Acórdão nº 00860/12.2BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelPaulo Moura
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:*A Fazenda Pública interpõe recurso da sentença que julgou procedente a Impugnação deduzida por «P., Lda.», por discordar da opção seguida pelo Tribunal sobre o valor tributável em sede de IVA da operação de cessão da posição contratual do contrato de locação financeira.

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem: 1) O Tribunal a quo julgou incorretamente a matéria de facto e de direito, ao considerar que liquidação padece de erro quanto á base de incidência do imposto.

2) O Tribunal a quo entendeu, que o valor tributável, sobre que vai incidir a taxa do IVA, no contrato de cessão de locação financeira, é o valor da contraprestação indicado pelas partes, e não o valor das rendas não vencidas de que o locatário se desonera.

3) A douta sentença proferida pelo tribunal a quo incorreu em erro de julgamento da matéria de facto e de direito, pois não fez uma correta apreciação da prova e da aplicação dos artigos 16º nº 1 do CIVA e artº 11º - A nº 1 alínea a) da sexta diretiva.

4) O ponto central da matéria de facto, que o tribunal recorrido deu como provado, foi conforme passamos a citar “ (…) conforme resulta do probatório, pela cessão da posição contratual no contrato de locação financeira a impugnante recebeu da cessionária, I., Lda a quantia de 5.000.00 €” 5) Tal conclusão sobre a matéria de facto assenta nos factos que se encontram no ponto E) do probatório, onde se dá como provado que pela cedência da posição contratual no contrato de locação financeira aqui em causa a impugnante recebeu da sociedade I., Lda a quantia de 5.000.00 € acrescida de IVA á taxa legal de 23%, conforme documento a fls. 42 do processo administrativo apenso aos autos; facto não controvertido.

6) O Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo partiu do pressuposto que a Administração Tributária não pôs em causa o valor da contraprestação recebida pela cedente, aqui impugnante, e decidiu que o valor da cessão é o valor indicado pela impugnante de € 5.000.00.

7) A recorrente não concorda com tal decisão, pois conforme resulta dos factos provados sob os pontos B) a D) do probatório e do relatório de inspeção tributária, o valor indicado pela impugnante de € 5.000.00, como traduzindo o valor da cessão sempre foi posto em causa pela Administração Tributária, e é essa discordância que está na origem das correções efetuadas.

8) Nos pontos B) e C) do probatório dá-se como provado que em 16/06/2011 a aqui impugnante celebrou com o BPN Crédito, Instituição de Crédito, S.A. e a sociedade I., Lda um contrato de cessão da posição contratual de locação financeira imobiliária, através do qual cedeu a sua posição contratual de locatária á I., Lda, e conforme estipula, a cláusula primeira, nº 3, que “ a presente cessão é feita pelo preço de € 336.176.85” 9) Mais tarde as partes fizeram um aditamento ao contrato de locação financeira, em que dizem que o valor da cessão é de € 5.000.00, e dizem também que o valor de € 336.176.85, é o valor do capital financeiro em divida assumido pelo cessionário locatário. (Cfr. ponto D) dos factos provados) 10) Por um lado, se no contrato de cessão da posição contratual as partes fixaram inicialmente um valor da cessão, que mais tarde alteraram, continuando a assumir que o valor inicialmente indicado traduz o valor do capital financeiro em divida assumido pelo cessionário locatário, é manifesto que não se pode concluir que o valor da cessão aqui em causa foi o posteriormente indicado, e que este facto não se encontra controvertido.

11) Por outro lado, da leitura do Relatório de Inspeção Tributária também não se retira, que a Administração Tributária não pôs em causa o valor da contraprestação.

12) Da leitura do relatório de inspeção tributária, resulta que para esta entidade o valor de € 336.176.85, constitui a contrapartida económica da prestação de serviços (cessão da posição contratual) em causa nos autos, conforme ponto G) do probatório.

13) Acrescentando-se que o valor da contraprestação, corresponde ao somatório das rendas ainda não pagas de que a P., Lda se desonera, conforme ponto G) do probatório.

14) No relatório de inspeção tributária refere-se de uma forma clara e objetiva que o valor da cessão é o de € 336.176.85, que corresponde ao valor do somatório das rendas ainda não pagas de que a P., Lda se desonera, e indicado inicialmente no contrato de cessão, e não o valor posteriormente indicado pelas partes, razão pela qual o Tribunal a quo não podia dar como provado que a Autoridade Tributária não pôs em causa o valor da cessão aqui em discussão.

