Acórdão nº 8621/17.6T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelCATARINA SERRA
Data da Resolução14 de Janeiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. RELATÓRIO 1.

AA, BB, CC e DD vêm intentar ação declarativa de condenação contra a BBVA Leasimo – Sociedade de Locação Financeira, S.A.

, formulando os seguintes pedidos: “-Deve a presente acção ser julgada provada e por isso procedente e, em consequência, condenar-se a R.

nos precisos termos; - Deve assim, declarar-se reconhecido o interesse dos AA., na realização da prestação; - Reconhecer-se que estão preenchidos os requisitos necessários à dedução da execução específica do contrato; - Reconhecer-se o “Direito de Retenção”, alegado e peticionado, para possibilitar a A., seu titular, à não entrega da coisa retida a quem a ela tenha direito, enquanto a R.

não cumprir a obrigação que tem para com ela; por outro, permitir-lhe, que em caso de venda do bem em execução, seja pago pelo seu valor atualizado, com preferência a qualquer outro credor do mesmo devedor que não disponha de privilégio imobiliário sobre ela.

- Deve ainda a Ré, ser condenada nos precisos termos, decretando o douto Tribunal sentença que produza imediatamente os efeitos da declaração negocial do faltoso, ou seja, o resultado prático do cumprimento, independentemente e mesmo contra a vontade da R., por via da execução específica, condenando-se a Ré, à celebração da escritura e ou transmitindo-se e registando-se a propriedade a favor da A; - Reconhecer-lhe o seu direito de propriedade inscrevendo-se tal direito no registo; - E em alternativa, e caso a execução específica do contrato nos termos do artigo 830.º do CC., não seja decretada, ser a Ré, condenada a restituir à A., a quantia recebida a título de pagamento total do preço, em dobro, sendo o valor atualizado e capitalizado à data do decretamento da sentença, acrescida de todas as despesas liquidadas pela A., no decurso do contrato, acrescido de juros legais desde a citação da R., até efetivo pagamento; - Deve ainda a R., ser condenada, a sanção pecuniária compulsória, isto é, ao pagamento de um valor diário, a fixar pelo tribunal, nos termos do artigo 384 nº2 do CPC e 829-A do CC., segundo critérios de razoabilidade, a título de sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso no pagamento e ou no cumprimento do que vier a ser condenada; - Deve a R., ser condenada ao pagamento de custas judicias, custas de parte e procuradoria, bem como, honorários de advogado nos termos do regulamento do código das custas judiciais; - E porque o A., já liquidou a totalidade do preço, deverá ficar isenta de prestar depósito do preço; - Deve ainda a presente acção ser registada oficiosamente, pelo funcionário judicial, conforme preceitua a lei Registral; - Deve ainda ser a Ré condenada a realizar todas as diligências necessárias com vista à emissão de todos os documentos necessários à realização da escritura, designadamente, licenças de utilização, certificado energético e todos e quaisquer documentos que se manifestam necessários e imprescindíveis à realização da mesma, devendo ser condenada ainda, ao pagamento de todas as despesas inerentes à obtenção dos respetivos documentos, bem como, às despesas da escritura e todos os emolumentos a que haja lugar, como forma de compensação pela mora em que incorre.” Alegam, em síntese, para fundamentar o seu pedido que, em 14.02.1995, a 1.ª autora celebrou com a ré um contrato de locação financeira que teve por objeto a fracção “…” correspondente à loja n.º … do prédio urbano sito na Rua dos …, n.º … , … e …, freguesia de …., por força do qual prometeram simultaneamente comprar e vender o referido imóvel, decorridos que fossem três meses do términus do prazo de duração do contrato conforme cláusula 20.ª, n.º 1, do contrato. O contrato terminou em 14.02.2005 e a escritura de compra e venda nunca se realizou, não obstante as manifestações de vontade por parte da autora, por a ré não se mostrar disponível invocando falta de licença de utilização. A autora cumpriu todas as obrigações contratuais a que se vinculou, liquidou e continua a liquidar todos os impostos referentes ao imóvel bem como as despesas com seguro e condomínio.

