Acórdão nº 00329/05.1BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Janeiro de 2021
Magistrado Responsável | Ros |
Data da Resolução | 28 de Janeiro de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. O Exmo.
Representante da Fazenda Pública vem recorrer da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela em 28.02.2014, pela qual foi julgada procedente a impugnação judicial que R., Lda., deduziu contra as liquidações de IRC dos anos de 2001, 2002 e 2003, cuja matéria coletável foi apurada através de métodos indiretos.
1.2. O Recorrente terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: “A-) Ao remeter-se, na factualidade dada como provada, para o relatório de inspecção tributária (que ali se dá por reproduzido), com destaque para o Grupo IV do mesmo, aí expressamente transcrito, e do relatório constando a factualidade suficiente à especificação, motivação, e percurso cognoscitivo e valorativo conducente ao juízo legitimador da impossibilidade de determinação directa e exacta da matéria tributável, e atenta a dimensão e relevância da mesma, a douta sentença recorrida faz Errónea interpretação dos factos constantes do relatório e concomitante e indissociável Errónea Valoração da factualidade dada como Provada ao concluir, com base nos preditos factos, em sentido contrário B-) A fundamentação de facto e de direito da douta sentença recorrida faz Errónea interpretação dos factos constantes do relatório e concomitante e indissociável Errónea Valoração da factualidade dada como Provada, já que a AT procurou demonstrar, e demonstrou com base no relatório de inspecção tributária da verificação dos pressupostos legais vinculativos da actuação da AT (aplicação de métodos indiciários), enunciando a fundamentação formal e material, de facto e de direito, para o efeito, e, designadamente, atenta a falha imputada à AT pela douta sentença recorrida, a especificação, a motivação, e o percurso cognoscitivo e valorativo conducente ao juízo legitimador da impossibilidade de determinação directa e exacta da matéria tributável, que não apenas dos erros/irregularidades contabilísticos C-) Também Erro de Julgamento da matéria de facto e de direito face à inconsideração, na fundamentação de facto e de direito da douta sentença em crise, de factualidade susceptível de suportar o juízo de impossibilidade de determinação directa e exacta da matéria tributável D-) Erro de Julgamento da matéria de facto e de direito que se traduz, no caso dos autos, pelo julgamento errado feito pelo Tribunal a quo quando, de um total de 12 erros contabilísticos confirmados em sede inspectiva e devidamente descritos e fundamentados no RIT, omite 4 deles os referidos no art. 30º supra, não se pronunciando, nem analisando os mesmos, quando estes se revelam determinantes para o Julgamento em causa E-) Erro de Julgamento da matéria de facto e de direito também, pelo julgamento errado feito pelo Tribunal a quo quando, dos 12 erros contabilísticos avalia cada um isoladamente, não os considerando em conjunto, já que uma coisa é avaliar os erros isoladamente, o que desmerece o conjunto, outra é sopesá-los no todo, para então, na unidade de pensamento daí decorrente fazer a avaliação final, por representarem uma relevância e contributo diferente no juízo final a fazer F-) Erro de Julgamento da matéria de facto e de direito porquanto, a fundamentação de direito da douta sentença preocupa-se apenas em desmontar os erros contabilísticos apontados pela AT, mas esquece se aqueles erros, se restringem a isso mesmo, sem mais, ou se vão mais além, omitindo a avaliação quanto aos aspectos reveladores de um juízo de insustentabilidade de idoneidade e credibilidade da escrita contabilística da recorrido, designadamente quanto aos factos referidos nos arts. 22º, 24º, 25º, 27º, e 34º a 38º supra, G-) Erro de Julgamento da matéria de facto e de direito, especificamente quanto aos factos referidos nos arts. 19º e 39º supra por desconsiderar da obrigatoriedade de inventariação das existências nas contas 35 e 36, no Inventário do Imobilizado da empresa/recorrida, e quanto aos arts. 25º, 34º a 36º quanto à omissão de registo de compras, por desconsiderar da razão da falta de facturação- realização de trabalhos e prestação de serviços estranhos ao objecto social da empresa 51º H-) Erro de Julgamento da matéria de facto e de direito por último, pela desconsideração absoluta da informação confessada pelo recorrido, em sede do exercício do direito de audição, nos termos do art. 60º do RCPIT, e citamos "...concordámos em fazer outros trabalhos de construção civil e aplicação de materiais que fogem ao nosso negócio, a pedido de alguns clientes. Em alguns casos até não chegou a haver coincidência com os trabalhos e materiais facturados e os efectivamente fornecidos. "-cfr. doc. 1 - fls. 43 do processo de inspecção (nº1 al. d) da exposição corporizadora do exercício do direito de audição) E ainda "...houve situações, nomeadamente ao abrigo do PROCOM que, por imposição dos respectivos clientes, mencionamos bens e serviços diferentes dos fornecidos na realidade." - cfr.doc. 1-fls. 44, 45 do processo de inspecção (nº 1 al. k) da exposição corporizadora do exercício do direito de audição) Termos em que, e nos melhores de Direito aplicáveis, deve: Conceder-se provimento ao presente recurso, e a Douta sentença recorrida ser revogada, Ser julgado válido, regular e legal, a aplicação de métodos indirectos na determinação da matéria tributável em sede de IRC referente aos exercícios de 2001, 2002 e 2003 E, bem assim, as correspectivas liquidações adicionais de IRC e juros compensatórios devidamente notificadas ao sujeito passivo/Recorrido Assim se fazendo inteira JUSTIÇA” 1.3. O Recorrido formulou as respetivas contra-alegações, terminando com as seguintes conclusões: “1ª: O Recorrido/Impugnante havia já apontado a falta de fundamentos ou motivos para a FP lançar mão dos métodos de avaliação indirecta.
