Acórdão nº 63/21 de Tribunal Constitucional (Port, 22 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Lino Rodrigues Ribeiro
Data da Resolução22 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 63/2021

Processo n.º 793/20

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. No âmbito dos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Coimbra, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, o primeiro interpôs recurso ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, adiante designada «LTC»).

O ora recorrente foi condenado pela prática de um crime, por sentença da qual foi interposto recurso fora do prazo legalmente prescrito. O recorrente foi notificado para pagar a multa devida pela interposição do recurso no segundo dia depois do termo do prazo, nos termos previstos nos n.os 5 e 6 do artigo 139.º do Código de Processo Civil. Considerando que o recorrente não havia efetuado o pagamento da multa no valor legalmente devido, o tribunal rejeitou o recurso, por intempestividade.

O recorrente apresentou reclamação deste despacho para o Tribunal da Relação de Coimbra, que a indeferiu por decisão datada de 9 de setembro de 2020, de que vem interposto o presente recurso.

2. O requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade vem formulado nos seguintes termos:

«A., arguido melhor identificado no processo referenciado em epígrafe, considerando-se notificado a de 14 setembro de 2020, da decisão singular proferida pela Exma. Senhora Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Coimbra, por delegação de competências, vem muito respeitosamente, porque dotado de legitimidade e por estar em tempo,

INTERPOR RECURSO PARA O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL,

Nos termos do art.º 70.º, n.º 1, al. b) e n.º 3 da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional (doravante LOTC) para apreciação concreta da seguinte questão de (in)constitucionalidade, O QUE FAZ. NOS TERMOS E COM OS SEGUINTES FUNDAMENTOS:

VENERANDOS CONSELHEIROS DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL

- O n.º 1 do art.º 20.º da Constituição da República Portuguesa, onde se funda a garantia de acesso aos Tribunais, aliado ao disposto no n.º 2, do art.º 18.º e n.º 1 do art.º 32.º da Lei Fundamental, foi, na perspetiva da recorrente, violado, pelo facto de não ter sido permitido o acesso à jurisdição do Tribunal da Relação de Coimbra, no âmbito do processo referenciado em epígrafe.

- Ao ser vedada a possibilidade de recorrer para o Tribunal da Relação de Coimbra, por motivos de extemporaneidade, cujas premissas se encontram erradamente fundamentadas, está a ser violado o princípio da proporcionalidade, por mor do artº 18.º, n.º 2 da CRP, no que tange ao acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva, presente no já mencionado n.º 1 do art.º 20.º da CRP.

- O entendimento do recorrente supra exposto não é acolhido pelo Tribunal a quo,

devido a uma interpretação restritiva, e não fundamentada, do regime legalmente aplicável à prática extemporânea de atos, violando o texto constitucional no que tange ao direito ao recurso, previsto no n.º 1 do art.º 32.º da CRP.

- Ficou exarado na decisão singular dos autos de reclamação que o despacho que não admitiu o recurso se limitou a cumprir a Lei "como se vê das normas transcritas", determinando assim a confirmação do não recebimento do recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra.

- Na verdade, não foram transcritas todas as normas aplicáveis ao presente caso concreto, como é passível de ser constatado da Reclamação apresentada para decisão do Presidente do Tribunal Superior supra referido, existindo, assim, omissão de pronúncia - infelizmente a decisão é definitiva, não sendo sindicável a respetiva nulidade.

- Ao não ser respeitado o art.º 105.º do CPPenal, no que tange ao prazo ordinário para prática de atos de foro processual penal, nomeadamente no que se refere ao pagamento de multas processuais, quando incumbe ao Tribunal a quo emitir uma guia com o valor em falta, acrescido da penalização pela sua ausência, conforme seria de esperar, dado que é o regime consignado nos termos conjugados do n.º 6 do art.º 139.º do CPCivil e n.º 1 do art.º 21.º da Portaria n.º 419-A/200, de 17 de abril, sendo ainda o que resulta dos usos dos Tribunais portugueses, está indubitavelmente a ser vedado o direito de acesso aos Tribunais, o direito ao recurso e ainda o princípio da proporcionalidade, no que tange à proibição do excesso, todos eles com assento constitucional, o que deve ser acautelado por este Tribunal.

