Acórdão nº 253/12.1BEPDL de Tribunal Central Administrativo Sul, 07 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelRICARDO FERREIRA LEITE
Data da Resolução07 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo – Sul: I. Relatório J....., UNIPESSOAL, LDA, Autora/Recorrente, nos autos em epígrafe melhor identificada, em que é Réu/Recorrido o MUNICÍPIO DE VILA FRANCA DO CAMPO, veio interpor recurso da decisão proferida pelo TAF de Ponta Delgada, datada de 12.02.2018, que decidiu julgar procedente a exceção perentória de caducidade do direito à reversão, e em consequência, absolver o Recorrido do pedido.

A Recorrente formulou as seguintes conclusões: “a) No âmbito do processo n.º 253/12.1BEPDL, que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada, foi proferida sentença que decidiu, além do mais, «julga[r] procedente a excepção peremptória de caducidade do direito de reversão (...)»; b) O Tribunal a quo incorreu em erro na aplicação do direito face aos factos dados como provados, ao decidir procedente aquela excepção, considerando que o direito de reversão da ora Recorrente havia caducado; c) Tal decisão não se coaduna e é contraditória face ao seguinte facto dado como provado: «D- Desde finais de 2009, na parcela de terreno cedida passou a funcionar um estabelecimento comercial de café/bar (dado provado por acordo):» d) O raciocínio levado a cabo pelo Tribunal contraria o disposto no n.º 5 do artigo 5.º do Código das Expropriações que determina: "5- A reversão deve ser requerida no prazo de três anos a contar da ocorrência do facto que a originou (...) e) A correta aplicação do referido preceito teria, inevitavelmente, como consequência a improcedência da excepção invocada pela Ré uma vez que a propositura da accão - em Março 2012 - se encontrava perfeitamente em tempo; f) O entendimento segundo o qual o direito da Autora, em 2012, se encontra já caducado não pode merecer acolhimento face à realidade fáctica, sendo contrária ao normativo ínsito no n.º 5 do artigo 5.º do Código das Expropriações; g) A Recorrente cedeu 368.00 m2 de área para "equipamento de utilidade coletiva".

