Acórdão nº 1751/19.1T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Novembro de 2020
Magistrado Responsável | MARGARIDA ALMEIDA FERNANDES |
Data da Resolução | 26 de Novembro de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I – Relatório A. M.
instaurou a presente acção, na forma de processo comum, contra Y. P.
pedindo o reconhecimento do seu direito de crédito sobre a ré no montante de € 91.126,24 e a condenação desta a restituir-lhe tal montante.
Alega, em síntese, que emprestou a ré € 91.126,24, quantia com a qual esta pagou o preço de um imóvel por si adquirido, bem como o respectivo imposto de selo e emolumentos do registo predial. A ré não lhe restituiu tal quantia, apesar de a ter interpelado para tal.
*A ré contestou impugnando o alegado e dizendo que a referida quantia foi-lhe doada.
*Foi realizada audiência prévia, onde se fixou o valor da acção, identificou o objecto do litígio, enunciaram os temas de prova, bem como foram admitidos os requerimentos probatórios.
*Procedeu-se a audiência de julgamento, após a qual foi proferida sentença, cuja parte decisória, na parte que interessa, reproduzimos: “Pelo exposto, julgo a ação improcedente, e, em consequência, absolvo a R. do pedido.
Custas a cargo do A. - art. 527º, do C.P.C.”*Não se conformando com esta sentença veio o autor dela interpor recurso de apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões: “1º O autor/apelante na acção identificada peticionou que fosse o seu direito de crédito no valor de 91.126, 24 euros reconhecido, bem como a ré/apelada condenada na restituição desse valor.
-
Considerou o tribunal a quo, como factos provados, nomeadamente o no número 3 e 4 que o valor da aquisição do imóvel identificado nos autos, foi pago pelo recorrente/autor “através de dois cheques bancários, um com o valor de 10.000,00 (dez mil euros) emitido pelo Banco ... S.A. e numero ......60 e outro no valor de 80.000,00 (oitenta mil) euros sob o n.º ......37 emitido pelo mesmo banco” e o “A. pagou ainda, as despesas com imposto de selo, no valor de 736,24 euros e os emolumentos do registo predial, no valor de 390,00 euros.” 3º O Exmo. Juiz do tribunal a quo não se pronunciou explicitamente, quanto ao pedido invocado pelo autor (reconhecimento de crédito) e apesar de estar o implícito nos factos considerados provados na douta sentença é certo que o não foi mencionado na douta decisão.
-
Configura assim uma nulidade da sentença prevista nos artigo 615.º n.º 1 al. c) e d) do Código Processo Civil, que se invoca.
-
A douta decisão que se recorre, considerou como não provados os seguintes factos: 1- a R. pediu ao A., na condição de empréstimo, uma quantia, para aquisição de um imóvel em Portugal, ao que o A., acedeu. 2- -os valores pagos pelo A., referidos em 3 e 4 dos factos provados, foram pagos a titulo de “ empréstimo” à R.…” 6º Salvo devido respeito, não fez o tribunal a quo, nos pontos da matéria de facto dada como não provada na sentença recorrida e que vem concretamente referidos nos pontos 1 e 2 dos factos não provados do item III destas motivações de recurso e que aqui se do integralmente por produzidos.
-
O tribunal a quo não apreciou concretamente toda a prova produzida em audiência e na sua apreciação violou as regras da experiencia e da lógica de um homem médio colocado nas mesmas circunstâncias pela ordem jurídica.
-
Pois de acordo com as regras da experiencia comum e os critérios da lógica, teria forçosamente impor decisão diversa, isto é, considerar os factos como provados o que foi dado como não provado e acima identificado.
-
O tribunal a quo não teve em consideração a prova documental junta aos autos, nomeadamente as cópias dos cheques, prova que em fins de 2017 reservou em seu nome o imóvel em questão e fez o pagamento do valor de 10.000,00 euros de sinal através de cheque emitido em 04/12/2017.
-
Prova essa, que aliada as declarações de parte prestadas pelo autor/apelante na sessão de julgamento do dia 12/03/2020 que aqui se dão como reproduzidas e o depoimento da testemunha A. J. prestado na sessão de julgamento de dia 12/03/2020 que igualmente se dá como reproduzido, demonstra que o mesmo nunca teve qualquer intenção de oferecer/doar o imóvel identificado à ré/apelada.
