Outubro de 2018 no processo n.º 418/15.4BEFUN (Acórdão integralmente disponível para consulta em www.dgsi.pt.), identificando como questão jurídica fundamental decidida nos referidos arestos em sentido divergente a da ineficácia da notificação da liquidação realizada aos Impugnantes nas situações em que, tendo sido constituído mandatário no procedimento inspectivo, a notificação não seja realizada na pessoa deste último.

1.2. Admitido o recurso no Tribunal Central Administrativo Sul e verificada a invocada oposição pela Excelentíssima Desembargadora Relatora (com os fundamentos exarados no processo em suporte físico, de fls. 210 e 211), foi ordenada a notificação das partes para alegarem nos termos do n.º 3 do artigo 282.º do CPPT, o que ambas fizeram.

1.3. Para a Recorrente, este Supremo Tribunal deve revogar o acórdão recorrido e julgar exigível a notificação da liquidação ao Mandatário constituído no procedimento e, consequentemente, caduco o direito à liquidação, uma vez que, conclui: «No entender do Recorrente, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, ao ter feito uma apreciação e valoração inapropriada e incorreta do Direito aqui aplicável, uma vez que: a) o exercício do direito à liquidação e a notificação do seu conteúdo ao contribuinte têm que ocorrer dentro do prazo de quatro anos contados do facto tributário, nos termos do artigo 45.º da LGT, sob pena de operar a caducidade de tal direito; b) nos termos do artigo 268.º n.º 3 da CRP, os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados na forma prevista na lei; c) a notificação não é um elemento intrínseco do acto tributário e, portanto, não é um requisito da sua validade, mas simples condição da sua eficácia; d) a falta de notificação da liquidação, enquanto elemento integrante da eficácia externa da mesma, é fundamento de oposição a enquadrar no art. 204.º n°.1, al. i) do CPPT; e) tendo sido constituído mandatário no âmbito do procedimento inspetivo é obrigatória a notificação deste do subsequente acto de liquidação que pôs termo ao mesmo procedimento gracioso, de acordo com o estabelecido no art. 40.º n°.1 do CPPT, não sendo tal formalidade substituível pela notificação do próprio sujeito passivo; f) o acto de notificação da liquidação tributária não é um acto pessoal; g) o art. 40.º n.° 1 do CPPT aplica-se às notificações a mandatários tanto no procedimento tributário como em processos judiciais tributários; h) sendo constitucionalmente imposta a notificação dos actos administrativos aos interessados, na forma prevista na lei (cfr. art. 266, n°.3, da Constituição da República), e impondo a lei tributária a notificação aos mandatários constituídos no procedimento dos actos lesivos nele praticados como condição de eficácia do acto notificando (art°.36, n°.1, do C.P.P.T.), ter-se-á de concluir que a notificação feita somente na pessoa do sujeito passivo é ineficaz, nomeadamente para fazer operar o termo final do prazo de caducidade do direito à liquidação; i) o valor da procuração junta a procedimento gracioso de inspecção mantém-se no consequente procedimento de liquidação; j) o procedimento de inspecção não existe por si mesmo, antes devendo visualizar-se como preparatório da liquidação dos tributos, tendo como objectivo verificar a regularidade da situação tributária do contribuinte; k) da regulamentação autónoma - R.C.P.I.T. - da inspecção tributária não resulta que ela seja mais que uma acção preparatória ou complementar da liquidação dos tributos e faça parte do procedimento tributário em geral; l) sendo legal o relevo dado a procuração passada/apresentada por contribuinte em processo administrativo/tributário de natureza graciosa, aquando da instauração de consequente processo de natureza contenciosa, por maioria de razão se deve relevar a existência de procuração face a dois procedimentos de natureza graciosa; m) nos termos do artigo 66.º do Estatuto da Ordem dos Advogados: «O mandato judicial, a representação e assistência por advogado são sempre admissíveis e não podem ser impedidos perante qualquer jurisdição, autoridade ou entidade pública ou privada, nomeadamente para defesa de direitos, patrocínio de relações jurídicas controvertidas, composição de interesses ou em processos de mera averiguação, ainda que administrativa, oficiosa ou de qualquer outra natureza; n) nos termos do art. 20, n°.2 da CRP: "Todos têm direito, nos termos da lei, (...) a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade”; o) face à liquidação que teve suporte na acção inspectiva não é possível considerar que a procuração foi emitida apenas para a representação do contribuinte na mesma acção inspectiva e não, também, para o procedimento