Acórdão nº 13512/18.0T8LSB.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelCHAMBEL MOURISCO
Data da Resolução13 de Janeiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n.º 13512/18.0T8LSB.L1.S2 (Revista excecional) - 4ª Secção Acordam na formação a que se refere o n.º 3 do artigo 672.º do Código de Processo Civil da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA, Autora no processo em que é Ré a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, veio interpor recurso de Revista Excecional, invocando que o Acórdão recorrido está em contradição com o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no âmbito do Processo número 388/18.7T8PDL.L1-4, datado de 07/11/2018.

  1. Foi proferido despacho liminar, no qual se considerou: que o recurso é tempestivo; que a recorrente tem legitimidade; que se verificam os requisitos do valor da ação e da sucumbência e ainda a existência de dupla conforme.

  2. Distribuído o processo a esta formação, cumpre indagar se estão preenchidos os pressupostos para a admissibilidade da revista excecional referidos na alínea c) do n.º 1 do artigo 672.º do Código de Processo Civil.

    A revista excecional é um verdadeiro recurso de revista concebido para as situações em que ocorra uma situação de dupla conforme, nos termos do artigo 671.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.

    A admissão do recurso de revista, pela via da revista excecional, não tem por fim a resolução do litígio entre as partes, visando antes salvaguardar a estabilidade do sistema jurídico globalmente considerado e a normalidade do processo de aplicação do Direito.

    Assim, só é possível a admissão do recurso pela via da revista excecional se estiverem preenchidos os pressupostos gerais de admissão do recurso de revista e se esta não for possível pela existência da aludida situação de dupla conforme.

    Nos presentes autos, como resulta do despacho liminar estão preenchidos os pressupostos gerais de admissibilidade do recurso decorrentes do artigo 629.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, sendo certo que a decisão recorrida confirmou, sem mais, a decisão proferida pela 1.ª instância, pelo que estamos perante uma situação de dupla conforme, nos termos do n.º 3 do artigo 671.º do Código de Processo Civil.

  3. A recorrente, como fundamento da admissão do recurso de revista excecional, invocou que o Acórdão recorrido está em contradição com o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no âmbito do Processo número 388/18.7T8PDL.L1-4, datado de 07/11/2018, tendo para o efeito formulado as seguintes conclusões:

    1. A primeira instância ao declarar que entre as partes foi, efetivamente, firmado um Contrato de Prestação de Serviços e não um Contrato de Trabalho, como se impunha, não teve em atenção toda a prova produzida, quer seja documental quer seja testemunhal; b) Da análise da prova resulta claro a existência de indícios suficientes para caraterizar o contrato celebrado entre a Recorrente e a Recorrida como uma Contrato de Trabalho e não um mero Contrato de Prestação de Serviços; c) Ficou provado, quer na primeira instância quer na relação que a Recorrente tinha um determinado horário de trabalho; d) Que obedecia a ordens superiores; e) Que tinha de dar pré-aviso bem como justificar as suas ausências; f) Que exercia as suas funções nas instalações da Recorrida ou em qualquer outro local por esta previamente definido; g) Que gozava 22 dias de férias; h) Que recebia uma determinada retribuição mensal fixa; i) Face a esta situação não se perceciona o motivo para enquadrar o contrato celebrado como Contrato de Prestação de Serviços e não como Contrato de Trabalho; j) Acresce que, pelo mesmo Tribunal da Relação de Lisboa foi proferido Acórdão em sentido contrário relativamente a esta mesma questão (Ac. TRL proferido no âmbito do Processo nº388/18.7PDL.L1-4, datado de 07/11/2018 e disponível para consulta em http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/46f0 28aaa918361680258345004f8669?OpenDocument) k) Face ao exposto não pode nem deve a Recorrente conformar-se com a decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa, devendo para tanto ser dado provimento ao presente recurso revogando-se o Acórdão proferido e sendo considerado como Contrato de Trabalho o contrato celebrado entre a Recorrente e a Recorrida, fazendo-se assim a costumada justiça.

  4. A parte contrária pronunciou-se pela rejeição da admissão da revista excecional.

  5. Cumpre apreciar e decidir: Como já se referiu, o fundamento invocado para a admissão do recurso de revista excecional é a contradição entre o acórdão recorrido e o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 07/11/2018, proferido no âmbito do Processo número 388/18.7T8PDL.L1-4, com previsão no artigo 672.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil, que refere o seguinte: 1 - Excecionalmente, cabe recurso de revista do acórdão da Relação referido no n.º 3 do artigo anterior quando: … c) O acórdão da Relação esteja em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido por qualquer Relação ou pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme.

