Acórdão nº 1006/17.6BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 28 de Janeiro de 2021
Magistrado Responsável | CRISTINA FLORA |
Data da Resolução | 28 de Janeiro de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO C... C..., Ld.ª, com os demais sinais nos autos, vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou improcedente a IMPUGNAÇÃO Judicial por aquela deduzida, pedindo a anulação da liquidação adicional relativa a IRC e juros compensatórios, referentes ao exercício de 2010, no valor global de 115.630,43€.
A Recorrente apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões: «
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Salvo o devido respeito, a Recorrente discorda do julgamento da matéria de facto contido na douta sentença recorrida, ou seja, o Tribunal “a quo” efetuou um errado e incorreto julgamento da matéria de facto, dando como não provados factos em contradição com a prova testemunhal efetuada e com os demais documentos juntos aos autos.
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Ao dar como provados os nos pontos 4., 6., 8. e 9. do probatório, não poderá ser extraída a conclusão de que a “W...” não prestou os serviços que se encontram registados na contabilidade da ora Recorrente.
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O facto dado como não provado na alínea a) da douta sentença recorrida está em clara contradição com os mencionados factos provados, o que se extrai, além do mais, na seguinte afirmação “(..) a W... emitia uma nota de honorários e era realizada uma reunião com a impugnante para avaliação da execução dos trabalhos efectuados por aquela” – que constitui facto provado (ponto 8).
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A prova testemunhal que atesta a efetividade dos trabalhos prestados pela W... à Recorrente resulta do depoimento da testemunha L... (aos minutos 00:05:10 e seg., minuto 00:08:30 e seg., minuto 00:16:00 e seg., minuto 00:16:29 e seg., minuto 00:19:15 e seg., minuto 00:22:30 e seg., minuto 00:28:30 e seg. e minuto 00:30:00 e seg.) e da testemunha S... (aos minutos 00:49:55 e seg., minuto 00:53:00 e seg. e minuto 01:21:00 e seg.), e ainda do depoimento de I..., legal representante da sociedade “U..., Lda,” aos minutos 02:06:20 e seg. e minuto 02:08:47 e seg.
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Embora tenha sido confirmado pelas testemunhas L... e S... que havia algumas divergências quanto às horas faturadas pela W... alocadas a cada uma das ações desenvolvidas nos clientes, tal facto não é suficiente para afastar a materialidade e efetividade dos serviços prestados, apenas relevando para efeitos de quantificação dos serviços prestados.
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Divergência de quantificação que é consentânea com a correção de saldos efetuada a 31/12/2010, dada como facto provado no ponto 22 do probatório.
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Tendo em conta que não foram desconsideradas as declarações de parte por falta de isenção ou de rigor ou de imparcialidade notória, a douta sentença deveria ter tido em consideração tais declarações na sua íntegra, para efeitos de factos provados e não provados.
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Designadamente, deveriam ter sido valoradas as declarações de parte de J... entre os minutos 02:23:50 e 02:28:29; entre os minutos 02:29:15 e 02:31:15; entre os minutos 02:38:00 e 02:42:00, e ainda aos minutos 02:43:00 a 02:45:30.
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Da conjugação da análise crítica dos depoimentos das testemunhas, das declarações de parte e dos documentos 6-A a 6-I juntos à p.i., e face aos factos provados nos pontos 4., 6., 8. e 9. do probatória, resulta, que deveria ter sido considerado provado o seguinte facto: “A “W...” prestou os serviços que se encontram registados na contabilidade da Impugnante”.
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Face às declarações de parte prestadas por J..., aos minutos 02:4:30 a 02:50:00 (as quais, como supra se disse, não devem ser desconsideradas por não se lhe poder assacar indícios de inveracidade ou falta de rigor), conjugadas com os documentos 9 a 10 juntos com a p.i., impunham que fosse dado como provado o seguinte facto: “A sociedade “V... & L..., Lda.”, “V...” ou “R...” forneceu à Impugnante material publicitário, designadamente folhetos promocionais, flyers e brindes faturados nas faturas n.º 4757 e 4864.” K) A douta sentença recorrida deveria, ainda, ter dado como facto provado que: “C... prestou os serviços que se encontram registados na contabilidade da Impugnante.”.
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Por um lado, a valoração deste facto como não provado está em contradição com o facto provado no ponto 17 do probatório, e, por outro lado, foram desconsiderados os documentos 11 a 13 juntos à p.i., meios de prova estes aptos a confirmar este facto, sem ter sido apresentada motivação justificativa para esta omissão de aceitação/rejeição dos mesmos.
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O facto foi ainda provado pelo testemunho de V..., repre- sentante da sociedade “S..., Lda.” que identificou em concreto quais os produtos de design adquiridos à Recorrente, e da autoria dos mesmos por “R...” (aos minutos 01:52:42 a 01:57:00).
