Acórdão nº 114/11.1BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 11 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I-RELATÓRIO O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA (DRFP) veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, na parte correspondente ao processo de execução fiscal n.º ..... e apensos, e procedente, na parte correspondente ao processo de execução fiscal n.º ..... e apensos, com a consequente extinção do mesmo, quanto à revertida, ora Recorrida, M.....

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A Recorrente, apresentou alegações tendo concluído da seguinte forma: “III – CONCLUSÕES: A- Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nos autos à margem melhor identificados, na parte que julgou procedente a oposição judicial apresentada por M....., julgando a oponente parte ilegítima para a execução.

B- Discorda a Fazenda Pública, com o devido respeito, do entendimento sufragado na douta sentença, e com o mesmo não se conforma, porquanto padece, a douta sentença, de erro de julgamento de facto [por ter errado na valoração da prova] e de direito [por não ter feito uma correta interpretação e aplicação das normas estabelecidas quanto prova do exercício da gerência ínsito na alínea b) do n.1 do art.º 24.º da Lei Geral Tributária (LGT)].

C- Neste âmbito, o thema decidendum, assenta em saber se os autos de oposição contêm prova do exercício da gerência, também denominada ou comummente conhecida como gerência de facto, por parte do revertido, ora oponente.

D- Entende a Fazenda Pública que o Douto Tribunal não levou ao Probatório, como lhe competia, todos os elementos relevantes para a boa decisão da causa e a descoberta da verdade material, pelo que, de molde a subsumir a situação real respigada dos autos à boa decisão da causa, o Probatório deverá ser corrigido de acordo com a verdade factual, ao abrigo do disposto no n.º 1 do art.º 662.º do CPC.

E- Devendo, atenta toda a prova produzida, ser aditado à matéria de facto o seguinte facto: F. Confessa a oponente na sua petição inicial ter assinado cheques em branco, a pedido do seu co-sócio, desconhecendo as quantias e a quem eram emitidos, devendo os factos ser renumerados tomando em consideração este cuja inclusão se requer.

F- Tal inclusão deve ser levada ao probatório para refutar toda a argumentação expandida pelo tribunal a quo quando tenta afastar a gerência de facto da ora recorrida alegando que não basta a prática de isolados para que os gerentes de direito possam ser considerados gerentes de facto.

G- Consultado os autos, para além do facto dado como provado na al. E) do probatório, a oponente tinha consciência de que quando assinava os “tais cheques” estava-o a fazer na qualidade de gerente da originária devedora, vinculando-a, não tendo renunciado ao cargo para o qual havia sido designada e que aceitou, sem qualquer reserva.

H- As afirmações e considerações da oponente, na sua petição inicial, nomeadamente “com vários postos de trabalho em causa, a ora impugnante procurou, desesperadamente, ultrapassar as dificuldades” [cfr. ponto 75 da P.I.] (…), “Maugrado a aqui oponente ter deitado mão, entretanto, a múltiplas diligências, tentando ultrapassar tão grave problema” [cfr. ponto 77 da P.I.], “Inclusive, ela própria e membros da sua família injetaram capital na empresa” [cfr. ponto 78 da P.I.], , constituem uma confissão implícita do efetivo exercício da gerência de facto da devedora originária revelando factos que só estariam ao alcance de um verdadeiro gerente de facto, ou seja, de um gerente que exercia efetivamente o seu cargo e não de um mero gerente de direito.

I- Ao anuir em apor a sua assinatura em cheques, dando ordens de pagamento em nome e no interesse da sociedade, a oponente assumia as decisões subjacentes, cooperando e co-responsabilizando-se no exercício de uma função própria de gerência, sendo irrelevante o facto de não praticar quaisquer outros atos em nome da sociedade.

J- Sendo a prova por confissão legalmente admissível nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 115.º do CPPT, supletivamente aplicável por força do art.º 211.º, n.º 1 do mesmo diploma, e ainda no art.º 352.º do Código Civil, a mesma deveria ter sido objeto de uma correta e adequada valoração em sede decisória.

K- E não pode, com o devido respeito, vingar a conclusão do tribunal a quo quando afirma tratar-se de “uma mera intervenção isolada” [cfr. primeiro paragrafo da página 20 da referida sentença], uma vez que, como a mesma reconhece, foram várias vezes que assinou cheques em representação da originária devedora.

L- Posto isto, acrescenta-se que, não obstante não ter a Fazenda Publica junto aos autos cópia dos referidos cheques, a existência dos mesmos é do conhecimento do D. Tribunal, conforme alegado pela oponente. E, isso é o bastante para serem relevados enquanto tal.