    Relativamente a este fundamento, o art.º 672.º, n.º 2, alínea c), do CPC, dispõe que o requerente deve indicar, na sua alegação, sob pena de rejeição os aspetos de identidade que determinam a contradição alegada, juntando cópia do acórdão-fundamento com o qual o acórdão recorrido se encontra em oposição.

    Tendo já sido transcritas as conclusões da recorrente vejamos a sua alegação no que concerne aos aspetos de identidade entre acórdão recorrido e acórdão-fundamento que na sua perspetiva determinam a alegada contradição: 11.Mas mais, além de se tratar de uma decisão que, no entender da Requerente, padece de uma deficiente análise e interpretação de toda a prova produzida, verifica-se que, em 07/11/2018, foi proferido Acórdão pelo mesmo Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito do Processo n.º 388/18.7T8PDL.L1-4, em sentido oposto ao assumido agora no presente processo.

  6. O Acórdão supramencionado incide sobre a mesma matéria, embora tenha obtido a final uma conclusão contrária à que ora se recorre.

  7. No Acórdão, a Trabalhadora que havia sido contratada para desempenhar a função de prestadora de cuidados domiciliários (a mesma função desempenhada pela ora Recorrente e para a qual foi contratada), viu o contrato celebrado com a entidade patronal ser caracterizado como Contrato de Trabalho e não como Contrato de Prestação de Serviços tendo em consequência de tal facto sido declarada a ilicitude do despedimento da mesma. 14.Nesse seguimento não se alcança o sentido de no presente processo, estando em causa uma Trabalhadora que foi contratada para exercer a mesma atividade de prestadora de cuidados domiciliários tenha visto o seu contrato ser reduzido a um mero Contrato de Prestação de Serviços e não como Contrato de Trabalho como se impunha uma vez que se verificou existir vários elementos caraterizadores deste tipo de contrato.

    Temos assim que a alegada contradição foi equacionada pela recorrente tendo por base o facto de as duas Autoras terem sido contratadas para desempenharem funções de prestadoras de cuidados domiciliários e, perante a mesma matéria fáctica, o acórdão recorrido ter considerado que a relação constituída enquadra-se num contrato de prestação de serviço, enquanto o acórdão-fundamento considerou que existia um contrato de trabalho. No acórdão recorrido foi considerada a seguinte matéria de facto:

    1. Em 01/10/1999, autora e ré celebraram o contrato que denominaram de “Contrato de Prestação de Serviços de Ajudante Familiar”, cuja cópia consta de fls. 10 e v. dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida.

    2. A autora começou por desempenhar funções no Centro Social ….. e posteriormente na unidade de acompanhamento terapêutico, Centro de S….., equipamento destinado ao atendimento acompanhamento e prestação de cuidados de saúde a pessoas com situação social, familiar e económica precária, a qual integra, entre as suas valências, o apoio domiciliário.

    3. A partir de março do ano de 2016, a autora passou a desempenhar funções na Unidade ….. - unidade de apoio à população vulnerável ….., desempenhando funções no………, apoiando na prestação de serviços de higiene pessoal dos utentes.

    4. A ré atribuiu à autora o número mecanográfico …....

    5. E incluiu-a nas apólices de seguros.

    6. A autora usufruiu do “Apoio Social prestado aos trabalhadores” da Santa Casa da Misericórdia, pedindo e sendo-lhe concedidos subsídios reembolsáveis que depois eram devolvidos em prestações mensais, tendo a autora autorizado que a ré procedesse à dedução na respetiva remuneração mensal.

    7. A autora cumpria o horário das 9,00 horas às 17,00 horas, de 2.ª a 6.ª feira.

    8. Mensalmente a autora recebia da ré a mesma quantia mensal, durante 12 meses ao ano, que foi sendo atualizada.

    9. A autora foi ressarcida pela ré das despesas de transporte despendidos na execução das suas funções.

    10. A autora gozou 22 dias de férias, anualmente.

    11. Em 17/03/2017, autora e ré celebraram o contrato de...

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