Acórdão nº 389/14.4T8VFR.P2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelCATARINA SERRA
Data da Resolução16 de Dezembro de 2020
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. RELATÓRIO 1. AA, residente na Rua …, propôs contra BB, residente na …, CC, residente na Rua …, e DD, residente na Rua …, acção com processo comum de impugnação e investigação de paternidade, pedindo que fosse declarado que não é filho de EE e em consequência que fosse eliminado do assento de nascimento do autor as referências, como pai, a EE e, como avós paternos, a HH e II; e que fosse declarado filho do 3.º réu e este condenado a reconhecer a paternidade do autor e, em consequência, ordenada a inscrição no seu assento de nascimento do réu DD, como pai, e JJ e KK, como avós paternos.

Para tanto alega factos constitutivos que demonstram que aquele que figura no seu registo de nascimento como pai, EE (pai de GG, falecida a … .04.1991 e mãe dos 1.º e 2.º réus), não pode ser efectivamente seu pai, devendo-se assim afastar a presunção legal {artigo 1796.º, n.º 2, do CC). Mais alega estar a acção “a ser instaurada em tempo, não obstante os normativos previstos no Código Civil relativos aos prazos para propositura de acções de impugnação e investigação de paternidade (artigos 1842.º e 1817.º por força do artigo 1873.º do Código Civil)”.

  1. Citados, apenas o 3.º réu, DD, deduziu contestação, invocando a caducidade do direito do autor e impugnando a matéria alegada, por não serem factos pessoais, serem inexactos ou não corresponderem à verdade.

  2. Seguidamente, a Mma. Juíza proferiu despacho em que referiu julgar estar em condições de proferir decisão de mérito em sede de despacho saneador, considerando, quanto ao pedido deduzido em A) da petição inicial, o disposto no artigo 1842.° do CC, na versão introduzida pela Lei n.º 14/2009, que confere aos filhos (ora demandante) o prazo de 10 anos contados a partir da maioridade para impugnar a paternidade presumida. Porém, para obstar a decisões convidou as partes para, querendo, se pronunciarem quanto à excepção deduzida, o que o autor fez, sustentando a inconstitucionalidade do artigo 1842.º, e alegou, ainda, que só por documento que obteve em 2014 teve conhecimento de circunstâncias de que pode concluir-se não ser filho do marido da sua mãe (artigo 1842.º n.º 1, al.

    c), do CC): quando obteve em … .09.2014 certidão de casamento da mãe, junto da Conservatória de Registo Civil, verificou, em tal certidão, que o casamento da mãe, ocorrido em … .08.1937, havia sido dissolvido por sentença de … .06.1962, proferida pelo Tribunal da Comarca da …..; a curiosidade levou, então, o A, ao arquivo judicial do extinto Tribunal de …. onde, por consulta do processo, verificou que foi alegado pela sua mãe, e dado como provado pelo tribunal que a mãe do autor se encontrava separada do seu marido há muito mais de 10 anos; ora, o autor nasceu em … .03.1955, ou seja, quando a mãe do autor já se encontrava separada do seu marido, pelo que não podia ser filho do homem que, sendo embora marido da mãe, já estava separado dela havia largo tempo. Por onde que a acção foi proposta tempestivamente.

  3. Na sequência, a Mma. Juíza proferiu saneador/sentença decidindo: “Relativamente ao primeiro pedido, de impugnação da paternidade presumida: - Julgo improcedente o pedido de recusa da aplicação do disposto no art. 1842º, n.º 1, al. c), do CC, por inconstitucionalidade; - Julgo verificada a exceção perentória da caducidade do direito de interpor a presente ação de impugnação da paternidade presumida e, em consequência, absolvo os Réus BB e CC do primeiro pedido.

    b). No que concerne ao segundo pedido, de investigação da paternidade, o seu conhecimento ficou prejudicado devido à improcedência do primeiro pedido, pelo que julgo extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide (277º, al. e), do Novo CPC), e, consequentemente, absolvo o Réu DD da instância”.

  4. Mediante apelação do autor, anulou o Tribunal da Relação do … a decisão, determinando o prosseguimento dos autos, por forma a ser produzida prova quanto à questão da caducidade do direito do autor.

  5. Baixados os autos e realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, em … .10.2017, que julgou: “a). Relativamente ao primeiro pedido, de impugnação da paternidade presumida: - [] improcedente o pedido de recusa da aplicação do disposto no art. 1842º, n.º 1, al. c), do CC, por inconstitucionalidade; - [] verificada a exceção perentória da caducidade do direito de interpor a presente ação de impugnação da paternidade presumida e, em consequência, absolvo os Réus BB e CC do primeiro pedido.

    b). No que concerne ao segundo pedido, de investigação da paternidade, o seu conhecimento ficou prejudicado devido à improcedência do primeiro pedido, pelo que julgo extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide (277º, al. e), do Novo CPC), e, consequentemente, absolvo o Réu DD da instância”.

  6. Novamente inconformado com o decidido, interpôs o autor recurso de apelação da sentença.

  7. Em … .09.2018, proferiu o Tribunal da Relação do …, por maioria, um Acórdão de cujo dispositivo consta: “Em face do exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente a apelação, em função do que na revogação da douta sentença recorrida, julgam a acção procedente, declarando que EE não é pai biológico do recorrente e se ordene a eliminação no assento de nascimento do A. da referência paterna e respectiva avoenga; e declare que o terceiro Réu DD é seu pai biológico e se ordene a inscrição no assento de nascimento do A. dessa paternidade e avoenga paterna; e devendo, após trânsito, efectuar-se a comunicação à conservatória do registo civil competente, nos termos do art.° 78.° do Código do Registo Civil.

    Custas pelo recorrido”.

  8. Desta decisão, que desaplicou a norma do artigo 1817.º, n.º 1 e n.º 3, al.

    b), do CC, com fundamento na sua inconstitucionalidade, recorreu o Ministério Público (recurso obrigatório) para o Tribunal Constitucional, tendo este, por decisão sumária, decidido: “Nos termos e pelos fundamentos expostos, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, decide-se:

    1. Não julgar inconstitucionais as normas constantes do artigo 1817.º, n.º 1, e n.º 3, alínea b), do Código Civil, na parte em que, quando aplicáveis à investigação da paternidade, prevêem, respetivamente, um prazo de dez anos e de três anos, verificadas as hipóteses legais, para a propositura da ação; b) Conceder provimento ao recurso, determinando-se a reforma da decisão recorrida em conformidade com o decidido quanto à questão de constitucionalidade”.

  9. Desta decisão sumária do Tribunal Constitucional veio, então, o autor apresentar reclamação, tendo a Conferência decidido revogar a decisão sumária e não tomar conhecimento do objecto do recurso.

  10. Pugnando pela confirmação na totalidade da decisão do Tribunal de 1.ª instância, vem o réu DD interpor recurso de revista.

    Conclui assim as suas alegações: “1ª- A questão objeto de recurso tem a ver com a não aplicabilidade por parte do douto tribunal de que se recorre, das normas legais previstas nos artigos arte 1842º nº 1 c) e 1817 nº 1 e 3 al b) por força do artigo 1873, todas do CC. que estabelecem o prazo de caducidade de 10 anos após atingir a...

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