Acórdão nº 6255/15.9TDLSB-G.L1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelJOÃO LEE FERREIRA
Data da Resolução20 de Janeiro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa.

I–RELATÓRIO: 1.

–Por despacho proferido a 16 de Julho de 2020 no processo nº 6255/15.9TDLSB, a Exmª juíza de instrução do Juízo Central Criminal de Lisboa, juiz 18, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa determinou a entrega à Assistente (adiante também designada por DSI) de uma cópia do conteúdo digital do apenso F dos autos.

O Ministério Público interpôs recurso desta decisão e da motivação extraiu as seguintes conclusões (transcrição): Questões prévias: subida e efeito do recurso 1.-O presente recurso tem como objeto o douto despacho proferido em 16.07.2020 (fls. 6470 a 6472), pela Mma. Juiz de Direito, o qual determinou a entrega à Assistente () cópia do conteúdo das pen drive que constituem o apenso F dos presentes autos, o qual contém e-mails.

  1. -O presente recurso deverá subir imediatamente e com efeito suspensivo - o que se requer, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 407.°, n.° 1 e 408.°, n.° 3, do Código de Processo Penal.

  2. -Caso o recurso venha a subir a final, o mesmo tornar-se-á totalmente desprovido de efeito útil uma vez que, após o conhecimento do conteúdo daquele apenso F na sua totalidade, qualquer decisão que obste à entrega de cópia do mesmo a qualquer sujeito processual já não produzirá qualquer efeito.

  3. -O efeito suspensivo da decisão recorrida não invalida os atos subsequentes que venham a ter lugar, e torna-se imprescindível à salvaguarda dos direitos que se visam acautelar com a interposição do presente recurso e a fixação do efeito a final ou meramente devolutivo tornaria absolutamente inútil a decisão que se viesse a tomar em face do presente recurso.

  4. -A partir da prolação da acusação em 18.9.2019, findou o segredo de justiça anteriormente decretado por despacho judicial.

  5. -Com base nos factos constantes da acusação e da pronúncia, o arguido R______ acedeu, por diversas formas a informações existentes nos sistemas informáticos de diversas entidades, pessoas singulares e coletivas por intrusão nos sistemas informáticos dos mesmos, sem o seu conhecimento e/ou consentimento.

  6. -Tais acessos permitiram ao arguido R______ aceder a um muito elevado volume de informação que, nos presentes autos se veio a concretizar como: -Contratos, informações pessoais, passwords, e-mails, e todo o tipo conteúdos privados que se encontravam nos computadores dos ofendidos.

  7. -Na posse dessa informação, segundo a factualidade de que vem acusado, decidiu o arguido R_______: -Publicar alguns conteúdos em blogues e sites da internet, os quais passaram a ser alvo de conhecimento público (vg. football-leaks); -Com base no conhecimento que obteve e, sabedor do prejuízo que isso causava à Assistente procurar lucrar com a informação obtida por forma ilícita, solicitando a entrega de quantia monetária para obstar à divulgação de documentos.

  8. -Muito do conteúdo obtido pelo arguido R______das formas descritas foi armazenado em discos rígidos, a chamada informação exfiltrada, discos esses que vieram a ser apreendidos ao arguido na Hungria.

  9. -Do conteúdo desses discos rígidos constavam várias caixas de e-mail de pessoas concretas, isto é, o arguido guardava nos seus dispositivos eletrónicos os mails de outras pessoas que não o autorizaram para o efeito e desconheciam essa sua prática.

  10. -Desses discos rígidos constavam todos os e-mails expedidos e rececionados por determinadas pessoas, conforme vem descrito na acusação.

  11. -O conteúdo das caixas de e-mail, constante do apenso F, porque se trata de informação pessoal e confidencial dos titulares da mesma, nunca foi vertido no processo, na acusação pública proferida e no despacho de pronúncia não são feitas referências nem à quantidade de e-mails acedidos nem ao seu teor, nem tal informação consta por escrito dos autos.

  12. -Tal informação encontra-se selada em duas pen drives que constituem o apenso F e fazem prova dos acessos descritos na acusação pelo arguido R_______, mas o seu conteúdo não foi acedido. Os e-mails apenas fazem prova de que o arguido os tinha na sua posse, razão pela qual nunca o Ministério Público poderia ter dado outro destino que não a junção aos autos, mas sempre velando para que tais acessos não viessem a ter lugar porquanto tais e-mails, no nosso entender, são conteúdo privado, o qual não deve ser, portanto, acessível por terceiros a não ser como prova de que o arguido os tinha na sua posse, mas sendo irrelevante para efeito de prova o conhecimento do conteúdo dos e-mails ali guardados.

  13. -Aquando da prolação da acusação pública foram proferidos vários despachos no sentido de vários elementos permanecerem sujeitos a segredo de justiça e não acessíveis a terceiros que não os intervenientes nos autos. Estão em causa os elementos contantes de fls. 3634, os Apensos A, H, F, e o relatório digital (fls. 118 e 119 do apenso G), os apensos I, II, IV, e letra I (cfr. despachos proferidos a fls. 3967 a 3968 e 4900 a 4901).

