Acórdão nº 14232/17.9T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução28 de Janeiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL *** I. Relatório 1. AA. e BB., intentaram a presente ação declarativa comum contra CC. e DD., pedindo que: a) Seja declarado que as frações autónomas, melhor identificados supra nos artigos 11.° e 12.°, pertencem à herança deixada por óbito do pai dos autores e da qual são os únicos herdeiros; b) Sejam os réus condenados a restituírem aos autores as identificadas frações, livres e devolutas de pessoas e dos bens que ali não se encontravam aquando da ocupação pelos réus; c) Sejam os réus condenados a efetuarem as obras necessárias com vista a restituir a varanda (que fruto das modificações operadas pelos réus é agora uma marquise) bem como a casa de banho do quarto (suite) (onde substituíram a banheira de hidromassagem por um poliban) ao seu estado/condição primitiva ou a pagarem todas as despesas que os autores tiverem de efetuar para reporem a fração autónoma no estado em que se encontrava, à data da ocupação, a liquidar em execução de sentença; d) Sejam os réus condenados solidariamente a pagarem aos autores uma indemnização por danos não patrimoniais a determinar equitativamente pelo Tribunal, mas em montante nunca inferior a € 10.000,00; e) Sejam os réus condenados solidariamente a pagarem aos autores uma indemnização por danos patrimoniais correspondente a um montante mensal de € 1.500,00 desde a data de início da ocupação das frações autónomas que se vier a apurar até à sua efetiva entrega aos autores, acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral e efetivo pagamento; ou, subsidiariamente, para o caso de assim não se entender, i) a pagarem aos autores a quantia correspondente a um montante mensal de € 1.500,00 desde a data de início da ocupação das frações autónomas que se vier a apurar até à sua efetiva entrega aos autores, acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral e efetivo pagamento, a título de restituição por enriquecimento sem causa (pelo enriquecimento decorrente do uso e fruição ilegítimo das frações autónomas — enriquecimento sem causa por intervenção de terceiros em bens alheios); ii) Sejam os réus condenados solidariamente a pagarem aos autores, a título de sanção pecuniária compulsória, a quantia diária de € 100,00, desde a notificação da decisão até à efetiva entrega das aludidas frações autónomas, ao abrigo do disposto no artigo 829.°-A, n.° 1 e 2, do Código Civil.

Alegaram, para tanto e em síntese, serem as frações dos autos pertencentes à herança indivisa da qual são únicos herdeiros, a ocupação não autorizada pelos réus das frações descritas nos autos, os prejuízos daí advenientes e a realização de obras não autorizadas numa das referidas frações.

  1. Os réus contestaram, invocando a existência de contrato de subarrendamento e deduziram pedido reconvencional requerendo a condenação dos autores no pagamento da quantia de euros 11. 213,36 euros, a título de indemnização pelas benfeitorias realizadas no locado, e de 3 881,06 euros, correspondentes às quotizações de condomínio referente às frações que pagaram.

  2. Realizada audiência prévia, nela foi proferido despacho saneador que afirmou, para além do mais, a legitimidade das partes.

    De seguida, foi identificado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova.

  3. Procedeu-se a julgamento, após o que foi preferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente e improcedente a reconvenção e, em consequência: a) Reconheceu que a fracção autónoma designada pela letra "AV" e descrita sob o n.° …. da C.R.P. de …., freguesia da …, e que a fracção autónoma designada pela letra "EF" e descrita sob o n.° … da C.R.P. de …, freguesia da …, são propriedade dos autores; b) Condenou os réus a restituírem aos autores as identificadas fracções, livres e devolutas de pessoas e bens; c) Absolveu os réus do demais peticionado.

    1. Absolveu os autores do pedido reconvencional.

  4. Inconformados com esta decisão, dela apelaram os autores para o Tribunal da Relação …, que por acórdão proferido, em 02.07.2020, julgou parcialmente procedente a apelação e, consequentemente, decretou uma indemnização a favor dos autores do valor de 1.500,00 por cada mês de ocupação do mesmo prédio a partir de 4 de dezembro de 2017 e até efetiva entrega do mesmo, acrescida de juros à taxa legal, desde a data do respetivo vencimento e até efetivo pagamento.

    Quanto ao mais e uma vez não provados os danos não patrimoniais, julgou improcedente o recurso quanto a esta parte da sentença, deixando ainda consignado, relativamente à ilegitimidade dos autores suscitada pelos réus na sua resposta, que esta matéria não foi objeto de recurso, pelo que se trata de questão transitada nos autos.

  5. Inconformados com este acórdão, os réus dele interpuseram recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões, que se transcrevem: «1.ª Tendo em vista o exposto na 1.ª questão, deverá conhecer-se da exceção do litisconsórcio necessário, de conhecimento oficioso do tribunal que, em consequência deverá declarar extinta a instância, com as legais consequências sem prejuízo do disposto na parte final do nº.3 do artigo 278º, do C.P.C, com a repristinação da decisão de 1ª. instância.

