Acórdão nº 139/17.3IDLSB-A.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 10 de Dezembro de 2020
Magistrado Responsável | CALHEIROS DA GAMA |
Data da Resolução | 10 de Dezembro de 2020 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam, em conferência, na 9a Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Lisboa: I – Relatório 1. No âmbito do processo sumaríssimo (art. 392º do CPP) n.º 139/17.3IDLSB, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste - Juízo Local Criminal da Amadora - Juiz 4, em que, para além de outra arguida pessoa singular, é arguida a pessoa coletiva AA………… S.A.
, NIPC …………., com sede no …………………………………, freguesia de Cacém e São Marcos, concelho de Sintra, condenada, por sentença nele proferida em 17 de janeiro de 2019 e transitada em julgado em 11 de abril de 2019, pela prática, em 2016, de dois crimes de abuso de confiança fiscal, previstos e punidos pelos artigos 7.°, n.°s 2 e 3, 12.º, n.° 1, 15.º, n.° 1, e 105.°, todos do RGIT, na pena de 60 dias de multa, por cada um dos crimes e, em cúmulo na pena única de 90 (noventa) dias de multa, à taxa diária de € 6 (seis euros), o que perfaz a quantia global de € 540 (quinhentos e quarenta euros), foi, em 20 de fevereiro de 2020, prolatado o seguinte despacho pela Mmª Juíza dele titular: “Acompanhando os fundamentos exarados na promoção, que antecede, com os quais se concorda, conclui-se que das circunstâncias não se pode induzir que existe, sem mais, perigo de prática de novos crimes, pelo que, ao abrigo do disposto no número 1 do artigo 13° da Lei n.° 37/2015, de 05 de Maio, e por se encontrarem verificados os pressupostos aí plasmados, determina-se a não transcrição da sentença proferida nos presentes autos nos certificados a que se referem o n° 5 e 6 do artigo 10° do referido diploma.
Notifique.” (fim de transcrição - cfr. referência Citius n.º 123937981).
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O Ministério Público inconformado com a mencionada decisão, interpôs recurso extraindo da sua motivação as seguintes conclusões: 1.
Nos autos de processo sumaríssimo, por decisão transitada em julgado em 11.04.2019, foi a arguida "AA", condenada pela prática de dois crimes de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelos artigos 7.º, n.ºs 2 e 3 do art.° 12.º, n.° 1 do art.° 15.° e n.° 1 do art.° 105.°, todos do RGIT, na pena de 60 dias de multa por cada um dos crimes e, em cúmulo na pena única de 90 (oitenta[1]) dias de multa, à taxa diária de € 6 (seis euros), o que perfaz a quantia global de € 540 (quatrocentos e oitenta euros[2]).
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Após requerimento da arguida e promoção do Ministério Público, em 20.02.2020 foi proferido despacho a determinar a não transcrição da sentença proferida nos presentes autos nos termos do disposto no artigo 13.°, n.° 1, da Lei n.° 37/2015, de 05 de Maio.
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Só na sequência da comunicação da Direção de Serviços de Identificação Criminal (de 26.02.2020) - a qual informa a devolução do boletim remetido a ordenar a não transcrição, por não ser legal e tecnicamente possível registar a decisão proferida nos termos do n° 1 do artigo 13° da Lei n° 37/2015 - o Ministério Público, dá conta do lapso ocorrido aquando da sua promoção anterior (ao promover o deferimento do requerido, no sentido da não transcrição da condenação para o CRC da sociedade arguida), circunstância, que se ficou a dever única e exclusivamente à utilização errada de ferramentas informáticas e de texto automático (utilizado no sistema operativo "word") e bem assim, à crescente acumulação de tarefas, não se tendo atendido à circunstância de a arguida/ requerente se tratar de uma pessoa colectiva e não de uma pessoa singular.
Ora, 4.
O art.° 13°, n.º 1, da Lei n.° 37/2015, de 05 de Maio, estabelece as condições para a não transcrição da condenação no registo criminal, para efeitos meramente civis, referindo-se expressamente às pessoas singulares e não às pessoas coletivas.