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Relevam também para a correta apreciação do facto as declarações credíveis e isentas de C..., atinentes a factos pessoais por si praticados em 2010, enquanto fornecedora da Recorrente, com a designação comercial de “R...”, aos minutos 03:02:50 e seg., minutos 03:03:40 e seg., sendo que das passagens dos minutos 03:08:03 a 03:09:00 resulta afastada a presunção errónea da AT de falta de estrutura empresarial, que serviu para fundamentar a correção fiscal, o que, claramente se conclui não ter suporte fáctico e, portanto, não corresponder à verdade.
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Acresce, também, considerar como meio de prova as declarações de parte de J... que asseveram os anteriores depoimentos (aos minutos 02:50:45 a 02:56:14).
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Em suma, a prova efetuada nos autos permite concluir, com certeza, que os serviços concretamente descritos foram efetivamente efetuados pela fornecedora C..., que usa o nome comercial “R...”, que foram objeto de contratação por parte dos clientes da Recorrente, nomeadamente da S... e que foram pagos, pelo menos, parcialmente.
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Em suma, as provas apresentadas pela Recorrente, sejam documentais sejam testemunhais, permitem aferir, por um lado, a materialidade e efetividade dos serviços e bens adquiridos e a sua essencialidade para a obtenção de rendimentos.
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Por outro lado, permite aferir a não responsabilidade da Recorrente relativamente ao comportamento fiscal dos seus fornecedores “W...” e “V... ou R...”.
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Por outro lado, quanto à fornecedora “C...” ilidiu-se a presunção de falta de estrutura empresarial para a realização dos serviços caindo por terra a fundamentação da AT para a correção fiscal.
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O TJUE tem vindo a produzir jurisprudência, em sede de IVA, no sentido em que a administração fiscal, para recusar a dedução, tem de demonstrar uma situação de fraude e a ausência de boa-fé por parte da empresa que adquiriu os bens em causa, e que esse direito à dedução não pode ser negado pelo facto do adquirente não possuir uma certificação documental de que o fornecedor/prestador de serviços dispunha dos bens em causa e estava em condições de os fornecer e tinha cumprido as suas obrigações de declaração e pagamento do imposto sobre o valor acrescentado.
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Logo, tal interpretação efetuada nas normas fiscais do IVA é passível de se adequar aos custos, suportados em sede de IRC.
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A douta sentença não entendeu que era exigível à AT a prova de que a adquirente dos serviços foi parte ativa do acordo simulatório do negócio ou de uma parte do negócio ou que atuou de forma negligente em relação à atuação que lhe é imposta pela lei e pelos costumes comerciais, contudo, tal posição, contradiz o entendimento da jurisprudência comunitária no que toca ao direito à dedução do IVA, e por maioria de razão, à dedução dos custos suportados com a aquisição de bens e serviços essenciais à obtenção do rendimento.
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Como ficou provado, a Recorrente adquiriu os serviços e bens dos identificados fornecedores e as faturas emitidas por estes titulam prestações de serviços e aquisição de bens efetivas, daí conclui-se ser ilegal a desconsideração dos custos suportados, o que significa que a douta decisão recorrida não poderá manter-se, devendo ser revogada e consequentemente anulada a liquidação de IRC e juros compensatórios, do ano de 2010.
Termos em que deve o presente recurso ser julga- do procedente e em consequência ser revogada a douta sentença recorrida, anulando-se a liquidação adicional de IRC e juros compensatórios, do ano de 2010.
Ou caso assim não se entenda, ser anulada a liquidação de IRC e JC, no ano de 2010, relativamente às correções de custos suportados com as aquisições de serviços aos fornecedores W... e C....» A Recorrida, FAZENDA PÚBLICA, devidamente notificada para o efeito, optou por não contra-alegar.
**** Foram os autos a vista da Magistrada do Ministério Público que emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
****Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
**** A questão invocada pela recorrente nas suas conclusões das alegações de recurso, que delimitam o objecto do mesmo, e que cumpre apreciar e decidir consiste em aferir se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de facto, porque deu como provado factos em contradição com a prova testemunhal efetuada e com as demais provas efetuadas nos autos.
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FUNDAMENTAÇÃO A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto: «1) A impugnante é uma sociedade comercial por quotas com o CAE 074900 – outras actividades de consultoria, científicas, técnicas e similares não especificadas, enquadrada no regime geral para efeitos de IRC e no regime normal trimestral para efeitos de IVA (relatório de inspecção tributária a fls. 159 do processo administrativo).
2) No âmbito da sua actividade comercial, em 21/12/2009, a impugnante celebrou, com a sociedade “E... – C..., Lda.” (E...), um contrato denominado de prestação de serviços, segundo o qual aquela obrigava-se a prestar, a partir de 01/01/2010, junto dos clientes angariados, serviços de consultoria nas áreas da qualidade, segurança e saúde no trabalho e ambiente, mediante o pagamento do valor estabelecido em proposta/orçamento, a elaborar caso a caso, na medida das necessidades e especificidades das entidades designadas...
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