Acórdão nº 3471/17.2T8VNG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução11 de Novembro de 2020
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL *** I. Relatório 1. AA e BB, instauraram ação declarativa com processo comum, contra Ocidental – Companhia Portuguesa de Seguros de Vida, S.A., pedindo que seja:

  1. Declarado que o grau de incapacidade de 80% atribuído ao Autor a que correspondeu a sua reforma por invalidez, preenche os requisitos previstos no contrato de seguro de vida para a cobertura de invalidez total e permanente do Autor, condenando-se a Ré ao seu reconhecimento; b) Declarado que tal invalidez cumpre os requisitos previsto no contrato de seguro de vida enunciado nos artigos 2º e 4º desta petição para cobertura do risco complementar previsto nas condições especiais de invalidez total e permanente, e por via disso, c) Condenada a Ré na obrigação contratual de liquidar o capital que os AA devem ao BCP, pelos empréstimos enunciados no artigo 1º desta petição, atualizando o valor do débito à data em que for proferida a sentença; d) Condenada a Ré a pagar aos AA a diferença entre o valor que vierem a ser obrigados a liquidar ao BCP, na data da sentença, e o valor que deveriam ter pago em 22 de Janeiro de 2016, e que representou pagamentos indevidos, por exclusiva culpa da Ré, efectuados ao Banco pelos AA, a liquidar em execução de sentença; e) condenada a Ré a devolver todos os valores pagos a título de prémio de seguro pelos AA após o dia 22 de Janeiro de 2016, a título de estorno, a liquidar em execução de sentença; f) condenada a Ré a pagar juros de mora desde 22 de Janeiro de 2016 em diante pelos valores despendidos pelos AA, à taxa anual de 4% .

    Alegaram, para tanto e em síntese, que: em 3 de junho de 2004, no âmbito da outorga de escritura pública de aquisição da sua casa de morada de família, com recurso a mútuo concedido pelo Banco Comercial Português, S.A., sob a forma de crédito à habitação permanente e de crédito associado ao crédito à habitação, aderiram a um contrato de seguro de vida grupo, mediante o qual a R. se obrigava, em caso de morte ou invalidez total e permanente de um dos mutuários, a entregar ao Banco o capital em dívida e, aos AA. ou aos herdeiros destes (consoante ocorresse a morte ou a invalidez), o remanescente; ao A. marido, em consequência de doença de que passou a padecer desde 2015, foi atribuída uma incapacidade permanente global de 80%, vindo a ser reformado e tendo-lhe sido atribuída uma pensão pela Segurança Social (Centro Nacional de Pensões), por invalidez absoluta, desde 8 de fevereiro de 2016; tendo interpelado a R. para o cumprimento do contrato de seguro, esta recusou-se a efetuar o pagamento devido, invocando doença pré-existente, embora tenha autorizado o pagamento de dois outros contratos de crédito pessoal, outorgados em abril e maio de 2015; a R. veio a resolver o contrato de seguro de vida, relativamente ao A., no final de 2016, com fundamento em que o mesmo não teria mencionado na proposta de adesão uma doença pré-existente; tal resolução é ilícita, porque o A. não tinha, na data da proposta, conhecimento de que sofresse de qualquer doença.

    1. A ré contestou a ação, impugnando a factualidade invocada na petição, e alegando, em síntese, que: após a participação efetuada pelo A. em 2016, analisou o relatório médico apresentado e concluiu que este padecia, desde data anterior à da celebração contrato de seguro, de uma doença coronária; tendo o A. omitido a existência de tal doença, o contrato de seguro é nulo, atendendo a que, caso tivesse tido conhecimento da mesma, a R. não o teria celebrado; há ilegitimidade dos AA. relativamente ao pagamento do capital garantido, atendendo a que tal entrega sempre teria de ser efetuada ao Banco Comercial Português, S.A., beneficiário do seguro, e não aos autores.

      Deduziu ainda incidente de intervenção principal provocada do Banco Comercial Português, S.A., tendo tal intervenção sido admitida por despacho de 4.07.2017.

    2. Os autores pronunciaram-se acerca das exceções suscitadas, pugnando pela sua improcedência e mantendo que não esconderam à ré qualquer doença, porquanto o autor desconhecia que tivesse sofrido um síndrome coronário agudo e que lhe tivesse sido colocado um stent, apenas sabendo que tinha feito um exame, ignorando que fosse um cateterismo.

    3. Após prolação de despacho que fixou o valor da ação em € 118.834,13, foi proferido despacho saneador, seguido da identificação do objeto do litígio e da enunciação dos temas de prova.

