Acórdão nº 03022/10.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelCeleste Oliveira
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Seção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO A ATA-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA e o BANCO (...), S.A., inconformados com a sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou parcialmente procedente a acção administrativa especial intentada pelo BANCO (...), SA, interpuseram recursos formulando nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que a seguir se reproduzem.

Para o efeito a ATA formulou as seguintes: “Conclusões

  1. Inconformada com a douta sentença proferida em 1ª instância, vem a Recorrente interpor recurso para o Tribunal Central Administrativo Norte, imputando à decisão, para o efeito, erro de julgamento do Tribunal a quo quanto à matéria de facto e de direito e ainda erro de julgamento face à invocada inconstitucionalidade do artigo 139º/6 do CIRC.

  2. Em causa está a sentença de 27/02/2018, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou parcialmente procedente a acção administrativa especial interposta pelo Autor, ora Recorrido, na qual deduzia, em síntese, (1) a inconstitucionalidade do nº 6 do artigo 139º do CIRC, por violação dos princípios da reserva da intimidade da vida privada, do Estado de Direito, do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva, da proporcionalidade e da tributação pelo rendimento real (artigos 26º/1, 2º, 20º/1 e 4, 286º/4 e 104º/2 da CRP), (2) da ilegalidade da decisão por violação do regime vertido no artigo 63º - B da LGT, (3) da interpretação do nº 6 do artigo 139º do CIRC, (4) da condenação à emissão de decisão de deferimento do pedido de prova do preço efectivo da venda do prédio urbano pelo Autor.

  3. A douta sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância considerou, em síntese, não existir qualquer violação dos princípios constitucionais sindicados pelo ora recorrido, não havendo igualmente que aplicar o artigo 63º-B da LGT ao caso concreto, uma vez que, se fosse essa a vontade do legislador, tê-lo-ia consignado expressamente, como fez no artigo 63º-C da LGT, ao prever no seu nº 5, a sujeição às regras e circunstâncias previstas naquele artigo.

  4. Porém, e apesar do tribunal a quo não concordar com a interpretação do artigo 139º/6 do CIRC por violação do artigo 63º-B da LGT, conclui que, a ora Recorrente fez uma errada interpretação do nº 6 do artigo 139º do CIRC, mas com base no erro nos pressupostos de direito, pois, e) como refere o tribunal a quo: [imagem que aqui se dá por reproduzida] f) Pelo que, considera o tribunal a quo que a ora Recorrente deveria ter adoptado um comportamento de maior empenho na busca da verdade material, sendo que o facto de não possuir autorização de derrogação do sigilo bancário, não é requisito essencial para indeferir o procedimento.

  5. Pois que, tendo a AT tido acesso a outros meios de prova, pode concluir que os mesmos são suficientes para a prova do preço efectivamente praticado, sendo desnecessária a apresentação das referidas declarações.

  6. Quanto à condenação à emissão de decisão de deferimento do pedido de prova do preço efectivo da venda do prédio urbano pelo Autor, vem o tribunal a quo afirmar que, em nome do principio constitucional da separação de poderes, não pode substituir-se à AT na determinação do conteúdo do acto a praticar por esta, podendo no entanto, condenar a AT a reapreciar o pedido, “…no âmbito de conformação da interpretação do artigo 139º, nº 6 do CIRC ora efectuada…”(…)”… entendendo-se que não lhe assiste o direito (ao Autor) à emissão dum acto de conteúdo favorável à sua pretensão, mas apenas o direito à emissão de novo acto, ato esse que terá de considerar o aqui decidido por forma a não incorrer nas mesmas ilegalidades e ofender o caso julgado.” i) Pelo que decidiu: [imagem que aqui se dá por reproduzida] j) A entidade ora Recorrente não se conforma com a sentença proferida a 27/02/2018, por considerar que a mesma incorre em erro de julgamento em matéria de direito.

  7. Senão, vejamos.

  8. Ora, o direito à prova do preço efectivo inferior ao valor de mercado do bem alienado, que assiste ao contribuinte, exige a demonstração eficaz e cabal do mesmo, o que postula a referida derrogação.

  9. Dada a massificação das relações tributárias, assentes no princípio declarativo e a concomitante massificação das relações bancárias, cujos registos servem de suporte aos lançamentos contabilísticos, dir-se-á que o acesso aos dados bancários do contribuinte constitui o meio de prova, por excelência, da veracidade das declarações e dos registos contabilísticos. De forma que o cumprimento eficaz do ónus da demostração da efectividade de certa operação económica e do valor implicado depende muito mais dos registos bancários do que apenas dos registos contabilísticos. O acesso aos dados referidos coloca-se, pois, como medida idónea, necessária e proporcionada ao fim em vista, porquanto estando em causa demonstração de que o preço efectivo foi inferior ao preço de mercado, importa garantir o acesso aos dados bancários do impugnante e dos seus administradores, tendo em vista assegurar a veracidade do declarado.

