Acórdão nº 428/12.3BEALM de Tribunal Central Administrativo Sul, 21 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução21 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO E.......

, devidamente identificada nos autos, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, datada de 07/06/2018, que no âmbito da ação administrativa especial de impugnação de ato administrativo, instaurada contra a Ordem dos Advogados, julgou a ação improcedente, mantendo o acórdão do Conselho Superior, de aplicação da pena disciplinar de censura.

* Formula a aqui Recorrente nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que infra e na íntegra se reproduzem: “A. A aqui Recorrente informou a Participante do Processo Disciplinar, que iria contestar ação de honorários, proposta pela referida Participante, contra o ex-marido da sua filha, o Senhor N........

B. A Advogada do Senhor N......., desde 2005, sempre foi a Dra. E......., aqui A./Recorrente (a este propósito rememore-se o ponto oito dos factos provados do Acórdão do Conselho Superior da R. e ainda a tabela inserta no articulado da A. de 2012/11/26, item n.º 11, que aqui se dá por integralmente reproduzido) e portanto, se a Participante, Dra. M......., intenta ação contra o Senhor N......., seguramente, seria a sua Advogada, Dra. E......., quem poderia deduzir Contestação.

C. Acresce a isto o facto de, em 2006/01/24, a A. ter dirigido fax para o escritório da Participante, Dra. M......., relativamente à ação de honorários, informando que iria contestar a ação de honorários e requerer a intervenção principal do Exmo. Sr. Dr. J.......

D. Destes dois factos, não controvertidos nestes autos, forçoso é concluir, até pelas regras de experiência comum, que a Dra. M....... sabia que a A. ia contestar a ação de honorários que aquela interpusera.

E. Destarte, a A./Recorrente cumpriu assim o dever previsto no art.º 91º. do E.O.A., estando completamente salvaguardados os deveres que a ratio do artigo prevê com o envio da comunicação remetida em 24.01.2006 para o escritório da participante: “deveres de solidariedade, cordialidade, urbanidade e honorabilidade”, assim como a “possibilidade de trocar esclarecimentos e explicações…” (cfr. pág. 29 do acórdão do Conselho de Deontologia do Conselho Distrital de Évora da Ordem dos Advogados).

F. Sem conceder quanto ao supra exposto e mesmo que se entendesse que a Participante do processo disciplinar não foi notificada previamente, o que não se aceita, mas que à cautela se verte, necessário se torna salientar que, em sede de contestação, não há lugar ao cumprimento do disposto neste artigo.

G. A obrigação decorrente do art.º 91º. dos E.O.A. não abrange o caso da subscrição de um articulado de contestação, mas apenas o acto de iniciativa judicial. Ora, neste caso, a acção estava já proposta e proposta pela Participante.

H. Na verdade, a interpretação operada pela R. do art.º 91.º do EOA, no sentido adoptado, quando confrontada com o princípio da subsidiariedade (ou princípio da máxima restrição das penas) e princípio da proporcionalidade, bem como com o respeito, em geral, pelos direitos, liberdades e garantias, que a Constituição da República consagra, mostra-se inconstitucional, ultrapassando os limites imanentes consagrados no n.º 2 do art.º 18.º da CRP.

I. Deverá ser declarada, por esta razão, a Inconstitucionalidade Material do art.º 91.º do EOA, quando interpretado no sentido de abarcar o dever de comunicação, no caso específico da dedução de Contestação, por violação dos princípios supra elencados, questão que expressamente se coloca à consideração deste Tribunal, solicitando-se a sua pronúncia, até para efeitos do art.º 70.º da Lei do Tribunal Constitucional.

J. Paralelamente, refira-se que o art.º 110.º do EOA apenas considera como infração disciplinar a ação ou omissão dolosa ou culposa, salientando-se que estamos perante um caso em que se operou uma mudança legislativa, com a entrada em vigor do novo EOA, em 2005.

K. Dos autos, nada permite concluir, com segurança (ou até mesmo indiciariamente), que a A./Recorrente agiu de forma dolosa ou com culpa, o que sai reforçado pelo facto de em causa estar uma omissão, cujos requisitos para a verificação de responsabilidade disciplinar, são mais exigentes.

L. Desta forma, inexistindo quaisquer factos que evidenciem a existência do elemento volitivo pela aqui A. (lembre-se que a A. até avisou o colega de escritório (e marido) daquela, de que iria contestar e nessa contestação suscitar a intervenção deste último.

M. Salvo superior entendimento, a conclusão plasmada pela R., no acto administrativo aqui impugnado, acerca da alegada culpa da A., excede claramente os limites do art.º 351.º do Código Civil – regras de experiência comum – já que não será da exposição e debate argumentativo em sede de peças processuais que se aquilatará do íntimo da A., mormente do seu processo mental no cumprimento ou não do dever consagrado no art.º 91.º do EOA N. A sustentar-se o contrário, no respeito pelo princípio da estrutura acusatória, também ele aplicável em sede de processo disciplinar, caberia à R. demonstrar tal intuito doloso, tal intenção “propositada” de violação do dever deontológico, o que não logrou fazer.