    4. Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente provada e, consequentemente: a) Declarou que o grau de incapacidade de 80% atribuído ao A., a que correspondeu a sua reforma por invalidez, preenche os requisitos previstos nos contratos de seguro de vida celebrados com a R. em 3/4/2004, referidos na alínea E) dos factos provados, para a cobertura de invalidez total e permanente do A.; b) Declarou que tal invalidez cumpre os requisitos previstos naqueles contratos de seguro de vida para cobertura do risco complementar previsto nas condições especiais de invalidez total e permanente; c) Condenou a R. a pagar ao Banco Comercial Português, S.A., o valor de capital que, à data desse pagamento, seja devido pelos AA. àquele Banco, relativamente aos empréstimos descritos na alínea E) dos factos provados, com o limite de € 118.834,13; d) Condenou a R. a pagar aos AA. a diferença entre o valor de capital que pagar ao Banco Comercial Português, S.A., em consequência da condenação referida em c), e o valor do capital garantido de € 118.834,13, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 17/2/2016, até efetivo e integral pagamento; e) Condenou a R. a pagar aos AA. o valor das prestações de juros que os AA. tenham pagado ao Banco Comercial Português, S.A., relativamente aos empréstimos referidos na alínea E) dos factos provados, desde 17 Fevereiro de 2016, até à data em que ocorra o pagamento mencionado em c), valor esse a definir em ulterior liquidação; f) Condenou a R. a restituir aos AA. todos os valores que, após o dia 17 de Fevereiro de 2016, lhe foram entregues pelos AA. a título de prémios de seguro, relativamente aos contratos de seguro referidos na alínea E) dos factos provados, valores esses a definir em ulterior liquidação, acrescidos de juros de mora, à taxa legal, desde a data de cada uma das entregas efetuadas pelos AA., até efetivo e integral pagamento; g) No mais, absolveu a R. dos pedidos contra a mesma formulados.

    5. Inconformada com esta decisão, dela apelou a ré para o Tribunal da Relação do Porto que, por acórdão proferido em 30.04.2020, julgou procedente a apelação e, em consequência, absolveu a ré dos pedidos formulados na petição.

    6. Inconformada com este acórdão, os autores dele interpuseram recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões, que se transcrevem: «1º) Autores e Ré celebraram um seguro de grupo donde decorre desde logo estarmos sob a alçada do disposto no artigo 1º-g) do DL 176/95 de 26 de julho, por ser esta a lei em vigor na data dos factos; 2º) Nos termos daquela norma considera-se de grupo o seguro de um conjunto de pessoas ligadas entre si ao tomador do seguro por um vínculo de interesse comum.

      1. ) Os AA vieram pedir que o Tribunal a quo declarasse que: a) o grau de incapacidade de 80% atribuído ao Autor a que correspondeu a sua reforma por invalidez, preenche os requisitos previstos no contrato de seguro de vida para a cobertura de invalidez total e permanente do Autor, condenando-se a Ré ao seu reconhecimento; b) Tal invalidez cumpre os requisitos previsto no contrato de seguro de vida para cobertura do risco complementar previsto nas condições especiais de invalidez total e permanente; c) A Ré se constituiu na obrigação contratual de liquidar o capital que os AA devessem ao BCP, pelos empréstimos enunciados que contraíram, atualizando o valor do débito à data em que for proferida a sentença; d) Condenar-se a Ré a pagar aos AA a diferença entre o valor que vierem a ser obrigados a liquidar ao BCP, na data da sentença, e o valor que deveriam ter pago em 22 de janeiro de 2016, e que representou pagamentos indevidos, por exclusiva culpa da Ré, efetuados ao Banco pelos AA, a liquidar em execução de sentença; e) Condenar-se a Ré a devolver todos os valores pagos a título de prémio de seguro pelos AA após o dia 22 de janeiro de 2016, a título de estorno, a liquidar em execução de sentença; f) Condenar-se a Ré a pagar juros de mora desde 22 de janeiro de 2016 em diante pelos valores despendidos pelos AA, à taxa anual de 4%; g) Condenar-se a Ré em custas e demais encargos.

      2. ) Daqui decorre e considerando o disposto no art. 342 nº1 do Código Civil, que aos AA. incumbia a prova dos factos constitutivos do seu direito: - a existência e teor do contrato; - a adesão dos Autores ao referido contrato; e, - a verificação do risco por aquele coberto; 5º) Ora, os AA lograram fazer tal prova, tendo demonstrado ainda que ao Autor marido, entre os dias 28 de Setembro e 9 de Outubro de 2015 foi diagnosticada esclerose múltipla, tendo o mesmo, em Janeiro de 2016, sido submetido a Junta Médica da Segurança Social, que lhe atribuiu uma incapacidade permanente global de 80% de acordo com a TNI, tendo o Autor vindo a ser reformado pelo Centro Nacional de Pensões por invalidez absoluta, desde 8 de Fevereiro de 2016; ora, decorrendo das condições especiais do seguro contratado (cfr. arts. 1º-e e 2º); 6º) Mais demonstrou que a Ré não só não assumiu o risco que lhe competia nos termos da lei e do contrato, como veio a resolver este em dezembro de 2016 7º) Tendo a Ré invocado que o Autor omitiu, aquando da celebração do contrato de seguro, que sofria de uma doença coronária, concluiu pela nulidade dos pedidos de adesão sustentando que se tivesse tido conhecimento da patologia pré-existente, não teria celebrado o contrato de seguro – o que nos parece não estar suportado na lei nem no contrato 8º) Quanto à factualidade entendemos que apesar da...

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