Acórdão nº 0745/15.0BECBR de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução02 de Dezembro de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade acima identificada recorreu para o Tribunal Central Administrativo Norte da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra que julgou improcedente a oposição por ela deduzida contra a execução fiscal em que lhe está a ser exigida coercivamente uma dívida ao acima identificado Recorrido.

    1.2 Admitido o recurso, a Recorrente apresentou alegações, com conclusões do seguinte teor: «1) O presente recurso vem interposto da, aliás douta, decisão proferida pelo Tribunal “a quo”, da qual decorre que os fundamentos do alegado pela ora recorrente se não integram em qualquer dos fundamentos previstos no disposto no art. 204.º n.º 1, do Código de Processo e Procedimento Tributário (doravante CPPT).

    2) Salvo o devido e merecido respeito, que é muito, não pode a recorrente conformar-se com os fundamentos plasmados na mesma.

    3) Com efeito, tendo em conta o disposto no art. 204.º n.º 1, do CPPT, em vigor à data dos factos, resulta que os fundamentos invocados pela recorrente em sede de oposição à execução, se subsumem ao disposto no mesmo.

    4) Com efeito, alegou a recorrente que a execução contra si apresentada, não o foi em conformidade com o disposto no art. 188.º, do CPPT.

    5) Uma vez que, inexiste nos autos qualquer decisão de promoção da execução, inexistindo, consequentemente, qualquer fundamentação.

    6) Acrescendo que, a mesma não foi instaurada mediante um despacho, como manda aquele normativo.

    7) O que resulta do simples compulsar dos autos.

    8) A desobediência do comando legal acima referido, na redacção em vigor à data dos factos, gera a inadmissibilidade da dívida exequenda.

    9) Assim, ao não ter decidido dessa forma, a douta decisão aqui em crise deu cobertura a situação de ilegalidade que expressamente se deixa alegada para os devidos e legais efeitos.

    10) A recorrente também desconhece que tipo de título executivo terá dado origem à presente execução, uma vez que na citação se refere a existência de uma certidão de dívida (com o n.º 2015/0000001).

    11) Que, todavia, lhe não foi notificada, o que determina a inexistência jurídica do título executivo.

    12) Vício esse que se deixa expressamente arguido para os devidos e legais efeitos.

    13) Ainda que se considere, como se considerou, que o título executivo que deu génese à execução fiscal é válido, retira-se que, no mesmo, nem sequer é transcrito qualquer acto decisório.

    14) O que faz com que o mesmo não cumpra os requisitos essenciais, plasmados na Lei.

    15) Assim sendo, a notificação/citação do mesmo não é válida, ao contrário do que foi doutamente decidido.

    16) Acresce que, além da fundamentação fáctica ser inexistente, como se deixou já dito, é também insuficiente a fundamentação de direito, pois o mesmo não contém a legislação que fundamenta o acto praticado.

    17) O direito à fundamentação dos actos administrativos e tributários que afectem direitos e interesses legalmente protegidos é princípio constitucional consagrado no art. 268.º, da Constituição da República Portuguesa.

    18) Pretendendo-se com este direito, o reforço das garantias da legalidade administrativa e dos direitos individuais dos cidadãos perante a Administração Pública e considerando-se que a falta de fundamentação das suas decisões dificulta, muitas vezes, a sua impugnação e o próprio controlo jurisdicional.

    19) A fundamentação há-de ser então expressa, através duma exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão.

    20) Deve ser ainda clara, permitindo que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide.

    21) Suficiente, possibilitando ao administrado ou contribuinte, um conhecimento concreto da motivação do acto, ou seja, as razões de facto e de direito que determinaram o órgão ou agente a actuar como actuou.

    22) E congruente, de modo que a decisão constitua conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação, envolvendo entre eles um juízo de adequação e não podendo existir contradição entre os fundamentos e a decisão – cfr. o disposto no art. 77.º, da Lei Geral Tributária.

    23) Já que, fundamentar é enunciar explicitamente as razões ou motivos que conduziram o órgão administrativo à prática de determinado acto.

    24) “In casu”, verifica-se que a citação em apreço, não só não vem acompanhada de qualquer decisão, ou título executivo, como a liquidação em causa e respectivos juros não se encontram fundamentados.

    25) O que, salvo melhor entendimento, consubstancia a ilegalidade prevista e enquadrável na alínea i) do art. 204.º, do CPPT, então em vigor e que é fundamento de oposição judicial.

    26) Com efeito, nos termos do disposto no art. 204.º, n.º 1, alínea i), do CPPT, a oposição à execução fiscal pode basear-se em quaisquer fundamentos não referidos nas alíneas anteriores do mesmo normativo, a provar apenas por documento.

    27) Desde que não envolvam apreciação da legalidade da liquidação da dívida exequenda.

    28) Nem representem interferência em matéria de exclusiva competência da entidade que houver extraído o título.

    29) Tal normativo, configura-se como sendo uma disposição com carácter residual à qual serão subsumíveis todas as situações não enquadráveis nas outras alíneas do mesmo número, em que há um facto extintivo ou modificativo da dívida exequenda, ou que afecta a sua exigibilidade.