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Como se pode ler no Ac. do TRG, de 06.02.2017 (disponível em: www.dgsi.pt): a finalidade do preceito é a de, em casos menos graves, restringir a desinserção social e a estigmatização do agente, não o prejudicando nomeadamente em termos laborais ou de acesso ao emprego. Questão que se não põe, nos mesmos termos, com as pessoas coletivas.
E bem assim: o facto de não se falar nas pessoas coletivas, quando da possibilidade de o Juiz determinar a não transcrição parcial da decisão, parece não surgir de qualquer lapso ou esquecimento do legislador, mas da sua própria vontade. Com efeito, foi o mesmo que foi restringindo a previsão do normativo, dela retirando as pessoas coletivas.
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Outrossim, o actual art.º 10.°, n.° 7 da Lei n.° 37/2015, de 05 de Maio, refere que "os certificados do registo criminal requeridos por pessoas coletivas ou entidades equiparadas contêm todas as decisões de tribunais portugueses vigentes." Nestes termos e nos demais de direito, que doutamente se suprirão, deverá o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência deve o despacho proferido em 20.02.2020, ser revogado e substituído por outro que indefira o requerimento da arguida de não transcrição da decisão condenatória dos autos no CRC, nos termos do disposto nos art.°s 10.
º, n.° 7 e 13.°, n.° 1, da Lei n.° 37/2015, de 05 de Maio.
Mas na certeza que V. Excelências farão tão costumada Justiça!" (fim de transcrição) 3. Foi proferido despacho judicial admitindo o recurso (cfr. referência Citius n.º 124985741).
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Respondeu a arguida AA………. SA sem extrair da sua motivação conclusões, terminando da seguinte forma: “Termos pelos quais, deve ser aferida a extemporaneidade do douto recurso interposto pelo Ministério Público, e, em qualquer circunstância, deve improceder por não provado o recurso interposto, devendo ser proferida decisão que mantém na sua totalidade a decisão recorrida, porque assim se fará Justiça às pessoas coletivas.” (fim de transcrição).
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Subidos os autos, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta teve neles “Vista” e emitiu o seguinte parecer: “Acompanha-se a posição da Magistrada do Ministério Público junto da 1ª instância que se pronuncia no sentido de que a lei, concretamente a Lei º 37/15, de 5/5, não permite que, relativamente às pessoas coletivas, seja determinada a não transcrição das condenações no registo criminal, o que decorre do disposto nos artigos 10º, n.º 7 e 13º, n.º 1 do citado diploma, devendo, assim, o recurso ser considerado procedente.” (cfr. referência Citius n.º 16004444).
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Foi cumprido, oficiosamente, o preceituado no art. 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal (doravante CPP), não tendo havido resposta.
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Efetuado o exame preliminar foi considerado não haver razões para a rejeição do recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre agora apreciar e decidir.
II – Fundamentação 1.
Questão prévia – Relativa à tempestividade do recurso.
Na sua resposta ao recurso a arguida AA… SA expendeu a início: “O recurso interposto pelo Ministério Público parece claramente extemporâneo.
Na verdade, o despacho em apreciação no presente processo foi proferido no dia 20.02.2020, após requerimento da recorrida e promoção confirmativa do Ministério Público.
Na verdade, a recorrida apresentou nos autos REQUERIMENTO PARA NÃO TRANSCRIÇÃO PARA O REGISTO CRIMINAL, no dia 27.12.2019 (Referência Citius 16064743).
No seguimento, o Ministério Público, em promoção de 10-01-2020, faz uma transcrição parcial do n° 1, do art° 13°, da LIC, e determina que se junte CRC atualizado e pesquisa de processos, para uma melhor decisão.
No dia 06-02-2020 é junto aos autos o Certificado do Registo Criminal a recorrida, como determinado pelo MP.
No dia 10-02-2020, o MP em douta promoção declara que "nada tem a opor ao requerido".
Nesta promoção o MP volta a transcrever a mesma norma legal, onde consta expressamente "pessoa singular".
No dia 20-02-2020 é proferida decisão pelo Tribunal "a quo", aqui em recurso, onde se pode ler que acompanha e concorda com os fundamentos do MP e onde se conclui e decide a não transcrição da sentença proferida no processo.
No dia 21-02-2020, o Tribunal elabora e envia para a Direção Geral da Administração da Justiça, o respetivo...
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