  10. Estava em causa o acesso aos dados bancários do contribuinte, alienante de prédio cujo preço inscrito na contabilidade é inferior ao valor de mercado e que pretende fazer prova da efectividade do mencionado preço. Ora, correspondendo o VPT do prédio a uma aproximação ao valor de mercado do mesmo, a asserção de que o proveito obtido com a sua venda não há-de ser inferior ao VPT constitui uma presunção cuja ilisão requer a prova em contrário (artigo 350.º do Código Civil). Prova cuja assertividade deve estar para além de qualquer dúvida e cujo ónus de demonstração recai sobre requerente, na medida em que fez inscrever na sua contabilidade preço inferior ao preço do mercado (artigo 74.º/1, da LGT).

  11. De referir também que sendo o preço a contrapartida monetária da venda, o qual origina fluxos financeiros entre pelo menos duas partes, então segue-se que os dados bancários da recorrente, enquanto alienante e contribuinte, surgem como elementos determinantes no apuramento do mencionado preço. Donde se infere que o acesso aos referidos dados bancários oferece-se como mecanismo adequado à comprovação do preço declarado do bem e inscrito na contabilidade da ora recorrida.

  12. Pelo que, no seu próprio interesse, deveria o sujeito passivo ter junto ao requerimento inicial apresentado junto da AT, e que determinou a instauração do procedimento do art. 139º do CIRC, as autorizações para acesso à sua informação bancária e dos respectivos administradores. Tanto mais, que o referido procedimento, regulado pelos arts. 91º e 92º da LGT, assenta num debate contraditório entre o perito indicado pelo contribuinte e o perito da AT e visa o estabelecimento de um acordo quanto ao valor da matéria tributável a considerar para efeitos de liquidação.

  13. Deste modo, não tendo o Autor feito a imprescindível prova do preço efectivo de venda do imóvel em causa, a questão deverá de ser contra ele decidida, em obediência às regras legais do ónus da prova, nomeadamente, do art. 342º, nº 1 do Código Civil e do art. 74º, nº 1 da LGT.

  14. O procedimento de produção de prova de preço efectivamente praticado na transmissão de imóveis inicia-se, pois, com o pedido do sujeito passivo dirigido ao Director de Finanças competente, o qual deve ser apresentado no mês de Janeiro do ano seguinte àquele em ocorreram as transmissões, caso o valor patrimonial tributário já se encontre definitivamente fixado. Se nesse período o valor patrimonial tributário ainda não estiver definitivamente fixado, o pedido deve ser efectuado nos 30 dias posteriores à data em que a avaliação se tornar definitiva.

  15. Analisados os artigos 64º e 139º do CIRC, retiram-se várias ilações, quer quanto à necessidade de promoção de uma reunião de peritos com o propósito de obter um acordo sobre o preço efectivamente pago pelo adquirente dos bens imóveis, baseado, não só nos elementos resultantes do acesso ao segredo bancário, mas também do exame das condições especiais ou normais de mercado que rodeiam a transmissão.

  16. A faculdade que a Administração fiscal tem de aceder à informação bancária do requerente e dos respectivos administradores ou gerentes do período em que ocorreu a transmissão e no anterior é, assim, uma condição do procedimento descrito. Com vista à sua abertura, devem os interessados anexar ao requerimento os documentos de autorização.

  17. Sendo o princípio da proporcionalidade um dos princípios estruturantes que alcançou grande prosperidade e dimensão, tendo inclusive o tribunal a quo decidido que o mesmo não tinha sido violado, questionamos o seguinte: E o principio da legalidade? Não está igualmente toda a Administração, nomeadamente Administração Tributária vinculada à lei? v) Deparamo-nos frequentemente com casos que envolvem actos vinculados e noutros actos discricionários, sendo estas as duas formas típicas pelas quais a lei modela a actividade da Administração.

  18. Neste ponto é legítimo suscitar a seguinte questão: sendo a própria Constituição da República Portuguesa que fixa os limites do poder tributário, regula o seu exercício, define as garantias dos cidadãos e indica os fins a prosseguir pelo sistema fiscal (ex. artigos106º, 107º, 168º/1 al. i), 170º/2, 212º/3, 229 al. f) e 255º da CRP), limitando o legislador ordinário na formulação das normas tributárias e salvaguarda dos direitos e liberdades individuais, não estará a própria Administração Tributária restringida nos seus poderes aos normativos legais? x) É que para haver discricionariedade é necessário que a lei atribua à Administração o poder de escolha entre várias alternativas diferentes de decisão, o que não sucede no caso em apreço.

  19. O acesso à informação bancária do sujeito passivo não é pois um acto discricionário da AT, a exercer só quando se suscitem duvidas sobre a existência de condições anormais de mercado que determinara uma fixação de um preço inferior ao do valor...

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