Acórdão nº 0415/16.2BEVIS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução16 de Dezembro de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1.- Relatório A…….. – COMPANHIA DE GÁS ………., S.A.

, Recorrente no presente processo, tendo sido notificada da Decisão Sumária proferida nos autos, no sentido da negação de provimento ao recurso, vem pelo presente deduzir RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA, ao abrigo do n.º 3 do artigo 652º do Código de Processo Civil (CPC), aplicável por força da alínea e) do artigo 2º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) nos termos e com os seguintes fundamentos constantes do respectivo requerimento e que, em síntese útil, entende que a Decisão Sumária reclamada deve ser anulada e substituída por um acórdão que se debruce sobre a questão da constitucionalidade dos artigos 2.º, 3.º, 4.º, 11.º e 12.º do regime jurídico da CESE em vigor em 2015, por força do artigo 237º da Lei n.º 82-B/2014, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2015), tendo em consideração a motivação desenvolvida pela ora Reclamante nas suas alegações de recurso produzidas nos autos.

Satisfeitos os vistos legais, cumpre, pois, aquilatar se assiste razão à reclamante.

* 2.

O Relator deste processo, por decisão singular proferida em 2 de Julho de 2020, decidiu negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.

Irresignada com tal decisão a AT e Reclamante, veio reclamar para a conferência da decisão singular do relator.

Vejamos.

O regime da decisão singular de mérito apenas proferida pelo Relator foi introduzido pelo DL 329-A/95, podendo a parte afectada pela decisão reclamar desta para a conferência conforme disposições conjugadas dos art°s. 705° e 700° n° 3 CPC, hoje, art°s. 656° ex vi 652° n° 1 c) e n° 3 CPC da revisão de 2013.

Deduzida reclamação para a conferência o colectivo de juízes reaprecia as questões que foram objecto da decisão singular do Relator e, nesse sentido, caso se esteja perante a decisão sumária do recurso, reaprecia novamente o recurso, naturalmente sem qualquer vinculação ao anteriormente decidido.

No entanto, se assim é, ou seja, se normalmente a intervenção da conferência, no caso em que se reclama de uma decisão sumária, faz retroagir o conhecimento do mérito da apelação ao momento anterior àquela decisão, importa ter presente que, nos termos gerais, no recurso ou na reclamação, o Recorrente ou o Reclamante podem restringir o seu objecto, isto é, o requerimento para a conferência (mesmo resultante de convolação do requerimento de interposição de recurso de revista) pode restringir o objecto próprio da reclamação, concretamente identificando a parte da decisão sumária de que discorda (da qual se sente prejudicado).

No que respeita à possibilidade de, em sede de reclamação da decisão singular do Relator, pode o Recorrente restringir o objecto do recurso, identificando os segmentos decisórios sobre os quais demonstra o seu inconformismo. Trata-se, na prática, de uma solução que se encaixa na possibilidade de desistência do recurso, nos termos que constam do art° 632° n° 5, com a especificidade de a extinção da instância ser, aqui, parcial- Cfr. Abrantes Geraldes, in Recursos no novo Código de Processo Civil, Almedina/2013, pág. 85.

O que implica precisar o pressuposto legal de delimitação do âmbito da pretensão recursória e das hipóteses legais de modificação.

A delimitação objectiva do recurso é dada pelas conclusões, cfr. art°s. 635° n° 4, 637° n° 2 e 639° n°s 1 e 2 CPC, na medida em que "(..) A motivação do recurso é de geometria variável, dependendo tanto do teor da decisão recorrida como do objectivo procurado pelo recorrente, devendo este tomar em consideração a necessidade de aí sustentar os efeitos jurídicos que proclamara, de forma sintética, nas conclusões. (...) Mas, independentemente do âmbito definido pelo recorrente no requerimento de interposição, é legítimo restringir o objecto do recurso nas alegações, ou, mais correctamente, nas respectivas conclusões, indicando qual a decisão (ou parte da decisão) visada pela impugnação.

(...) A restrição pode ser tácita em resultado da falta de correspondência entre a motivação e as alegações, isto é, quando, apesar da maior amplitude decorrente do requerimento de interposição de recurso, o recorrente restrinja o seu âmbito através das questões que identifica nas conclusões. (..)", cfr. art° 635° n° 4 CPC. (cfr. Abrantes Geraldes, in Recursos no novo Código de Processo Civil, págs. 115, 84/85).

No tocante à ampliação do objecto do recurso, o art° 636° n°1 CPC permite que, embora a decisão seja favorável à parte e a parte vencida interponha recurso, caso no Tribunal a quo não tenha acolhido todos ou alguns dos fundamentos da acção (de facto ou de direito) suscitados pela parte vencedora, essas questões serão reapreciadas pelo Tribunal ad quem a requerimento do Recorrido em alegações complementares, isto é, o Tribunal de recurso reapreciará os fundamentos do segmento da sentença recorrida em que aparte vencedora tenha decaído.

