Acórdão nº 877/15.5T8CSC.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelBERNARDO DOMINGOS
Data da Resolução16 de Dezembro de 2020
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Relatório[1] « i) - Em … de Março de 2015, AA, solteiro, maior, residente na Rua …, n° … - …, …, intentou a presente acção declarativa de condenação para a efectivação de responsabilidade civil de advogado no exercício das suas funções profissionais na forma comum contra - Dr. BB, II. Advogada, com domicílio profissional na Av. …, n° …, …, …, …, - Dra. CC, II. Advogado, com domicílio profissional na Rua …, n° …, …, …, e - Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A., actualmente designada Seguradoras Unidas, S.A., com sede na Av. …, …, …, pedindo a condenação solidária dos Réus no pagamento da quantia de €187.875,98, acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento.

Sustenta - socorrendo-nos para o efeito com a devida vénia do relatório da sentença recorrida - que constituiu o Io Réu como advogado em acção proposta pelo Autor que deu entrada em … de Maio de 1996, tendente à efectivação de obrigações derivadas de contrato-promessa. Nessa acção foi formulado pedido principal de reparação de defeitos e pedido subsidiário de resolução do contrato-promessa e restituição ao promitente-comprador Autor do sinal e reforço do mesmo no valor de 40.000.000$00, e indemnização no montante de 40.000.000$00 acrescido de juros. No decorrer do processo o Autor revogou o mandato conferido ao Io Réu e constituiu a 2a Ré com sua mandatária. A sentença atendeu parcialmente ao pedido principal, porém, em recurso, o tribunal da Relação de Lisboa absolveu a Ré dos pedidos principais e condenou-a na resolução do contrato-promessa e na restituição do sinal prestado, após o que, o S.T.J., revogando parcialmente o acórdão recorrido, condenou a Ré a pagar ao Autor a quantia de €199.519,15 acrescida de juros, e posteriormente rectificou a decisão retirando a referência aos juros relativamente à devolução do sinal, por este pedido não ter sido formulado. Só com esta decisão teve o Autor consciência do prejuízo que sofrera consubstanciado na perda de juros que seriam devidos sobre o sinal que lhe foi restituído, que computa em €187.875,98, calculados até ao trânsito em julgado do acórdão de rectificação do S.T.J..

Acrescenta que, a Ordem dos Advogados celebrou com a 3a Ré um contrato de seguro de responsabilidade civil daí a sua demanda.

Conclui que o Io Réu e a 2a Ré incumpriram deveres que sobre eles impendiam como advogados - com quem havia celebrado contrato de mandato - de exercer com zelo a sua actividade, o primeiro por não ter pedido a condenação da Ré no pagamento de juros sobre a restituição da quantia entregue pelo Autor a título de sinal, e a segunda por não ter ampliado o pedido até ao encerramento da discussão em Ia instância.

Juntou procuração e documentos.

ii) - A Ré Dra. CC apresentou contestação invocando as excepções de incompetência territorial, ilegitimidade por faltar um dos interessados (o colega que lhe passou o substabelecimento mediante o qual passou a representar o Autor), e não verificação do dano invocado, por nada impedir o Autor de demandar a devedora Ré na acção n° 4…7/1996 formulando o pedido de juros. Acrescenta que o Autor sempre participou activamente na elaboração das peças processuais e nunca transmitiu que os juros decorrentes do sinal não estavam pedidos e de que pretendia fazê-lo. Entende que os RR não podem ser condenados solidariamente dado que não exerceram o mandato no mesmo período temporal e que não se verificam os pressupostos da sua responsabilidade civil pois não praticou qualquer acto ilícito tendo cumprido os seus deveres.

Requer a intervenção principal provocada das seguradoras Mapfre Seguros Gerais, S.A. e Markel International Insurance Co Ltd, com quem celebrou contratos de seguro para transferência da responsabilidade civil emergente da sua actividade profissional.

Conclui pela admissão do incidente de intervenção principal provocada, procedências das excepções e improcedência do pedido. Junta documentos. Advoga em causa própria.

iii) - O Réu Dr. BB apresentou contestação na qual começou por arguir a nulidade da citação, entretanto sanada, e a sua ilegitimidade processual. Em sede de impugnação refere que todas as questões atinentes à instauração da acção foram debatidas com pormenor, sendo que a pretensão do Autor era apenas a reparação dos vícios e defeitos da fracção e a execução da escritura de compra e venda, não querendo saber de juros. O pedido formulado foi posto à consideração do Autor e por este integralmente escrutinado. Acresce que o Autor revogou o mandato do Io Réu antes do encerramento da discussão em primeira instância, pelo que deixou de dispor de poderes para ampliar o pedido.

Conclui pugnando pela sua absolvição da instância, pela sua absolvição do pedido, e pela condenação do Autor no pagamento de indemnização ao Io Réu por danos patrimoniais e não patrimoniais causados com a propositura da presente acção. Junta documentos. Advoga em causa própria.

iv) - A Ré Seguradoras Unidas, S.A. apresentou contestação na qual começa por referir que no ano de 2015 a responsabilidade civil profissional dos Advogados com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados encontra-se transferida para a Mapfre Seguros Gerais, S.A., e não para a Ré, sendo que foi em 2015 que foram reclamados pela primeira vez os factos quanto à 2a Ré Dra. CC, requerendo a intervenção principal provocada da Mapfre.

