Acórdão nº 294/17.2T8VNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 28 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelJOÃO VENADE
Data da Resolução28 de Janeiro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 294/17.2T8VNG.P1.

* 1). Relatório.

B…, residente na Rua …, n.º .., …, …, Vila Nova de Gaia, propôs contra C…, S. A., com sede na Avenida …, n.º .., Lisboa, a presente Ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, alegando em síntese que: celebrou com a Ré, na qualidade de aderente, um contrato de seguro de vida grupo temporário anual renovável contributivo com data de 06/04/2006, titulado pela apólice ../…/……, figurando como pessoa segura/segurado a Autora, tomador de seguro Banco D…, SA e beneficiários em caso de morte os herdeiros legais; o capital garantido para ambos os riscos cobertos quer em caso de morte quer em caso de invalidez absoluta e definitiva é de 15.000 EUR; tem pago os prémios; exercia a profissão de auxiliar da ação escolar na Escola Secundária E…, em Vila Nova de Gaia; por atestado médico de incapacidade multiuso com data de 15/01/2014, foi-lhe conferida uma incapacidade permanente global de 95%; acionou a cobertura de invalidez, solicitando à Ré o pagamento do capital seguro o que a mesma declinou por carta de 09/09/2014 alegando que a Autora, «… à data de adesão ao seguro de vida a segurada era portadora de um quadro clínico suscetível de influenciar a verificação do risco», considerando o contrato nulo; não é correta essa afirmação pois padece de incapacidade (ao nível oftalmológico) de invalidez atestada com uma incapacidade permanente global de 95%; no âmbito do contrato de seguro em apreço nos autos, a Autora limitou-se a apor a sua assinatura numa Proposta de Subscrição que lhe foi presente pelo tomador de seguro (Banco D…, S.A.), através de um seu funcionário, por instruções da Ré seguradora; nessa proposta constava em letras minúsculas uma «Declaração de saúde» não tendo a Autora preenchido qualquer campo desse boletim de adesão, não tendo sido transmitida qualquer explicação quanto ao âmbito, conteúdo e regime de incumprimento do dever de declaração inicial do risco; assim, devem as cláusulas em causa ser excluídas; na data do seu preenchimento a Autora declarou tudo quanto sabia; a Ré aceitou o contrato em causa, pretendendo a sua manutenção ao aceitar o pagamento dos prémios sendo que se assim não fosse, existiria abuso de direito.

a incapacidade permanente global de 95% deve ser equiparado para efeitos de acionamento da cobertura MORTE; Termina pedindo a condenação da Ré a entregar à Autora o capital contratado de 15.000 EUR, acrescido de juros à taxa legal a contar da citação até efetivo e integral pagamento.

*Citada, contestou a Ré alegando em síntese que: à data de adesão ao seguro de vida, a Autora era portadora de quadro clínico suscetível de influenciar a verificação dos riscos cobertos pelo mesmo pois desde 2003 que era seguida por estrias angiogoides com atingimento macular num quadro de Pseudoxantoma Elasticam; tivesse a Ré tido acesso a essa informação e jamais teria celebrado o contrato de seguro; de acordo com o contrato entende-se que se verifica a invalidez absoluta e definitiva quando o Segurado/Pessoa Segura, em consequência de doença ou acidente, fica «total e definitivamente incapaz de exercer qualquer actividade lucrativa de acordo com os respetivos conhecimentos e aptidões e, simultaneamente, na obrigação de recorrer à assistência permanente de uma terceira pessoa para efectuar cumulativamente os atos elementares da vida corrente e/ou apresentar um grau de incapacidade igual ou superior a 85%, de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais»; impugna a restante factualidade.

*Procedeu-se à realização de audiência prévia, elaborando-se despacho saneador tabelar, come elenco do objeto da ação e temas de prova.

Realizado o julgamento, proferiu-se sentença onde se decidiu condenar a Ré nos pedidos formulados contra si.

*Inconformada, recorre a Ré apresentando as seguintes conclusões: «1. O objecto primordial do presente recurso é a veemente impugnação da decisão proferida quanto ao facto 14. dado como provado que se pretende que seja alterado, ao 15., igualmente provado, que se pretende que seja dado como não provado e às alíneas a) e b) dadas como não provadas e que se pretende que sejam dadas como provadas - atento o errado julgamento das mesmas.

  1. Previamente, não pode a Apelante deixar de exortar a este Tribunal que lance mão da possibilidade prevista no artigo 662.º CPC.

  2. Na verdade, este Tribunal fará um novo julgamento e que procurará a sua própria convicção, de forma autónoma, mediante a reapreciação de todos os elementos de prova disponíveis (mesmo que nem indicados pelas partes).

  3. O número 2 do artigo 662.º permite aos Tribunais da Relação, mesmo oficiosamente, que, entre outros poderes, ordenem, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova.

  4. Ora, uma interpretação conforme deste artigo com o artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa impõe que este Tribunal da Relação use dos poderes-deveres de que dispõe para se concretizar a almejada verdade material.

