Acórdão nº 00299/09.7BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Dezembro de 2020
Magistrado Responsável | Ros |
Data da Resolução | 17 de Dezembro de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. A Exma.
Representante da Fazenda Pública, vem recorrer da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel em 25.02.2014, pela qual foi julgada procedente a impugnação judicial deduzida por E., Lda.
contra a liquidação de IRC do ano de 2004, no valor global de € 802.963,21, anulando-se as correções impugnadas.
1.2. A Recorrente terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: “A. Julgou a douta sentença recorrida parcialmente procedente a impugnação deduzida contra a liquidação de IRC, respeitante ao exercício de 2004, no montante de €802.963,21, incidindo exclusivamente sobre duas matérias: provisões para créditos de cobrança duvidosa e custos não aceites, e sujeitos a tributação autónoma.
B. Primordialmente, sobre o objecto da impugnação, embora o sentido da douta sentença seja de procedência parcial, entende a Fazenda Publica que a impugnação foi totalmente procedente, na medida em que, a parte julgada improcedente, relacionada com a não aceitação da provisão de €5.668,25, não integrava o pedido, porque a própria impugnante que assumiu aceitar tal correcção.
C. Termos em que, não se formulando qualquer pretensão anulatória, nem em sede de pedido, nem de causa de pedir, relativamente a este ponto, estamos, na perspectiva da Fazenda Pública, perante matéria excluída do objecto da presente impugnação, que por tal motivo não poderá ser julgada procedente ou improcedente, materializando o seu julgamento excesso de pronúncia, que desde já se invoca.
D. Quanto às matérias relativas a provisões e custos não aceites foram individualmente apreciadas na douta sentença sob recurso, separação que vamos respeitar nas presentes alegações, e, com a ressalva do sempre devido respeito, que é muito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o doutamente decidido pelas razões que passa a expender.
E. Sobre a correcção das provisões para créditos de cobrança duvidosa, não se conforma a recorrente com a total destruição da factualidade recolhida na contabilidade da impugnante e cruzada, constante de um Relatório bem fundamentado, pormenorizado e tecnicamente rigoroso, através da primazia atribuída à prova testemunhal de uma normal funcionária administrativo, cujo depoimento reputamos de impreciso, conclusivo e genérico.
F. Sendo certo que, se os créditos eram em 2004 reputados de incobráveis, então, do ponto de vista contabilístico já não se poderia constituir qualquer provisão, mas antes reconhecer a perda respectiva, enquanto crédito incobrável, nos termos do art. 39º do CIRC, porque se o crédito é incobrável (34.º do probatório), já não há risco associado à sua incobrabilidade, há certeza de incobrabilidade.
G. Por outro lado, não resulta devidamente ponderada a razão originariamente subjacente à contabilização das provisões em 2004 que, segundo o TOC, teria tido como origem informação prestada pela gerência da sociedade impugnante, na qual o mesmo confiou.
H. Portanto, a questão das provisões, atendendo ao supra exposto e à profusão de elementos recolhidos em sede inspectiva, jamais poderia ser julgada procedente com fundamento na prova testemunhal de M., por a mesma não ter sido capaz de trazer para os autos, com o seu depoimento, todos os requisitos necessários para o preenchimento do conceito fiscal de provisão para créditos de cobrança duvidosa [por nem sequer se alcançar a razão pela qual só em 2004 a impugnante tomou consciência de que não receberiam os créditos pendentes].
I. Concluindo, considera a Fazenda Pública que a impugnante não logrou demonstrar um risco de incobrabilidade efectivo verificado no exercício de 2004, que justificasse a constituição de provisões neste exercício.
J. Ora, o respeito pelos princípios contabilísticos da especialização dos exercícios e o da prudência conduz a que contabilidade não se submeta ao arbítrio associado à violação das regras jurídico-tributárias, que teve por consequência afectação negativa dos resultados da empresa contrariando, também, o princípio da tributação das empresas pelo lucro real e efectivo, K. Na verdade, a conduta da impugnante, que só constitui provisões no exercício em análise e não nos anteriores, como devido, ou até no posterior, demonstra que a elaboração da sua contabilidade se afastou da tributação pelo lucro real e não teve, sequer, em consideração os documentos que foram exibidos perante a Administração Tributária em sede inspectiva, sendo manifestamente insuficiente a prova testemunhal apresentada, no sentido de provar que só em 2004, se concluiu pela incobrabilidade (ou risco de incobrabilidade) dos créditos em análise.