    30) Uma das situações que a jurisprudência vem admitindo como enquadrável nesta alínea i) do art. 204.º do CPPT é a existência de causa que afecte, ainda que temporariamente, a exigibilidade da dívida – cfr., neste sentido, os Acs. da Secção de Contencioso Tributário do STA, de 03.04.2013 (recurso 1308/12), de 13.10.2004 (recurso 217/04) e de 30.04.1997 (recurso 21.471), todos disponíveis em www.dgsi.pt.

    31) Ora, a falta de fundamentação da decisão da Autoridade Administrativa, é causa que afecta a exigibilidade da dívida, pelo que, atento o supra exposto, se inclui na referida alínea i) do art. 204.º, do CPPT.

    32) Ao não ter julgado de forma diversa esta questão, a douta decisão aqui em crise, incorreu em erro de julgamento, que aqui se deixa arguido para os legais e devidos efeitos.

    33) No que respeita à alegada falta de notificação do mandatário da aqui recorrente, está comprovado nos autos que o mesmo foi devidamente constituído por aquela, através da junção do respectivo instrumento de representação, ainda na fase graciosa do presente processo.

    34) Facto esse que foi ostensivamente ignorado pela Administração Tributária, em desobediência ao disposto nos arts. 40.º n.º 1, do CPPT e 52.º, do Código do Procedimento Administrativo (CPA).

    35) Porque a ora recorrente constituiu mandatário judicial, ainda antes da apresentação da oposição à execução fiscal, as notificações subsequentes deviam ter sido efectuadas na pessoa daquele causídico, o que não ocorreu.

    36) De acordo com a interpretação jurisprudencial do quadro normativo existente quanto a esta matéria e salvo o devido e merecido respeito por posição contrária, fica aberta, na fase executiva, pelos meios legais de oposição, a discussão da falta ou de eventuais vícios da notificação, designadamente, por inexigibilidade da dívida, ao abrigo do disposto no art. 204.º n.º 1, alínea i), do CPPT.

    37) O que significa que, se é instaurada uma execução fiscal e não foi efectuada notificação válida do acto de liquidação, o sujeito passivo pode sempre opor-se à execução ao abrigo do disposto na alínea i) do n.º 1, do art. 204.º, do CPPT.

    38) Desde logo, invocando a ineficácia do acto, o que impede que a dívida seja exigível, sendo indiferente, para este efeito, que o acto de liquidação enferme de qualquer vício, inclusivamente o da extemporaneidade da liquidação.

    39) Até porque, a notificação não sendo um elemento intrínseco do acto tributário, não é um requisito da sua validade, mas uma simples condição da sua eficácia.

    40) Da exegese do disposto no art. 40.º, do CPPT, deve concluir-se que, tendo sido constituído mandatário judicial no procedimento tributário, é obrigatória a notificação deste do acto de liquidação que pôs termo ao procedimento gracioso.

    41) Não sendo esta notificação substituível pela notificação do próprio sujeito passivo.

    42) Sendo constitucionalmente imposta a notificação dos actos administrativos aos interessados, na forma prevista na lei, nos termos do disposto no art. 266.º n.º 3, da Constituição da República e impondo a lei tributária a notificação aos mandatários constituídos no procedimento dos actos lesivos nele praticados como condição de eficácia do acto notificando, nos termos do disposto no art. 36.º n.º 1, do CPPT, ter-se-á de concluir que a notificação feita somente na pessoa do sujeito passivo é ineficaz.

    43) Ao contrário, do que é referido na douta decisão aqui em sindicância, “actos pessoais” para efeitos de enquadramento no disposto no art. 40.º n.º 2, do CPPT, serão aqueles que implicam a participação/assistência pessoal do sujeito passivo em diligências, para tanto devendo comparecer o próprio, tanto em serviços da Administração Tributária como no Tribunal.

    44) Levando-se, naturalmente, em consideração o conteúdo e o alcance do próprio mandato – cfr. o disposto nos arts. 44.º a 46.º e 452.º e segs., do C. P. Civil.

    45) Assim, atenta esta noção de “actos pessoais”, não pode, como o faz a douta decisão “a quo”, considerar-se o acto de notificação ao sujeito passivo, de uma liquidação tributária, como um acto pessoal.

    46) Devendo a mesma notificação seguir a regra prevista no disposto no art. 40.º n.º 1, do CPPT e, por consequência, devendo ser efectuada na pessoa do mandatário e no seu escritório – veja-se, por todos, o decidido no, aliás douto Acórdão do Venerando TCA Sul, datado de 11/10/2018 e disponível para consulta em www.dgsi.pt.

    47) Em decorrência do acima exposto, é pacífico que as notificações efectuadas exclusivamente na pessoa do próprio executado são ineficazes, nos termos do disposto nos arts. 36.º n.º 1, do CPPT e 266.º n.º 3, da CRP.

    48) Neste sentido, veja-se o decidido no...

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