  1. Regularmente citada, a ré veio contestar, concluindo a final pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.

    Alega que inexiste qualquer incumprimento culposo da sua parte e que também pretende celebrar o contrato de compra e venda, apenas não o fazendo por impossibilidade do seu cumprimento. Refere que a loja objeto do contrato de leasing se insere num centro comercial desde há muito encerrado ao público já que a CM…. não emite licenças de utilização do imóvel por não se mostrarem concluídas obras constantes da licença de obras n.º … que eram da responsabilidade do promotor – L……. imobiliária, Lda. Esta situação de falta de licença camarária, por falta de realização de obras nas zonas comuns do edifício mantém-se hoje, facto do qual os autores têm conhecimento. No que respeita ao pedido alternativo formulado, refere que os autores não indicam quais os valores despendidos, sendo, por isso, um pedido ilíquido; que o contrato dos autos não é um contrato promessa desde logo porque a ré não estava obrigado a vender nem a autora obrigada a compra e porque a autora beneficiou desde o inicio do contrato do gozo da loja, o que não podem pretender ter feito gratuitamente, exigindo o pagamento de todas as quantias que lhe foram entregues.

  2. Os autores apresentaram articulado de resposta no qual requereram ainda a condenação da ré como litigante de má-fé.

  3. A ré respondeu, afirmando a inadmissibilidade da resposta apresentada e pugnando pela improcedência do pedido de condenação como litigante de má fé.

  4. Realizou-se audiência prévia, elaborou-se despacho saneador, procedeu-se a julgamento e foi, por fim, proferida a sentença com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, e sem necessidade de maiores considerações decido: 1. Julgar a presente acção parcialmente procedente por parcialmente provada e consequentemente condenar a R. a pagar aos AA. a quantia de 946,83€ (novecentos e quarenta e seis euros), acrescida de juros à taxa legal desde a citação até integral pagamento.

  5. Absolver a R. do pedido de condenação como litigante de má-fé.

    Custas por A. e R. na proporção do respectivo decaimento.

    Notifique e registe”.

  6. Não se conformando, interpuseram os autores recurso de apelação.

  7. Em 21.05.2020 proferiu o Tribunal da Relação de Lisboa um Acórdão em cujo dispositivo pode ler-se: “Em face do exposto, julga-se o recurso intentado pelos AA. parcialmente procedente, alterando-se a decisão recorrida e nos termos do art.º 609.º n.º 2 do CPC condena-se o R. a pagar aos AA. a quantia que até ao montante máximo que foi peticionado vier a ser liquidada como contrapartida da prestação por eles realizada no âmbito do contrato de locação financeira celebrado que o R. está impossibilitado de cumprir, de acordo com as regras do instituto do enriquecimento sem causa, levando em linha de conta os parâmetros enunciados na presente decisão, sem prejuízo de poderem ser considerados outros factos relevantes, para além dos enunciados e mantendo-se a decisão que absolveu o R. da condenação como litigante de má fé.

    Custas da ação e do recurso por ambas as partes provisoriamente na proporção de metade para cada uma, a corrigir posteriormente em função do resultado da liquidação.

    Notifique”.

  8. Não se resignando, vem agora BBVA Leasimo – Sociedade de Locação Financeira, S.A.

    interpor recurso de revista, ao abrigo do artigo 671.º do CPC, pugnando pela revogação do Acórdão.

    A finalizar as suas alegações, enuncia as seguintes conclusões: “i. O Acórdão a quo não poderá manter-se, pois parte de uma incorreta aplicação do regime do enriquecimento sem causa e apreciação do direito aplicável, nomeadamente com o ónus de alegação e prova do mesmo.

    ii. O presente recurso é interposto nos termos do disposto nos artigos 671.º e 674.º n.º1 alínea a) do Código de Processo Civil (doravante CPC) e assenta no erro de interpretação e de aplicação das normas aplicáveis (artigos 795.º, n.º 1, 473.º e 479.º do Código Civil (doravante CC) e regime do contrato de locação financeira – nomeadamente o artigo 1º do DL 149/95 de 24 de junho), o que, por sua vez, motivou a errada determinação da indemnização a atribuir aos ora Recorridos.

    iii. O regime do enriquecimento sem causa, nos termos do artigo 473.º do CC, fixa os seguintes pressupostos...

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