    1. Tendo em vista o disposto no nº.4 do artigo 607º, do C.P.C, por força da confissão dos autores no articulado da ação, na decisão de mérito deverão dar-se como provados os seguintes factos: i. Que a Mãe dos AA celebrou para a fração reivindicada contrato de arrendamento com EE. (14.º fls. 7); (facto nº.4).

      ii. Que, o prazo do contrato era de um ano, renovável automaticamente, com início em 1.3.1997 (15.º fls. 7); iii. Que a renda à época era de 960.000$00 anuais (16.º fls. 7); iv. Que nunca colocaram em causa a validade dos atos praticados pela sua Mãe por desconhecimento e quando foram informados “…o prazo para exercer tal direito já se encontravam exauridos” (19.º e 20.º fls. 7); v. Que não conseguiram por fim ao contrato em 2012 e por isso viram-se forçados a respeitar aquele contrato (21.º e 23.º fls. 7vs); vi. Que, em 2015, os AA. tentaram atualizar a renda (25.º); vii. Que a arrendatária continuou a pagar o montante de 445,41€; 3.ª Considerando que:

      1. Conforme consta da confissão dos AA nos artigos 14.º a 23.º e se verifica do documento de fls. 41, a fração reivindicada encontra-se arrendada conforme consta do contrato de arrendamento a fls. 41.

      2. Os AA reconhecem o arrendamento, e referem ainda, que a “inquilina” continuou a pagar a renda (cf. art.º 26.º da p.i.); c) No entanto, não fizeram intervir na ação, a parte interessada, arrendatária, procurando servir-se dos autos num uso anormal da ação para, sem a intervenção da arrendatária, conseguirem um fim proibido por lei, que é a resolução do arrendamento sem utilizar a ação de despejo contra a arrendatária, posto que à luz do disposto no artigo 1084.º do CC, a resolução do contrato de arrendamento, na falta de acordo terá de ser decretada pelo tribunal.

      3. Pretenderam assim os AA, através de meio processual impróprio e ilegítimo, obter um benefício económico e jurídico que não têm direito, posto que o direito dos AA recorridos, no caso, é a contrapartida da renda acordada com a arrendatária e que confessam receber.

      4. Sem prejuízo do requerido na 1ª conclusão, perante a falta de legitimidade dos RR pela falta da arrendatária na ação e posteriormente dos herdeiros na relação material controvertida, e, em face da fase processual dos autos, deverá a instância ser declarada extinta em face do disposto no nº.1 alínea “d” do artigo 278º do C.P.C, com as legais consequências.

    2. Considerando o exposto na anterior conclusão, existindo sobre a fração reivindicada, o ónus de arrendamento habitacional que não foi resolvido através de ação de despejo, tal ónus impede os recorridos de usar e fruir da coisa para além do valor da renda que recebem da arrendatária, tal facto apenas lhe confere o direito à perceção das rendas que recebem tal como se considerou na R, sentença proferida em 1ª, instancia, não assumindo aqui qualquer relevância a avaliação da fração como se estivesse livre de tal ónus ou encargo.

    3. Que, tal como confessam na ação e se verifica dos documentos prova vinculada existentes nos autos a fls. 103 a 177, os AA recebem a renda da fração no valor de 445,41€.

    4. Perante a factualidade antecedente, inexiste fundamento jurídico para justificar a condenação dos recorrentes no pagamento do valor de 1500,00€ mensais, como se sobre a fração em causa não existisse o ónus de arrendamento.

    5. A que acresce ainda o facto de que o raciocínio jurídico expendido na R, decisão recorrida não é justa nem adequada, porquanto: a) O contrato de arrendamento celebrado obsta à pretensão dos recorridos no pedido de qualquer tipo de indemnização por danos, designadamente os que reclamam como se não existisse arrendamento, e que foram reconhecidos no acórdão recorrido constituindo tal decisão um enriquecimento injusto e sem causa que à indemnização fixada, soma-se ainda o valor da renda num total de 1945,41€, mensais.! 8.ª Tal como se considerou na R. decisão de 1.ª instância: “…a verdade é que no caso em apreço os Autores não se viram privados da utilização das frações reivindicadas porquanto sobre estas incidia um contrato de arrendamento com uma terceira pessoa, EE., que se manteve em vigor pelo menos até à propositura da acção pelo que mesmo sem a ocupação dos Réus não poderiam ter fruído dessas fracções...” 9.ª Contrariamente ao decidido no Acórdão recorrido, a obrigação dos herdeiros do arrendatário nos casos de caducidade do arrendamento não é na data do óbito, mas no prazo de seis meses a contar de tal data – conforme dispõe o art.º 1053º, do CC, sendo certo que para que tal pudesse ocorrer, teria de existir factualidade nos autos de prova de que o arrendamento não se transmitiu aos herdeiros da arrendatária – o que no caso não se verifica.

    6. A decisão recorrida para além do vício de nulidade...

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