M- Tendo confessado a oponente que assinou vários cheques enquanto gerente da sociedade e encontrando-se nos autos comprovativos da receção (vulgos AR) de correspondência enviada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, teria o tribunal a quo que dar como provado, salvo o devido respeito, o exercício de gerência da oponente.

N- Por conseguinte, salvo o devido respeito, que é muito, o Tribunal a quo lavrou em erro de interpretação e aplicação do direito e dos factos, nos termos supra explanados, levando a que também preconizasse uma errada valoração da factualidade dada como assente violando o direito aplicável, no caso a al. b) do nº 1 do art.º 24º da LGT.

O- Assim, face ao exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso e consequentemente revogada a sentença recorrida.

PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA!” *** A Recorrida optou por não apresentar contra-alegações.

*** O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

*** Colhidos os vistos dos Exmos Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

*** II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: “Com interesse para a decisão a proferir, o Tribunal considera provados os seguintes factos: A) Em 16.11.1998, foi constituída a sociedade por quotas com a designação “T..... Lda.”, tendo como únicos sócios J..... e a ora Oponente, os quais foram designados como seus gerentes (cfr. documento de fls. fls. 28 a 32 dos autos; matéria não controvertida); B) A sociedade identificada na alínea A) supra obrigava-se com a assinatura de qualquer um dos seus gerentes (cfr. documento de fls. fls. 28 a 32 dos autos e fls. 145 a 147 da certidão do processo de execução apensa); C) O Serviço de Finanças de Arruda dos Vinhos instaurou contra a sociedade identificada na alínea A) supra o processo de execução fiscal n.º ....., por dívida de coima aplicada por falta de pagamento de IVA do período de 2001/03T, e encargos relativos ao respectivo processo de contra-ordenação, no valor de 876,08 EUR, bem como os processos de execução fiscal infra identificados, entretanto apensos àquele processo de execução: (cfr. documentos de fls. 1 a 4 dos autos e fls. 1 a 3 e 130 a 132 da certidão do processo de execução apensa); D) No âmbito do processo de execução fiscal n.º ....., mencionado em C) que antecede, foi remetido à sociedade identificada em A) supra, por carta registada em 09.01.2002, ofício de “CITAÇÃO”, tendo em vista a cobrança no valor em dívida naquele processo de execução (cfr. documentos de fls. 3 e 4 da certidão do processo de execução apensa); E) Em 25.01.2005 e 09.03.2005, a ora Oponente procedeu à aposição da sua assinatura em 2 avisos de recepção relativos a ofícios remetidos à sociedade identificada em A) supra, pelo Serviço de Finanças de Arruda dos Vinhos (cfr. documentos de fls. 35 e 36 dos autos); F) Em 26.04.2007, foi celebrada escritura de “Cessão de Quotas e Alteração do Pacto”, entre os sócios gerentes da sociedade identificada na alínea A) supra, enquanto primeiros outorgantes, e L....., como segundo outorgante, na qual aqueles declararam ceder a este segundo outorgante as suas quotas na referida sociedade e renunciar à sua gerência, e o segundo outorgante declarou aceitar estas cessões, bem como todo o activo e passivo existente à data na sociedade (cfr. documento de fls. fls. 20 a 25 dos autos); G) Pelo averbamento ap. 1/20070507, foi registada na Conservatória de Registo Civil/Predial/Comercial de Arruda dos Vinhos a cessão de funções da Oponente como gerente da sociedade identificada na alínea A) supra, por renúncia em 26.04.2007 (cfr. documento de fls. fls. 33 dos autos); H) Em 29.10.2007, 30.10.2007, 31.10.2007 e 05.11.2007, foram elaboradas notas de diligências por funcionário do Serviço de Finanças de Arruda dos Vinhos, das quais consta que, tendo-se dirigido ao Banco Popular, ao Banco Santander Totta, ao Banco Banif, ao Montepio Geral e ao Banco Espírito Santo, respectivamente, a fim de cumprir mandado de penhora em nome da sociedade identificada em A) supra, tal não foi possível, “em virtude de não existir qualquer conta bancária em que o executado seja titular e/ou co-titular.” (cfr. documentos de fls. 65 a 69 da certidão do processo de execução apensa); I) Em 18.08.2008, deu entrada no Serviço de Finanças de Arruda dos Vinhos ofício do Banco Comercial Português, S.A., sob o assunto “Penhora de Saldos em Conta(s) Bancária(s)”, no qual se comunicou àquele...

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