Acórdão nº 00945/20.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 22 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelHelena Canelas
Data da Resolução22 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I. RELATÓRIO J.

(devidamente identificado nos autos) requerente no processo cautelar que instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto contra a ORDEM DOS ADVOGADOS - no qual requereu a decretação de providência cautelar de suspensão de eficácia do ato que lhe aplicou a pena disciplinar de suspensão pelo período de dois anos – inconformado com a sentença de 19/07/2020 (fls. 7712 SITAF) que a indeferiu, dela interpôs o presente recurso de apelação (fls. 7792 SITAF), formulando as seguintes conclusões, nos seguintes termos: 1ª O recorrente não se conforma com a sentença recorrida, por considerar que não é justa face às questões que suscitou na petição inicial e também não ficou juridicamente convencido.

  1. Com efeito entende o Recorrente que o Tribunal Recorrido errou no seu processo mental.

  2. Nos presentes autos não está só em causa, saber em abstracto e de direito, se um trabalhador, designadamente o Recorrente, que advoga num serviço público ao abrigo de um contrato individual de trabalho, em regime de não exclusividade, está, ou não, abrangido pelos diferentes regimes de impedimentos consagrados nos sucessivos estatutos da Ordem dos Advogados, sem atentar com seriedade e objetividade na ressalva de que a pretensa imposição só surgiu posterior e supervenientemente, por via legislativa, após a celebração do contrato de trabalho do Recorrente com o Instituto de Segurança Social, IP, com a alteração do Estatuto da Ordem de Advogados em 2005 (26-01-2005).

  3. A questão a saber e a discernir nos presentes autos é a suspensão de uma decisão da entidade recorrida, por não ter respeitado nos articulados do Recorrente e no processo disciplinar que lhe foi movido, os formalismos legais, designadamente da apreciação das nulidades invocadas.

  4. Com efeito, trata-se de erro de julgamento, porquanto o Tribunal Recorrido não sindicou a decisão da Ordem dos Advogados, proferindo uma decisão tabelar, sendo certo que se lhe impunha apreciar e julgar os factos alegados pelo Recorrente, as nulidades e irregularidades invocadas que inquinam a decisão da entidade recorrida.

  5. Ao invés, a sentença recorrida limitou-se a aderir à tese da Ordem dos Advogados, não apreciando a matéria de facto e de direito, alegada pelo Recorrente na sua petição inicial.

  6. O Tribunal Recorrido não se pronunciou sobre as questões que obrigatoriamente tinha que apreciar.

  7. A sentença recorrida está assim inquinada com a nulidade de prevista na alínea d), nº 1, do Art. 615º do CPC.

  8. E também o Tribunal Recorrido não respeitou o comando normativo inserto no Artigo 608º, nº 2 do CPC, que prescreve que o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação.

  9. O Tribunal recorrido interpretou e aplicou erradamente o disposto no artigo 120º do CPTA, norma que consideramos ter sido violada.

  10. Não tem qualquer sentido deixar de resolver as questões com a justificação dada na sentença a folhas 49, que citamos: “É consabido que a abordagem destas ilegalidades deve, nesta instância cautelar, ser meramente perfunctória, de modo a não substituir, ou afetar, a liberdade de julgamento em sede de processo principal, é ai, na acção administrativa de impugnação, que tais ilegalidades deverão ser analisadas com o requerido pormenor”.

  11. Ao contrário da conclusão tirada pelo tribunal recorrido, face à matéria de facto e de direito alegada na petição inicial do recorrente é legítimo concluir que se verifica o fumus boni iuris pelo que se impunha o deferimento da pretensão cautelar.

  12. Pela sua relevância, designadamente na parte atinente à subsunção da matéria de facto ao direito aplicável, remete-se para os pontos III-a) e III-b) do corpo das alegações, dando-se aqui como integralmente reproduzida.

  13. Face à matéria de facto alegada pelo Recorrente na sua petição inicial, o Tribunal Recorrido devia consignar na sentença como factos provados, porém e se assim o não entendesse deveria também consigná-los como não provados, tal como impõe o n.º 4 do Art. 607º do CPC, não o fazendo, a sentença violou a referida norma.

  14. A sentença recorrida fez uma errada subsunção dos factos ao direito, porquanto os factos citados suportam positivamente o juízo de fumus boni iuris necessário à procedência da providência cautelar.

  15. O tribunal recorrido interpretou e aplicou erradamente o disposto no artigo 120º do CPTA, norma que consideramos sido violada.

17º O tribunal recorrido violou também as seguintes normas jurídicas: artigo 607º, nº 4, artigo 608º, nº 2 e alínea d), do nº 1, do artigo 615 do CPC; artigos 3º, 7º e 8º do CPA e ainda nos artigos 20º, nºs 4 e 5, 18º, nº 2 e 12º, nº 2 da Constituição da República Portuguesa, incorrendo do mesmo modo em violação dos princípios do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva em prazo razoável, da legalidade, da justiça e da razoabilidade, da proporcionalidade e universalidade, e da confiança e segurança jurídicas.

