Acórdão nº 583/13.5BEALM de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelSUSANA BARRETO
Data da Resolução14 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I - Relatório A Autoridade Tributária e Aduaneira, não se conformando com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por J......

e R......

, contra a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) referente ao ano 2008, dela veio recorrer para este Tribunal Central Administrativo Sul.

Nas alegações de recurso apresentadas, formulam as seguintes conclusões: 1. Não concorda a Representação da Fazenda Pública com a, aliás, Douta Sentença, na qual se decidiu pela procedência da presente Impugnação, ordenando a anulação do ato tributário – liquidação de IRS referente ao ano de 2008 -, por ter considerado que a Administração Tributária não logrou demonstrar que as quantias pagas como ajudas de custo representavam um ganho real para o trabalhador ou, pelo menos que esse abono excedia as despesas normais das deslocações ao serviço da entidade patronal; 2. A lei não exclui do conceito de rendimentos da categoria A os rendimentos pagos pela entidade patronal que não revistam natureza de ajudas de custo e, in casu, está precisamente em discussão a qualificação dos pagamentos realizados pela sociedade C...... como ajudas de custo, pois só assim se poderá proceder à aplicação da alínea d) do n.º 3 do art.º 2.º do CIRS; 3. Caso se conclua que os pagamentos realizados não têm carater compensatório, mas meramente remuneratório, não há sequer que ir para aquela alínea d) do n.º 3 do artigo, pois trata-se apenas de aplicar a regra geral prevista nos n.ºs 1 e 2, dos quais se subsume que os pagamentos realizados pela entidade patronal ao seu trabalhador (independentemente da forma que revistam) se enquadram na categoria de rendimentos de trabalho. Pelo que, salvo melhor opinião, caberia sempre a quem paga os rendimentos e quem os recebe fazer prova de que os mesmos não revestem natureza remuneratória, mas antes compensatória; 4. Cabe à Administração Tributária provar o excesso dos pagamentos de carater compensatório, os quais passam a ser tributados como se revestissem natureza remuneratória, cabe, no entanto, ao sujeito passivo da relação tributária fazer prova necessária e logicamente anterior – a de que os pagamentos realizados revestem a natureza de ajudas de custo.

  1. Ainda que tendo verdadeira natureza compensatória, os pagamentos, a partir de determinados limites, passam a ser tributados como se de natureza remuneratória se tratassem. Mas se os rendimentos têm natureza remuneratória ab initio são sempre tratados tendo em conta essa natureza, e portanto, tributados; 6. Por outro lado, e trata-se de diferente requisito, a alínea d) do n.º 3 do art.º 2.º do CIRS, aplicável apenas nas situações de pagamento de ajudas de custo, faz depender a sua tributação, não apenas do cumprimento dos limites legais, mas também da observação dos pressupostos da sua atribuição aos servidores do Estado; 7. Refere a Douta Sentença que valores pagos a título de ajudas de custo de forma regular não os qualifica como remuneração, e por si só assim será. No entanto, esse não foi o único argumento utilizado pela Autoridade Tributária em sede Inspetiva para fundamentar as suas correções e, por outro lado, o facto de se tratarem de pagamentos regulares muito menos os qualifica como ajudas de custo – e caberia ao contribuinte fazer essa prova.

  2. Não pode também deixar de se relevar o facto de, mensalmente, os valores pagos pela empresa ao seu trabalhador e qualificados como ajudas de custo serem em montante bastante superior ao rendimento do trabalho.