h) Aquando a cedência apenas ficou estipulado [Vide. alvará de loteamento n.º ....., de 10.05.2006) que aquela área seria destinada ao uso/fim de utilidade pública, sem lhe ter sido dado a conhecer em que se traduziria, concretamente, aquela afectação; i) Resultou claro e inequivocamente provado que "desde os finais de 2009, na parcela de terreno cedida passou a funcionar um estabelecimento comercial de cefé/bar (dado provado por acordo)"; j) Dispõe o n.º 1 do artigo 45.º do RJUE (em vigor à data da propositura da acção) que “o cedente tem o direito de reversão sobre as parcelas de terreno cedidas nos termos do artigo anterior sempre que estas sejam afetas a fins diversos daqueles para que hajam sido cedidas."; k) Equipamentos de utilidade pública são «os edificações onde se localizam actividades destinadas à prestação de serviços de interesse público imprescindíveis à qualidade de vida das populações»; l) A cedência será feita observando sempre os princípios norteadores da atividade administrativa, designadamente os princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade; m) O direito de reversão mais não é do que um afloramento do princípio da proporcionalidade que surge quando se depreende com elevado grau de certeza que o fim de utilidade pública não exige a lesão do bem do particular; n) Quando a Recorrente cedeu a referida área à Entidade Recorrida, estava em crer que a mesma iria ser utilizada para a prossecução do interesse público e não para a implantação de um café/bar e discoteca; o) Pese embora seja um estabelecimento comercial aberto ao público, não é um "equipamento de utilidade pública"!; p) A Recorrente desconhecia as reais intenções da Entidade Recorrida (em instalar a sociedade filarmónica e o café e discoteca), de outro modo não teria cedido gratuitamente os 368 m2 de terreno; q) Determina o artigo 5.º e do Código das Expropriações (doravante CE), aplicável ex vi n.º 2 do artigo 45.º do RJUE que a reversão deve ser requerida no prazo de três anos a contar da ocorrência do facto que a originou, sob pena de caducidade; r) Por sua vez, determina o n.º 1 do artigo 74.º daquele diploma: "A reversão a que se refere o artigo 5.º é requerida à entidade que houver declarado a utilidade pública da expropriação ou que haja sucedido na respectiva competência"; s) Em Janeiro de 2012, exerceu o seu direito junto da Entidade Recorrida - Câmara Municipal de Vila franca do Campo; t) A Entidade Recorrida não deu qualquer resposta ao pedido apresentado pela Recorrente; u) O Regime Jurídico da Urbanização e Edificação prevê a possibilidade de o cedente exercer o seu direito de reversão sobre as parcelas cedidas sempre que estas sejam afectas a fins diversos daqueles para os quais hajam sido cedidas; v) Prevê ainda aquele diploma que, em substituição da reversão, o cedente pode pedir uma indemnização (n.º 3 do artigo 45.º do RJUE); w) Este direito é uma concretização do princípio geral ínsito no princípio do Estado de Direito Democrático, de harmonia com o qual os actos lesivos de direitos e os danos causados a outrem determinam uma justa indemnização - Cfr., 62.º CRP e 23.º e 26.º Código das Expropriações; x) A Recorrente entende que a sentença enferma de erro de julgamento na apreciação do direito uma vez que não poderia ser dado como provado o facto enunciado no ponto "D" dos factos dados como provados, e concluir, como concluiu, que o direito de reversão já havia caducado; y) É que o raciocínio levado a cabo pelo doutro Tribunal a quo é, para além de contraditório, completamente alheio à realidade dos factos: z) Para a tomada de decisão o Mmo. Juiz do Tribunal a quo apenas tomou em linha de conta a existência de um protocolo celebrado entre a Recorrida e a mencionada Sociedade Filarmónica firmado no ano de 2005; aa) Não poderia ser aquela a data "da ocorrência do facto" para efeitos de contagem do prazo previsto no n.º 5 do artigo 5.º do CE; bb) Aquele preceito determina, de forma clara: "o reversão deve ser requerida no prazo de três anos a contar da ocorrência do facto que a originou sob pena de caducidade (...)" cc) No presente caso "o facto que a originou" foi a utilização para fim diverso - não de utilidade coletiva mas para a exploração de um café/bar e discoteca; dd) Pese embora não tenha resultado provado a exata data de inicio de actividade da referida Sociedade Filarmónica iniciou a sua atividade nem tampouco quando começaram as obras de execução da sua sede, resultou provado que no final do ano de 2009 ali se teria instalado um bar/café, contrariando os fins para os quais foi feita a cedência; ee) Ao ignorar este facto o Tribunal comprometeu a boa decisão da causa; ff) Para efeitos da contagem do prazo de caducidade previsto no n.º 5 do artigo 5.º do CE, o Tribunal a quo deveria ter em consideração aquela data (finais de 2009), e não outra; gg) Entendeu o Tribunal o quo: “in casu, o imóvel não foi aplicado ao fim estabelecido no loteamento (...) em Maio de 2006, data da emissão do Alvará, foi determinado o fim da parcela de terreno em causa para equipamentos de utilidade pública, e por isso, o direito de reversão nasceu decorridos dois anos sobre essa data, ou seja, Maio de 2008, sem que haja sido dada à parcela o fim a que se destinava»; hh) Adianta ainda a douta sentença: “em consequência, de Maio de 2008 a Maio de 2011 (três anos) teria a Autora de requerer a reversão do terreno ou a indeminização e, sua substituição, o que fez apenas em 03.01.2012 perante a Entidade Demandada, ou seja, quando já havia caducado o direito a exigir a reversão do terreno ou indemnização em sua substituição"; ii) Com o devido respeito, o raciocínio do Tribunal a quo não pode estar mais equivocado, jj) O Tribunal considerou que o direito de reversão nasce nos dois anos após a data da emissão do alvará de loteamento; kk) O Recorrente entende que o decurso do prazo de dois anos referido no n.º 1 do artigo 5. ° para que se considere ter ocorrido o facto que origina a reversão apenas é válido quando em causa esteja a reversão fundada na não utilização do bem ao fim da utilidade pública por omissão; ll) Se a não utilização para aquele fim decorrer de uma acção do Município de afectação do bem para um fim distinto daquele que justificou a cessão - é essa acção (independente do prazo que tiver decorrido desde a adjudicação) que se apresenta como o facto que origina a expropriação; mm) O direito de reversão estabelece uma importante garantia do particular e ao mesmo tempo um instrumento de defesa contra arbitrariedades infundadas por parte do Estado; nn) Este direito encontra fundamento na garantia conferida pela Constituição ao direito de propriedade, direito fundamental previsto, nomeadamente no artigo 62º da Lei Fundamental; "A todos é garantido o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte, nos termos da constituição; oo) O direito de propriedade define-se pelos poderes que confere ao seu titular, abrangendo, designadamente o direito de não ser privado deles; pp) «Com efeito, em qualquer caso, o direito de reversão, havendo desvio da finalidade de utilidade pública, fundamenta-se na própria Constituição da República (art. 62), como corolário da protecção constitucional da propriedade privada, cuja validade não depende da subsistência de um direito subjectivo determinado, mas decorre do próprio direito subjectivo, isto é, do instituto da propriedade privada» - Vide Ac. do Tribunal Constitucional nº 827/96, de 26 de Junho; qq) Tal como afirma António Lopes Cardoso, "...O direito de reversão existe não só como parte inseparável, umbilical, do que foi o seu berço, mas também como «cominação imposta por lei para garantir o particular do arbítrio da Administração» e, com existir, se traduz numa «faculdade», não num dever, que o expropriado pode exercitar a seu exclusivo aprazimento, verificado que seja o condicionalismo legal"; rr) O fundamento da reversão desemboca na garantia constitucional da...

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