  5. Tanto mais que, ouvida a prova tal qual ela se encontra gravada (com a omissão da gravação de grande parte do depoimento da testemunha H…) deverá suscitar junto deste Tribunal a necessidade de produzir nova prova. Pois que, a prova (não) gravada, conjugada com a restante prova aponta num sentido diferente daquele que consta dos factos dados como não provados.

    Sem prejuízo, 7.Quanto ao facto 14. o Tribunal a quo entendeu que “a referida incapacidade inabilita a autora totalmente e de forma permanente para o exercício da profissão exercida ou de qualquer outra”.

  6. Fundamentando esta conclusão com base tão só na prova testemunhal produzida.

  7. Elementos/Prova que impõe decisão diversa: i) relatório pericial de 22.11.2018 (notificado às partes no dia 29.11.2018) e ii) esclarecimentos prestados em julgamento pelo senhor Perito Dr. F… (Declarações gravadas no Habillus Media Studio, no dia 27.03.2019, com início pelas 11:04:19 e fim de gravação pelas 11:16:51, mais concretamente aos minutos 04:40 a 07:30).

  8. Com efeito, o Tribunal a quo, porque entendeu que o prova deste facto 14. Estava dependente de conhecimentos técnicos ou científicos que nem o próprio Juiz os detinha, ordenou, e bem, a realização de prova pericial.

  9. Quer a perícia, quer os esclarecimentos do perito em julgamento foram ambos no sentido de que a Apelante reúne critérios para Invalidez Relativa para a profissão de auxiliar de acção educativa, mas já não reúne critérios de invalidez absoluta para toda e qualquer actividade profissional.

  10. Ora, sempre com o devido respeito, o Tribunal a quo depois de deferir a perícia, de lhe fixar um objecto, de analisar o seu conteúdo e de ouvir os esclarecimentos do Senhor Perito em julgamento, não podia, simplesmente, ignorar tal prova.

  11. E, muito menos, desconsiderá-la em detrimento da prova testemunhal que é, consabidamente, sujeita a maior risco de falibilidade e de parcialidade.

  12. Para prova deste facto 14. não há mais prova alguma, ainda que indiciária e que no seu conjunto com a prova testemunhal permita contrariar as conclusões da prova pericial.

  13. Assim sendo, no confronto da prova testemunhal com a prova pericial, esta terá de prevalecer.

  14. Em consequência, a resposta ao facto 14 deverá ser alterada passando a ser “a referida incapacidade inabilita a autora totalmente e de forma permanente para o exercício da profissão de auxiliar de acção educativa, mas já não para toda e qualquer actividade profissional”.

    Sem prescindir, 17. No facto 15 resultou provado que “a referida incapacidade também a limita nas atividades da vida diária, dependendo de modo continuo de terceiros para a grande maioria dessas tarefas, tais como comer, usar a casa de banho, arranjar-se, vestir-se, tomar banho, deambular, cozinhar”.

  15. Prova que impõe decisão diversa: i) relatório pericial de 22.11.2018 (notificado às partes no dia 29.11.2018) e ii) esclarecimentos prestados em julgamento pelo senhor Perito Dr. F… (supra identificado, mais concretamente ao minuto 03:20) 19. A propósito deste facto 15 repete-se a argumentação supra: sobre este facto foi realizada prova pericial; além da prova testemunhal não há mais prova alguma que, em conjunto com aquela, permita contrariar as conclusões da prova pericial. Donde, no confronto da prova testemunhal com a prova pericial, esta terá de prevalecer.

  16. Pelo que, o facto 15 deverá ser dado como não provado.

    Ainda sem prescindir, 21. De acordo com a sentença em crise não resultou provado que A autora era seguida, desde 2003, por estrias angiogoides com atingimento macular num quadro de pseudoxantoma elasticam.

  17. Prova que impõe decisão diversa: i) esclarecimentos prestados em julgamento pelo senhor Perito Dr. F… (supra identificado, mais concretamente aos minutos 09:44 a 10:12); ii) doc. 3 junto com a contestação e que consta da informação documental do relatório pericial de 22.11.2018 como sendo a declaração do serviço de oftalmologia datada de 12-08-2013; iii) doc. 5 junto com a contestação e que consta da informação documental do relatório pericial de 22.11.2018 como sendo declaração da Dra. G… datada de 06-03-2014; iv) depoimento da testemunha H… (citado nas alegações do Mandatário da Apelante, minutos 03:50 a 04:05, nas quais se refere sobre o que disse a testemunha H… e que explicou os motivos pelos quais entendia que a doença já estava diagnosticada); v)documentação clínica que foi junta pela própria Apelada no requerimento de 14.11.2017, mais concretamente o registo de consulta externa do Hospital I… que contém a anamese/registo de problemas com data de 04.04.2006; 23. Da conjugação dos esclarecimentos do perito (que afirma peremptoriamente que em 2003 foi diagnosticada uma alteração no olho da Apelada), da prova testemunhal (Dr. H…, citado nas alegações do Mandatário da Apelante, minutos 03:50 a 04:05, nas quais se refere que aquele explicou os motivos pelos quais entendia que a doença já estava diagnosticada) e da prova...

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