O recorrido contra-alegou (fls. 7852 SITAF) pugnando pela improcedência do recurso, com manutenção da sentença recorrida, formulando o seguinte quadro conclusivo, nos seguintes termos: 1. O dever de fundamentar as decisões impõe-se por razões de ordem substancial, cabendo ao juiz demonstrar que, da norma geral e abstrata, soube extrair a disciplina ajustada ao caso concreto permitindo às partes conhecer os motivos da decisão a fim de, podendo, a impugnar; 2. De facto, só a absoluta falta de fundamentação e não a sua insuficiência, mediocridade ou erroneidade, integra a nulidade por falta de fundamentação desenhada na al. b) do n.º 1 do artigo 615.º do NCPC, cabendo o putativo desacerto da decisão no campo do erro de julgamento; 3.

In casu, a douta sentença recorrida mostra-se devidamente fundamentada, apresentando, no que agora releva, a descrição fáctica considerada pertinente e a correspondente subsunção jurídica; 4. Não ocorre, por conseguinte, a invocada causa de nulidade por falta de fundamentação, pelo que deve improceder tal alegação; 5. Quanto à nulidade consagrada na alínea d) da referida norma que nos remete diretamente para o dever consagrado no artigo 608º do Código de Processo Civil, importa referir que estamos perante uns autos de suspensão de eficácia, de natureza cautelar em que ao Juiz se impõe, em momento anterior à apreciação do mérito da causa, a necessidade de verificar se estão reunidos os requisitos essências para decretar a providência cautelar; 6. Em sede de tutela cautelar, a apreciação de cada um dos referidos requisitos obedece naturalmente a um mero juízo de verosimilhança que não se confunde e prejudica o juízo que venha a ser feito no âmbito do processo principal; 7. A falta de um qualquer dos requisitos cumulativos de que depende o decretamento da providência implica que fique prejudicada a apreciação dos demais requisitos ou até dos demais argumentos apresentados; 8. Verifica-se que entendeu o Tribunal a quo não estar verificado o requisito de Fumus bonis iuris, pelo que indeferiu a providência requerida e ao indeferi-la ficou prejudicada a apreciação dos demais requisitos e dos demais argumentos apresentados pelo Requerente; 9. Não se verifica, assim, qualquer Nulidade nos termos em que esta vem desenhada na alínea d) do artigo 615º do Código do Processo Civil, pelo que deverá improceder tal alegação; 10. O requisito do fumus boni iuris, na formulação positiva, obriga a um juízo positivo de probabilidade através da “intensificação da cognição cautelar”, ou seja, duma “apreciação mais profunda e intensa da causa”; 11. A apreciação judicial sobre a probabilidade da procedência da pretensão formulada no processo principal deve ser feita em moldes de summario cognitio, materializada num juízo de verosimilhança ou mera previsibilidade e razoabilidade dos indícios, que permita ao tribunal acreditar na probabilidade do êxito da pretensão principal; 12. Designadamente, verificar-se-á o critério referenciado quando a ilegalidade do ato a suspender resulte de forma clara dos autos, sem necessidade de mais provas, ou, por outras palavras, quando se esteja perante uma ilegalidade evidente; 13. O ato impugnado não padece de qualquer nulidade, sendo que todas as questões ora levantadas já foram debatidas, contraditadas e decididas no processo disciplinar ora posto em crise; 14. A nulidade é uma medida extrema, a última ratio, devendo ser utilizada e alegada com a cautela devida sob pena de banalizar os seus efeitos; 15. Não existe qualquer direito adquirido no caso do Requerente, o que existe é uma situação deontologicamente desconforme, de manifesta e patente incompatibilidade que não permite qualquer aquisição de direito ou garantia de manutenção futura de uma situação que permanece contrária às sucessivas normas estatutárias; 16. Do exposto resulta que a pretensão do Requerente veiculada nos presentes autos carece de qualquer fundamento legal e que não se verifica o segundo requisito para decretação da providência ora requerida, por inexistência da aparência do bom direito “Fumus Bonis Iuris; 17. Efetivamente são manifestamente aplicáveis ao Requerente as incompatibilidades previstas no artigo 81º da Lei nº 15/2005 de 25/01 e no artº. 86º da Lei nº 145/2015 de 9/09; 18.Mas mesmo que assim não se entendesse sempre teríamos de concluir pela não verificação do terceiro requisito previsto no art.º 120º.º, n.º 2 do CPTA segundo o qual “a adoção da providência ou das providências é recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências”; 19. O exercício da advocacia é passível de comprometer os interesses públicos prosseguidos pela Ordem dos Advogados, enquanto associação pública que atua na defesa dos seus associados e do Estado de Direito...

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