de liquidação de imposto em que ela se integra quando, entre o termo da inspecção e a estruturação da liquidação não há qualquer outro acto administrativo; p) não parece ser razoável que a constituição de mandatário, durante um procedimento de inspecção, não releve para o acto de liquidação que é o único acto impugnável e, por outro lado, o único para o qual parece ser impossível constituir mandatário, no pressuposto, consensual, de que a notificação de acto de liquidação não configura um acto pessoal; q) a interpretação restritiva dada ao art.40, n°.1 do CPPT, no sentido de que a constituição de mandatário durante o procedimento de inspecção não impõe que lhe seja notificado o acto de liquidação que se fundamenta na decisão final de tal procedimento enferma de vício de inconstitucionalidade; r) a resposta legal só pode ser dada pelo Código de Processo Civil, pois só esta codificação contém a chave do problema, já que o CPPT e o CPTA — que precede o CPC na integração de lacunas daquele, como resulta do artigo 2.° do CPPT — nada referem a respeito desta questão; s) o CPC contém, em concreto, no seu artigo 44.º n.° 1, duas soluções abstractamente possíveis para a questão da validade extraprocessual ou heteroprocessual da procuração; t) a primeira solução, numa interpretação estritamente literal da norma, aponta no sentido da procuração valer, não só no processo em que foi e para o qual foi apresentada — função endoprocessual — mas também nos respectivos incidentes de instância; u) os incidentes da instância são “relações processuais secundárias, intercorrentes no processo principal; v) é intuitivo que não faria sentido que a lei exigisse, para cada uma dessas "intercorrências" a apresentação de uma nova procuração, valendo, portanto, a que foi apresentada no processo; w) a procuração é válida para o processo em que é apresentada e respectivos incidentes; x) o artigo 44.º n.° 1, do CPC, só pode ser interpretado no sentido da procuração conferir poderes ao mandatário para representar a parte em todos os actos e termos do processo principal e respetivos incidentes, incluindo aqueles que, tendo a estrutura de uma causa, devam correr por apenso aos autos principais e vice-versa; y) embora constituindo dois procedimentos autónomos, a inspecção e a liquidação tributárias são como irmãos siameses, que tendo a sua própria identidade partilham órgãos comuns; z) a liquidação consequente a uma fiscalização/inspecção baseia-se nos resultados desta, que de resto constitui o seu discurso fundamentador; aa) há uma "correlação e interdependência entre o procedimento de inspeção tributária e o procedimento de liquidação; bb) o mandato forense destina-se ao exercício de qualquer mandato com representação em procedimentos administrativos, incluindo tributários, perante quaisquer pessoas coletivas públicas ou respetivos órgãos ou serviços, ainda que se suscitem ou discutam apenas questões de facto, nos termos do artigo 67.°, n.° 1, al. c), do EOA; cc) quando o contribuinte visado num procedimento de inspecção confere mandato a advogado pretende a defesa de todos os seus interesses, os quais são indissociáveis da liquidação a praticar posteriormente; dd) pela natureza das coisas o mandato conferido num procedimento de inspecção não tem em vista, primordialmente, os actos que nesse procedimento sejam praticados mas sim o acto final que verdadeiramente é lesivo do contribuinte: a liquidação cujo procedimento constitui, verdadeiramente, um apenso do procedimento de inspeção; ee) o mandato forense conferido em procedimento de inspecção abrange não só todos os actos praticados nesse procedimento mas também todos os actos consequentes praticados no procedimento de liquidação, dada a reconhecida relação de proximidade, "correlação e interdependência" que entre ambos existe e que justifica que a procuração conferida no primeiro releve também para o segundo; ff) qualquer interpretação contrária violaria o direito de defesa consagrado no artigo 20.° n.°s 1 e 2 da CRP, uma vez que, tendo sido constituído mandatário no procedimento de inspeção, com vista à defesa do contribuinte perante actos da administração tributária lesivos da sua esfera jurídica, tal mandato forense abrange necessariamente, o procedimento e o acto de liquidação; gg) quando o mandante confere mandato ao advogado no procedimento de inspecção, está a perspectivar a sua defesa no sentido mais amplo, ou seja, em relação a todos os actos que, próprios desse procedimento ou nele ancorados, possam afectar a sua esfera jurídica; hh) é inconstitucional a interpretação que exige uma procuração específica para cada um dos...

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