Do complexo normativo citado se conclui que o acto processual de convocação da conferência no regime do art° 652° n° 1 c) e n° 3 ex vi 656° CPC não é configurado como meio adjectivo próprio para alterar as conclusões de recurso, ressalvada a hipótese já mencionada de limitação do objecto (art° 635°/4 CPC), nem para desistir do recurso (art° 632° 5 CPC), posto que "(...) a desistência do recurso apenas é possível até à prolação da decisão, tornando-se agora inequívoca a solução que já anteriormente se defendia. Representa uma medida que valoriza o papel do tribunal superior, evitando que o recorrente accione o mecanismo da desistência depois de ter sido confrontado com o resultado do recurso.

Aliás, o momento que releva para o efeito nem sequer é o da notificação da decisão, mas antes o da sua prolação (...)" –(cfr. Abrantes Geraldes, in Recursos no novo Código de Processo Civil, págs. 71/72).

Neste sentido, junta aos autos a decisão singular de mérito sobre o objecto do recurso proferida pelo relator (art° 652°/1 c) ex vi 656° CPC) ocorre nessa data a preclusão de exercício do direito de desistência por parte do recorrente, cfr. art° 632° n° 5 CPC.

A reclamação para a conferência constitui o meio adjectivo próprio ao dispor da parte que se sinta prejudicada pela decisão individual e sumária do relator sobre o objecto do recurso, podendo o recorrente/reclamante, nessa reclamação, restringir o objecto do recurso no uso do direito conferido pelo art° 635° n° 4 CPC, mas não pode ampliar o seu objecto, faculdade limitada ao recorrido nos termos do art° 636° n°1 CPC, isto é, limitada à parte vencedora que tendo decaído em alguns dos fundamentos da acção, apesar disso, obteve vencimento no resultado final.

No regime do art° 652° n° 1 c) e n° 3 ex vi 656° CPC a reclamação para a conferência da decisão sumária proferida apenas pelo relator faz retroagir o conhecimento em conferência do mérito da apelação ao momento anterior àquela decisão sumária, conhecimento limitado às questões especificadas pelo recorrente nas conclusões de recurso, sem prejuízo de o recorrente, ora reclamante, restringir na reclamação o objecto recursório anteriormente definido nos termos do art° 635° n° 4 CPC.

Pelas razões de direito expostas, no caso concreto cumpre reapreciar as questões suscitadas pela Reclamante em sede de conclusões de recurso, fazendo retroagir o conhecimento do mérito do recurso ao momento anterior à decisão singular de mérito apenas proferida pelo Relator.

E foi isso que exactamente ocorreu no caso concreto, passando a apreciar-se do bem fundado da decisão singular proferida pelo Relator.

Esta, é do seguinte teor: (Decisão Sumária) + 1 – Relatório inconformada com a sentença do TAF de Viseu, que julgou improcedente impugnação judicial deduzida contra o indeferimento tácito de reclamação graciosa intentada contra o ato de autoliquidação da CESE de 2015, no entendimento de que o tributo tem a natureza de contribuição financeira, sendo que as normas que a regulam são conformes à CRP, não se mostrando violados os princípios da capacidade contributiva, tributação sobre o rendimento real, equivalência e proporcionalidade.

Formulou as seguintes conclusões: A Recorrida não contra-alegou.

Recebidos os autos neste Supremo Tribunal, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja deve ser negado provimento ao recurso remetendo para a jurisprudência deste STA, manifestada, designadamente no acórdão proferido em 08/01/2020-P. 0386/17 (disponível em www.dgsi.pt), em consonância com a já jurisprudência do TC sustenta a conformidade legal e constitucional da CESE, ora, em análise.

* 2.- Fundamentação 2.1.- Questão a decidir É a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao julgar improcedente a acção deduzida pela ora recorrente na consideração de que o tributo tem a natureza de contribuição financeira, sendo que as normas que a regulam são conformes à CRP, não se mostrando violados os princípios da capacidade contributiva, tributação sobre o rendimento real, equivalência e proporcionalidade.

2.2. De facto Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 663º, nº6 do NCPC, dá-se aqui por reproduzida a matéria de facto constante da sentença recorrida.

*2.3. Do Direito As questões que se suscitam no presente recurso são precisamente as mesmas que se suscitavam no processo nº 0386/17, julgado em 08/01/2020- (disponível em www.dgsi.pt), tirado por este relator, em consonância com a já citada jurisprudência do TC sustenta a conformidade legal e constitucional da CESE, ora, em análise.

O julgamento que aí se fez – no sentido da confirmação da sentença recorrida, também aqui, por integral adesão à douta fundamentação deles constante, para a qual expressamente se remete, pois que se trata de caso análogo, e, como tal, merecedor do mesmo tratamento.

Assim, sem mais delongas, e pelos fundamentos constantes do Acórdão de 08/01/2020– de que se junta cópia – haverá que negar...

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