  3. Mais fundamenta a Douta Sentença que o Impugnante marido foi contratado para exercer funções em Amora, sendo admissíveis as importâncias pagas como ajudas porque se deslocou para Cádis, sendo o centro da sua atividade funcional Amora. No entanto, suporta-se factualmente o Tribunal na cláusula 4 do contrato de trabalho outorgado entre o Impugnante marido e a respetiva entidade patronal, o qual faz parte integrante do Relatório inspetivo (assim como os recibos referentes ao sujeito passivo no ano de 2008), mas, com o devido respeito, o contrato de trabalho em causa não é constituído apenas por aquela cláusula, mas por outras, havendo que proceder à análise do mesmo num todo sistemático; 10. Assim, consta daquele contrato, que o Impugnante marido é contratado para as oficinas na sede da C......, mas desde logo, fica também ali fixado que, com o início da execução do contrato, exerce as suas funções nas instalações da S......, em Cádis. E todas as deslocações que ocorram dentro e fora do território nacional ficam a cargo da entidade contratadora. Não deixa de ter relevância o facto de, pela Cláusula Segunda, o contrato de trabalho ser a termo incerto, motivado por acréscimo excecional de atividade da empresa, o qual obriga a reforço do trabalho temporário; 11. E este contrato de trabalho, a termo incerto, dura por todo o tempo necessário para a substituição do trabalhador ausente ou para a conclusão da atividade, tarefa, obra ou projeto cuja execução justifica a celebração – nos termos do disposto no art.º 144.º da Lei n.º 99/2003, de 27.08, na redação à data; 16 / 17 12. Ao decidir, como decidiu, a Douta Sentença fez errada apreciação dos factos apurados – erro de julgamento de facto - e errada aplicação do direito – erro de julgamento de Direito, tendo violado o disposto nos n.ºs 1, 2 e 3 do art.º 2.º do CIRS e Decreto-Lei n.º 106/98, de 24.04, assim como o disposto no art.º 342.º do CC.

    Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, requer-se a V.as Ex.as se dignem julgar PROCEDENTE o presente recurso, por totalmente provado e em consequência ser a douta sentença ora recorrida, revogada e substituída por douto Acórdão que julgue totalmente improcedente a presente Impugnação, tudo com as devidas e legais consequências.

    A Recorrida contra-alegou, pugnando pela sua improcedência, com base no seguinte quadro conclusivo: A) A sentença ora recorrida determinou a anulação da liquidação de IRS do ano de 2008 por vício de violação de lei consubstanciada na insuficiência da fundamentação e errónea interpretação da citada norma de incidência no que respeita à desconsideração dos rendimentos auferidos pelo Recorrido marido a título de ajudas de custo por parte da AT.

    B) O objeto de recurso do Ilustre Representante da Fazenda Pública considera que a liquidação adicional se deverá manter atendendo a que o montante pago a título de ajudas de custo ao Recorrido marido constitui remuneração proveniente de trabalho por conta de outrem e, nessa medida, considerado como rendimento de trabalho dependente de acordo com o disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 2º do CIRS.

    C) Considerou o Tribunal a quo, e bem, que sempre caberia à Autoridade Tributária (AT) demonstrar que as ajudas de custo não correspondem a efetivas deslocações e que os montantes pagos excediam os limites previstos na lei.

    D) Ora, dos autos e tal como exaustivamente fundamentado na sentença ora recorrida, em nenhum momento a Representante da Fazenda Pública ou a AT faz a prova que lhe competia para afastar a verificação dos pressupostos legais quanto à não tributação das ajudas de custo: (i) a prova de que os montantes auferidos enquanto ajudas de custo ocorreram por inexistência de efetivas deslocações por parte do trabalhador ao serviço e no interesse da sua entidade patronal; e, (ii) de que o pagamento de quantitativo diário excedia os limites anualmente fixados para os servidores do Estado E) Bem andou a decisão proferida pelo Tribunal a quo, que considerou, na senda do Acórdão do STA de 08/11/06, recurso 01082/04, que a alínea d] do nº 3 do artigo 2º do CIRS uma verdadeira norma de delimitação negativa de incidência ou exclusão de tributação de IRS, o ónus da prova de tal excesso, bem como a verificação da falta de pressupostos de atribuição, enquanto pressuposto da norma de tributação, sempre recairia sobre a AT.

    F) Na verdade, da apreciação da prova vertida nos autos, resultou claro que não foi possível qualificar, sem mais, as ajudas de custo como revestindo natureza remuneratória - antes pelo contrário, ficou provado que as deslocações do Recorrido ocorreram efetivamente para Cádis e que o local de trabalho era em Amora, Seixal.

    G) De facto, nos termos do disposto na aludida norma de exclusão de incidência de IRS, apenas as ajudas de custo que excedam o limite legal fixado anualmente para os servidores do Estado estão sujeitas a IRS.

    H) Sendo certo que, o ónus de prova de tal excesso, bem como da verificação dos pressupostos da sua atribuição, como pressuposto da norma de tributação, impendia sobre a AT e a Fazenda Pública não logrou fazer prova nesse sentido...

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