Acórdão nº 6/07.9BEBJA de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução14 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão I. RELATÓRIO A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio apresentar recurso da sentença proferida a 03.02.2014, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Beja, na qual foi julgada procedente a impugnação apresentada por J.....

e J.....

(doravante Recorridos ou Impugnantes), que teve por objeto a liquidação de imposto municipal de Sisa (doravante, Sisa) reportada a maio de 2001.

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito suspensivo.

Nesse seguimento, a Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “I. Os impugnantes adquiriram a benfeitoria – um restaurante – existente no prédio pelo preço de € 49.879,79.

  1. A aquisição de benfeitorias está sujeita a sisa nos termos do disposto no artigo 8.º, n.º 4 do respectivo código.

  2. A sisa foi liquidada pelo valor patrimonial tributário, por ser o valor mais elevado - € 87.269,68. –, por comparação com o valor da aquisição.

  3. A douta sentença fez uma errada interpretação do regime jurídico aplicável, ao considerar que o imposto deve incidir sobre o valor do contrato, por se tratar de uma cessão de exploração onde foi transmitida o prédio.

  4. A benfeitoria na data da celebração do contrato existia, como de resto foi reconhecido pelos impugnantes, e veio por estes a ser removida – demolida – para ser edificado um novo restaurante.

  5. Não havia discrepância entre a matriz e a realidade, ou seja, sendo o valor patrimonial tributário superior ao valor do contrato, era sobre aquele que devia, como entendeu a Administração fiscal, incidir imposto de sisa.

  6. Ou seja, existindo identidade entre a realidade descrita na matriz e o objecto de transmissão, a consideração das normas acima apontadas legitimam a liquidação efectuada pela Administração fiscal.

  7. Acresce que, se a tal quisessem obstar, deveriam os impugnantes ter requerido a respectiva avaliação, nos termos do artigo 56º do CIMSISSD, que conferia a possibilidade aos contribuintes de requerer a avaliação da totalidade ou parte dos prédios caso considerassem excessivo o valor patrimonial inscrito na matriz, poderão.

  8. Pelo que, não o tendo feito, sibi imputet.

  9. Além disso, a entender-se como se entendeu a sentença recorrida que a benfeitoria foi transmitida no âmbito de um contrato de cessação de exploração, estar-se-ia a abrir a porta para que se transmitisse um prédio de valor patrimonial superior ao valor do contrato, transmissão essa que não seria tributada, ou seria tributada por um valor inferior.

  10. O que constitui uma violação do princípio da capacidade contributiva previsto no artigo 104.º n.º 3 da CRP, na medida em que os impugnantes estariam a ser tributados por um valor inferior à capacidade contributiva demonstrada, aferida através do valor patrimonial da benfeitoria.

  11. É que, ainda que se admitisse tratar-se de um contrato de cessão de exploração, uma vez que da cessão consta uma benfeitoria cujo valor patrimonial é superior ao valor do contrato, seria sempre sobre aquela que teria de incidir sisa.

  12. Assim, não havendo qualquer erro censurável na liquidação da sisa colocada em crise, ao não decidir pela manutenção do acto de liquidação nos moldes em que o mesmo ocorreu, a douta sentença recorrida violou o disposto nos artigos 8.º n.º 4 e 56.º do CIMSISSD e 104.º n.º 3 da CRP.

    Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, requer-se a V.as Ex.as se dignem julgar PROCEDENTE o presente recurso, por totalmente provado e em consequência ser a douta sentença ora recorrida, revogada e substituída por douto Acórdão que julgue improcedente a presente oposição, tudo com as devidas e legais consequências”.

    Os Recorridos contra-alegaram, nos seguintes termos: “Na sua petição, AA./impugnantes alegaram, em síntese, que a sisa impugnada não era devida porque o preço pago ao J..... não o foi como contrapartida da benfeitoria, porque a demolição desta foi imposta pela Direcção do PNSACV, ainda em momento anterior à aquisição de direitos, e que, por isso, era destituída de valor, incidindo a SISA sobre nada ou zero, que era o valor da benfeitoria, correspondendo o preço pago a outras realidades, que identificaram: - mobiliário e equipamento, - «clientela» ou valor de trespasse do estabelecimento comercial, excluído o valor dos equipamentos e mobiliário e, - direito à celebração de contrato de utilização da parcela de terreno com o PNSACV.

    Ficou provado que, pelo menos em 2000.03.20, o Presidente da Comissão Directiva do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina (PNSACV) impôs a demolição da benfeitoria existente, como condição da autorização de utilização futura do terreno, agora mediante contrato administrativo de concessão de parcela de terreno pertencente ao Estado.

    Quando os impugnantes adquiriram o direito já havia terminado o prazo inicialmente concedido para a demolição da benfeitoria existente e para a construção de novo edifício, nas condições previstas no POOC, facto igualmente provado nos autos.