- Por conseguinte, revela-se inconstitucional a interpretação levada a cabo, quer pelo Tribunal a quo, quer pela Vice-Presidente do Tribunal da Relação, quando descuram por completo o disposto no n.º 6 do art.º 139.º do CPCivil, rejeitando liminarmente um recurso, sem ser dada a oportunidade ao arguido de pagar o valor em falta, de acordo com a guia a emitir pela Secretaria Judicial competente.

- Ao não ser recebido o recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, o recorrente depara-se com a consolidação das consequências advenientes de uma condenação injusta, quer no que tange à matéria penal, quer no que concerne à matéria civil.

- Face ao supra exposto, dúvidas não restam que as questões de constitucionalidade supra invocadas também o foram em momento processual imediatamente anterior ao presente (Autos de reclamação), subsumindo-se assim o objeto deste recurso ao disposto na al. b) do n.º 1 e n.º 3 do art.º 70.º da LOTC.

- Porque legal e tempestivo deve o presente requerimento ser recebido, com os devidos efeitos legais, sendo as Alegações de recurso oportunamente aduzidas, nos termos conjugados dos arts. 280.º da CRP e, 70.º, n.º 1, al. b) e n.º 3, 71.º, 72.º, n.º 1, al. b), 75.º, 75.º·A, 78.º, n.º 4, 79.º da LOTC.»

3. Através da Decisão Sumária n.º 603/2020, foi decidido não conhecer o objeto deste recurso, com base na seguinte fundamentação:

«(...)

4. Cabendo aos recorrentes enunciar em termos claros e precisos, no requerimento de interposição de recurso, a norma ou interpretação normativa cuja inconstitucionalidade pretendem ver apreciada por este Tribunal, é por referência a esse enunciado e à decisão recorrida que devem ser aferidos os pressupostos de admissibilidade do presente recurso.

Analisado o requerimento de interposição de recurso supratranscrito, rapidamente se verifica que em momento algum o recorrente enuncia, com rigor, uma norma ou interpretação normativa cuja inconstitucionalidade pretenda ver apreciada. Com efeito, limita-se a referir vagamente uma «interpretação restritiva, e não fundamentada, do regime legalmente aplicável à prática extemporânea de atos», ou a tecer críticas de constitucionalidade que se dirigem, diretamente, à decisão recorrida. Assim, por exemplo, afirma que «o n.º 1 do artigo 20.º da Constituição (…) aliado ao disposto no n.º 2, do art.º 18.º e n.º 1 do art.º 32.º da Lei Fundamental (…) foi, na perspetiva da recorrente, violado, pelo facto de não ter sido permitido o acesso à jurisdição do Tribunal da Relação de Coimbra (…)» ou que é «inconstitucional a interpretação levada a cabo, quer pelo Tribunal a quo, quer pela Vice-Presidente do Tribunal da Relação, quando descuram por completo o disposto no n.º 6 do art.º 139.º do CPCivil, rejeitando liminarmente um recurso, sem ser dada a oportunidade ao arguido de pagar o valor em falta, de acordo com a guia a emitir pela Secretaria Judicial competente.»

Também o teor da peça processual, em que o recorrente alega ter suscitado a questão de constitucionalidade, evidencia críticas exclusivamente dirigidas à atuação do tribunal ou à decisão reclamada, concluindo o recorrente, v.g., que «o Tribunal a quo não observou quer o facto de o direito ao recurso daquele despacho estar constitucional e ordinariamente positivado…» ou que «o requerimento de recurso foi rejeitado sem fundamento para o efeito, descurando o texto da lei...

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