Acórdão nº 7637/17.7T8LSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 17 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelJORGE LEAL
Data da Resolução17 de Dezembro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa RELATÓRIO Em 29.3.2017 Cristina apresentou perante os juízos locais cíveis do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa petição de ação declarativa de condenação com processo comum contra Maria Teresa, José, Fernanda e Orlando.

A A. alegou, em síntese, ser afilhada e herdeira testamentária de Gracinda (…), falecida em 28.10.2015. A sua falecida madrinha era arrendatária da fração correspondente ao 1.º esquerdo de um edifício (que identificou) pertencente aos RR., em Lisboa, sendo estes os senhorios. A madrinha da A. estava acamada e totalmente dependente de terceiros, em virtude de sequelas de dois AVC, tendo sido interditada, por sentença transitada em julgado em 21.02.2008, e tendo a ora A. sido nomeada a sua tutora. Devido à situação de dependência de Gracinda (…), a ora A. foi viver com ela, em economia comum, na dita fração, desde finais de 2011. Porém, devido a sérios problemas na instalação elétrica do edifício e à queda de parte do estafe do tecto da cozinha, por onde entravam baratas e outros insetos, e uma vez que os RR., devidamente alertados e intimados, não faziam as necessárias obras, a A. foi forçada, em finais de outubro de 2013, a mudar de residência com a sua madrinha, para o efeito arrendando uma fração (que identificou) também em Lisboa, ficando a A. obrigada a suportar integralmente uma renda mensal de € 550,00, desde novembro de 2013 a abril de 2016. A A. viu, assim, ser ilicitamente violado o seu direito a uma habitação condigna, com o que sofreu danos patrimoniais e não patrimoniais.

A A. concluiu pedindo que os RR. fossem condenados a pagarem-lhe: a) Uma indemnização, a título de danos patrimoniais, no valor de € 16 500,00; b) Uma indemnização, a título de danos não patrimoniais, em montante não inferior a € 3 000,00.

Os R. contestaram, alegando a prescrição do direito da A., negando que esta tivesse residido e vivido em economia comum com a dita inquilina e que a casa padecesse da invocada inabitabilidade. Alegaram que a A., à data dos factos invocados, era arrendatária do r/c direito do prédio onde morava Gracinda (…). À cautela, invocaram abuso de direito por parte da A..

Os RR.

concluíram a contestação pugnando pela sua absolvição do pedido e pela condenação da A. como litigante de má-fé, em multa e indemnização.

A A. respondeu à contestação, pugnando pela improcedência da prescrição arguida e impugnando os documentos juntos pelos RR.. Para tal, quanto à prescrição, defendeu que esta fora interrompida pela apresentação, perante a Segurança Social, de requerimento de nomeação de patrono e, além disso, a conduta imputada aos RR. era omissiva e manteve-se ao longo do tempo.

A pedido dos RR., a A. veio esclarecer que não punha em causa a genuinidade dos documentos que os RR. haviam juntado, mas tão só o seu valor probatório quanto aos factos alegados pelos RR.

Notificada para exercer o contraditório face a uma eventual condenação como litigante de má-fé, a A.

veio admitir que era arrendatária do r/c direito do dito prédio, onde viviam o seu companheiro e as suas duas filhas, mas reafirmou que, devido ao grau de dependência da madrinha, fora viver em economia comum com esta, pois o dito r/c direito, que só tinha três divisões, não reunia condições para acolher ambas. E, face a tudo isto e à inabitabilidade da casa arrendada pela madrinha, de que os RR. eram senhorios, vira-se forçada a arrendar o outro andar referido. Assim, a A. não omitiu qualquer facto relevante ou essencial para a decisão da causa, devendo o pedido de condenação da A. como litigante de má-fé ser julgado improcedente.

Em 11.6.2019 foi proferido saneador-sentença, no qual, após se considerar que o direito da A. se encontrava prescrito e que a A. litigara com má-fé, se emitiu o seguinte dispositivo: “Nestes termos e pelo exposto, julgo a presente acção improcedente e, em consequência, absolvo os Réus do pedido.

Condeno a Autora, por litigância de má fé, nos termos do disposto nos artigos 542.º, n.º 1 e 2, alíneas a) e b) e 543.º do Código de Processo Civil e 27.º, n.º 3 do Regulamento das Custas Processuais, em multa que fixo em duas Unidades de Conta e em indemnização aos Réus no valor total de 1008 (mil e oito) Euros.

Custas pela Autora, nos termos do disposto no artigo 527.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, atentando-se que beneficia de Apoio Judiciário.

Nos termos do disposto nos artigos 296.º, 297.º, n.º 1 e 306.º todos do Código de Processo Civil, fixo como valor da presente acção o do pedido, 19.500 Euros (dezanove mil e quinhentos Euros).