-
: Em sua modesta opinião, não merece qualquer censura a fundamentação de facto e de direito expendida na douta sentença.
-
: A FP não logrou provar que as alegadas anomalias e incorrecções da contabilidade do Recorrido impediam ou inviabilizavam o apuramento da matéria tributável por quantificação directa e que o recurso aos métodos indirectos era a única forma de a determinar.
-
: Fê-lo separadamente e, para cada um deles apresentou fundamento bastante para desconsiderar a existência da irregularidade e/ou erro, ou; 5ª: Para concluir que, existindo, não afecta os demais exercícios (2002 e 2003) e não legitima – porque irrelevante - de forma alguma, o recurso aos métodos indiretos.
-
: Mais; como se diz na douta sentença e a FP escamoteia: “alguns dos fundamentos invocados pela Administração Tributária não contendem com a empresa em análise ou com a forma como a contabilidade está organizada, antes corporizam meras opiniões sobre questões de gestão que não só não legitimam o recurso a métodos indiretos como são exteriores ao âmbito de competências da Administração Tributária.” 7ª: Não se olvide a última e correcta conclusão extraída na douta sentença referente à impugnação do IVA no Proc. n.º 331/05.3 BEMDL também do TAF de Mirandela: que não é, de todo, irrelevante ou indiferente, apesar de a Recorrente a ela não fazer menção nas suas alegações.
-
: A AT fixou o lucro tributável em factos que não ocorreram o que tem como consequência a errada quantificação dos rendimentos do impugnante que se reflectiram no IVA a liquidar.
-
: O que se provou é diferente daquilo que a AT considerou no Relatório para proceder à liquidação oficiosa através da aplicação de métodos indirectos.
-
: Nomeadamente, foi dado como provado que o Impugnante não realizou nos anos em causa obras de carácter plurianual; exercendo a actividade de comércio de materiais de construção/prestação de serviços de construção civil, CAE – 52463, só esporadicamente vende materiais com aplicação e, atendendo às características dos mesmos, são de rápida e fácil colocação; no final do ano o Impugnante encerra o estabelecimento não deixando qualquer “obra” a meio; não é proprietário de veículos pesados; tem ao seu serviço três viaturas todo o terreno; tem veículos de transporte de mercadorias que estão ao seu serviço há mais de seis anos; e no exercício de 2003 apenas uma viatura foi amortizada e pela última vez, já que as restantes haviam sido amortizadas em anos anteriores.
-
: Assim, existe erro nos pressupostos de facto, porque o órgão administrativo se enganou quanto aos factos com base nos quais praticou o acto administrativo.
-
: Ora, os dois processos, apesar de fisicamente distintos, estão intimamente relacionados, sendo conexos porque, este é consequência do outro.
-
: Dito de outro modo; se inexiste fundamento para liquidar IVA à recorrida, o mesmo vale, mutatis mutandis e por consequência, quanto à liquidação de IRC.
NESTES TERMOS e nos melhores em direito aplicáveis que V.ª Ex.ª se dignará suprir, deve o presente recurso ser julgado improcedente, por não provado e, em consequência, mantida a douta sentença recorrida que anulou as liquidações impugnadas Com o que se fará a costumada JUSTIÇA!” 1.4. Os autos foram com vista ao Ministério Público junto deste Tribunal.
Dispensados os vistos legais, nos termos do artigo 657.º, n.º 4, do CPC, cumpre apreciar e decidir, pois que a tanto nada obsta.
-
DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Uma vez que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da Recorrente, cumpre apreciar e decidir se a sentença recorrida enferma dos erros de julgamento de facto e de direito que lhe vêm imputados.
-
FUNDAMENTAÇÃO 3.1. DE FACTO A decisão recorrida contém a seguinte fundamentação de facto: “III.1 – Factos Provados Com interesse para a decisão da causa consideram-se provados os seguintes factos: 1) Nos exercícios em apreço (2001 a 2003) a impugnante dedicava-se à venda de materiais de construção específicos, essencialmente de isolamento e tetos falsos; 2) A impugnante também aplicava...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO