Acórdão nº 690/19.0T8SSB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MATOS
Data da Resolução28 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. nº 690/19.0T8SSB.E1 Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório 1. O Ministério Publico instaurou ação especial de acompanhamento de maiores em benefício de (…), nascido a 27/2/1957, residente na Rua (…), lote (…), Quinta do Conde.

Alegou que o requerido sofre de alcoolismo crónico, com alterações graves e permanentes da memória e deterioração cognitiva que o impossibilitam de exercer plena, pessoal e conscientemente os seus direitos e de cumprir os seus deveres.

Requereu a medida de representação geral do requerido e indicou (…), irmã do requerido, para exercer as funções de acompanhante.

Verificada a impossibilidade do requerido receber a citação foi-lhe nomeado defensor oficioso, o qual não apresentou contestação.

  1. Procedeu-se à audição pessoal do requerido e após a produção das provas julgadas convenientes seguiu-se decisão em cujo dispositivo designadamente se consignou: “Pelo exposto, declaro: a) - O acompanhamento da maior, (…), por sua irmã, (…), residente no Bairro da (…), Ruas de (…), nº 24, 7005-395 Évora; b) - Atribuir, à acompanhante poderes de representação geral do beneficiário; c-) Bem como poderes de representação especial, concretamente os de, em substituição do beneficiário, realizar os atos necessários à gestão dos bens do mesmo, proceder à abertura de contas bancárias em nome do beneficiário, receber a pensão do beneficiário, por forma a poder custear as despesas diárias da mesma, visando o bem-estar de (…), e exclusivamente para este fim; c)- Declarar que a medida de acompanhamento se tornou conveniente desde 01 de novembro de 2019 (artº 900º, nº 1, do CPC); d-) - Que nos termos do art. 147º do C.C., o beneficiário não pode: - Casar ou constituir situações de união de facto, - Procriar, - Perfilhar, - Adotar, - Cuidar e educar filhos biológicos ou adotados, - Votar, - Se deslocar no país ou no estrangeiro sozinho, - Fixar domicílio e residência, - Assinar documentos oficiais.

    e) – Que, para os efeitos do disposto no artº 2189º, al. b) do C.C., o beneficiário é incapaz de testar; f) – Que, para os efeitos do disposto no artº 1601º, al. b) do C.C., a presente decisão de declaração de situação de acompanhamento, constitui impedimento dirimente absoluto; g) – Que, para os efeitos do artº 4º, nº 1, do DL nº 272/2001, de 13/10, a acompanhada não pode aceitar ou rejeitar liberalidades, a seu favor; i)- Que a situação de acompanhamento ora declarada, não faculta o exercício direto de direitos pessoais, nos termos do artº 5º, nº 3, da Lei de Saúde Mental; j) - Que, para os efeitos do artº 13º da Lei Saúde Mental, ocorre restrição de direitos pessoais, com a presente declaração da situação de acompanhamento, pelo que o acompanhante tem legitimidade para requerer as providências previstas no referido diploma legal; l) - Estabelecer o prazo de cinco anos para a revisão oficiosa da medida de acompanhamento (artº 155º do C.C.); m) - Que transitado em julgado, comunique, nos termos do disposto nos arts. 1920º-B do C.C., aplicável ex vi artº 902º, nº 2 e 3, do C.P.C., dispensando o tribunal a publicidade da sentença; n) - Declarar que não existe testamento vital e procuração para cuidados de saúde relativamente ao beneficiário (artº 900º, nº 3, do CPC); o) - Dispensar a constituição de conselho de família; p) - sem custas (artº 4º, nº 1, al. l), do RCP, na redação da Lei nº 41/2018, de 14/08); q) - Fixar, à presente causa, o valor de € 30.000,01 (artº 303º, nº 1, do CPC); r) – Que se proceda ao registe e notificação da presente sentença.” 3. O Ministério Público recorre da sentença e conclui assim a motivação do recurso: “1. No âmbito da ação de acompanhamento de maior, que decretou o acompanhamento do maior (…) foi restringido ao mesmo, entre outros, o direito pessoal de voto.

  2. O direito ao sufrágio consubstancia um direito fundamental e universal, atribuído a todos os cidadãos maiores de dezoito anos.

  3. A Lei Orgânica nº 3/2018, de 17 de agosto, conferiu nova redação aos artigos relativos a incapacidades eleitorais ativas constantes das leis eleitorais do Presidente da República, da Assembleia da República, dos Órgãos das Autarquias Locais e do regime do referendo local, estabelecendo não gozarem de capacidade eleitoral ativa, apenas, «os que notoriamente apresentem limitação ou alteração grave das funções mentais, ainda que não sujeitos a acompanhamento, quando internados em estabelecimento psiquiátrico ou como tais declarados por uma junta de dois médicos» e «os cidadãos que estejam privados de direitos políticos, por decisão judicial transitada em julgado.» 4. Mais revogou a citada lei as alíneas que previam não gozarem de capacidade eleitoral os interditos por sentença com trânsito em julgado.

  4. Pretendeu, pois, o legislador não operasse a restrição da capacidade eleitoral decorrente de sentença proferida no âmbito de processo de acompanhamento de maior.

  5. A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência operou uma mudança de paradigma, através da qual se reconhece a dignidade inerente a todas as pessoas com deficiência, bem como, se reconhecem as pessoas com deficiência como sujeitos do direito.

  6. A Convenção visa promover as condições e os meios necessários para garantir o acesso e exercício dos direitos humanos, bem como, assegurar a participação ativa das pessoas com deficiências em todas as decisões e processos que lhe respeitam.

  7. Do artigo 29.º da Convenção decorre a obrigação de os Estados partes garantirem às pessoas com deficiência os direitos políticos e a oportunidade de os gozarem, em condições de igualdade com as demais pessoas, comprometendo-se, mormente a assegurar o direito a votarem e serem eleitas.

  8. O Regime Jurídico do Maior acompanhado foi aprovado à luz da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, adotando o novo paradigma que privilegia a dignidade inerente a todas as pessoas com deficiência.

  9. Nos termos do disposto no artigo 147.º do Código Civil, o exercício pelo acompanhado de direitos pessoais e a...

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