” A A.

apelou da sentença, tendo apresentado alegações em que formulou as seguintes conclusões: I. A A., e ora Recorrente, intentou, em 29 de Março de 2017, a acção de condenação contra os RR., e ora Recorridos, no pagamento de uma indemnização, a título de danos patrimoniais, no valor de € 16 500,00 (dezasseis mil e quinhentos euros), nos termos do disposto no art. 483º do Código Civil, e, a título de danos não patrimoniais, em montante não inferior a € 3000,00 (três mil euros), tendo apresentado pedido de apoio judiciário na modalidade de dispensa total de pagamentos de custas e de nomeação de patrono, a fim de instaurar acção cível no 20 de Outubro de 2016 e tendo-lhe sido nomeada Patrona por Ofício datado de 24 de Fevereiro de 2017; II. Fundamentando a sua pretensão no facto de, com a sua conduta omissiva, os RR. serem os responsáveis pelo agravamento do mau estado da fracção e da deterioração das condições de habitabilidade tornando insustentável a permanência da A. e da arrendatária na habitação; III. Levando a A. a mudar de residência com a sua madrinha acamada e num estado de grande debilidade; IV. A arrendar a fracção sita na Rua da Infantaria (…) R/c esquerdo, em Lisboa, para esse fim; V. E a suportar integralmente o pagamento de uma renda mensal de € 550 (quinhentos e cinquenta euros), desde Novembro de 2013 a Abril de 2016, no valor total de € 16 500,00.

VI. Os RR. invocaram a prescrição alegando que a A. tinha conhecimento dos factos desde Outubro de 2013; VII. E veio o Tribunal a quo Despacho Saneador-Sentença, e ora em apreço, veio a Meritíssima Juiz a quo decidir que “…à data da propositura da presente acção tinham já decorrido três anos desde o conhecimento pela Autora dos factos em que funda a responsabilidade civil dos Réus, inexistindo qualquer causa de interrupção ou suspensão desse prazo, pelo que se mostra prescrito o alegado direito a indemnização da Autora.

” VIII. E tendo por fundamento que “Nos termos do disposto no artigo 498.º, nº 1 do Código Civil, o direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do facto danoso.”; IX. Acrescentando que “Da própria exposição factual da Autora na Petição Inicial resulta que pelo menos desde Outubro de 2013 teve conhecimento do direito que pretende alegar na presente acção, não relevando para o início e decurso do prazo a conduta dos Réus, nomeadamente se a mesma se manteve ou não ao longo do tempo, mas nos termos legais, quando o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete.

” X. Ora, salvo o devido respeito por diverso entendimento, o pressuposto relevante para o prazo prescricional da norma constante do art. 498º nº 1 do Código Civil é o do conhecimento do direito; XI. E não resultando da Petição Inicial que a A. tenha tido conhecimento do direito que lhe assistia em Outubro de 2013, antes sim do facto (omissivo) ilícito e dos seus responsáveis; nem tendo os RR. logrado provar, de acordo com o ónus da prova que sobre eles impendia, os factos extintivos do direito invocado, nos termos do disposto no art. 342º nº 2 do Código Civil, pelo que, o Tribunal a quo, ao decidir como decidiu, violou por errada interpretação a norma constante do art. 498º nº 1 do Código Civil.

XII. Acresce que, a Meritíssima Juiz a quo, ao julgar procedente a excepção peremptória invocada, nos termos em que o fez, absolvendo os RR./Recorridos da totalidade do pedido quanto aos danos patrimoniais, não considerou que a conduta omissiva e continuada dos RR., e ora Recorridos, foi causando um dano, em cada mês que a A. suportou a renda, no valor mensal de € 550,00, pelo que, em relativamente aos danos que se foram verificando mês após mês, o prazo de prescrição só começaria a contar a partir do momento em que a A. tomou conhecimento da produção efectiva desses novos danos; XIII. Pelo que não estaria prescrito o direito à indemnização pela totalidade dos danos patrimoniais causados à A. pelos RR., nos termos em que foram pedidos pela Recorrente, não devendo a excepção peremptória invocada ter procedido como foi decidido no Despacho Saneador-Sentença, violando, por errada interpretação, a norma constante do art. 498º nº 1 do C.C.

XIV. Na Decisão ora recorrida, foi a A. condenada em litigância de má fé, tendo o Tribunal a quo ponderado os factos alegados pelas partes, nomeadamente, na Petição Inicial e na Contestação, fundamentando a Meritíssima Juiz a quo tal decisão no facto de a A. não ter referido na Petição Inicial de que era titular...

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