O. Não é verdade que a A. tenha, intencionalmente, querido omitir o cumprimento do dever do art.º 91.º do EOA.

P. Este facto, que constitui o fulcro da decisão, foi dado como provado ao arrepio das mais elementares regras de prova, maxime dos limites em que é admissível recorrer a presunções, conforme ao disposto nos artigos 349.º e 351.º do Código Civil.

Q. Como tal, o douto acórdão impugnado aplicou erradamente a lei, violando aqueles preceitos e o disposto nos artigos 110.º do EOA e 13.º a 15.º do Código Penal (ex vi art.º 121.º do EOA), já que, falhando na atuação da A. os momentos representativo e volitivo relativamente ao resultado que consubstanciará a ofensa, não poderá ela, caso se entenda que essas suas condutas são objetivamente violadoras de deveres impostos por normas do Estatuto da Ordem dos Advogados, ser atribuída, senão a título de negligência.

R. Dispõe o artigo 135.º do Código do Procedimento Administrativo que «são anuláveis os atos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção».

S. Ao concluir-se pela conduta dolosa da A., sem apoio fáctico que o legitimasse, violou aquelas normas, em conexão com os preceitos dos artigos 91.º, 110.º, 126.º, 127.º e 128.º do EOA, em que fundamentou a punição cominada ao autor T. Subsidiariamente, caso feneça a tese ora sustentada, o que apenas se ressalva por imperioso dever de patrocínio e sob pena de preclusão de tal direito, deverá ser aplicada a figura de dispensa de pena, ao abrigo do disposto no art.º 121.º, alínea a) e art.º 74.º do Código Penal.

U. Ora, no caso sub judicio, a ilicitude e culpa, a existirem, são bastante diminutas, o dano não ocorreu (e portanto nem tampouco se deverá aquilatar deste requisito e, mesmo que se admitisse o contrário, o dano foi reparado, até porque a Advogada Participante soube, ab initio, mesmo antes da notificação judicial da Contestação, que iria ser a aqui A. a patrocinar o ali R. Senhor N.......) e, por fim, à dispensa da pena não se opõem razões de prevenção, porquanto este tipo de ilícito disciplinar não teve qualquer repercussão, nem tampouco se trata de infracção frequente V. Caso este Tribunal entenda não aplicar a figura da dispensa da pena, sempre deverá ser reconsiderada a dosimetria da medida concreta da pena, porquanto, mesmo considerando cometida infracção ao art.º 91.º do EOA (hipótese que se coloca, reforce-se, por mero dever deontológico), a pena aplicada é desproporcional, considerando os critérios previstos no n.º 1 do art.º 126.º do EOA.

W. A A./Recorrente nunca foi alvo de uma sanção disciplinar, por mais leve que fosse.

X. A sua culpa, a admitir-se a tese da R. (o que se faz por mera cautela de patrocínio judiciário), é bastante diminuta, tampouco tendo representado a violação do art.º 91.º do EOA e as consequências da infração foram nulas, porquanto a Advogada Participante tomou conhecimento de que a aqui A. iria contestar a ação judicial interposta, já que disso deu nota ao marido da Participante, também ele advogado.

Y. Há ainda a considerar todas as circunstâncias atenuantes nesta matéria, como a conduta mantida desde sempre no processo disciplinar, fiel à verdade e não procurando obstaculizar a descoberta da verdade material, colaborando, inclusive, com a R. e nunca procurado de alguma forma demonstrar que afinal dirigiu, diretamente, à Advogada Participante a comunicação em causa.

Z. Por tudo isto, mostra-se manifestamente desproporcional a aplicação da pena de censura.

AA. Em bom rigor, estamos na presença de uma falta leve no exercício da profissão de Advogado, que não teve quaisquer consequências nefastas, que deve implicar apenas uma advertência para que não se repita, como aliás se cuida de referenciar no art.º 126.º, n.º 2 do EOA.

BB. Note-se que a escolha da pena de censura implica, nos termos do art.º 11.º, n.º 1 do EOA, a impossibilidade da aqui A. poder ser eleita ou designada para qualquer órgão da Ordem dos Advogados, o que redunda na cumulação com uma verdadeira pena acessória, coartando a A./Recorrente de poder ser eleita ou designada para o desempenho de funções de dirigente, junto da Ordem dos Advogados, o que denota a desproporcionalidade e excesso da pena de censura.

CC. Deverá este douto Tribunal declarar a prescrição do procedimento disciplinar movido pela R. contra a A., ora Recorrente, com as devidas e legais consequências.

DD. Verificou-se a prescrição do procedimento disciplinar na data de 06 de Junho de 2014.

EE. Outra forma de contagem do prazo prescricional seria simplesmente considerar se o prazo de um ano e meio de suspensão da prescrição e o prazo máximo de prescrição (no qual se incluem causa de interrupção) de sete anos e meio (art.º 117.º, n.º 5...

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