15) O Meritíssimo Juiz do tribunal a quo fundamenta-se na posição defendida no acórdão do STA de 12/09/2018, proferido no processo nº 0570/17, a qual reproduz e adere na integra, porque decidiu que a situação factual em análise é igual á decidida no referido Acórdão em que se baseou, na medida em que partiu do pressuposto que a Administração Tributária não pôs em causa o valor da contraprestação recebida pela cedente, aqui impugnante.

16) Ora ao contrário do entendido pelo Tribunal a quo, a situação em análise não é idêntica á do referido acórdão do STA, pois no caso em apreço, de acordo com o que consta tanto dos factos provados como do relatório de inspeção anteriormente referidos, a inspeção tributária indicou os fundamentos de facto e de direito que serviram de base ao apuramento do valor tributável, enquanto na situação em análise no acórdão do STA não é indicada qualquer explicação para tal apuramento.

17) Razão pela qual não se poderá aplicar ao caso concreto o Acórdão do STA, acima indicado.

18) O artigo 16º nº 1 do CIVA, prevê que o valor tributável é o valor da contraprestação obtida ou a obter pelo alienante ou prestador de serviços.

19) O princípio geral estabelecido por o artº 16º do CIVA, corresponde basicamente ao estabelecido na 6ª diretiva. A tributação faz-se tendo em conta o valor real da operação, a despesa feita pelo consumidor, tal como o requer um imposto de consumo.

20) Como ensina Clotilde Celorico Palma, in Introdução ao Imposto Sobre o Valor Acrescentado, Cadernos IDEFF, nº 1, Almedina, Pág. 141, o conceito de contraprestação deverá ser real e efetivo, suscetível de avaliação pecuniária e de apreciação subjetiva, devendo incluir-se todos os benefícios obtidos de uma forma direta, independentemente de terem natureza monetária ou consistirem numa transmissão de bens ou numa prestação de serviços.

21) O artigo 11.º, A, n.º 1, alínea a) da Sexta Diretiva prevê que a matéria coletável é constituída: “ No caso de entregas de bens e de prestações de serviços […], por tudo o que constitui a contrapartida que o fornecedor ou o prestador recebeu ou deve receber em relação a essas operações, do adquirente, do destinatário ou de um terceiro […]».

22) Para efeitos de cálculo da matéria coletável, num contrato de cessão de posição contratual relativa ao contrato de locação financeira como o do caso em apreço, deve ser considerado contrapartida o valor da cessão que corresponde ao valor do capital financeiro em divida assumido pelo locatário cessionário, pois é este valor que constitui verdadeiramente contraprestação.

23) Na verdade, e compulsado o contrato de cessão da posição contratual celebrado em 16/06/2011, conforme resulta do ponto C) dos factos provados, constatamos, efetivamente que na cláusula primeira, nº 3, que “a presente cessão é feita pelo preço de € 336.176.85” 24) Apesar de mais tarde as partes terem feito um aditamento ao contrato de locação financeira, em que dizem que o valor da cessão é de € 5.000.00, o que é certo é que continuam a admitir que o valor de € 336.176.85, é o valor do capital financeiro em divida assumido pelo cessionário locatário. (Cfr. ponto D) dos factos provados).

25) Ora tratando-se de uma cessão de contrato de locação financeira, o valor da contraprestação obtida do adquirente, corresponderá ao valor do bem que ainda falta pagar, ou seja o valor das rendas vincendas.

26) No que respeita á determinação do preço da cessão, as partes num primeiro momento fixaram o preço, como correspondente ao valor do capital financeiro em divida assumido pelo cessionário locatário, e num segundo momento vêm defini-lo por um valor de € 5.000.00.

27) Mas o que é certo é que este valor não corresponde ao valor das obrigações assumidas pelo cessionário locatário, não corresponde á contraprestação efetiva e real da transação realizada, e como tal não foi aceite como preço da cessão, pela inspeção tributária.

28) Assim sendo, e tendo em consideração que em 16/06/2011 a sociedade impugnante cedeu a sua posição contratual de locatária á sociedade I., Lda., conforme ponto B) dos factos provados, e que esta assumiu o valor do capital financeiro em divida de € 336.176.85, conforme ponto D) do probatório, preço esse que foi indicado pelas partes como preço da cessão, conforme ponto C) dos factos provados, é manifesto que o valor da contraprestação da cessão da...

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