  14. -Relativamente aos apensos F e G, foi apenas deferido que os mesmos fossem consultados na secção pelos intervenientes processuais, nunca tendo sido facultada cópia dos mesmos: -Despacho do Ministério Público de fls. 4349 deferindo relativamente ao apenso F apenas a consulta na secretaria (requerimento de consulta da Assistente de fls. 4348); -Despacho do Ministério Público de fls. 4286 deferindo relativamente ao apenso F apenas a consulta na secretaria (requerimento de consulta do arguido R_______ de fls. 4230); -Despacho do Ministério Público de fls. 4442 deferindo cópia digitalizada dos autos principais e apenas consulta do apenso G (requerimento de consulta do Assistente RP_______ de fls. 4439 a 4440). Foi lavrado termo de entrega a fls. 4525 tendo sido, quanto ao apenso F, cópia digitalizada das folhas de rosto do apenso F, mas não dos suportes digitais do mesmo apenso F.

  15. -O apenso F (conteúdo das pen drives) carece de uso de password para desencriptação (contentores de bit locker só acessível com password). A password consta de envelope lacrado que só em 20.7.2020 foi aberto (veja-se o termo lavrado em 20.7.2020, fls. 6487).

  16. -Qualquer cópia que possa ter sido feita do apenso F, ainda que por lapso de secretaria não determinada por despacho, desacompanhada da password de acesso, sempre tornaria inacessível o seu conteúdo. Nunca por despacho foi determinada a entrega dessa password a nenhum dos intervenientes processuais.

  17. -O apenso F contém, em si, as caixas de correio eletrónico completas de um determinado período temporal (que desconhecemos), contendo tais caixas os e-mails enviados, recebidos, apagados, rascunhos e tudo o que aquelas caixas de correio eletrónico contiverem, de várias entidades, a saber, pelo menos: -E-mails institucionais dos dirigentes, funcionários e jogadores do Sporting Clube de Portugal - Futebol SAD (SCP); -E-mails profissionais de advogados e funcionários da sociedade de Advogados ; -E-mails profissionais de AG______, à data Diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal.

  18. -O conteúdo dos e-mails contidos naquelas caixas de correio eletrónico poderão conter: - Conteúdo inócuo não sujeito a qualquer tipo de segredo; - E-mails institucionais dos dirigentes, funcionários e jogadores do Sporting Clube de Portugal, que poderão conter factos sujeitos a segredo comercial; - E-mails profissionais de advogados e funcionários da sociedade de Advogados , contendo informação de clientes, estratégias de defesa próprios daquela Sociedade de Advogados, correspondência entre Advogados e clientes sujeita a segredo de Advogado, eventuais conteúdos sujeitos a segredo de Justiça relativos aos processos de clientes cujos interesses defendam; - E-mails profissionais de AG_____, à data Diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal. Na caixa de correio de AG_____ os mesmos conterão, de entre o mais, eventuais conteúdos sujeitos a segredo de justiça, existindo inquéritos que ainda se encontram pendentes e não são do conhecimento público, correspondência cujos conteúdos se possam encontrar sujeitos a segredo de Estado, correspondência trocada entre o próprio e as Exmas. Senhoras Conselheiras Procuradoras-Gerais da República, correspondência trocada entre o próprio e os Procuradores da República titulares de inquéritos que se encontram (alguns ainda) em segredo de justiça, com a inerente estratégia de investigação e tomadas de posição sobre inquéritos.

    Do caso julgado - Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa em 5.5.2020.

  19. -Veio a requerer, em 29.22.2019 (fls. 5291 a 5305), que se determinasse a exclusão de publicidade externa em relação a todos os documentos dos autos de onde conste informação sujeita a segredo comercial e industrial ou a qualquer outro regime de segredo específico, e bem assim informações referentes a terceiros que contenham elementos pessoais, bem como se determinasse a confidencialidade interna dos elementos das Assistentes e ofendidos nos autos que contenham qualquer informação sujeita a segredo comercial e industrial, ou a qualquer outro regime de segredo específico, e bem assim informações referente a terceiros que contenham elementos pessoais.

  20. -Foi proferido douto despacho pela Mma. Juiz de Instrução Criminal em 2.12.2019 (fls. 5311 a 5312), o qual indeferiu a pretensão da requerente, devendo o acesso dos senhores jornalistas ser irrestrito quanto a todos os meios de prova, não sendo permitida a reprodução de peças processuais e demais elementos referidos no artigo 88.°, n.os 2 a 4 do Código de Processo Penal.

  21. -A douta decisão proferida pela Mma. Juiz de Instrução Criminal ressalvava, contudo, o acesso à prova digital tal como foi recolhida (originais alvo de tratamento forense não reproduzidos no processo), por aplicação analógica do n.° 12 do artigo 188.° do Código de Processo Penal.

  22. -Do douto despacho recorreu a em 13.01.2020 (cfr. fls. 5682 a 5745).

  23. -Por douto Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de...

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