Excepciona a sua ilegitimidade passiva no que respeita a actos e omissões imputáveis à 2a Ré, a exclusão da apólice por falta de participação do sinistro, e novamente a sua ilegitimidade uma vez que deveria ter sido demandada a título acessório.

Em sede de impugnação refere inexistir responsabilidade civil dos advogados, desde logo por não se encontrar concretizado o prejuízo ou dano, já que o direito aos juros não se encontra precludido, assim como nem sequer é evidente a omissão imputada uma vez que foram pedidos juros quanto à quantia indemnizatória, para além da devolução do sinal.

Conclui pela procedência do incidente de intervenção principal provocada da Mapfre, e procedência das excepções, ou caso assim não se entenda pela improcedência da acção absolvendo-se os RR dos pedidos.

Junta documentos e procuração. Os documentos respeitam ao seguro profissional de responsabilidade civil de advogado.

  1. - Notificado para o efeito, e depois de regularizado o seu patrocínio, o Autor apresentou resposta às excepções, pugnando pela sua improcedência e requerendo a intervenção principal provocada do advogado Dr. DD, conforme requerimento de fls. 285 e segs..

    vi) - Agendada audiência prévia, foram proferidos despachos no sentido de admitir o requerimento do Autor de fls. 285 e segs., julgar improcedentes as excepções de incompetência relativa e ilegitimidade passiva invocadas pela 2a Ré Dra. CC, admitir a intervenção a título principal das seguradoras Mapfre Seguros Gerais, S.A. e Markel International Insurance Co Ltd.

    requerida pela 2a Ré, julgar improcedente a excepção de ilegitimidade passiva invocada pelo Io Réu Dr. BB, e convidá-lo a aperfeiçoar o pedido reconvencional, julgar improcedente a excepção de ilegitimidade passiva invocada pela 3a Ré actual Seguradoras Unidas, S.A., indeferir o pedido de intervenção principal requerido por esta Ré, e indeferir o pedido de intervenção provocada do Sr. advogado Dr. DD (cfr. acta da audiência prévia de fls. 312 a 317).

    vii) - Por requerimento de fls. 318 verso veio o Io Réu Dr. BB desistir dos pedidos deduzidos em reconvenção.

    viii) - Citada, a Interveniente Mafre Seguros Gerais, S.A.

    apresentou contestação na qual se defende por excepção invocado exclusões contratuais, e impugna toda a matéria factual alegada pelo Autor, acrescentando que, em todo o caso, aos Réus advogados não poderá ser imputada qualquer erro ou omissão passível de gerar a sua responsabilidade civil, os quais prosseguiram a sua actuação profissional com base nas informações e instruções do Autor, assim como inexiste qualquer dano já que o Autor pode reclamar os juros de mora do devedor (fls. 335 e segs.) Finda pugnando pela procedência das excepções e caso assim não se entenda pela improcedência da acção, absolvendo-se a Interveniente dos pedidos. Junta um documento (apólice, condições particulares) e procuração.

    ix) - A Interveniente Markel International Insurance Company Ltd., sucursal em …, apresentou contestação na qual aduz que a 2a Ré sabia da existência do risco pelo menos desde … de Abril de 2012, o qual era por isso pré-existente à celebração do contrato de seguro, encontrando-se excluído da cobertura da apólice, já que a 2a Ré nada declarou quanto à sua existência. Diz também que a 2o Ré sempre agiu com os deveres de diligência e zelo que lhe são exigidos no âmbito do exercício da advocacia, tendo entrado no processo mais de 10 anos depois da elaboração da petição inicial, além de que o Autor nunca demonstrou vontade em receber qualquer quantia a título de juros, sendo um cliente que acompanhou muito de perto todo o trabalho que estava a ser executado, não se verificando os requisitos de ilicitude e culpa de que depende a procedência do pedido, assim como não houve dano, por não haver caso julgado sobre o pedido de juros que não ficou precludido, nem mesmo enveredando pela teoria da perda de chance.

    Conclui pela improcedência da acção, absolvendo-se a Interveniente do pedido. Junta um documento (apólice, condições particulares) e procuração. Cfr. fls. 398 verso.

  2. - Por despacho de fls. 400 ficou sem efeito o pedido formulado pelo Io Réu na alínea e) da parte final da sua contestação.

    Foi observado o contraditório relativamente à matéria de excepção invocada pelas Intervenientes.

    xi) - A fls. 412 e 413 foi proferido despacho saneador que definiu o objecto do litígio e procedeu à enunciação dos temas da prova.

    Apresentadas reclamações contra os temas da prova foram as mesmas decididas por despacho de fls. 431 e 432.

    xii) - Teve lugar audiência final, com gravação dos trabalhos.

    Prolatou-se a sentença.

    (…) Decidiu-se do mérito, julgando-se a acção...

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