Acórdão nº 0955/19.1BEAVR de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Janeiro de 2021
Magistrado Responsável | MARIA DO CÉU NEVES |
Data da Resolução | 14 de Janeiro de 2021 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO 1. RELATÓRIO A………………………., Ldª. com sede na Zona Industrial, ……………, nº ……., em Albergaria-a-Velha Moura, melhor identificada nos autos, intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro (TAF) acção administrativa de contencioso pré-contratual contra a AdRA – Águas da Região de Aveiro, SA., com sede na Travessa da Rua da Paz, nº 4, Cacia-Aveiro, indicando como contra-interessados B……………………., SA., com sede na Zona Industrial ………….., Lote ……….., no .. e, C……………., Ldª., com sede na ………………, nº ……, em Estarreja, tendo peticionado: “(i) a anulação do “acto de adjudicação praticado pela Ré, consubstanciado na declaração de nulidade da adjudicação à A. do contrato (…), e na adjudicação da proposta ordenada subsequentemente”.
(ii) subsidiariamente, a anulação do referido contrato, caso este já tenha sido celebrado, e a respectiva adjudicação à aqui A., fixando-se um prazo de 10 dias para o efeito; e ainda, (iii) subsidiariamente, “caso venha a ser considerado que não pode adjudicar-se a proposta da A., deve a Ré ser condenada a anular o procedimento ora em análise e a lançar novo procedimento concursal.
”*Por decisão do TAF, datada de 16 de Abril de 2020, foi decidido julgar a acção improcedente por não provada e, em consequência, absolver a Ré dos pedidos.
*A Autora apelou para o TCA Norte e este, por acórdão proferido a 15 de Julho de 2020, concedeu provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida e julgando procedente a acção.
*Deste Acórdão foram interpostos dois (2) recursos de revista.
Pela Ré, “AdRA–ÁGUAS DA REGIÃO DE AVEIRO, S.A., que na respectiva alegação, formulou as seguintes conclusões: «
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O douto acórdão do Tribunal a quo, por referência às questões suscitadas em sede de recurso, discorre sobre (6) seis seguintes pontos de análise: (1) Do meio impugnatório usado pela Contrainteressada: (2) Da violação do direito de audição prévia: Por facilidade de exposição, seguiremos a ordem discursiva da sentença do TCAN, pelo que se recuperará este ponto posteriormente.
(3) Da falta de fundamentação da decisão/ato impugnado; (4) Da violação de lei, por erro nos pressupostos de direito (cfr. 317º e ss do CCP; Portaria n.º 372/2017, de 14.12 e no ponto 6.1 do «programa do procedimento»); (5) Da aplicabilidade do disposto no artigo 163º do Código do Procedimento Administrativo; (6) Da violação dos princípios da igualdade, do formalismo, da publicidade, da proporcionalidade, da transparência, da concorrência e da imparcialidade.
B) Por celeridade de exposição, segue, a Recorrente, a mesma ordem. Assim, relativamente ao ponto (1), o TCAN (pág. 42 e ss da sentença), concordando com a sentença do TAFA, conclui de igual forma. Nada tem a assinalar, aqui, a Recorrente; Quanto ao ponto (2), e seguindo a ordem discursiva da sentença do TCAN, recuperar-se-á este ponto posteriormente; No ponto (3), o TCAN (na pág. 44 e 45), concordando com a sentença do TAFA, conclui de igual forma. Nada tem a assinalar, aqui também, a Recorrente; C) Relativamente ao ponto (4), o TCAN (de págs. 44 a 52), faz uma resenha das alegações das partes e da decisão do TAFA, relativamente ao entendimento sufragado por estas quanto à natureza mista do contrato e à legislação aplicável em matéria de documentos de habilitação a apresentar nos contratos mistos, bem como da necessidade de preenchimento dos requisitos de habilitação pelo concorrente, per se ou manifestando a mobilização de habilitações de terceiros, concluindo o TCAN (pág. 52) da seguinte forma: “Explicitamente o caderno de encargos prevê que sejam feitas as operações de construção civil associada às intervenções (cfr. cláusula 2ª do Anexo I, especificações técnicas e normativas, do caderno de encargos – cfr. supra D).)” (sublinhado nosso);” D) Ora a citada cláusula não “prevê”, nem diz rigorosamente nada disto, nem “explícita” nem implicitamente, conforme se pode verificar objetivamente no citado ponto D da sentença do TCAN (pág. 16 e 17). Andou mal o TCAN ao dizer uma coisa que não corresponde à verdade e ainda reforçar, usando a expressão “Explicitamente o caderno de encargos prevê”, o que não é verdade e é diretamente constatável pela contraposição com a cláusula em questão. O TCAN é que, com o devido respeito, confunde os conceitos, sendo-lhe indiferente o uso de “construção civil”, no sentido de “obra” ou “edificação” e o conceito jurídico de empreitada, nomeadamente para efeitos da Lei nº 41/2015, de 3 de junho, que estabelece o regime jurídico aplicável ao exercício da atividade da construção, e que no seu Anexo I, ex vi do disposto no seu art. 6º, nº 2, estabelece as categorias e subcategorias de trabalhos que estão sujeitas à obtenção de qualificações profissionais no âmbito da execução de empreitadas de obras públicas; E) Ora os trabalhos elencados na citada cláusula 2ª, n.º 1, al. a) a i), do Anexo I (Cláusulas Técnicas), do caderno de encargos, doravante CE, são trabalhos que, à luz do referido regime, no ponto anterior das conclusões, se inserem na categoria 4 “Instalações elétricas e mecânicas”, e portanto, para poderem ser exercidos, estão sujeitos à obtenção de qualificações mínimas que são tituladas no alvará do IMPIC respetivo; Crê mesmo a Recorrente que foi este errado e redutor entendimento do TCAN, o facto que esteve na base dos seguintes errados entendimentos, em cadeia.