L. Assim, a provisão para créditos de cobrança duvidosa foi correctamente desconsiderada, e não é dedutível nos termos da alínea h) do n.º1 do art. 23º do CIRC, por não se enquadrar no âmbito da alínea a) do n.º 1 do art. 34º do CIRC, nos termos constantes do RIT, pelo que, entende a Fazenda Pública que, tendo a sentença determinado a procedência da impugnação relativamente às provisões incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de facto e de direito, na medida em que a fundamentação constante do RIT que conduziu à não aceitação dos custos fiscais decorrentes da constituição de provisões não se pode julgar destronada pelo mero testemunho, genérico, abstracto e conclusivo de uma funcionária administrativa da impugnante que se limitou a declarar que só em 2004 se convenceram da incobrabilidade dos créditos em causa.
M. Sobre os custos não aceites, documentados pelas facturas n.º 123, 148, 163 e 188 da sociedade angolana N., questiona-se a materialidade subjacente às facturas contabilizadas, bem como a entrega dos montantes facturados à entidade emissora dos documentos, na sequência do que se recorreu à tributação autónoma, como consequência da consideração de despesas confidenciais.
N. Como estamos perante um pagamento a uma sociedade não residente, relativamente à qual foi despoletado, em sede inspectiva, o mecanismo de controlo estipulado no art. 59º do CIRC, cabia à impugnante o ónus de demonstrar, independentemente da concreta situação que se vivia em Angola no ano de 2004, que os encargos correspondiam a operações efectivamente realizadas e não tinham um carácter anormal ou um montante exagerado.
O. A correcção teve lugar como consequência da não satisfação de tal ónus no âmbito do procedimento inspectivo, ónus que a impugnante também não o satisfez em sede judicial, não se tendo produzido, nem constando do probatório, factualidade que permitisse a afirmação contida no segmento decisório de que a impugnante provou, como lhe competia que tais encargos correspondem a operações efectivamente realizadas e não têm um carácter anormal ou um montante exagerado.
P. Acresce que, é irrelevante para o enquadramento legal da presente situação que Angola integre ou não a lista de países com regimes de tributação privilegiada, porque tal facto não obsta à aplicação do regime previsto no art.º 59º do CIRC, Q. De onde resulta que a correcção efectuada tem base legal.
R. Cumpre ainda salientar a destruição das folhas de ponto, a não exibição das facturas e o descontrolo dos movimentos financeiros, desconformes com o contratualmente estabelecido (que não podem considerar-se supridos por um singelo documento tardiamente exibido), a que acresce o retardamento no pagamento dos valores facturados, a relevância atribuída à moeda de pagamento e o facto de em 2006 se manter um saldo credor de €114.303,82, S. Porque caso fossem montantes destinados a pagar a trabalhadores angolanos locais, no respeito pela lei da paridade, e intermediados pela N., não se compreende o facto de os valores serem pagos maioritariamente (€34.038,20 em 2004 vs. €739.038,20 em 2005) no ano seguinte, em euros e subsistindo aquela dívida.
T. Por último, a pronúncia relativa à liquidação de IVA e a qualificação como “inacreditável”, referindo-se aos resultados hipoteticamente auferidos pela impugnante em Angola, não se mostra adequadamente fundamentadas, o que conduz à sua impugnação na presente sede.
U. Termos em que, a decisão de procedência no que a esta correcção se refere padece também de erro de julgamento de facto e de direito, uma vez que, estando no âmbito de aplicação do art. 59º do CIRC, que reveste carácter especial relativamente à consideração dos custos fiscalmente relevantes, a impugnante não satisfez o ónus probatório que sobre si impendia e a douta sentença, ao afastar a aplicação do normativo, incorreu em erro de julgamento.
V. Mantendo-se a correcção, nos moldes propugnados, também se mantém a correspondente tributação autónoma, por estarmos perante despesas confidenciais, subsistindo igualmente os juros compensatórios.
W. Termos em que, demonstrando-se o erro de julgamento subjacente à procedência da presente impugnação, deve a douta sentença sob recurso ser substituída por outra, que julgue improcedente a impugnação.
Nestes termos, Deve proceder-se à delimitação do objecto da presente impugnação com exclusão das matérias não impugnadas, relativamente às quais se verifica excesso de pronúncia, e, Deve revogar-se a douta sentença recorrida na parte em que julgou procedente a impugnação, com as legais consequências.” 1.3. O Recorrido formulou as respetivas contra-alegações, terminando com as seguintes conclusões: “A) -As correcções efectuadas aceites pela recorrida e a que a sentença alude, apenas são citadas por facilidade de explanação; B) - Nada impede que um testemunho, seja ele de quem for e tenha o seu autor a qualidade que tiver (doutor, engenheiro ou simples funcionário) possa demonstrar o desacerto de um qualquer relatório da inspecção tributária; C) - A sentença não afirma, contrariamente ao que alega a Fazenda Pública, que as conclusões a que chegou tiveram por base as declarações da M.; D) - Mesmo admitindo que a aludida testemunha M. tenha sido a fundamental para a...
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