    Tratando-se de terreno do Estado e do cumprimento de imposições constantes de actos administrativos válidos e nunca impugnados, não é lícito atribuir qualquer valor a um bem que, à data da transmissão, estava sujeito a uma obrigação de demolição e, consequentemente, sem valor patrimonial.

    Consequentemente, bem se decidiu na douta sentença recorrida que o valor a considerar para efeitos de liquidação da sisa nunca poderia, em tal caso, ser o da benfeitoria, condenada a demolição e devendo até já estar demolida nessa data, mas, a haver lugar a sisa, apenas o seria sobre o valor do direito temporário sobre o solo, único direito que foi objecto de transmissão – o de manter um novo restaurante construído de acordo com novas regras, impostas pelo POOC.

    Assim, bem se julgou na douta sentença recorrida, anulando a liquidação por inexistência do facto tributário em que esta se fundamentou, ainda que julgando devida sisa pelo valor declarado na transmissão, segmento em que se não acompanha a referida decisão.

    Termos em que deve ser confirmada a anulação da liquidação da sisa pelo valor da benfeitoria, julgando não devida qualquer sisa, atenta a inexistência de qualquer valor da benfeitoria, por estar ordenada administrativamente a sua demolição como condição da subsistência do direito ao uso do solo.

    Em todo o caso, e salvo melhor, já não será possível a liquidação do imposto de sisa relativo ao mero direito de uso do terreno mediante contrato de concessão, porquanto já caducou o direito a tal liquidação, decorridos que estão bem mais de 13 anos desde a data do facto tributário – a transmissão – tendo o processo estado parado, por causa não imputável aos impugnantes, por mais de um ano, desde 2007.01.07.

    Termos em que, confirmando a douta sentença quanto à anulação da liquidação em apreço e julgando indevida a sisa, ou caducado o direito a nova liquidação ou, ainda, prescrita a mesma, atenta a data do facto tributário, se fará a costumada”.

    Foram os autos remetidos ao Supremo Tribunal Administrativo (STA), nos quais, por decisão sumária de 08.10.2014, o mesmo se declarou incompetente em razão da hierarquia, ordenando a sua remessa a este TCAS.

    Neste TCAS, os autos foram a vista do Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do então art.º 289.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

    Colhidos os vistos legais (art.º 289.º, n.º 2, do CPPT) vem o processo à conferência.

    São as seguintes as questões a decidir: Questões prévias suscitadas pelos Recorridos: a) Ocorreu caducidade do direito à liquidação? b) Ocorreu a prescrição? Questão suscitada pela Recorrente: c) Verifica-se erro de julgamento, porquanto a transmissão de benfeitorias está sujeita a Sisa? II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO II.A.

    O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto: “A) Em 2000.03.20, o Presidente da Comissão Directiva do Parque Natural Sudoeste Alentejano Costa Vicentina, comunicou a J..... nada ter a opor à cedência do restaurante M....., sito na Praia de Morgavel, Sines, em terrenos da Direcção Geral do Património sob gestão do Instituto da Conservação da Natureza (ICN), constante de fls. 26 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzido; deste transcreve-se: a. (…); b. Assunto: Cedência do restaurante “M.....” sito em Praia de Morgavel em terrenos da DGP sob gestão do ICN c. Vimos pela presente informar V. Exa. De que o Plano de Ordenamento da Orla Costeira entre Sines e Burgau (RCM nº 152/98, de 30 de Dezembro) prevê para a praia de Morgavel/Sines, a atribuição de uma nova concessão para apoio de praia, tal como a manutenção dos restaurantes existentes desde que sujeitos às obras de adaptação previstas no POOC; d. Assim, nada têm a opor estes serviços à cedência solicitada por V. Exa., do restaurante “M.....” sito na Praia de Morgavel/Sines, em terrenos da Direcção Geral do Património sob gestão do Instituto da Conservação da Natureza no entanto, deverão ser estes serviços informados da identificação da pessoa singular ou colectiva a quem irá ser cedido o restaurante; e. Mais se informa V. Exa. de que o prazo para a execução das obras de adaptação do restaurante aos requisitos do POOC, mantém-se inalterado, ou seja, até 30 de Dezembro de 2000; f. (…); B) Em Maio de 2001, J....., por si e em representação de M..... e M....., como primeiros outorgantes e os Impugnantes, com segundos outorgantes, celebraram o contrato constante de fls. 11 a 11-v do PA e que aqui se dá por integralmente reproduzido; deste contrato transcreve-se: a.

    Cessão de Crédito b. (…); c.

    Os primeiros cedem pelo preço de PTE 10 000 000$0, aos segundos, o direito de crédito que possuem sobre o prédio urbano sito em .....

    , Sines, destinado a comércio, com a denominação comercial “Restaurante M.....

    ”, com alvará de licença de utilização nº .....

    , emitido pela Câmara Municipal de Sines em 1998.07.09, construído em terreno sob gestão do Instituto da...

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