F) Ainda dentro do ponto (4), o TCAN (pág. 53), conclui: “Mas face a uma relativa indeterminação do peso específico da prestação principal não sem sentido, e ajuizando que “a componente com maior expressividade corresponde à prestação de serviços e aquisição de bens móveis”, a própria entidade adjudicante fez prevalecer a “prestação de serviços” em caracterização do que viria a ser contratado, como remeteu, já em sede de execução, a respeito da conformidade e garantia técnica (cfr. cláusula 7.ª do caderno de encargos – cfr. supra D), para o regime dos contratos de aquisição de bens móveis, como é de legal remissão (art.º 451º do CCP).” Com tal entendimento não pode a Recorrente conformar-se, pois a escolha do procedimento foi realizada nos termos do disposto no art. 32º do CCP. Não se tratou de fazer “prevalecer a “prestação de serviços” em caracterização do que viria a ser contratado” (sublinhado nosso), como diz a sentença do TCAN. Conforme cabalmente explicado na contestação (artigos 7º a 25º e 42º a 47º da contestação) e constitui matéria assente, trata-se de um verdadeiro contrato misto. Nestes casos, e para efeitos de escolha do procedimento, dispõe o art. 32º do CCP, que deve escolher-se o regime previsto para o tipo contratual que caracteriza o objeto principal, para o que se deve atender, designadamente, ao valor estimado das prestações essenciais; Ora também conforme bem explicado e demonstrado na contestação (artigos 55º a 64º da contestação) e dado como matéria assente, não é possível a priori determinar um objeto principal nem qual a tipologia de prestações que vai ter maior expressão financeira no contrato pois tudo dependerá das concretas necessidades que surgirão, em cada momento, para a AdRA, podendo inclusivamente todo o valor esgotar-se numa só prestação e ou numa só tipologia contratual. Como determinar então o regime a aplicar? Ora a aqui recorrente partiu do plano de manutenção interno, mas esse plano não é transposto como objeto contratual, ou seja, o plano interno serviu apenas de base para a demandada tipificar as diferentes necessidades, fazer um elenco taxativo a constar do cabaz contratual, apenas para efeito de escolha do procedimento a adotar. Não é a execução tipificada, muito menos pacta sunt servanda, do plano interno de manutenção, que se pretende executar, o que constitui matéria assente; Nessas circunstâncias, tiveram maior expressão as necessidades classificadas como de aquisição de serviços. Acresceu que, por cautela jurídica, em respeito pela jurisprudência do Tribunal de Contas, o regime do contrato de aquisição de serviços é também muito mais restritivo para efeitos de limites de valor para a escolha do procedimento, pelo que a adoção do regime mais restritivo é garantia de mais formalidades essenciais na escolha do procedimento a adotar em função do valor, e assim, suscetível de comportar mais segurança jurídica, e por isso a escolha deste regime implicou, nos termos do disposto no art. 20º do CCP, a publicitação no Jornal Oficial da União Europeia (JOUE) (o que não aconteceria se o regime adotado fosse o das empreitadas), por se considerar que (face ao valor) o contrato passa a ter interesse potencial para os agentes económicos situados noutros Estados-Membros, alargando assim o mercado internacionalmente, possibilitando maior concorrência e transparência; G) A escolha do procedimento foi absolutamente adequada e a indefinição das quantidades e tipologias das prestações em causa é absolutamente natural e subjacente aos contratos – chapéu ou cabaz, sendo indiferente que os items pertençam todos a uma tipologia de contratos (p.ex., sejam todos bens, como por exemplo, bens de economato) ou pertençam a duas tipologias de contratos, como bens e serviços (por exemplo, aquisição do bem impressora e do serviço da sua manutenção), ou a todas as tipologias de contratos, como o caso concreto. Estes contratos caracterizam-se por ser uma bolsa de fornecimento disponível, que pode ser periódica ou apenas consoante as necessidades, como é o caso. Podem obviamente esgotar-se numa só prestação ou irem sendo utilizados até ao seu limite temporal ou um misto. Podem terminar por se ter atingido todo o valor ou por decurso do tempo de vigência. Podem ser solicitadas todas as categorias de contratos (bens e ou serviços e ou trabalhos de empreitada) ou apenas uma só categoria ou até se pode “esvaziar a bolsa” num só item. [Imagine-se um contrato chapéu ou contrato cabaz para aquisição de contadores e de serviços da sua leitura. Imagine-se que surge uma inesperada alteração...
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