-
O tribunal a quo não deu a devida credibilidade ao depoimento da testemunha A. J., que sem qualquer interesse na demanda, que referiu que o autor/apelante comentou com a mesma que a mudança de titularidade no acto da outorga da escritura pública do imóvel em questão se deveu a um alegado empréstimo.
-
Salvo devido respeito, não deu o tribunal a quo a devida relevância ao documento de fls. 17 e fls. 18, comunicação por mensagem escrita e enviada pela mãe da ré/apelada ao autor/apelante, em que refere que a filha em conjunto com a mesma estariam a diligenciar para liquidar o empréstimo efectuado pelo autor/apelante à ré/apelada.
-
Conjugada com a prova documental, in casu a procuração outorgada a favor do autor/apelante pela ré/apelada, com as declarações prestadas em sessão de julgamento por ambos, de acordo com as regras da experiencia comum e critérios da lógica, levaria que o tribunal a quo desse como provado a existência de um empréstimo.
-
De igual modo mediante as declarações prestadas pela ré/apelada e conjugada com os depoimentos das testemunhas E. P. e C. C., prova que a procuração outorgada pela ré/apelada e posteriormente revogada, era uma condição ou garantia do valor mutuado pelo autor/apelante a favor da ré/apelada.
-
Salvo melhor opinião, conforme as declarações prestadas pela ré/apelada, prova que a mesma teria ou demonstrou condições para que o autor/apelante fosse ressarcido do valor mutuado.
-
Andou mal o tribunal a quo em considerar o depoimento de M. G. prestado na sessão de audiência de julgamento no dia 12/03/2020 e de M. C. na sessão de julgamento de dia 17/06/2020, quando ficou provado e demonstrado que tais depoimentos estão feridos de credibilidade por existir uma relação de proximidade e de acordo com as regras da experiencia comum e critérios da lógica os mesmos estariam inquinados para as inverdades.
-
Prevê o artigo 1142.º do Código Civil que o mútuo é um contrato pelo qual uma das partes em presta à outra dinheiro ou outra coisa fungível, ficando a segunda obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade.
-
O contrato de mútuo é um contrato bilateral ou sinalagmático, emergindo da sua celebração obrigações recíprocas para ambos contraentes, e oneroso.
-
É um contrato típico e assume a natureza de um contrato real, quoad constitutionem, porquanto só fica perfeito com a entrega da quantia ou da coisa para a esfera de propriedade do mutuário e a obrigação de restituir outro tanto do mesmo género do que foi recebido.
-
Cabia ao autor/apelante o ónus da prova de que a compra do imóvel teria subjacente um empréstimo realizado à ré/apelada no valor de 91.126,00 euros, de que foi entregue essa quantia e que estava obrigada a restituir-lha.
-
A ré/apelada por sua vez, veio confirmar que o autor/apelante pagou com o referido imóvel com valores da sua propriedade, mas que a causa seria a titulo de doação.
-
Foi inequívoco que o autor/apelante utilizou quantias da sua propriedade para a compra do identificado imóvel, ainda propriedade da ré/apelada.
-
Foi ainda provado que o autor/apelante só o fez, com a condição e através de uma “garantia “ cedia pela ré/apelada, neste caso a procuração com poderes de compra e venda, entre outros.
-
Foi provado que o autor / apelante interpelou a ré / apelada para o pagamento do seu credito, neste caso 91.126,24 euros.
-
Foi ainda provado que a ré/ apelada demonstrou condições de ressarcimento do valor “emprestado” pelo autor/apelante, quando no iato temporal da realização do empréstimo até à sua interpelação para pagamento, a mesma ter demonstrado que teria património no Brasil, suficiente para o ressarcir.
-
E por fim foi ainda provado que a ré/apelante não teria a intenção fez qualquer pagamento/restituição/entrega do valores utilizados para a compra do imóvel.
-
Existem elementos suficientes para que o valor entregue pelo autor/apelante seja considera um...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO